Doutrina Catolica

DOUTRINA CATOLICA

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Mensagem do Cardeal D. Eugenio de Araújo Sales

Arcebispo Emérito da Arquidiocese do Rio de Janeiro

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29/10/2004

Finados

A comemoração dos fiéis defuntos leva aos cemitérios do Rio de Janeiro uma multidão. Vão os que crêem e , também , os incrédulos , para reverenciar seus mortos e - quem tem fé - por eles rezar. Desde o início da Igreja os cristãos costumavam visitar os túmulos de seus mortos ; muitos mártires da Fé , e na mais remota antigüidade , durante todo o ano , há ofícios fúnebres , missas exequiais e outras simples celebrações religiosas , recordando na prece os que nos antecederam na casa do Pai.

Nós lembramos nossos parentes e amigos falecidos normalmente no dia em que foram chamados para o céu. Porém , há uma outra data , a de 2 de novembro , que vigora em muitas partes do mundo , independentemente de crença religiosa.

O Dia de Finados teve início na Abadia de Cluny , França , no ano 998. O então abade Santo Odilon , no dia seguinte à Festa de Todos os Santos, 1 de novembro, estabeleceu uma “Comemoração dos Fiéis Defuntos”. Por ocasião do primeiro milênio desse fato, em 1998, o Papa João Paulo II enviou uma Mensagem, com data de 2 de junho daquele mesmo ano , dirigida ao Bispo de Autun , Châlon e Mâcon, que acumula também o título de Abade de Cluny , em honra desta grande Abadia, assim resumida: “Orando pelos mortos, a Igreja contempla, antes de tudo, o mistério da Ressurreição de Cristo , que nos obtém a vida eterna”. A partir dessa Abadia , difundiu-se, pouco a pouco, por todo o universo o costume de , nessa data, interceder junto a Deus , solenemente , pelos defuntos ou homenageá-los. Santo Odilon chamou esse evento a “Festa dos Mortos”. Diz o “Catecismo da Igreja Católica” (nº 2635): “Interceder, pedir em favor de outro, desde Abraão, é próprio de um coração que está em consonância com a misericórdia de Deus. No tempo da Igreja, a intercessão cristã participa da de Cristo: é a expressão da comunhão dos santos! São Paulo assim exortava os Filipenses (2,3-5): ”Nada façais por espírito de partido ou vanglória, mas com humildade , considerando os outros superiores a vós mesmos”. O Dia de Finados , a visita aos túmulos de nossos entes queridos, a assistência à Santa Missa , as orações pelos mortos, de maneira particular nossos benfeitores, oferecem-nos a oportunidade de interceder por eles e , ao mesmo tempo , em nossas necessidades , socorrer-nos por intermédio dos amigos que já estão na casa do Pai.

A Comemoração Universal dos Mortos nos adverte contra qualquer forma de reencarnação. A crença católica é clara. Lemos em Hebreus (9,27): “É um fato que os homens devem morrer uma só vez, depois do que vem o julgamento”. O Concílio Vaticano II, na Constituição Dogmática “Lumen Gentium” (nº 48) é categórico: “Vigiemos constantemente, a fim de que no termo de nossa vida sobre a terra, que é só uma, mereçamos entrar com Ele para o banquete (...) e ser contados entre os eleitos”. A idéia de existências sucessivas faz parte de algumas religiões orientais, como o hinduismo e o budismo, estando presente também na Grécia. Nos tempos modernos, é defendida em muitos ambientes. A doutrina cristã sobre o assunto é matéria de Fé. A obra divina da salvação dos homens tem valor infinito. Não necessita de repetição da vida humana para alcançar a salvação, oferecida a todos por Cristo, no Calvário. O Concílio (“Gaudium et Spes”, 18) reconhece: “Diante da morte, o enigma da condição humana atinge o clímax”. O que é impossível compreender pela razão, limitada, torna-se claro à luz da Fé. Cristo, na cruz, venceu a morte. O fim terreno do ser humano se transforma em uma eternidade feliz. A Constituição Pastoral “Gaudium et Spes” é clara: “Para qualquer homem que reflete, apresentada com argumentos sólidos, a Fé dá resposta à sua angústia sobre a sorte futura” (idem). Há uma expressão de Santa Teresinha do Menino Jesus de uma extraordinária eloqüência e valor: “Eu não morro, entro na vida”.

Na sua Mensagem por motivo da Comemoração dos Defuntos, o Papa João Paulo II diz: “Para as almas do purgatório, a espera da felicidade eterna, do encontro com o Bem-Amado, é fonte de sofrimentos por causa da pena devida ao pecado, que mantém longe de Deus” (nº 4). A nós que ainda não fomos chamados pelo Pai, resta a certeza de que, terminado o tempo da purificação no purgatório, dar-se-á nosso encontro definitivo com Deus. Além dessa verdade, uma outra deve ser recordada no Dia de Finados: é a possibilidade de ajudar nossos mortos. Diz o Concílio de Trento (Decreto sobre o Purgatório): “A Igreja acredita que as almas que estão retidas no purgatório “são ajudadas pela intercessão dos fiéis e sobretudo pelo sacrifício propiciatório do altar”. O Santo Padre João Paulo II tem, nessa matéria, uma palavra de estímulo: “Encorajo, pois, os católicos a orarem com fervor pelos defuntos, por aqueles das suas famílias e por todos os nossos irmãos e irmãs que morreram, a fim de obterem a remissão das penas devidas aos seus pecados e ouvirem o apelo do Senhor: “Vem (...) ao repouso eterno”. São Paulo (I Tess 4,14): “Se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também os que morreram em Jesus, Deus há de levá-los em sua companhia”. A certeza da morte é indiscutível. O ser humano se interessa sobre seu futuro após a existência terrena. Essa realidade, à qual ninguém pode fugir, reduz a uma dimensão extraordinariamente curta todos os bens terrenos. Em sua busca, muitos lutam com ardor, deixam de lado os valores eternos, quando somente estes podem trazer a verdadeira felicidade ao coração do homem, ainda aqui na terra.

O silêncio dos sepulcros nos fala de modo eloqüente, da vida agitada, do ruído das festas pecaminosas, do ardor das paixões que ofendem a lei de Deus. Tudo passou tão rápido! A eternidade, porém, jamais termina.

Essas considerações por ocasião de Finados, quando iluminadas pela luz da Fé suscitam em nós algo de fundamental: a esperança, que traz a certeza de que temos um Pai que tudo sabe e tudo pode. Através da realidade da morte, Ele nos fala, convidando-nos a uma vida cristã, consciente e fecunda.

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