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Arcebispo Emérito da Arquidiocese do Rio de Janeiro 12/07/2002

O Sacramento da Confissão

No decorrer dos séculos, o sacramento da Penitência ou Confissão tem passado por diversas alterações, conservando, evidentemente, intactos os elementos essenciais. Assim, o ministro é um Bispo ou presbítero e, da parte do penitente, requer-se a contrição, a manifestação dos pecados ao sacerdote que perdoa em nome de Deus e a satisfação por eles, imposta pelo confessor. Até nossos dias, há uma prática ininterrupta da ordem do Senhor: “Recebei o Espírito Santo. Aquele a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados; aqueles aos quais retiverdes, ser-lhes-ão retidos” (Jo 20, 22 s). Até ao século VI, esse processo era público, severo e não podia ser repetido. Dessa data em diante a penitência sacramental foi sendo reiterada e a absolvição era imediata. O Concílio de Trento, no século XVI, 25 de novembro de 1551, XIV Sessão, promulgou as normas que chegaram até nossos dias. O Concílio Vaticano II, no documento “Lumen Gentium”, estuda o tema e, em “Sacrosanctum Concilium” (nº 72), determina: “Revejam-se o rito e as fórmulas da penitência (confissão), de modo que exprimam, com mais clareza, a natureza e o efeito do sacramento”. Isso foi realizado pelo “Ordo Poenitentiae” publicada em 1974. Apresentava três modalidades: a habitual, com a acusação das faltas e a absolvição individual; a segunda, a mesma, mas precedida de uma celebração comunitária; a terceira, após um ato penitencial coletivo, uma absolvição geral. Esta última em casos de necessidade previstos pelo Bispo, de acordo com a Conferência Episcopal, e ficava a obrigação de acusar os pecados em confissão individual, posteriormente, mas antes de nova recepção do sacramento. O Código de Direito Canônico, no cânon 961 §§ 1 e 2, fala sobre o assunto. Por causas diversas, inclusive como conseqüência da turbulência no período pós-conciliar, a terceira modalidade, em vários lugares, predominou e até tornou-se quase exclusiva, de modo, evidentemente, abusivo.

O Sínodo dos Bispos, em 1984 tratou dessa problemática. O Papa João Paulo II recolheu os frutos dessa reflexão e publicou, a pedido dos padres sinodais, a Exortação Apostólica “Reconciliatio et Poenitentia”. A propósito, na sua recente “Carta Apostólica sob a forma de um “motu proprio”, “Misericórdia Dei”, com data de 27 de abril deste ano, observa: “Quando o referido Sínodo se debruçou sobre o tema, estava à vista de todos, a crise deste sacramento, sobretudo nalgumas regiões do mundo. E os motivos que a originaram, não desapareceram neste breve espaço de tempo”. A situação do Sacramento da Confissão, em muitos lugares, se agravou. A absolvição comunitária, que deveria ser reservada unicamente para situações excepcionais, veio a ser algo de habitual. A confissão auricular, de ordinário, tornou-se pouco freqüente. O ânimo apostólico de alguns confessores arrefeceu e os penitentes também optaram, indevidamente, pelo mais cômodo, ou simplesmente não mais recorreram à misericórdia divina, manifestada nesse sacramento. A crise da vida religiosa se revelou, de maneira particular, no abandono da confissão. Contudo, o extraordinário aumento de fervor na freqüência a esse sacramento, motivada pelo Grande Jubileu do ano 2000, fez retornar à confissão multidões. Um dos problemas era encontrar sacerdotes para ouvir individualmente aos que assim os procuravam. Na Carta Apostólica “Novo Millennio Ineunte”, com data de 6 de janeiro de 2001, João Paulo II escreveu: “Solicito ainda uma renovada coragem pastoral para (...) se propor, de forma persuasiva e eficaz, à prática do sacramento da reconciliação”. Houve um retorno à confissão individual, que havia sido, por tantos, abandonada.

João Paulo II volta a insistir, em sua recente Carta Apostólica “Misericordia Dei”. Com ela, o Sucessor de Pedro se dirige aos Bispos e, por intermédio deles, a todos os presbíteros, “para um solícito relançamento do sacramento da Reconciliação, inclusive, como exigência da autêntica caridade e da verdadeira prática pastoral, lembrando-lhes que cada fiel, com as devidas disposições interiores, tem o direito de receber pessoalmente o dom sacramental”.

O tom desse documento não é de uma mera exortação, deixando os destinatários livres para uma interpretação subjetiva da disciplina da Igreja, no que se relaciona com a substituição da confissão individual por uma absolvição coletiva. O Papa alude ao “abandono de uma confissão pessoal”, ao “recurso abusivo à “absolvição geral” ou “coletiva”. Refere-se a graves danos à vida espiritual dos fiéis, causados por esse abuso. Ciente da responsabilidade de Pastor supremo, determina o retorno à normalidade, dada a necessidade e eficácia, sempre atual, desse sacramento. Utiliza expressões categóricas: “A confissão individual e íntegra e a absolvição constituem o único modo ordinário pelo qual o fiel, consciente de pecado grave, se reconcilia com Deus e com a Igreja”. A grande afluência de penitentes não é causa suficiente para apelar à absolvição coletiva. Não cabe ao confessor julgar se, em um caso concreto, pode aplicá-la. Somente ao Bispo diocesano, de acordo com os demais membros da Conferência Episcopal cabe fazê-lo e, evidentemente, dentro das normas contidas na Carta Apostólica O Papa termina o documento, em que dá normas claras em matéria tão importante para a vida eclesial, com as seguintes palavras: “Tudo o que estabeleci com a presente Carta Apostólica, em forma de “motu próprio”, ordeno que tenha valor pleno e estável e seja observado a partir deste dia, não obstante qualquer outra disposição em contrário.” O simples desejo do Sucessor de Pedro sempre é tomado em consideração por quem vive, em profundidade, sua Fé católica. Muito mais, diante dos termos deste documento. Cabe a nós e aos penitentes dar uma resposta generosa e adequada a João Paulo II.

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Confissão no Código de Direito Canônico

959 - No sacramento da penitência, os fiéis que confessam seus pecados ao ministro legítimo, arrependidos e com o propósito de se emendarem, alcançam de Deus, mediante a absolvição dada pelo ministro, o perdão dos pecados cometidos após o batismo, e ao mesmo tempo se reconciliam com a Igreja, à qual ofenderam pelo pecado.

916 - Quem está consciente de pecado grave não celebre a missa nem comungue o Corpo Senhor, sem fazer antes a confissão sacramental, a não ser que exista causa grave e não haja oportunidade para se confessar; nesse caso, porém, lembre-se que é obrigado a fazer um ato de contrição perfeita, que inclui o propósito de se confessar quanto antes.

960 - A confissão individual e íntegra e a absolvição constituem o único modo ordinário, com o qual o fiel, consciente de pecado grave, se reconcilia com Deus e com a Igreja; somente a impossibilidade física ou moral escusa de tal confissão; neste caso, pode haver a reconciliação também por outros modos.

961 - § 1. Não se pode dar a absolvição ao mesmo tempo a vários penitentes sem prévia confissão individual, a não ser que:

1°- haja iminente perigo de morte e não haja tempo para que o sacerdote ou sacerdotes ouçam a confissão de cada um dos penitentes;

2°- haja grave necessidade, isto é, quando por causa do número de penitentes, não há número suficiente de confessores para ouvirem as confissões de cada um, dentro de um espaço de tempo razoável, de tal modo que os penitentes, sem culpa própria, seriam forçados a ficar muito tempo sem a graça sacramental ou sem a sagrada comunhão; essa necessidade, porém, não se considera suficiente, quando não é possível ter os confessores necessários só pelo fato de grande concurso de penitentes, como pode acontecer numa grande festividade ou peregrinação.

§ 2. Julgar sobre a existência das condições requeridas no § 1, n.2, compete ao Bispo diocesano que, levando em conta os critérios concordados com os outros membros da Conferência dos Bispos, pode determinar os casos de tal necessidade.

* Texto da Legislação Complementar ao Código de Direito Canônico emanada pela CNBB #8226; Quanto ao cân. 961 § 2:

O Bispo diocesano poderá permitir a absolvição sacramental coletiva sem prévia confissão individual, levando em conta, além das condições requeridas pelos câns. 960-963, as seguintes recomendações e critérios:

1. A absolvição coletiva, como meio extraordinário, não pode suplantar, pura e simplesmente, a confissão individual e íntegra com absolvição, único meio ordinário de reconciliação sacramental.

2. Para facilitar aos fiéis o acesso à confissão individual, estabeleçam-se horários favoráveis, fixos e freqüentes.

3. Fora das condições que a justificam, não se pode dar absolvição coletiva.

4. Ministros e penitentes poderão, contudo, sem culpa própria, encontrar-se em circunstâncias que legitimam o recurso, mesmo repetido, a esse meio extraordinário de reconciliação. Não se pode, portanto, ignorando tais situações, impedir simplesmente ou restringir seu emprego pastoral.

5. A absolvição sacramental coletiva seja precedida de adequada catequese e preparação comunitária, não omitindo a advertência de que os fiéis, para receberem validamente a absolvição, devem estar dispostos e com o propósito de, no tempo devido, confessar-se individualmente dos pecados graves que não puderam confessar.

6. Para dar licitamente a absolvição coletiva, fora do perigo de morte, não basta que, em vista do número de penitentes, os confessores sejam insuficientes para atendê-los na forma devida, em espaço de tempo razoável. Requer-se, além disso, que sem a absolvição coletiva esses fiéis, sem culpa própria, permaneceriam, por cerca de um mês, privados do perdão sacramental ou da comunhão; ou lhes seria muito penoso ficar sem esses sacramentos.

962- § 1. Para que um fiel possa receber validamente a absolvição dada simultaneamente a muitos, requer-se não só que esteja devidamente disposto, mas que ao mesmo tempo se proponha também a confessar individualmente, no tempo devido, os pecados graves que no momento não pode assim confessar.

§ 2. Os fiéis, enquanto possível, também no momento de receber a absolvição geral, sejam instruídos sobre os requisitos do § 1; à absolvição geral, mesmo em caso de perigo de morte, se houver tempo, preceda uma exortação para que cada um cuide de fazer o ato de contrição.

963 - Salva a obrigação mencionada no cân. 989, aquele a quem são perdoados pecados graves mediante absolvição geral, ao surgir oportunidade, procure quanto antes, a confissão individual, antes de receber outra absolvição geral, a não ser que se interponha justa causa.

964 § 1. O lugar próprio para ouvir confissões é a igreja ou oratório.

§ 2. Quanto ao confessionário, estabeleçam-se normas pela Conferência dos Bispos, cuidando-se porém que haja sempre em lugar visível confessionários com grades fixas entre o penitente e o confessor, dos quais possam usar livremente os fiéis que o desejarem.

* Texto da Legislação Complementar ao Código de Direito Canônico emanada pela CNBB- Quanto ao cân. 964 § 2:

1. O local apropriado para ouvir confissões seja normalmente o confessionário tradicional, ou outro recinto conveniente expressamente preparado para essa finalidade.

2. Haja também local apropriado, discreto, claramente indicado e de fácil acesso, de modo que os fiéis se sintam convidados à prática do sacramento da penitência.

§ 3. Não se ouçam confissões fora do confessionário, a não ser por justa causa.

965 - Ministro do sacramento da penitência é somente o sacerdote.

966 -§ 1. Para a válida absolvição dos pecados se requer que o ministro, além do poder de ordem, tenha a faculdade de exercer esse poder em favor dos fiéis aos quais dá absolvição.

967 - § 1. Além do Romano Pontífice, pelo próprio direito, os Cardeais têm a faculdade de ouvir confissões em todo o mundo, como também os Bispos que dela usam licitamente, em qualquer parte, a não ser que em algum caso particular o Bispo diocesano num caso particular se tenha oposto.

969 -§ 1. Só o Ordinário local é competente para dar a quaisquer presbíteros a faculdade para ouvirem confissões de todos os fiéis; todavia, os presbíteros de institutos religiosos não a usem sem a licença, ao menos presumida, de seu Superior.

970 - Não se conceda a faculdade de ouvir confissões, a não ser a presbíteros que tenham sido julgados idôneos por meio de exame, ou cuja idoneidade conste por outro forma.

971 - O Ordinário local não conceda a faculdade de ouvir confissões de forma habitual a um presbítero, mesmo que tenha domicílio ou quase-domicílio em sua jurisdição, sem antes ouvir, enquanto possível, o Ordinário desse presbítero.

972 - A faculdade para ouvir confissões pode ser concedida pela autoridade competente mencionada no cân. 969, por tempo indeterminado ou determinado.

976 - Qualquer sacerdote, mesmo que não tenha faculdade de ouvir confissões, absolve válida e licitamente de qualquer censura e de qualquer pecado qualquer penitente em perigo de morte, mesmo que esteja presente um sacerdote aprovado.

977 - Exceto em perigo de morte, é inválida a absolvição do cúmplice em pecado contra o sexto mandamento do Decálogo.

978 - § 1. Lembre-se o sacerdote que, ao ouvir confissões, desempenha simultaneamente o papel de juiz e de médico, e que foi constituído por Deus como ministro da justiça divina e, ao mesmo tempo, de sua misericórdia, para procurar a honra divina e a salvação das almas.

§ 2. O confessor, como ministro da Igreja, ao administrar o sacramento, atenha-se fielmente à doutrina do magistério e às normas dadas pela autoridade competente.

979 - O sacerdote, ao fazer perguntas, proceda com prudência e discrição, atendendo à condição e idade do penitente, e abstenha-se de perguntar o nome do cúmplice.

980 - Se ao confessor não resta dúvida a respeito das disposições do penitente, e este pede a absolvição, a absolvição não seja negada nem diferida.

981 - De acordo com a gravidade e número dos pecados, levando em conta, porém, a condição do penitente, o confessor imponha salutares e convenientes satisfações, que o penitente em pessoa tem obrigação de cumprir.

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