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Doutrina Católica

VOZ DO PASTOR

D. Eugênio de Araújo Sales

29/6/2001

Dom Vital

No Próximo 4 de julho, em Recife, terá lugar solene concelebração eucarística, por ocasião do encerramento da fase diocesana do Processo para a Beatificação de Dom Frei Vital Maria Gonçalves de Oliveira.

O procedimento canônico teve início a 14 de janeiro de 1992, ao ser constituída a “Comissão Especial com a incumbência de realizar uma pesquisa histórica nas etapas do mesmo processo, concluídas no passado”. O passo seguinte foi o despacho do Cardeal Angelo Felici, então Prefeito da Congregação para a Causa dos Santos, com data de 3 de novembro de 1994: “Feitas as investigações, apraz-me comunicar que, da parte da Santa Sé, nada obsta para que a Causa de Beatificação do Servo de Deus Vital Maria Gonçalves de Oliveira possa prosseguir”. Celebramos, com alegria e grande esperança, a conclusão dessa primeira parte. Aguardamos pleno sucesso nos passos seguintes. Interessa também à nossa Pátria a exaltação da memória de grandes figuras da História da Igreja no Brasil. Ela é elemento gerador de otimismo. E este é fator válido no esforço pela superação de problemas e dificuldades. Nem sempre recordamos convenientemente essas personalidades e as lições que nos legaram. Dom Vital nasceu no Município de Pedras de Fogo, Paraíba, a 27 de novembro de 1844. Foi aluno em Recife e do Seminário de Olinda. Continuou seus estudos na França e ingressou no Convento dos Capuchinhos, em Versailles. Chamava-se Antonio e, na ordem, recebeu o nome de Frei Vital Maria. Completou sua formação em Toulouse e foi ordenado sacerdote a 2 de agosto de 1868. Nesse mesmo ano retornou ao Brasil e, em São Paulo, exerceu diversos cargos, inclusive o de Professor de Teologia. Aí recebeu, a 21 de maio de 1871, o nomeação para Bispo de Olinda. Ao pedido “para que o livrem de semelhante fardo, em razão da idade e da indignidade”, Pio IX respondeu: “Hás de estrenuamente defender a causa de Deus e nada omitir que possa dizer respeito à salvação e proveito do rebanho a ti confiado”. Uma diretriz marcada por uma premonição.

Ao tomar posse, a 24 de maio do ano seguinte, já se percebiam os sinais de borrasca. Publicações anti-clericais chamavam-no de “ultramontano”. Em novembro desse mesmo ano, escreveu uma Carta Pastoral defendendo a Igreja, atacada pela imprensa. Dom Vital incomodava, por tentar corrigir graves falhas na vida diocesana. A resposta ao Bispo foi o anúncio pomposo de uma Missa e publicações dos nomes de maçons pertencentes a Irmandades, inclusive sacerdotes. O Pastor reage com prudência. Uma circular confidencial procura levá-los a obedecer à determinação da Igreja. Quase todos os eclesiásticos observaram a ordem dada. O interdito canônico a essas associações foi precedida de caridosa exortação, que explicitava “a pena imposta permanece em vigor, até à retratação da Irmandade, que fica em pleno gozo de seus direitos, na parte temporal e na administração de seus bens”.

Houve recurso à Coroa. Pressionado pelo Governo Imperial, Dom Vital responde ao Ministro João Alfredo: “Se a minha resistência vai dar lugar a cenas tristes, só conheço um meio: peça o Governo Imperial à Santa Sé que me mande, quanto antes, para meu convento”. Chegando ao Rio de Janeiro, encarcerado no Arsenal de Marinha, recebe a visita de Dom Pedro Maria de Lacerda, Bispo do Rio, que lhe diz emocionado: “Vejo em Vossa Excelência um prisioneiro de Cristo; meu Clero e Cabido serão felizes pondo-se às suas ordens.” A amizade fraterna e a comunhão na defesa da verdade e da liberdade da Igreja uniram desde então Dom Vital e a diocese do Rio de Janeiro.

O julgamento teve aspectos dramáticos e comoventes. O Sucessor do Apóstolos foi condenado, como incurso no Artigo 96 do Código Penal, a quatro anos de prisão, com trabalhos forçados, por crime inafiançável. A 22 de dezembro de 1873 Dom Vital foi recolhido à Fortaleza de São João.

Pelas pressões do Duque de Caxias, foi anistiado pelo Decreto nº 5.933, de 17 de dezembro 1875 e reconhecida a inocência. A seguir, viaja a Roma, em visita “ad limina”. Ao ser recebido pelo Papa Pìo IX, este o abraçou com afeto e disse: “Aprovo tudo o que Vossa Excelência fez, desde o princípio”. Regressou à Diocese em 6 de outubro de 1876 e recebido triunfalmente. Iniciou, com entusiasmo, suas atividades pastorais. No entanto, agravou-se seu estado de saúde e embarcou para a Europa, em busca de tratamento. Escreveu ao Papa, com sua renúncia à Diocese, sem resultado. A medicina não conseguiu descobrir a enfermidade, que provocou misteriosos sintomas. Dom Vital morreu em Paris, a 4 de julho de 1878. Ao receber o Viático, diz: “Perdôo de coração aos meus inimigos e ofereço a Deus o sacrifício da minha vida”. Monsenhor de Ségur, na oração fúnebre, por ocasião das exéquias, afirmou que Dom Vital morreu envenenado. Assim terminou esse triste episódio, que é denominado a “Questão Religiosa”. Com ela, foram dados os primeiros passos para a correção de graves obstáculos ao florescimento da vida da Igreja no Brasil. Foi o início de um despertar.

A desejada Beatificação será um reconhecimento de uma vida heróica, a serviço do Evangelho. Dom Vital sofreu a amargura da injustiça, mas se tornou um modelo fecundo como Pastor fiel às orientações da Igreja. Seu exemplo de fidelidade à doutrina do Sucessor de Pedro é um valioso estímulo a todos nós, do clero e do laicato. Agiu com prudência, corajoso sem ser audacioso, obedeceu ao apelo que, no futuro, seria feito por João Paulo II, no dia de sua eleição: “Não tenhais medo.”

Mensagem do Cardeal D. Eugenio de Araújo Sales

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