Doutrina Católica

DOUTRINA CATÓLICA

OS DOGMAS DA IGREJA

Por Margarida Hulshof

Gostaria de saber quais são os dogmas da Igreja, e quando foram instituídos (Ana Carolina R. Zabisky – Araraquara/SP.)

Os dogmas são as verdades da nossa fé, ou seja, tudo aquilo em que nós, católicos, acreditamos e professamos como verdade revelada por Deus.

Na base de tudo está a nossa crença em que Cristo fundou a sua Igreja sobre Pedro e seus sucessores, e a ela confiou a missão de transmitir fielmente seus ensinamentos, prometendo-lhe sua assistência infalível (por meio do Espírito Santo) até o fim dos tempos (Mt 16,17-19; 28,19-20). Por isso dizemos no Credo: “Creio na santa Igreja Católica”. Isso é um dogma, ou seja, uma verdade de fé que não pode ser questionada. Quem não aceita a autoridade divina da Igreja, não pode considerar-se autenticamente católico.

A essa missão da Igreja, de ensinar em nome de Cristo, chamamos “Magistério”. Esse magistério se exerce de duas maneiras:

1) Magistério ordinário: o ensinamento unânime dos bispos do mundo inteiro, em comunhão com o Papa.

2) Magistério extraordinário: manifesta-se em condições especiais (dúvidas ou controvérsias que exijam uma definição solene). O Magistério extraordinário pode expressar-se pelas definições dos Concílios Ecumênicos (“ecumênico” no sentido de pleno, universal, que abrange a Igreja inteira), ou então pelas definições do Sumo Pontífice quando fala ex cathedra, ou seja, valendo-se expressamente de sua autoridade como sucessor de Pedro.

Duas coisas precisamos entender: primeiro, que não é necessária uma definição solene para que haja um dogma de fé. Todos os ensinamentos da Igreja merecem igual credibilidade, desde que haja a necessária unanimidade entre todos os bispos e a comunhão com o Papa. A opinião isolada de um ou outro bispo não representa a autoridade do Magistério da Igreja.

O segundo ponto importante é que os dogmas não se “criam”, não surgem “do nada”, estabelecendo como obrigatória, a partir de determinada data, uma verdade de fé que até então não era professada. A data da definição de um dogma não significa o “início da validade” de uma verdade de fé. Todos as definições do magistério extraordinário referem-se a pontos da doutrina já de há muito estabelecidos na Igreja e unanimemente professados, e que desde os tempos apostólicos já estavam ao menos implícitos na fé da Igreja, mas que precisaram ser solenemente definidos, em determinado momento, diante de dúvidas e controvérsias que surgiram.

Por exemplo, o dogma da infalibilidade do Papa (em matéria de fé e de moral) só foi definido em 1870, no Concílio Vaticano I, mas isso não significa que, antes disso, o ensinamento do Papa não fosse infalível, e sim que sua autoridade nunca tinha sido, até então, posta em dúvida de forma significativa, a ponto de exigir essa definição oficial.

Outra questão importante é que nem todos os ensinamentos da Igreja são dogmas de fé, ou seja, verdades imutáveis. De modo geral, os dogmas referem-se aos ensinamentos do próprio Cristo, que a Igreja não tem autoridade para mudar, como por exemplo a indissolubilidade do matrimônio, ou a fé na presença real de Cristo na Eucaristia.

Às vezes, alguns princípios podem não ter sido expressamente definidos por Cristo, mas estão subentendidos em suas atitudes, como por exemplo a atribuição do ministério sacerdotal exclusivamente a homens, que a Igreja também já afirmou não ter poder para mudar. Quando se trata, porém, de normas da Igreja, e não de um mandamento expresso de Cristo, há possibilidade de que essas normas venham a ser modificadas pela mesma Igreja, segundo as necessidades ou o contexto social e cultural de cada época, sempre com vistas ao melhor proveito espiritual e a uma adequada compreensão dos mistérios da fé por parte dos fiéis. O conteúdo da fé não muda, mas sua expressão pode mudar, segundo o discernimento da Igreja em cada tempo. Assim, já no tempo dos apóstolos, diante de uma problemática nova que surgiu, o Espírito Santo inspirou à Igreja (reunida em concílio) o discernimento de que os costumes judeus não precisavam ser impostos aos pagãos convertidos ao cristianismo.

Em nossos dias, temos a questão da liturgia, que abandonou (embora não exclua) a língua latina em favor das línguas vernáculas, ou a posição do altar e do celebrante na Missa.

O que pode mudar (até certo ponto) é a expressão, não o conteúdo do mistério sacramental, como, por exemplo, o dogma da presença real de Cristo na Eucaristia.

O sacramento da reconciliação é outro cuja forma passou por muitas variações ao longo da história da Igreja, embora o essencial não mude, ou seja, a nossa fé no perdão dos pecados concedido por Deus nesse sacramento, por intermédio do sacerdote. A regra do celibato sacerdotal também não constitui dogma de fé, e pode ser mudada, se algum dia a Igreja o julgar conveniente.

De qualquer forma, permanece a obrigação de nos submetermos às normas hoje vigentes, ainda que no futuro elas venham a mudar. O caráter temporal de determinada regra não significa que sua obediência seja facultativa.

As primeiras verdades de fé foram definidas ainda pelos apóstolos, e são aquelas contidas no “Símbolo dos Apóstolos”, o Credo que rezamos sempre na Missa. Aos poucos, as controvérsias que foram surgindo tornaram necessário explicitar mais detalhadamente essas verdades, dando origem ao Símbolo Niceno-Constantinopolitano, também usado na liturgia em algumas ocasiões especiais. Essa formulação mais completa do Credo (que explicitou, por exemplo, a doutrina da Santíssima Trindade) é fruto dos concílios de Nicéia I (325) e de Constantinopla I (381). Recentemente (em 1968) o Papa Paulo VI publicou o “Credo do Povo de Deus”, no qual explica detalhadamente e atualiza (diante dos modernos questionamentos) a profissão de fé católica.

A inspiração divina da Bíblia é dogma de fé, e o Magistério da Igreja definiu em 393, pela primeira vez, o catálogo dos livros que deviam ser considerados como divinamente inspirados. Todo o ensinamento da Igreja precisa estar em conformidade com as verdades bíblicas, o que não significa que a Bíblia seja a única fonte da fé em nossa Igreja, pois ela mesma recebe sua autoridade do Magistério, que lhe é anterior e ao qual está subordinada. Como os escritos bíblicos podem, muitas vezes, dar margem a interpretações diversas e até contraditórias, cabe ao Magistério da Igreja (segundo o ministério conferido por Jesus aos apóstolos) a autoridade para definir qual é a interpretação correta.

A doutrina quanto ao purgatório já era claramente professada no tempo de Santo Agostinho (século IV), e foi definida mais explicitamente em 1264, no II Concílio de Lião.

A concepção virginal de Jesus por Maria já era professada pelos primeiros cristãos, e já os Santos Padres (séculos II e III) atestavam sua virgindade perpétua, antes, durante e depois do nascimento de Jesus. Em 649, o Concílio regional de Latrão formulou essa doutrina. Em 431, o Concílio de Éfeso já tinha proclamado Maria como Mãe de Deus. Quase todas as verdades de fé não foram definidas oficialmente uma única vez, mas sim reafirmadas várias vezes, ao longo da história da Igreja.

Quanto às definições solenes ex cathedra, foram apenas doze ao longo de toda a história da Igreja. São elas:

1º) Em 449, S. Leão Magno professava a presença, em Cristo, de duas naturezas (humana e divina) e uma só pessoa (divina);

2º) Em 680, S. Agatão afirmou haver, em Cristo, duas vontades, a humana e a divina, sendo a humana submissa à divina;

3º) Em 1302, Bonifácio VIII afirmou a autoridade do Papa sobre todas as pessoas, no que diz respeito à vida eterna;

4º) Em 1336, Bento XII definiu que, logo após a morte corporal, as almas totalmente puras são admitidas à visão de Deus face-a-face;

5º) Em 1520, Leão X condenou, como heréticas, 41 das proposições de Lutero;

6º) Em 1653, Inocêncio X condenou algumas proposições da heresia jansenista, que subestimava o papel da graça divina na salvação; 7º) Em 1687, Inocêncio XI condenou a heresia quietista, que negava o papel do livre arbítrio humano na salvação;

8º) Em 1699, Inocêncio XII condenou ainda a doutrina quietista;

9º) Em 1713, Clemente XI condenou um ressurgimento do jansenismo;

10º) Em 1794, Pio VI condenou as proposições do Sínodo de Pistoia, que reivindicava uma Igreja de cunho nacionalista e regional, submetida mais ao Estado do que ao Papa;

11º) Em 1854, Pio IX definiu o dogma da Imaculada Conceição de Maria;

12º) Finalmente, em 1950, Pio XII definiu o dogma da Assunção Corporal de Maria.

Como se pode ver, os dogmas de nossa fé vão muito além das definições solenes ex cathedra. O magistério autêntico da Igreja merece igual crédito em todas as formas pelas quais se manifesta, em sua missão de guardar íntegro o depósito da fé a ela confiado por Jesus.

Margarida Hulshof

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