Doutrina Católica

DOUTRINA CATÓLICA

CELIBATO SACERDOTAL: IMPOSIÇÃO OU OPÇÃO?

D. José Cardoso Sobrinho

Por ocasião da recente assembléia geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, uma parte da imprensa leiga voltou, mais uma vez, a abrir espaço para o tema do celibato sacerdotal, quase sempre numa atitude hostil. A objeção mais comum contra o celibato é a seguinte: por que a Igreja (ou o Papa) obriga os padres a não se casarem? A esta objeção, o Papa João Paulo II respondeu nestes termos: "É fruto de equívoco - se não mesmo de má fé - a opinião amplamente difundida, segundo a qual o celibato sacerdotal na Igreja Católica seria simplesmente uma instituição imposta por lei àqueles que recebem o sacramento da Ordem. Todos sabemos que não é assim..." (Carta aos padres, na Quinta-feira Santa de 1979, primeiro ano do seu pontificado).

Nessa pergunta-objeção, a questão está mal colocada. Parte-se do falso pressuposto de que a Igreja obriga os padres a renunciarem ao matrimônio. Imagina-se (falsamente) que preexiste uma inteira categoria de pessoas (os padres) sobre os quais a autoridade eclesiástica baixa um decreto, impondo-lhes o ônus do celibato, proibindo-lhes contrair matrimônio. Nada mais falso. O direito à livre escolha do próprio estado de vida (casamento ou celibato) é um direito natural, proclamado oficialmente pela própria Igreja. Já o afirmara Pio XII, em sua mensagem de Natal de 1942. O Beato João XXIII reafirmou o mesmo na Encíclica Pacem in Terris: "É direito da pessoa escolher o estado de vida, de acordo com suas preferências; e, portanto, de constituir família, na base da paridade de direitos e deveres entre homem e mulher; ou então, de seguir a vocação ao sacerdócio ou à vida religiosa".

O Concílio Vaticano II, ao descrever os direitos fundamentais, universais e invioláveis de toda pessoa humana, coloca entre eles "o direito de escolher livremente o estado de vida e de constituir família" . O Código de Direito Canônico estabelece no Cân. 219: "Todos os fiéis têm o direito de ser imunes de qualquer coação na escolha do estado de vida". Portanto, nenhuma autoridade humana pode obrigar alguém a contrair matrimônio ou a abraçar o celibato.

DIREITO DA IGREJA DE ESCOLHER SEUS MINISTROS

Entretanto, simultaneamente com esse direito natural de toda pessoa humana, existe também o direito de toda associação ou sociedade de escolher livremente seus próprios ministros ou dirigentes; e, por conseguinte, o direito a estatuir normas sobre a idoneidade dos mesmos. Isto se pode constatar lendo os estatutos de qualquer associação, mesmo profana, esportiva, etc. nos quais se determinam os requisitos ou condições para que alguém possa ser escolhido como presidente, diretor, sócio, etc. Compete, portanto, à Igreja o direito de estabelecer normas sobre a idoneidade dos candidatos ao sacerdócio, como o recorda Paulo VI na Encíclica Sacerdotalis Caelibatus: "A vocação sacerdotal, ainda que divina na sua inspiração, não se torna definitiva e operante sem o exame e a aceitação de quem possui na Igreja o poder e a responsabilidade do ministério ao serviço da comunidade eclesial; e pertence por conseguinte à autoridade da Igreja estabelecer, segundo os tempos e os lugares, quais devam ser em concreto os homens e quais os requisitos exigidos para que possam considerar-se aptos para o serviço religioso e pastoral da mesma Igreja".

Fruto do exercício deste direito é toda a legislação hodierna sobre a idoneidade ao sacerdócio e, em particular, o requisito do celibato. A Igreja, já nos primeiros séculos de sua existência, observando o diverso teor de vida das pessoas unidas em matrimônio e daqueles que se haviam, espontaneamente, consagrado a Deus pelo celibato, julgou que estes eram mais idôneos do que aqueles para o exercício das funções sacerdotais. E, apesar de haver, nos primeiros séculos, exemplos de sacerdotes no estado matrimonial, paulatina e espontaneamente se introduziu o costume de escolher as pessoas julgadas mais idôneas, ou seja, os consagrados totalmente pelo celibato. O costume, nascido espontaneamente, transformou-se em norma obrigatória (Encíclica SACERDOTALIS CAELIBATUS n. 15).

COEXISTÊNCIA DOS DOIS DIREITOS

Estes dois direitos (o direito do fiel de optar entre casamento ou celibato e o direito da Igreja de recrutar livremente os seus presbíteros) podem e devem coexistir harmonicamente. Aqui também vale o que ensina João XXIII na Pacem in Terris: "O exercício dos direitos da parte de uns não deve constituir um obstáculo ou uma ameaça ao exercício dos mesmos direitos da parte de outros". O exercício do direito de cada fiel não deve impedir o exercício do direito da autoridade eclesiástica; e vice-versa. Haveria violação de direito se um Bispo, desejando promover alguém ao sacerdócio, primeiro o obrigasse a abraçar o celibato. E violar-se-ia igualmente o direito da Igreja se se pretendesse constrangê-la a conferir a ordenação sacerdotal a pessoas não consagradas pelo celibato.

CONCLUSÃO:

A renúncia ao matrimônio por motivos religiosos é uma dessas novidades misteriosas, introduzidas no mundo por nosso Salvador; novidades que não podem ser acolhidas senão por aqueles que acreditam realmente em Deus (o promulgador do Decálogo) e que têm uma Fé total na palavra de Jesus. Certas objeções contra o celibato denotam claramente que seus autores não acreditam na vida futura e, menos ainda, no Evangelho de Jesus Cristo. Aliás, o próprio Jesus, ao revelar esse caminho novo do celibato "por causa do Reino dos céus", acrescentou: "Nem todos são capazes de compreender essa palavra, mas só aqueles a quem é concedido" (Mt 19,11). Entretanto, nossa Santa Igreja, impertérrita, continua a proclamar, através dos séculos, que o celibato "é uma pérola preciosa" (cf Mt 7,6); enquanto seus fiéis, movidos pela ação do Espírito Santo, continuam a abraçar esse estilo de vida, testemunhando a todos que "a figura deste mundo passa" mui rapidamente (cf 1Cor 7,31) e que vale a pena usar o breve tempo da vida terrena para incitar toda a humanidade a erguer o olhar para as coisas do alto (cf Cl 3, 1-4).

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