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Equívocos Comuns Sobre o Charlatanismo

Stephen Barrett, M.D.

Apesar de muitos pessoas serem prejudicadas pelo charlatanismo, poucas o vêem como um problema grave e menos ainda estão interessadas em tentar fazer qualquer coisa a respeito. Muitos equívocos parecem contribuir para esta situação:

Equívoco n°1: É fácil identificar o charlatanismo. É muito mais difícil identificar o charlatanismo do que a maioria das pessoas acham. Os promotores modernos utilizam jargões científicos que podem enganar pessoas não familiarizadas com conceitos que estão sendo discutidos. Até mesmo profissionais da saúde podem ter dificuldade em separar os fatos da ficção nos campos não ligados a sua área de atuação. 

Equívoco n°2: A experiência pessoal é a melhor maneira para dizer se algo funciona. Quando você se sente melhor após ter usado um produto ou procedimento, é natural dar crédito a qualquer coisa que se tenha feito. Contudo, isto pode induzir ao erro, porque muitas doenças se resolvem por elas mesmo e aquelas que não podem ter sintomas variáveis. Mesmo condições graves podem ter variações diárias suficientes para permitirem que os métodos charlatanescos ganhem muitos seguidores. Além disso, tomar uma ação freqüentemente produz alívio temporário dos sintomas (um efeito placebo). Por estas razões, estudos científicos controlados são normalmente necessários para estabelecer se métodos de saúde funcionam realmente. 

Equívoco n°3: A maioria das vítimas do charlatanismo são facilmente enganadas. Os indivíduos que compram um livro de regime ou pílulas "mágicas" de regime um após o outro são de fato ingênuos. E também o são muitos pessoas que seguem quaisquer novidades que estejam em voga. Mas a maioria das vítimas do charlatanismo são meramente insuspeitas. As pessoas tendem a acreditar naquilo que mais ouvem. E as idéias charlatanescas -- particularmente sobre nutrição -- estão em toda parte. Outro grupo grande de vítimas do charlatanismo é composto por indivíduos que tenham doenças graves ou crônicas que faz com se sintam desesperados o suficiente para tentar qualquer coisa que ofereça esperança. Pessoas alienadas -- muitas das quais são paranóicas -- formam outro grupo de vítimas. Estas pessoas tendem a acreditar que nosso suprimento de alimentos são inseguros; que os medicamentos trazem mais prejuízos que benefícios; e que os médicos, companhias farmacêuticas, as grandes companhias alimentares e agências governamentais não estão interessados em proteger o público. Tais crenças as tornam vulneráveis àqueles que oferecem alimentos e abordagens de cura que alegam serem "naturais".

Equívoco n°4: As vítimas do charlatanismo merecem o  que recebem. Isto é baseado na idéia de que as pessoas que são crédulas deveriam "conhecer melhor as coisas" e desse modo merecem o que recebem. Este sentimento é uma das principais razões pela qual jornalistas, oficiais de justiça, juízes e legisladores raramente dão prioridade no combate ao charlatanismo. Contudo, como apontado acima, a maioria das vítimas não são ingênuas. Tampouco as pessoas merecem sofrer ou morrer devido a ignorância ou ao desespero. 

Equívoco n°5: Todos charlatões são fraudadores e trapaceiros. O charlatanismo é freqüentemente discutido como se todos seu promotores estivessem engajados em trapaça deliberada. Isto não é verdade. Promotores do charlatanismo pelo reembolso postal são quase sempre artistas que batem e fogem e que sabem que seus produtos são falsos mas esperam obter lucros antes que o Serviço Postal os coloque para fora. Mas muitos outros promotores do charlatanismo parecem ser crentes sinceros, fanáticos e devotos cujo problema é a falta de crítica -- um fracasso em aplicar o ceticismo para a terapia escolhida, muito parecido com uma pessoa religiosa que cegamente aceita "a fé".

Equívoco n°6: A maioria do charlatanismo é perigoso. Charlatanismo pode prejudicar seriamente ou matar pessoas por induzi-las a abandonarem ou adiarem tratamentos eficazes para condições graves. Pode também arruinar a vida das pessoas que são tão completamente iludidas que passam ela mesmas a se dedicarem na promoção dos métodos e bem-estar do charlatão. Ainda que o número de pessoas prejudicadas desta maneira não possa ser determinado, não é grande o suficiente ou óbvio o suficiente para despertar o clamor do público geral. A maioria das vítimas do charlatanismo são prejudicadas economicamente ao invés de fisicamente. Ainda mais, muitas pessoas acreditam que um método não científico as ajudou. Em muitos casos, elas confundem causa-e-efeito e coincidência. Mas algumas vezes uma abordagem não comprovada na verdade alivia sintomas relacionados com as emoções por baixar os níveis de tensão da pessoa.

Equívoco n°7: "Formas "menores" de charlatanismo são inofensivas. Charlatanismo envolvendo quantias pequenas de dinheiro e nenhum dano físico são freqüentemente vistos como inofensivos. Entre os exemplos temos o "seguro nutrição" com pílulas de vitaminas e o uso de uma pulseira de cobre para artrite. Porém seu uso indica confusão por parte do usuário e vulnerabilidade para formas mais sérias de charlatanismo. Também existe o dano a sociedade. O dinheiro desperdiçado com o charlatanismo deveria ser melhor gasto com pesquisas, mas muito deste dinheiro vai para os bolsos de pessoas (como os empurradores de vitamina) que estão espalhando desinformação e tentando enfraquecer as leis de proteção do consumidor. 

Equívoco n°8: O governo nos protege. Apesar de várias agências governamentais estarem envolvidas no combate ao charlatanismo, muitas não dão prioridade suficiente para serem eficientes. Ainda mais, as agências envolvidas não possuem um plano coordenado para maximizar sua eficiência. 

Equívoco n°9: O sucesso do charlatanismo representa o fracasso da medicina. É freqüentemente sugerido que as pessoas se voltam ao charlatões quando os médicos são rudes com elas, e que se os médicos fossem mais atenciosos, seus pacientes não se voltariam aos charlatões. É verdade que isto algumas vezes acontece, mas muitas atividades do charlatanismo não envolvem assistência médica. Os médicos deveriam dar atenção as emoções de seus pacientes e fazer um esforço especial para explicarem coisas para eles. Mas culpar a medicina pelo charlatanismo é como considerar o sucesso da astrologia como culpa da astronomia. Algumas das necessidades das pessoas superam aquilo que a assistência à saúde científica e ética pode oferecer. A razão principal para o sucesso do charlatanismo é sua habilidade em seduzir pessoas insuspeitas. Há alguns anos atrás uma pesquisa realizada na Nova Zelândia descobriu que a maioria dos pacientes de câncer que utilizaram terapias "alternativas" estavam satisfeitos com sua assistência médica e utilizam a assistência "alternativa" somente como um suplemento. 

Equívoco n°10: Os métodos "alternativos" têm se aproximado da corrente científica principal. Em 1991, o Congresso dos EUA aprovou uma lei ordenando o National Institutes of Health (NIH) a estabelecer um departamento (agora chamado National Center for Complementary and Alternative Medicine - NCCAM) para encorajar pesquisas das práticas não convencionais. Resta ver se como resultado qualquer pesquisa útil será realizada. Enquanto isso, é claro, os proponentes do "alternativo" tem rotulado o próprio estabelecimento do departamento do NIH como "aceitação científica" -- e notícias vinculadas pela imprensa tem repetido esta alegação sem se dar o trabalho de investigar se isto é verdade. 

 

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Este artigo foi revisto no site original em 30 de agosto de 1999.

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