Chico Xavier
Muitos espíritos, afeitos ao tradicionalismo
intransigente e rotineiro, são incapazes de conceber a
estrada ascensional do progresso, como de fato ela é
cheia de lições novas e crescentes resplendores; é assim
que, completando as longas fileiras de retardatários,
perturbam, às vezes, a paz dos que estudam devotadamente
no livro maravilhoso da Vida, com as suas opiniões
disparatadas, prevalecendo-se de certas posições
mundanas, abusando de prerrogativas transitórias que
lhes são outorgadas pelas fortunas iníquas.
Não conseguem, porém, mais do que estabelecer a
confusão, sem que as suas mentes egoístas tragam algo de
belo, de novo ou de verdadeiro, que aproveite ao
progresso geral. Seus trabalhos se prestam unicamente às
suas experiências pessoais nos domínios do conhecimento,
não conseguindo viver na memória dos pósteros, porquanto
a veneração da posteridade é uma galeria gloriosa
reservada, quase que invariavelmente, aos que passaram
na Terra perseguidos e desprezados, e que se impuseram a
Humanidade ofertando-lhe generosamente o fruto abençoado
dos seus sacrifícios imensos e das suas dores
incontáveis.
Desalentadoras são as características da sociedade
moderna, porque, se a coletividade se orgulha dos seus
progressos físicos, o homem se encontra, moralmente,
muito distanciado dessa evolução. Semelhante anomalia é
a consequência inevitável da ignorância das criaturas,
com respeito à sua própria natureza, desconhecimento
deplorável que as incita a todos os desvios. Vivendo
apenas entre as coisas relativas à matéria, submergem
nas superficialidades prejudiciais ao seu avanço
espiritual. Ignoram, quase que totalmente, o que sejam
as suas forças latentes e as suas possibilidades
infinitas, adormecendo ao canto embalador dos gozos
falsos do “eu pessoal”, e apenas os sofrimentos e as
dificuldades as obrigam a despertar para a existência
espiritual, na qual reconhecem quanta alegria dimana do
exercício do Bem e da prática da virtude, entre as
santas lições da verdadeira fraternidade.
Infelizmente, se a Ciência e a Religião constituem as
forças matrizes de esclarecimento das almas, vemos uma
empoleirada na negação absoluta e a outra nas afirmações
arriscadas e absurdas. A Ciência criou a academia, e a
religião sectarista criou a sacristia, uma e outra
abarrotada de dogmas e preconceitos, repelindo-se como
polos contrários, dentro dos seus conflitos têm somente
realizado separação em vez de união, guerra em vez de
paz, descrença em vez de fé, arruinando as almas e
afastando-as da luz da verdadeira espiritualidade. Entre
a força de um preconceito e o atrevimento de um dogma, o
espírito se perturba, e, no círculo dessas vibrações
antagônicas, acha-se sem bússola no mundo das coisas
subjetivas, concentrando, naturalmente, na esfera das
coisas físicas, todas as suas preocupações.
É por essa razão que de grandes responsabilidades se
investem aqueles que se entregam na Terra aos labores
espirituais sob todos os aspectos em que se nos
apresentam; grandes serviços constam de suas
incumbências e elevada conta lhes será solicitada dos
seus afazeres sobre a face do planeta. Dolorosas
decepções os aguardam na existência de além-túmulo,
quando menosprezam as suas possibilidades para o bem
comum, fazendo de suas faculdades intelectuais objeto de
mercantilismo, em troca de prebendas, as quais,
augurando-lhes um porvir de repouso egoístico na vida
transitória, os fazem estacionários e nocivos às
coletividades, o que equivale a existências de provas
amargas, entre prolongadas obliterações dos seus poderes
de expressão.
Não é que o artista e o pensador devam aderir a este ou
àquele sistema religioso, ou alistar-se sob determinada
bandeira filosófica; o que se faz mistér é compreender a
necessidade da tarefa de espiritualização, trabalhando
no edifício sublime do progresso comum, colaborando na
campanha de regeneração e de reforma dos caracteres,
auxiliando todas as ideias nobres e generosas, em
qualquer templo, facção ou casta em que vicejem,
espiritualizando as suas concepções, transformando a
ação inteligente num apelo a todos os espíritos para a
perfeição, desvendando-lhes os segredos da beleza, da
luz, do bem, do amor, através da arte na Ciência e na
Religião, em suas manifestações mais rudimentares.
Que todos operem na difusão da verdade, quebrando a
cadeia férrea dos formalismos impostos pelas
pseudoautoridades da cátedra ou do altar, amando a vida
terrena com intensidade e devotamento, cooperando para
que se ampliem as suas condições de perfectibilidade,
convencendo-se de que as suas felicidades residem nas
coisas mais simples.