NÃO VIM DESTRUIR A LEI
As três revelações: Moisés, Cristo,
Espiritismo. Aliança da Ciência e da Religião. - Instruções
dos Espíritos: A nova era.
1. Não penseis que eu tenha vindo destruir a lei ou os
profetas: não os vim destruir, mas cumpri-los: - porquanto, em
verdade vos digo que o céu e a Terra não passarão, sem que
tudo o que se acha na lei esteja perfeitamente cumprido,
enquanto reste um único jota e um único ponto. (S. MATEUS,
CAP. V, v. 17 e 18.)
Moisés
2. Na Lei Mosaica, há duas partes distintas: a lei de Deus,
promulgada no monte Sinai, e a lei civil ou disciplinar,
decretada por Moisés. Uma é invariável; a outra, apropriada
aos costumes e ao caráter do povo, se modifica com o tempo.
A lei de Deus está formulada nos dez mandamentos seguintes:
I. Eu sou o Senhor, vosso Deus, que vos tirei do Egito, da
casa da servidão. Não tereis, diante de mim, outros deuses
estrangeiros.
—Não fareis imagem esculpida, nem figura alguma do que está em
cima do céu, nem embaixo na Terra, nem do que quer que esteja
nas águas sob a terra. Não os adorareis e não lhes prestareis
culto soberano.
Nota: - Allan Kardec cita a parte mais importante do
primeiro mandamento, e deixa de transcrever as seguintes
frases: “… porque eu, o Senhor vosso Deus, sou Deus zeloso,
que puno a iniquidade dos pais nos filhos, na terceira e na
quarta geração daqueles que me aborrecem, e uso de
misericórdia até mil gerações daqueles que me amam e guardam
os meus mandamentos." - (ÊXODO, XX, 5 e 6.)
Nas traduções feitas pelas Igrejas católica e protestantes,
essa parte do mandamento foi truncada para harmonizá-la com a
doutrina da encarnação única da alma. Onde está “na terceira e
na quarta gerações”, conforme a tradução Brasileira da Bíblia,
a Vulgata Latina (in tertiam et quartam generationem), a
tradução de Zamenhof (en la tria kaj kvara generacioj),
mudaram o texto para “até a terceira e quarta gerações”.
Esses textos truncados que aparecem na tradução da Igreja
Anglicana, na Católica de Figueiredo, na Protestante de
Almeida e outras, tornam monstruosa a justiça divina, pois que
filhos, netos, bisnetos, tetranetos inocentes teriam de ser
castigados pelo pecado dos pais, avós, bisavós, tetravós.
Foi uma infeliz tentativa de acomodação da Lei à vida única. -
A Editora da FEB, 1947.
II. Não pronunciareis em vão o nome do Senhor, vosso Deus.
III. Lembrai-vos de santificar o dia do sábado.
IV. Honrai a vosso pai e a vossa mãe, a fim de viverdes longo
tempo na terra que o Senhor vosso Deus vos dará.
V. Não mateis.
VI. Não cometais adultério.
VII. Não roubeis.
VIII. Não presteis testemunho falso contra o vosso próximo.
IX. Não desejeis a mulher do vosso próximo.
X. Não cobiceis a casa do vosso próximo, nem o seu servo, nem
a sua serva, nem o seu boi, nem o seu asno, nem qualquer das
coisas que lhe pertençam.
É de todos os tempos e de todos os países essa lei e tem, por
isso mesmo, caráter divino. Todas as outras são leis que
Moisés decretou, obrigado que se via a conter, pelo temor, um
povo de seu natural turbulento e indisciplinado, no qual tinha
ele de combater arraigados abusos e preconceitos, adquiridos
durante a escravidão do Egito. Para imprimir autoridade às
suas leis, houve de lhes atribuir origem divina, conforme o
fizeram todos os legisladores dos povos primitivos. A
autoridade do homem precisava apoiar-se na autoridade de Deus;
mas, só a ideia de um Deus terrível podia impressionar
criaturas ignorantes, em as quais ainda pouco desenvolvidos se
encontravam o senso moral e o sentimento de uma justiça reta.
E evidente que aquele que incluíra, entre os seus mandamentos,
este: “Não matareis; não causareis dano ao vosso próximo”, não
poderia contradizer-se, fazendo da exterminação um dever. As
leis moisaicas, propriamente ditas, revestiam, pois, um
caráter essencialmente transitório.
O Cristo
3. Jesus não veio destruir a lei, isto é,
a lei de Deus; veio cumpri-la, isto é, desenvolvê-la, dar-lhe
o verdadeiro sentido e adaptá-la ao grau de adiantamento dos
homens.
Por isso é que se nos depara, nessa lei, o princípio dos
deveres para com Deus e para com o próximo, base da sua
doutrina. Quanto às leis de Moisés, propriamente ditas, ele,
ao contrário, as modificou profundamente, quer na substância,
quer na forma. Combatendo constantemente o abuso das práticas
exteriores e as falsas interpretações, por mais radical
reforma não podia fazê-las passar, do que as reduzindo a esta
única prescrição: “Amar a Deus acima de todas as coisas e o
próximo como a si mesmo”, e acrescentando: aí estão a lei toda
e os profetas.
Por estas palavras: “O céu e a Terra não passarão sem que tudo
esteja cumprido até o último jota”, quis dizer Jesus ser
necessário que a lei de Deus tivesse cumprimento integral,
isto é, fosse praticada na Terra inteira, em toda a sua
pureza, com todas as suas ampliações e consequências.
Efetivamente, de que serviria haver sido promulgada aquela
lei, se ela devesse constituir privilégio de alguns homens,
ou, sequer, de um único povo? Sendo filhos de Deus todos os
homens, todos, sem distinção nenhuma, são objeto da mesma
solicitude.
Nota: - O texto certo que, por mercê de Deus, já está
reproduzido pelas edições recentíssimas a que nos referimos –
traduções Brasileira e de Zamenhof, – que conferem com S.
Jerônimo, mostra que a Lei ensina veladamente a reencarnação e
as expiações e provas. Na primeira e na segunda geração, como
contemporâneos de seus filhos e netos, o Espírito culpado
ainda não reencarnou, mas, um pouco mais tarde – na terceira e
quarta gerações – já ele voltou e recebe as consequências de
suas faltas. Assim, o culpado mesmo, e não outrem, paga sua
dívida.
Logo, têm-se de excluir a primeira 1ª e 2ª gerações e
expressar “na” 3ª e 4ª, como realmente é o original.
Achamos conveniente acrescentar aqui esta nota, para facilitar
a compreensão do estudioso que confronte a sua tradução da
Bíblia com a citação do Mestre. - A Editora da FEB, 1947.
4. Mas, o papel de Jesus não foi o de um simples legislador
moralista, tendo por exclusiva autoridade a sua palavra.
Cabia-lhe dar cumprimento às profecias que lhe anunciaram o
advento; a autoridade lhe vinha da natureza excepcional do seu
Espírito e da sua missão divina. Ele viera ensinar aos homens
que a verdadeira vida não é a que transcorre na Terra e sim a
que é vivida no reino dos céus; viera ensinar-lhes o caminho
que a esse reino conduz, os meios de eles se reconciliarem com
Deus e de pressentirem esses meios na marcha das coisas por
vir, para a realização dos destinos humanos. Entretanto, não
disse tudo, limitando-se, respeito a muitos pontos, a lançar o
gérmen de verdades que, segundo ele próprio o declarou, ainda
não podiam ser compreendidas. Falou de tudo, mas em termos
mais ou menos implícitos. Para ser apreendido o sentido oculto
de algumas palavras suas, mister se fazia que novas ideias e
novos conhecimentos lhes trouxessem a chave indispensável,
ideias que, porém, não podiam surgir antes que o espírito
humano houvesse alcançado um certo grau de madureza. A Ciência
tinha de contribuir poderosamente para a eclosão e o
desenvolvimento de tais ideias. Importava, pois, dar à Ciência
tempo para progredir.
O Espiritismo
5. O Espiritismo é a ciência nova que vem
revelar aos homens, por meio de provas irrecusáveis, a
existência e a natureza do mundo espiritual e as suas relações
com o mundo corpóreo. Ele no-lo mostra, não mais como coisa
sobrenatural, porém, ao contrário, como uma das forças vivas e
sem cessar atuantes da Natureza, como a fonte de uma
imensidade de fenômenos até hoje incompreendidos e, por isso,
relegados para o domino do fantástico e do maravilhoso. E a
essas relações que o Cristo alude em muitas circunstâncias e
dai vem que muito do que ele disse permaneceu ininteligível ou
falsamente interpretado. O Espiritismo é a chave com o auxílio
da qual tudo se explica de modo fácil.
6. A lei do Antigo Testamento teve em Moisés a sua
personificação; a do Novo Testamento tem-na no Cristo. O
Espiritismo é a terceira revelação da lei de Deus, mas não tem
a personificá-la nenhuma individualidade, porque é fruto do
ensino dado, não por um homem, sim pelos Espíritos, que são as
vozes do Céu, em todos os pontos da Terra, com o concurso de
uma multidão inumerável de intermediários. É, de certa
maneira, um ser coletivo, formado pelo conjunto dos seres do
mundo espiritual, cada um dos quais traz o tributo de suas
luzes aos homens, para lhes tornar conhecido esse mundo e a
sorte que os espera.
7. Assim como o Cristo disse: “Não vim destruir a lei, porém
cumpri-la”, também o Espiritismo diz: “Não venho destruir a
lei cristã, mas dar-lhe execução”. Nada ensina em contrário ao
que ensinou o Cristo; mas, desenvolve, completa e explica, em
termos claros e para toda gente, o que foi dito apenas sob
forma alegórica. Vem cumprir, nos tempos preditos, o que o
Cristo anunciou e preparar a realização das coisas futuras.
Ele é, pois, obra do Cristo, que preside, conforme igualmente
o anunciou, à regeneração que se opera e prepara o reino de
Deus na Terra.
Aliança da Ciência e da Religião
8. A Ciência e a Religião são as duas
alavancas da inteligência humana: uma revela as leis do mundo
material e a outra as do mundo moral. Tendo, no entanto, essas
leis o mesmo princípio, que é Deus, não podem contradizer-se.
Se fossem a negação uma da outra, uma necessariamente estaria
em erro e a outra com a verdade, porquanto Deus não pode
pretender a destruição de sua própria obra. A
incompatibilidade que se julgou existir entre essas duas
ordens de ideias provém apenas de uma observação defeituosa e
de excesso de exclusivismo, de um lado e de outro. Daí um
conflito que deu origem à incredulidade e à intolerância.
São chegados os tempos em que os ensinamentos do Cristo têm de
ser completados; em que o véu intencionalmente lançado sobre
algumas partes desse ensino tem de ser levantado; em que a
Ciência, deixando de ser exclusivamente materialista, tem de
levar em conta o elemento espiritual e em que a Religião,
deixando de ignorar as leis orgânicas e imutáveis da matéria,
como duas forças que são, apoiando-se uma na outra e marchando
combinadas, se prestarão mútuo concurso. Então, não mais
desmentida pela Ciência, a Religião adquirirá inabalável
poder, porque estará de acordo com a razão, já se lhe não
podendo mais opor a irresistível lógica dos fatos.
A Ciência e a Religião não puderam, até hoje, entender-se,
porque, encarando cada uma as coisas do seu ponto de vista
exclusivo, reciprocamente se repeliam. Faltava com que encher
o vazio que as separava, um traço de união que as aproximasse.
Esse traço de união está no conhecimento das leis que regem o
Universo espiritual e suas relações com o mundo corpóreo, leis
tão imutáveis quanto as que regem o movimento dos astros e a
existência dos seres. Uma vez comprovadas pela experiência
essas relações, nova luz se fez: a fé dirigiu-se à razão; esta
nada encontrou de ilógico na fé: vencido foi o materialismo.
Mas, nisso, como em tudo, há pessoas que ficam atrás, até
serem arrastadas pelo movimento geral, que as esmaga, se
tentam resistir-lhe, em vez de o acompanharem. E toda uma
revolução que neste momento se opera e trabalha os espíritos.
Após uma elaboração que durou mais de dezoito séculos, chega
ela à sua plena realização e vai marcar uma nova era na vida
da Humanidade. Fáceis são de prever as consequências:
acarretará para as relações sociais inevitáveis modificações,
às quais ninguém terá força para se opor, porque elas estão
nos desígnios de Deus e derivam da lei do progresso, que é lei
de Deus.