Chico Xavier
Desde o primeiro quartel do século XX, após a vitória
japonesa em Tsushima, multiplicam-se as possibilidades
do Oriente, para onde parece transportar-se o centro
evolutivo da Humanidade. O Pacífico volve a revestir-se
de vida nova. A China movimenta-se com as suas
revoluções internas. Em centros remotos, como o
Afeganistão e a Turquia, percebe-se uma onda de
renovação geral. A Rússia soviética há muito tempo,
dirige as suas vistas para o Extremo Oriente, na Sibéria
Oriental que repousam, na atualidade, as mais
importantes de suas bases militares. A Nova Zelândia e a
Austrália são celeiros de possibilidades infinitas. A
Índia não obstante o domínio britânico fornece, ao
planeta, exemplos e doutrinas regeneradoras. Figuras
proeminentes dos povos orientais são hoje acatadas em
todo o mundo. A figura de Gandhi tem a sua projeção
universal. As costas do Pacifico estão cheias de
movimentos comerciais; nas suas margens, as Repúblicas
da América Meridional acusam uma vida nova, no plano da
cultura, do progresso e do pensamento. Todos os
movimentos mais importantes do orbe afiguram-se-nos,
mais ou menos deslocados de novo para a Ásia, onde o
Japão assume o papel de orientador desse incontestável
movimento de organização.
A Europa, na atualidade, é o gigante cansado, à beira do
seu túmulo. Infelizmente, o senso arraigado do
militarismo envenenou-lhe os centros de força. A
Alemanha e a Itália superlotadas apeiam para os recursos
que a guerra lhes oferece. Não obstante todos os
tratados e pactos em favor da tranquilidade europeia,
nunca, como agora, foram a paz ali tão vilipendiada. O
Tratado de Versalhes e os Acordos de Locarno nada mais
foram que fenômenos diplomáticos da própria guerra em
perspectiva. Nunca houve um propósito sincero de
fraternidade e de igualdade nessas alianças. Em 1928,
foi assinado o Pacto Briand-Kellogg, como se fora uma
esperança para todas as nacionalidades. Entretanto,
jamais, como nestes últimos anos, o armamentismo tomou
tanto incremento, em todos os países do planeta. Só a
França, nas suas estatísticas do ano passado, acusava
uma despesa de mais de treze bilhões de francos,
invertidos nos programas de sua defesa. E, atrás dos
grandes vasos de guerra, das metralhadoras de pesado
calibre, das granadas destruidoras, escondem-se os novos
gases asfixiantes e os terríveis elementos da guerra
bacteriológica, que os algozes da ciência engendraram
criminosamente para suplício dos povos. O momento é de
angústia justificável. A própria Inglaterra, que nunca
se encontrou tão poderosa e tão rica quanto agora, sente
de perto a catástrofe; sua missão colonizadora toca,
igualmente, o fim. Ao lado dos bens que os ingleses
prodigalizaram a diversas regiões do planeta, houve de
sua parte lamentável esquecimento: o de que cada povo
tem a sua personalidade independente.
Diz-se que todo o Oriente se ocidentaliza na atualidade;
todavia, o Oriente apenas aproveita o fruto de
experiências que hoje lhe entrega a Civilização
Ocidental, pressentindo o sintoma de sua decadência.
O Cristianismo, deturpado na Europa, degenerado pela
influenciação dos bispos romanos, não conseguiu ser o
baluarte dessa civilização que, aos poucos, vai
desmoronando.
As nações do Velho Mundo apenas cuidaram de dominar os
outros países como seus vassalos; mas, é passada a época
desses domínios injustificáveis. Os pretextos de
expansionismo não se justificam dentro dos princípios da
paz internacional e os movimentos de conquista apenas
servem para enfraquecer a economia dos povos que se
abandonam aos seus excessos. A Europa moderna
esqueceu-se de que a Ásia tem a massa considerável de
setecentos milhões de almas, como elementos de energia
potencial, aguardando igualmente o instante de sua
necessária expansão; olvidou que a América é consciente,
agora, de sua importância e de suas infinitas
possibilidades, prescindindo da sua tutela e dos seus
estatutos e, no momento atual, o continente europeu
reconhece a ineficácia de suas teorias de paz, diante da
sua necessidade irrevogável de guerra, de destruição.
Integrada no conhecimento de seus falsos princípios,
edificados, todos eles, na base armamentista, a
Civilização Ocidental reconhece o seu próprio
desprestígio; há muitos anos, o vírus do morticínio lhe
vem solapando os alicerces, e as épocas de aflição e de
crise periodicamente se repetem. A França que, em 1870,
foi procurar socorro às portas da Rússia poderosa dos
czares, acossada pela Alemanha, volta-se hoje para a
união pseudocomunista de Stalin, pedindo a mesma aliança
para conjurar o perigo germânico. A Grã-Bretanha
observa, da sua tribuna, o movimento e prepara-se para
surpresas eventuais; tentando conservar seu poderio,
volve à política de conciliação; todavia, a guerra é
inevitável no ambiente dessa civilização de monumentos
grandiosos de ciência no plano material, mas feita de
fogos-fátuos no domínio da espiritualidade. Os povos, em
virtude da organização de suas leis, têm necessidade de
deflagração dos movimentos bélicos. Não poderão viver
muito mais tempo sem eles. A destruição lhes é
necessária.
A quem caberá então o cetro da cultura, a liderança do
pensamento? Sabe-o Deus.
Dentro de alguns séculos, os colossos de Paris, de Roma
e de Londres serão contemplados com o embevecimento
histórico das recordações; a torre Eiffel, a Abadia de
Westminster serão como as ruínas do Coliseu de
Vespasiano e das construções antigas do Spalato. Os
ventos tristes da noite hão de soluçar sobre os
destroços, onde os homens se encontraram para se
destruírem, uns aos outros, em vez de se amarem como
irmãos.
Os raios da Lua deixarão ver, nas margens do Tâmisa, do
Tibre e do Sena, o local onde a Civilização Ocidental
suicidou-se à míngua de conhecimentos espirituais. O
império britânico conhecerá então, como a Península
Ibérica, a recordação dos seus domínios e das suas
conquistas. A França sentirá, como a Grécia antiga, um
orgulho nobre por ter cooperado na enunciação dos
Direitos do Homem e a Itália se lembrará,
melancolicamente, de suas lutas.
De cada vez que os homens querem impor-se, arbitrários e
despóticos, diante das leis divinas, há uma força
misteriosa que os faz cair, dentro dos seus enganos e de
suas próprias fraquezas. A impenitência da civilização
moderna, corrompida de vícios e mantida nos seus maiores
centros à custa das indústrias bélicas, não é diferente
do império babilônico que caiu, apesar do seu fastígio e
da sua grandeza. No banquete dos povos ilustres da
atualidade terrestre, leem-se as três palavras fatídicas
do festim de Baltasar. Uma força invisível gravou
novamente o “Mane – Thécel – Phares” (Contado,
pesado, dividido. Palavras que, segundo o livro de
Daniel, apareceram na parede da sala onde o Rei
Baltasar promovia uma festa sacrílega) na festa do
mundo.
Que Deus, na Sua misericórdia, ampare os humildes e os
justos.