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     Cachaça

     
     O Elogio da Cachaça

     Meus amigos, camaradas,
     Me prestem toda atenção
     Vai formar-se nesta vila
     Uma grande Associação.

     A Associação de que falo,
     (Não julguem que seja asneira),
     Tem o fim de incentivar
     Nesta vila a bebedeira.

     Mas, antes de organizar
     A sua Diretoria,
     Vou fazer em tôscas rimas
     Da canguara a apologia.

     A canguara tem o dom,
     Quando é pura, não tem água,
     De desfazer em nossa alma
     Qualquer sentimento ou mágoa.

     Da doença é preservativa,
     Assim sendo nos ampara;
     Eu enfrentei a espanhola
     Com dez litros de canguara.

     Quantas vezes atacado
     Eu fui de uma nevralgia;
     E se não fosse a cachaça.
     De certo que eu não dormia.

     Quantas vezes a insônia
     Veio cá me acometer;
     Apelando p'ra canguara
     Sempre a pude combater.

     Beber canguara é um vício
     Que está generalizado;
     Em São Luiz havia um juiz
     Que vivia embriagado.

     E era Juiz de Direito,
     Infelizmente hoje é morto,
     Achou que, beber cachaça,
     Era direito, não torto.
      

     Não só bebe o analfabeto,
     Porém, intelectuais;
     Porque a caninha dissipa
     Nossas impressões morais.

     A caña espanta a tristeza
     Deixa o povo divertido;
     E muita mulher casada
     Na caña logra o marido.

     P'ra fortalecer a "Liga"
     Invoco a Mitologia;
     Para festejar deus Baco
     Quanto vinho, quanta orgia.

     E bebe a mulher casada,
     E bebe a moça solteira;
     De deus Baco originou-se
     A eterna bebedeira.

     Como não há de beber-se
     Canguara pura ou com mel,
     Pois, se Baco, o deus do vinho
     Está sentado num tonel.

     Nas bacantes, as mulheres
     Pelo vinho embriagadas,
     Dançavam, empunhando archote,
     Quase nuas, desgrenhadas.

     E os Gregos, os Romanos,
     Com as orgias bacanais...
     Festas de grandes desordens,
     Cada qual bebia mais.
      

     Quantos há que não reagem
     Contra quem lhes ofendeu;
     Acham na caña a coragem
     Que o berço numca lhes deu.

     É um vício inveterado
     No Brasil por toda gente;
     O bugre do Mato Grosso
     Também usa entorpecente.

     Nós, cá, nos embriagamos
     Com a nossa caña crioula
     Lá na China se embriagam
     Com o suco da papoula.

     O ópio e a cocaína...
     De tudo que é entorpecente,
     O que menos mal nos faz
     É a nossa pura aguardente.

     Não há povo que não tenha
     Qualquer um entorpecente;
     Provado está que seu uso
     Dá prazer a muita gente.

     Bebe o rico, bebe o pobre,
     E sabem porque razão;
     Quanto poeta, na canguara
     Encontrou inspiração.

     Lobo da Costa, o poeta
     Que morreu embriagado,
     Quantas vezes, foi seu verso
     Pela canguara inspirado.

     Embora fosse transviado,
     Na poesia foi um destro;
     Por sua beleza fecunda
     E a beleza de seu estro.

     Num dia o poeta caído,
     Um amigo dá-lhe a mão:
     "Levanta Lobo, que vai
     Passar uma procissão".

     Diz o poeta, então embriagado,
     (Os que não souberem disto leiam),
     Qu'importa que a humanidade tombe
     Quando as divindades cambaleiam.

     Andrade Neves, que foi
     Uma inteligência rara,
     Antes de sua oratória
     Enpinava uma canguara.

     Não deixou de o ser por isso
     Um prodígio, ou um portento;
     Pela eloqüência do verbo
     E o brilho de seu talento.

     Eduardo Lima, também,
     Que foi o leão da tribuna;
     Quantas vezes o seu verbo
     Fêz-se ouvir nesta comuna.

     Transviado, não obstante,
     Legou à posteridade,
     Bons exemplos de civismo
     Por sua dignidade.

     E o doutor Herculano
     Que em São Paulo foi formado,
     Não gostava de canguara?
     Não vivia embriagado?

     Dizem que por um desgosto
     Que a alma lhe corroía,
     Encontrando lenitivo
     Na canguara que bebia.

     A canguara é aperitivo,
     É também estimulante;
     Pois, até da medicina
     Ela faz parte integrante.

     Fernando Abbot, o médico
     Que neste mundo tombara,
     Em jejum dava a seus filhos
     Um traguinho de canguara.

     Até os santos bebiam,
     Eu não me admiro disto...
     E não foi regada a vinho
     A ceia de Jesus Cristo?

     E quem é que não conhece
     Santo Onofre, no Brasil?
     Sua imagem não carrega
     A meia espalda um cantil.

     E quantas vezes nos pampas,
     Com o tropeiro a gente tópa;
     Que, sem caña ele não pode
     De noite rondar a tropa.

     Quem é que caça, que pesca
     De linha, espinhél, tarrafa,
     Que não leve em sua mala
     De canguara uma garrafa?

     É antídoto a canguara.
     Cito um fato que se deu:
     Mordido o dedo por cobra...
     Foi a cobra que morreu!

     Tem ação nas lutas, onde
     A nossa vida se esvai;
     Estimulou nossas tropas
     Na guerra do Paraguai.

     Osório dava aos soldados.
     Com sua coragem rara,
     Uma mistura composta
     De pólvora com canguara.

     Quem não bebe ao som da gaita
     Ao ouvir-se dela o guincho,
     Ajudada por um pinho,
     No estrougir dum bochincho?

     Qual gaúcho que se nega
     Aos bailados de seus pagos,
     P'ra dançar ao som da gaita,
     Do violão... tomar uns tragos?

     Na luta de vinte e três,
     Me disse uma testemunha,
     Que a caña foi receitada
     Ali por Flores da Cunha.

     Ferido Monteiro, em campo,
     Flores chega e o abraça;
     E mandou sua ordenança
     Dá-lhe um trago de cachaça.

     Até almas d'outro mundo
     Já tinham a bebedeira
     Eu cito um caso recente
     Que ora empolga a Palmeira.

     Um espírito vagante,
     assim um jornal traduz:
     Abre portas, fecha portas,
     Acende e apaga luz.

     Do nosso Exército um cabo,
     Bebendo com toda a calma,
     Ouviu que nas suas costas
     Bem perto batiam palma.

     Sem medo virou-se e disse,
     Sorrindo, com ar de graça:
     "Se tu és um bicho mesmo
     Toma um trago de cachaça".

     Qual não foi sua surpresa,
     Já um tanto impressionado,
     Quando viu que foi o copo
     Aos poquitos esvaziado.

     Esse espírito, em Palmeira,
     Está chamando a atenção;
     Pois só não bebe cachaça,
     Como toma chimarrão!

     Dizem que voltara à casa
     Que foi sua nesses pagos;
     Depois de andar noutro mundo...
     Cá, tornar, beber uns tragos!?

     Quando espiríto encarnado
     Em que farras se envolveu;
     Que ainda, depois de morto,
     Ele numca se esqueceu.

     Quantas vezes, nas tavernas,
     Esse espírito bebeu;
     Neste mundo, junto ao bloco
     Que com ele conviveu.

     Nossa crença, embora morte
     Nos leve na garra adunca,
     Se fortalece, no caso:
     Noss'alma não morre numca.

     Que não se abandone a caña
     Pela sua propriedade;
     É a mola prepotente
     Que agita a humanidade.

     Aos bebedores eu peço
     Seu concurso à Associação;
     A inércia mata um povo,
     É preciso agitação.

     Ela fez um surdo ouvir
     Também fez um cego ver;
     A um mudo fez falar
     E a um cocho fez correr.

     Que sejam os armazéns
     Substituídos por diques;
     Por ora tem o Rio Grande
     Só uns três mil alambiques.

     Uma cousa interessante
     Com a cachaça sempre ocorre:
     Se cai um rico, - é um ataque.
     Cai um pobre, - está no porre.

     A canguara em muitos casos
     Da vida nos dá conforto;
     E eu até já não duvido
     Que ela ressuscite um morto.

     Vou terminar estas rimas,
     Porém, sobraçando um pinho;
     Que serão então cantadas
     Pelo trovador Narinho.
      

     Liga Pró-Alcoolica
     Meus amigos, camaradas,
     Me prestem toda atenção
     Vai formar-se nesta vila
     Uma grande Associação.

     A Associação de que falo,
     (Não julguem que seja asneira),
     Tem o fim de incentivar
     Nesta vila a bebedeira.

     Todo sócio d'esta Liga
     Deve ser homem Virtuoso:
     Só póde entrar jogador,
     Ou bêbado e mentiroso.

     O motivo d'esta Liga
     Foi a queda do Augusto
     Que desandou lá do Club...
     Não morreu, mas levou susto.

     Nossa lei é letra morta
     (Queijo em francês, é FROMAGE);
     No CLUBE se joga e bebe,
     A Lei ali é bobagem.

     Pois um público empregado,
     De certa categoria,
     Não deve beber ao ponto
     De perder a escadaria.

     Será Diretor da Liga
     Um homem sem impostura;
     Que conheça bem canguara,
     Se tem água ou é bem pura.

     Um homem que está talhado
     Para ser o Presidente,
     É o doutor Tyrteu Vianna,
     Um rapaz inteligente.

     Será ele o Presidente,
     (Pois tem grau de bacharel).
     Conhecedor de bons vinhos,
     De caña pura ou com mel.

     Pra Segundo Presidente
     Será então escolhido,
     Cidade Filho, notário,
     Que bebe, mas, escondido.

     P'ra secretario, o Augusto,
     Que do copo não se arreda,
     Pois tem uma letra boa
     E não morre mais de queda.

     Para segundo - o Theobaldo,
     Que não é nenhum tartufo;
     Só por ser apologista
     Da canguara do Peruffo.

     Orador Clímaco Castro,
     Que sem um cargo não fica;
     É quem consome a caninha
     Da casa do Inácio Bica.

     Tesoureiro - Thierry Vianna,
     Que simpatiza com a FU;
     É um freguês infalível
     Do botequim do Chirú.

     O seu Nestor Ataíde
     Nesta Liga se admite,
     Por freqüentar os bolichos
     Do Nengo e do Walter Witt.

     (Não é só desses bolichos
     A canguara que ele traga;
     Ressabiando os bolicheiros,
     Pois ele bebe e não paga).

     Será também convidado
     Para sócio desta Liga
     Um que gosta da branquinha:
     Conhecido por "Bexiga".

     Será também incluído
     O nosso amigo Godoaldo,
     E o conhecido funil
     Que acóde por Brinaldo.

     Entra o sub-delegado
     Conhecido por "Barraca";
     Quer seja vinho ou canguara
     Com energia ele ataca.

     Também entra o Nestorzinho
     Por gostar da bebedeira;
     Ninguém fica sem levar
     Um frasquinho n'' algibeira.

     O coronel Álvaro Marques,
     (Não entra aqui puritano),
     Fará parte d'esta Liga
     Por gostar do "ADRIANO".

     Também entra o Heltemino
     Inspetor de quarteirão,
     Gosta muito da canguara
     No inverno e no verão.

     Também entra como sócio
     Na Liga da bebedeira,
     O barbeiro, meu vizinho,
     Evangelino Caldeira.

     Entraram tabém na Liga
     Quem usa casaca e frack;
     Só por beberem wisky,
     Cerveja, vinho e cognac.

     Será sócio um que só gosta
     De vinho de pura uva
     XXXXXXXXXXXXX
     O viajante Bocaiúva.

     Fara parte outro que gosta
     Da caña e do "NACIONAL";
     O ajudante de cartório
     Chamado Antônio Natal.

     Seu Emílio e Luiz Trombini
     (O alambique os ampara),
     Entrarão como inventores
     Da legítima canguara.

     Meu amigo Zeca Carpes
     Será também associado;
     Comigo, nas pescarias,
     Canguara ele tem tomado.

     João Azzolin, comerciante,
     Entrará na Associação;
     Não vende um cálix de caña
     Sem beijar o garrafão.

     Jacinto e José Trombini,
     Desta Liga serão sócios;
     Não só gostam da canguara,
     Pois dela fazem negócios.

     Também entra nesta Liga
     Chirú Funck, meu parente;
     Não só bebe, como paga
     Canguara pra toda gente.

     Também entra Inácio Bica,
     Que aplica a homeopatia;
     Pois, não despreza a canguara
     Quando está numa folia.

     José Dorneles, cambista
     Cá dá rua d'Obelisco,
     Fará parte porque gosta
     Da caña de São Francisco.

     Farão parte desta Liga
     Seus companheiros de ofício;
     Que uma parte dos bilhetes
     Consagram p'ro mesmo vício.

     O seu Lodônio Leiria,
     Um prócer da oposição,
     Por apreciar os bons vinhos
     Entra nesta Associação.

     Nos discursos, seu Lodônio,
     Gaúcho modesto e leal,
     Se torna tão expansivo
     Que fica até liberal.

     Fará parte desta Liga,
     "Nengo", sub-delegado;
     Só por gostar da caninha,
     A qual sempre foi ligado.

     Também entra o seu Sefrin,
     Um caçador de perdiz,
     XXXXXXXXXXXX
     Em São Francisco de Assis.

     Ama a arte venatória
     No nosso grande Brasil;
     Pode esquecer-se da arma,
     Mas, numca do seu cantil.

     Também entra o fazendeiro
     Chamado Crispim Jardim;
     Quando toma sua canguara
     Numca se lembra de mim.

     Também entra o João Otávio,
     Um distinto advogado;
     Lá no jantar da "Mulata"
     Deixou um litro esvaziado.

     Fará parte desta Liga
     O advogado Leitão,
     Que, junto co'o seu colega
     Bebeu no mesmo salão.

     Entrará Conrado Antunes,
     Um barbeiro veterano;
     Gosta muito de canguara
     E usa vinho "Serrano".

     Também entra um trovador
     Que se chama Assis do Prado
     Da canguara lá do Walter
     Numca ele foi divorciado.

     Januário Batista Tubino, Narinho.
      

       A cidade de Sabará, em Minas Gerais, promove o Festival da Cachaça no mês de junho.
       Origem
          A Europa do século XVII experimentava uma bebida nova que fazia o maior sucesso, o rum, vindo da Jamaica. Era uma fermentação e destilação do mel da cana-de-açúcar. Os portugueses já tinham uma bebida feita de borra de vinho. Decidiram, porém, aproveitar o mel de cana abundante por aqui. A idéia era ter uma bebida própria, também de cana-de-açúcar, para competir com o rum. Nascia assim a cachaça, também conhecida como "garopa" e "jeribita". No princípio, a cachaça era a bebida do brasileiro pobre. Mas logo foi conquistando todas as classes sociais.

Uma bebida de muitos nomes
Aguardente
Aguarrás
Azuladinha
Azulzinha
Borbulhante
Branquinha
Canha
Caxixi
Dengosa
Engasga-gato
Filha do senhor de engenho
Gás
Homeopatia
Junça
Maçangana
Mamãe-de-aluana
Mamãe-sacode
Mandureba
Manjopina
Mata o bicho

Meladinha
Miscorete
Quebra-goela
Patrícia
Perigosa
Pindaíba
Pinga
Porongo
Retrós
Sipia
Teimosa
Tira-teimas
Zuninga
www.guiadoscuriosos.com.br


       Cachaça
          Pinga, garapa, canjibrina, manguaça, mé, uma, branquinha, pura, martelo, água que passarinho não bebe, goro, parati, cana, caninha, caiana, birita. São infinitos sinônimos. Os apreciadores de destilados se relacionam com esta típica bebida brasileira numa escala que vai da paixão à esnobação. Ela surgiu no tempo da colonização portuguesa no Brasil, nos antigos engenhos de açúcar, onde o refugo da produção era dado aos animais e aos escravos. Estes, por sua vez, deixavam a borra do melaço de cana fermentar por alguns dias e daí se extraía a aguardente. Hoje a cachaça é produzida em todo o país. Os números são desconhecidos, devido à quantidade de alambiques caseiros e clandestinos. Entre as melhores marcas estão as mineiras das cidades de Salinas (terra da insuperável Havana e da boa Indaiazinha), de Januária e de São Tiago, como a Espírito de Minas, a paulista Santo Grau, a catarinense Armazém Vieira e a cearense Ypióca reserva especial, envelhecida seis anos, e a carioca Nega Fulô. No Nordeste prevalecem as cachaças adoçadas. No Sul prevalecem as cachaças aromatizadas, de nítida influência européia.

       Como reconhecer as melhores
          Da aguardente que sai do alambique apenas 20% é o chamado "coração" da cachaça, a parte mais nobre, de virtudes excepcionais. Ficam de fora de uma produção cuidadosa e honesta a "cabeça" e a "cauda", ou seja, o início e o fim de uma alambicagem. Para reconhecer a boa cachaça observe:

• Ela tem consistência semelhante à do licor e parece levemente oleosa.
• Como o vinho, forma "lágrimas" no copo.
• Seu aroma deve lembrar o da cana.
• Não arde na boca nem na garganta.
• Forma um "colar" de bolhas por, no máximo, 30 segundos, quando a garrafa é sacudida.
• Não dá ressaca.
       www.uol.com.br/claudiacozinha/portal/bebidas/
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