Voltar

Guerra do Paraguai 1865/1870

           A Questão Platina
            A Argentina, assim como o Brasil passou por uma série de conflitos internos. De um lado, as elites de Buenos Aires queriam o estabelecimento de um Estado nacional forte e centralizado. Do outro lado, as elites de províncias distantes da capital lutavam por federalismo e autonomia.
            A nação Argentina, liderada pelo maior defensor do Estado centralizado, o presidente Juan Manuel Rosas, conseguiu anexar todo centro sul do país, praticamente dizimando os indígenas, dando a configuração da Argentina atual.
            Rosas e seu grupo buscavam também resgatar a unidade do antigo vice-reinado do rio do Prata, em outras palavras procuravam a anexação do Uruguai a Argentina. As pretensões de Rosas não eram pequenas, pois na realidade queria ele um país que controlasse toda bacia platina. Naquela época a disputa pelo controle da navegação e do comércio na região platina, era provavelmente o mais importante conflito latente, envolvendo não só os interesses internos a Argentina como todos os países da região, incluindo o Brasil.
            O principal ponto de tensão encontrava-se nas margens de Buenos Aires, o estuário do rio da Prata, porta de entrada e saída para todo o interior da América do Sul. A disputa pelo controle dessa região já haviam suscitados conflito entre o antigo Império espanhol e português, provocando a Guerra da Cisplatina e agora, na década de 1850, eles voltavam a tona.
            A intervenção do governo argentino na política interna do Uruguai não repercutiu nada bem no Rio de Janeiro. O Estado brasileiro considerava o Uruguai uma zona de influência fundamental ao nosso país e segundo nossa diplomacia, a liberdade de circulação pela bacia platina só seria garantida ao Brasil com a manutenção no Uruguai de um governo contrário a Argentina e favorável ao Império brasileiro. Em outras palavras Brasil e Argentina brigavam de Imperialismo e agrediam a soberania uruguaia.
            O apoio de Rosas ao Partido Blanco ( sob a liderança de Oribe ) e de outro lado o apoio de D. Pedro II ao Partido Colorado ( liderado por Rivera ) Tensionaram a questão platina ao máximo, levando a guerra em 1851. A guerra contra Rosas e contra Oribe, como ficou conhecida no Brasil, foi na realidade um conjunto de intervenções do Brasil na política interna da Argentina e, como de costume, do Uruguai. O Estado brasileiro apoiou militar e economicamente os movimentos contrários a Rosas em várias províncias argentinas, levando o general Urquiza, líder dos federalistas do norte da Argentina, a presidência da República. No Uruguai, os colorados apoiados pelo Brasil voltaram ao poder.
            A Política interna do Uruguai nos anos seguintes continuaram tensas, os conflitos entre Blancos e Colorados acirravam-se ainda mais. No começo da década de 1860, os Blancos liderados por Aguirre, questionavam não apenas os Colorados, mas também as constantes intervenções brasileiras. Tornaram-se comuns ataques dos Blancos à fazendas gaúchas em toda região fronteiriça. Em 1864, Aguirre chegava ao poder do Estado uruguaio, provocando a ira do governo Brasileiro. Dessa vez os Blancos subiram ao poder sem o apoio argentino, mas com um novo aliado: O Estado paraguaio, sob a liderança de Solano Lopez.
            A aproximação do Estado paraguaio não agradava ao Estado argentino e muito menos ao brasileiro, pois representava uma nova força na luta pelo controle da região platina. Naquele momento o equilíbrio da região estava dividido entre Argentina, Brasil e Inglaterra e nenhuma outra nação era bem vinda.
            A intervenção brasileira e argentina no Uruguai, que ficou conhecida como a guerra contra Aguirre (1864) promoveu a derrubada dos Blancos e o retorno dos Colorados ao poder. Provocou também uma imediata resposta por parte do Estado paraguaio: A guerra.

      www.multirio.rj.gov.br
 

   A Guerra do Paraguai: duas vertentes historiográficas

                                                               “somos um exército
                                                        (o exército de um homem só)
                                                    no difícil exercício de viver em paz
                                                               somos um exército
                                                        (o exército de um homem só)
                                                                   sem bandeira
                                                         sem fronteiras pra defender
                                                                   neste exército
                                                       (no exército de um homem só)
                                                         tantos sabem que tanto faz
                                                           ser culpado ou ser capaz
                                                                   ... tanto faz ...
                                                                (Gessinger/Licks)
    HISTÓRICO

    O Paraguai tornou-se independente em 1811, sendo governado por José Gaspar Rodriguez de Frância, o qual deu início a um amplo processo de nacionalização da economia. Tal atitude foi seguida por seus sucessores, Carlos López e Francisco Solano López.
     A reviravolta econômica, após a independência, teve seu início a partir da questão agrária, redefinindo-se uma política que contemplasse terras aos índios e mestiços, tomadas desde o início da conquista pelos colonizadores espanhóis.  Frância iniciou um amplo embate contra a igreja católica e os latifundiários, tomando-lhes as terras e arrendando-as a valores baixos aos camponeses.
      Dentro de uma perspectiva nacionalista, criara-se “fazendas estatais”, onde se praticava a agricultura, pecuária e artesanato como fontes de recursos para o fortalecimento do Estado, de modo que havia grandes quantidades de trabalho aos camponeses, outrora sem-terras. O Estado aos poucos torna-se interventor nas relações econômicas do Paraguai, sendo um verdadeiro gestor na produção de alimentos e manufaturados. Tais atitudes levaram a uma crescente independência econômica com relação aos outros países, definindo-se por uma política diferenciada, adotada pelos demais países da América Latina, que aumentavam seus laços de dependência com a Inglaterra. Outro aspecto da política de Frância foi o ataque ao analfabetismo.
     Frância morre em 1840 e é sucedido por Carlos López que prossegue a política de nacionalização da economia, sendo construídas estradas de ferro, estaleiros para os barcos a vapor, fábricas de pólvora, de louças etc.
     O intenso nacionalismo que se construía era mal observado pelo capital estrangeiro, principalmente o inglês, pois o protecionismo econômico do Paraguai impedia as importações européias. Desta maneira, a Inglaterra organizou a chamada Tríplice Aliança, congregando  Brasil, Uruguai e Argentina afim de impedir o crescente progresso paraguaio. Francisco Solano López sucedeu seu pai, em 1862, continuando sua política de intervenção estatal.
      Logo após o processo de independência, a maioria dos estados americanos aceitaram a  hegemonia comercial e financeira da Inglaterra. O Paraguai havia sido uma exceção, fechando suas fronteiras aos estrangeiros e promovendo um desenvolvimento autônomo, contrastando com a política dos
países vizinhos.
      Neste momento, o Brasil era uma sociedade de senhores e escravos governados pela monarquia portuguesa dos Bragança. O governo da Argentina  era dominado pelos latifundiários e ambos vendiam seus produtos para o mercado externo e compravam os manufaturados da Inglaterra.
     O Paraguai constituía-se em uma exceção perigosa aos interesses das potências capitalistas. Tornava-se necessário destruir um regime que promovia um desenvolvimento autônomo. Em 1840 o Paraguai já havia erradicado o analfabetismo e se fechado à penetração  de manufaturas inglesas, desenvolvendo uma vasta indústria artesanal, em um momento de miséria e em que a dependência
econômica e o poder latifundiário eram característicos da América Latina. As potências não podiam aceitar um Estado que nacionalizava as terras e o comércio exterior, e promovia o ensino obrigatório e gratuito para todas as classes. Do ponto de vista dos políticos e intelectuais brasileiros e argentinos, que estudavam na
Europa às custas dos escravos e camponeses, o Paraguai era visto como “barbárie”, sendo necessário integrá-lo à “civilização”, ou seja, ao mercado mundial e controlado pelas potências capitalistas.
      O isolamento do Paraguai verificou-se benéfico para a população, pois erradicou-se o analfabetismo e ao mesmo tempo, sua indústria interna artesanal substituía  as importações dos manufaturados ingleses. Ao mesmo tempo, a Inglaterra era o principal fornecedor bélico dos países da bacia do Prata.
      O Paraguai pretendia controlar a navegação do trecho do rio Paraguai, ferindo os interesses dos países vizinhos e também dos comerciantes ingleses.
      O Brasil levantara a questão da livre navegação do rio Paraguai e das fronteiras entre os dois países, bem como a Argentina e o Uruguai reivindicavam  a livre navegação nos rios.
      Em 1865, temendo uma invasão do Uruguai, o Paraguai atacara a província de Mato Grosso no Brasil, ao mesmo tempo toma a província de Corrientes na Argentina. Em contra-partida, organiza-se a Tríplice Aliança, pretendendo garantir a livre navegação nos rios Paraguai e Paraná.
      Após longos anos de guerra, a superioridade bélica dos aliados derrotou o exército paraguaio em seu próprio território, tendo a guerra se desenvolvido em três frentes de batalhas, no Mato Grosso, na mesopotâmia Argentina e no Rio Grande do Sul.
      O término da guerra acabou provocando sequelas terríveis àquele povo, pois perdera cerca de 75% da sua população. Dos cerca de 1.300.000 de habitantes, restaram 250.000 mil pertencentes a população masculina, além de parte de seu território anexado pelo Brasil e pela Argentina.
     A livre navegação da bacia platina ficou assegurada aos interesses da Tríplice Aliança, ao mesmo tempo, transformações acarretaram na estrutura militar do Brasil, pois antes da guerra, praticamente não existia o exército brasileiro, e ao final do conflito, este saíra fortalecido, passando a reivindicar um papel mais
importante na vida política do império. A convivência dos soldados brasileiros com os regimes republicanos da América do Sul contribuíram para o desenvolvimento das idéias anti-monarquistas no Brasil.
      A participação brasileira na guerra do Paraguai foi um resultado da política instituída por Dom João por ocasião da transferência da corte portuguesa para o Brasil, pois a influência econômica da Inglaterra era muito grande a partir da abertura dos portos as nações amigas em 1808.

    A HISTORIOGRAFIA POSITIVISTA –

                                              “O Amor por princípio, e a Ordem por baze;
                                                 O progresso por fim
                                                   Viver para outrem.
                                                    Viver às claras.

      Editado em 1920, o livro A Guerra do Paraguai, de R. Teixeira Mendes, começa suas observações criticando duramente a política do Segundo Reinado em seus movimentos de anexação da Banda Oriental, após sua independência, sob a denominação de Província Cisplatina.
      “(...) dilaceram-se encarniçadamente as nações cujos interesses são mais comuns, cujas ligações são mais fraternaes; profana-se o passado, compromete-se o futuro, sacrifica-se o prezente (...)”
      A questão dos limites e fronteiras são exaltados por Teixeira Mendes como fatores preponderantes para os conflitos bélicos àquelas épocas. A comunicação natural entre oriente e ocidente do Império Brasileiro era fundamental para proteger a integridade política da nação contra as tentativas internas, como para defendê-la dos ataques externos e promover o desenvolvimento industrial da região. Quanto aos interesses das nações platinas, estas eram contra a livre navegação do rio Paraná pela perda de hegemonia e de vantagens comerciais  e, por outro lado, dificultando a defesa de prováveis invasões por parte do Brasil
Império.
      O historiador leva em consideração a questão da tradição de lutas seculares entre portugueses e espanhóis pela região, que inevitavelmente provocariam rompimentos não pouco constantes.
      Vários destes conflitos seriam fatalmente evitados e atenuados, segundo Mendes, se não faltassem ao Imperador um “espírito culto e um coração generoso”, inspirado em intrigas dinásticas européias que colocavam as nações aborígenes submetidas ao ocidente. Novamente  comparando o governo imperial com o “belo exemplo legado pelo regime medieval”, longe do exemplo “moderno” e “anárquico”.
      Forte crítica à postura do Imperador são impetradas:
       “Se o ex-imperador do Brazil estivesse ao nível das exigências sociaes da alta pozição que os nossos antecedentes históricos lhe confiaram, teria desde logo concebido o arbritamento como o substitutivo da guerra na sua política internacional.”
      Contra as rivalidades no que tange à livre navegação do rio Paraná, o governo brasileiro deveria ter construído vias internas de comunicação, diminuindo desta forma a função estratégica da linha fluvial.
      “Jamais se elevou ele acima das vulgares aspirações da mais grosseira vaidade patriótica.”
      Roberto Mendes coloca-nos que a primeira empresa militar do Império seria o ataque contra a Argentina em 1851, com o objetivo de combater o ditador Rosas, denunciando que o interesse exclusivo do imperador não teria sido movido pela generosidade, apenas para promover interesses próprios de seu reinado, enfocando a contradição brasileira que lutara para libertar os povos vizinhos de seus tiranos, enquanto que em seu próprio país contavam-se milhões de cidadãos escravizados  por grande opressão.
      Muitas das acusações feitas ao ditador argentino tem por base tendências e cálculos que o Império Brasileiro considerava como título de glória para si. Rosas tentou reconstruir o antigo vice-reinado de Buenos Aires conquistando o Uruguai e o Paraguai, no entanto, a monarquia brasileira tentou incorporar a América Portuguesa à Banda oriental, bem como recorreu à violência para evitar que várias de suas províncias obtivessem sua independência.
      Desta maneira, o historiador positivista leva-nos a crer que, admitido o princípio da legitimidade da interferência de um governo estrangeiro nas questões internas de qualquer povo, fica aberta a porta para todas  as atrocidades.
      As relações internacionais tendem a se complicar a partir de 1861, quando em junho deste ano naufragou nas costas do Albardão do Rio Grande do Sul a barca inglesa Prince of Walles, tendo sido os objetos salvos desta embarcação roubados, e assassinada a tripulação. Deste modo, o ministro inglês iniciou uma reclamação ao governo brasileiro, afora a questão escravagista adotada pelo império, que complicava ainda mais as relações entre ambos.
     Sobre a questão da campanha contra o Paraguai, este tinha, como o Brasil, problemas com relação a questão de fronteiras e limites.
      Provavelmente López paraguaio afirmava a pretensão de ser o árbitro das questões internacionais na América do Sul. Uma vez subjugada a República Oriental, o ditador paraguaio intentava chegar a vez do Império, liquidando pelas armas a antigas questões de limites com o Brasil.
      Dessa forma, suas pretensões também eram de atacar o Brasil tendo como aliados a Banda Oriental e talvez a República Argentina, bem como a Província do Rio Grande do Sul.
      Em 22 de novembro, a Vila do Salto é rendida pelo Brasil com o apoio do General Flores, e em princípios de dezembro, a cidade de Paisandu é atacada. Em contra-partida, López invade o Mato Grosso.
      Em princípios de 1865, López projeta a invasão do Rio Grande do Sul, na esperança de sublevá-lo contra o Império. Nesse intuito, pede permissão à Confederação Argentina para atravessar o território federal, sendo-lhe nagada. Isto leva ao rompimento com o governo de Buenos Aires, precipitando na formação da Aliança da Argentina com o Brasil.
       “Tal foi a série de erros políticos, filhos principalmente da falta de elevação mental e moral do governo do ex-imperador, que conduziu a uma calamitoza guerra entre povos irmãos.”
      Mendes diz-nos que, apesar do Brasil não estar preparado para o conflito, os recursos do Brasil levaram Lópes a sentir a necessidade de negociar a paz. Suas propostas não serão atendidas porque o Império não concluiria a guerra
sem a expulsão do ditador paraguaio.
      Dessa forma, o Império Brasileiro, a República Argentina e o General Flores, em nome da República Oriental, decidem a sorte do Paraguai.
      Proclama-se que a guerra não fora feita contra o povo paraguaio, mas contra o seu governo. A Aliança institui os limites territoriais do Paraguai, o desarmamento desta nação, bem como se impõe a este povo o pagamento das despesas de guerra.
      A política desenvolvida pelo Império é no sentido da continuidade da guerra, sendo considerada por Mendes como um crime de lesa-humanidade, pois o imperador não cedeu ao sacrifício da vida de milhares de seus concidadãos, não vacilou ante a perspectiva de ruína do Paraguai e nem recuou ante aos desperdícios de enormes quantidades de recursos.
      Inclui-se a solicitação de várias repúblicas americanas ao fim da guerra, como o Chile, o Peru, a Bolívia, o Equador e os Estados Unidos.
      Tais atos são vistos como “caprichos” do Império, obcecado pela rancorosa idéia de aniquilar López, onde no entanto, milhões de brasileiros gemiam na escravidão sem que o ex-monarca sentisse maculada a honra nacional.
      Finalizando esta rápida apreciação sobre a Guerra do Paraguai, de Teixeira Mendes, torna-se importante salientar que tal autor levante a questão de uma não interferência da Igreja Católica contra o conflito, pois todos os países envolvidos denominavam-se professos da mesma fé. A resposta oferecida pelo próprio autor leva-nos a entender o enfraquecimento do prestígio político do Papa, onde há muito não passava de um príncipe italiano absorvido exclusivamente  em seu mundo e na preservação de seus bens materiais, bem como ao clero da época.

    A HISTORIOGRAFIA CRÍTICA
    A exposição à  seguir baseia-se fundamentalmente no autor Ricardo Salles, em seu livro Guerra do Paraguai: Escravidão e Cidadania na Formação do Exército. Tal autor refere-se inicialmente as obras positivistas, destacando o excessivo “oficialismo e factualismo” que tendem a simplificar as obras tradicionais sobre o tema. Ao mesmo tempo,  tece uma crítica as versões ditas revisionistas sobre as causas do conflito.
     A chamada versão tradicional diz-nos que o conflito teria sido decorrente da agressividade de Solano López, por desejar uma hegemonia e expansão na região platina. Tal visão procura enfatizar o ataque paraguaio ao Brasil, dando pouca importância à intervenção militar brasileira no Uruguai. O dirigente paraguaio é visto como megalomaníaco, não medindo conseqüências em impor-se na região platina.
     Combatendo a historiografia tradicional, Salles fala-nos do revigoramento das obras sobre o conflito platino a partir dos anos 50, com as chamadas obras revisionistas, ou seja, que fazem uma revisão nas causas da guerra do Paraguai. Obras que se distinguem das demais, que destacavam o imaginário de
Solano López como “tirano”.
      Nestas obras revisionistas, o Paraguai é apresentado como uma “República de crescimento”, portando uma via original de desenvolvimento econômico e social, ou seja, um verdadeiro bastião de resistência à penetração do imperialismo britânico. Além disso, o Paraguai é mostrado com heroísmo e
grandeza, contrapondo-se à “mesquinhes” das forças da Tríplice Aliança.
      Ricardo Salles aponta duas versões revisionistas, respectivamente de José Maria Rosa e Léon Pomer.
      Para Salles, Rosa defende em suas obras a versão de uma “unidade da América hispânica”, sendo o Paraguai o país timoneiro desta união. Tal união  não teria se completado pela interferência dos interesses britânicos através da Tríplice Aliança na região.
    “O Paraguai de Solano López é considerado como o herdeiro de uma causa da unidade hispano-americana que se manifestava numa solução de continuidade desde a época da independência. Os opositores dessa causa são principalmente determinadas oligarquias que lucravam...”
     Empreendemos que os grandes “vilões” deste epsódio são a classe dominante portenha, a Inglaterra e o Brasil imperial. Em contra-posição, a República guarani é vista como um Estado nacionalista e antiimperialista, sendo o Paraguai um verdadeiro Estado socialista baseado em uma vida fácil para todos aqueles que lá nasceram, devendo estes prestar serviços de forma manual, intelectual ou de tarefas militares, ou seja, doando sua parte de serviço à comunidade. O grande inimigo desse projeto de união dos descendentes espanhóis tinha como seu grande inimigo o Brasil imperial e sua política de relações exteriores que continuava o intervencionismo português na região platina. Esta política de intervenção contava com o apoio dos comerciantes, das elites de Buenos Aires  e também da Inglaterra.
      Salles elogia a obra de Rosa, pois, ao contrário da historiografia tradicional, dá voz aos vencidos, mas aponta o que na sua opinião caracteriza como limites, no sentido de que Rosas superdimensiona a influência inglesa na região e diminui as motivações dos países mais diretamente envolvidos no conflito.
      “Entretanto, reduzir o papel desses grupos (...) ao de prepostos do imperialismo pouco contribui para a elucidação de relações mais complexas e sutis que estão na base da formação efetiva de nossas nacionalidades não idealizadas ...”
      Ricardo Salles ainda salienta que esta interpretação de Rosa insere-se no contexto de propostas de desenvolvimento nacionalista, autônomo e antiimperialista para os países latino americanos, caracterizado no final dos anos 50 e início da década de 60.
      Outro autor revisionista apresentado é Léon Pomer. Para este, o Paraguai é caracterizado por um desenvolvimento próprio, tendo após sua independência obtido um desenvolvimento “original, autônomo, auto-suficiente, nacionalista e, até mesmo antiimperialista” contra a Inglaterra. Como provas desta opção, é salientado o surgimento de manufaturas, fundições, o monopólio estatal do comércio externo, o fechamento do país com contados vizinhos etc.
      Outros aspectos levantados por Pomer para seu desenvolvimento histórico são o fato do país não possuir analfabetos, o acesso dos camponeses à terra, do fato dessas mesmas terras, em sua maioria pertencerem ao Estado, a perseguição e extermínio dos criollos ...
      Nas palavras de Salles:
      “ (Léon Pomer) Sem caracterizar o Paraguai de López como um Estado socialista e sim como um Estado nacional que buscava sua via própria de desenvolvimento, cortando os laços coloniais, aliás de  formação histórica frágil, ele considera um obstáculo à penetração do imperialismo inglês no Prata.”
      Dessa maneira, constituindo-se fechado e isolado e não permitindo a livre navegação do rio Paraguai às nações estrangeiras, este país era visto como um cobiçado mercado e zona de expansão comercial que mantinha-se fora do alcance dos ingleses. O imperialismo britânico é observado como o grande incentivador do Brasil e Argentina com o objetivo de furar o bloqueio paraguaio, abrindo-o às demais nações. Salles considera que Léon Pomer ressalta uma influência decisiva da Inglaterra sobre a vida política do Brasil, Argentina e Uruguai, ao ponto de formarem uma “burguesia anglo-brasileira” que controlava o comércio interno e externo do Império.
      Tais afirmações também são contestadas por Ricardo Salles, entendendo este que a elite brasileira do Império ligava-se fundamentalmente à produção agrária baseada no escravismo, e o imperialismo inglês com as exportações de capitais.
      Segundo Salles:
       “Ainda que essas relações fossem complementares e hierarquizadas, no sentido de uma predominância do capital inglês, isto não significa que não ocorressem contradições e atritos, principalmente no nível político, da relação entre os dois Estados. Nunca é demais lembrar que, ao iniciar-se a guerra, Brasil e Inglaterra estavam com as relações diplomáticas cortadas, por iniciativa do governo brasileiro, desde junho de 1863.”
      Finalizando este breve artigo, Ricardo Salles aponta como principal limite, ou em suas próprias palavras, “ponto fraco” das versões revisionistas acerca da guerra do Paraguai, as tentativas de inserção do conflito no contexto mais geral de expansão do capitalismo, pecando pela maximização das atividades diretas da Inglaterra e diminuição das motivações das nações envolvidas no conflito.

    BIBLIOGRAFIA
    CALÓGERAS, J. Pandiá. Formação Histórica do Brasil. São Paulo: Editora Nacional,  1980.
    CERQUEIRA, Dionísio. Reminiscências da Campanha do Paraguai. Rio de Janeiro:  Biblioteca do Exército, 1980.
    MENDES, R. Teixeira. A Guerra do Paraguai. Rio de Janeiro: Edição de Joaquim
Bagueira Leal, 1920.
    POMER, Léon. Paraguai: Nossa Guerra contra esse Soldado. São Paulo: Global, 1984.
    SALLES, Ricardo. Guerra do Paraguai: Escravidão e Cidadania na Formação do Exército. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.
    VIANNA, Hélio. História do Brasil. São Paulo: Melhoramentos, 1977.

    Daniel Porciuncula Prado
    Professor do Departamento de Biblioteconomia e História da FURG
    Mestre em Educação Ambiental (FURG)
 

 CD ROOM Primeiras Jornadas de História Regional Comparada 23 a 25 de Agosto de 2000, PUC/POA  RS.


    Solano López
    3 de marzo de 1870 - Cerro Corá - Solano López
    Esta es una caravana de muertos que respiran. Los últimos soldados del Paraguay peregrinan tras los pasos del mariscal Francisco Solano López. No se ven botas ni correajes, porque se los han comido, pero tampoco llagas ni harapos: son de barro y hueso los soldados que deambulan por los bosques, máscaras de barro, corazas de barro, carne de alfarería que el sol ha cocinado con el barro de los pantanos y el polvo rojo de los desiertos.
    El mariscal López no se rinde. Alucinado, la espada en alto, encabeza esta última marcha hacia ninguna parte. Descubre conspiraciones, las delira, y por delito de traición o de flaqueza manda a matar a su hermano y a todos sus cuñados y también al obispo y a un ministro y a un general... A falta de pólvora, las ejecuciones se cumplen a lanza. Muchos caen por sentencia de López, y muchos más por extenuación, y en el camino quedan. La tierra recupera lo que es suyo y los huesos dan el rastro al perseguidor. Las inmensas huestes enemigas cierran el cerco en Cerro Corá. Derriban a López a orillas del río Aquidabán y lo hieren a lanza y lo matan a espada. Y de un tiro lo rematan, porque ruge todavía.

    Elisa Lynch
    Rodeada por los vencedores, Elisa cava con sus uñas una fosa para Solano López.
    Ya no suenan los clarines, ni silban las balas, ni estallan las granadas. Las moscas acribillan la cara del mariscal y le acometen el cuerpo abierto, pero Elisa no ve más que niebla roja. Mientras abre la tierra a manotazos, ella insulta a este maldito día; y se demora el sol en el horizonte porque el día no se atreve a retirarse antes de que ella termine de maldecirlo.
    Esta irlandesa de pelo dorado, que ha peleado al mando de columnas de mujeres armadas de azadas y palos, ha sido la más implacable consejera de López. Anoche, al cabo de dieciséis años y cuatro hijos, él le dijo por primera vez que la quería.

Eduardo Galeano
www.patriagrande.net


Voltar
Hosted by www.Geocities.ws

1