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CULTURA

IX Feira do Livro

 

TeleNews Torres[email protected]

 

 


Martha Medeiros: "escrevo para mim, mesma".

 

Martha Medeiros - não escrevo só para mulheres.

Texto e Fotos de Antônio Barañano* / TNT

Martha Medeiros subiu ao palco e se acomodou numa pequena poltrona colocada à sua disposição como se estivesse em nossa sala de visitas. De imediato estabeleceu empatia com a platéia revelando que tinha milhares de recordações de sua infância em Torres. "Posso dizer que tenho recordações de toda a minha vida", porque segundo ela essa ligação com Torres continuou pela vida adulta. "Eu não vinha pra cá só nos verões, tive um apartamento aqui em Torres, que infelizmente não tenho mais, então eu vinha no inverno quase todos os finais de semana. Cheguei a pegar o Catarina (ciclone) aqui. Estava no oitavo andar e tudo tremia. Vocês sabem bem como foi... pois fui testemunha do Catarina". Essa experiência rendeu a crônica O Furacão.

De início, Martha Medeiros deixou claro que preferia um bate-papo descontraído "pra gente se aproximar um pouco mais". Perguntada se ela identificava quem era seu público, para que tipo de gente escrevia, respondeu que o público de jornal é heterogêneo. "Na verdade escrevo para mim mesma. Começo a escrever sobre determinado tema, as idéias vão surgindo, parece psicografado". Ela crê que consegue empatia com os leitores pelo fato de escrever sobre coisas triviais, do dia-a-dia, do cotidiano.

Martha Medeiros gosta de escrever especialmente sobre as relações humanas. "Relação marido e mulher, relação pais e filhos. Escrevo sobre a solidão e sobre como lidamos com nossas escolhas". Ou seja, ela escreve sobre um universo muito particular a cada um.

"Trato do que as pessoas têm de mais secreto, mas não externam. Às vezes escrevo pra trazer uma luz pra mim mesma e isso repercute no leitor. Homem ou mulher, todo mundo tem medo. Todo mundo quer encontrar um amor."

Martha - "quem quiser ser escritor precisa ler muito e praticar muito. Um blog na internet é um ótimo começo".


Existem temas que ela não pode entrar porque acaba magoando as pessoas. Lembrou que outro dia criticou as pessoas que já estão na fase adulta e colecionam 40 bichinhos de pelúcia. Segundo ela a reação foi espantosa. "Chegaram a pedir pra me tirarem o espaço no jornal". Mas, 95 por cento das reações são positivas e carinhosas.

 

"Não escrevo para fazer a 'cabeça' de ninguém, é só pra provocar reflexão. Pensem por vocês, não é pra seguir à risca".

"Não façam como uma mulher que me ligou certa vez. 'Martha, segui seu conselho: larguei do marido, da família, estou sozinha aqui em Nova Iorque, vim viver minha vida'. Eu fiquei pensando... poxa! Essa mulher é louca". E se exime da responsabilidade pelo que escreveu. "É claro que se ela fez isso é porque ela já tinha essa vontade dentro dela...".

 

Martha Medeiros pediu às pessoas não se deixarem "fazer a cabeça" por cronista algum. "Todo mundo escreve para despertar senso crítico, não como se fosse uma verdade absoluta".

Sobre a transposição de suas obras para o teatro ou para o cinema, concede liberdade total para adaptações. "Não adianta o autor querer interferir. Livro é livro. Teatro é teatro e cinema é cinema. O livro vai se transformar em outra coisa (quando vai para o cinema ou para o teatro)".

 

Foi o que aconteceu com Divã, livro lançado em 2002, em 2005 levado ao teatro em forma de comédia e posteriormente levado para o cinema. "José Alvarenga (diretor de cinema) me disse: 'isso dá filme...' Mas, o filme saiu uma cópia da peça de teatro... é mais fiel à peça de teatro do que ao livro. Não tem como se evitar isso... No livro sou eu que decido sozinha... no teatro, no cinema é muita gente envolvida... cada um tem a sua percepção... a sua sensibilidade".

Durante a palestra teve de explicar a crônica Super gaúcha. "Eu quis dizer que não preciso me vestir de prenda para mostrar que sou gaúcha". Disse temer que o culto desenfreado às tradições possa ser alienante. "Temos nossas raízes claro... mas eu com uma linguagem mais urbana, vamos dizer assim, sou tão gaúcha quanto a Mery Terezinha, Não podemos esquecer que existe o (resto do) mundo".

Sobre o fato de escrever muito sobre psicanálise revelou que é uma "leiga total no assunto". Escreve porque gosta do tema. "Nunca fiz análise... não de forma ortodoxa... tenho um psiquiatra que consulto de dois em dois anos, ou quando me sinto frágil sobre determinado assunto... é mais um pronto-socorro emocional..."

"Mas o que faço quando escrevo sobre o assunto é me colocar no lugar do outro. Procuro não julgar mas entender a situação do outro".

A reposta a seguir certamente surpreenderá muita gente. "Não sou feminista... até no início comecei no Caderno Donna (de Zero Hora) escrevendo só para as mulheres. Mas essa foi uma fase que durou pouco".

"No Rio, quando passei a escrever para o jornal O Globo vi que tinha mais retorno masculino. Aqui (no Rio Grande do Sul) é 50 por cento (homens) a 50 por cento (mulheres). Não existe mais assunto só de homem e assunto só de mulher. Agora é assunto de todos. Até porque meus pontos-de-vista não são tão cor-de-rosa assim, tenho opiniões masculinas".

"Os homens também se interessam por temas como saúde, amor e relacionamentos. Não se pode dizer que só porque é homem não sofre com o fim de um relacionamento, que só porque é homem não tem medo de envelhecer, de ficar sozinho. Quando escrevo tou pensando em todos nós. Não quero formar um rótulo de que escrevo só pra homem ou só pra mulher".

Nesta altura do bate-papo uma leitora no meio da platéia provoca uma agradável surpresa em Martha Medeiros. "Sou a Zeni de Camaquã... Vim eu e outras amigas..." Atravessaram meio Rio Grande do Sul para assistirem a palestra da cronista em Torres. "Zeni!!!... ela me mandou um e-mail que viria mesmo!" Zeni quer saber se ela já mudou seu ponto-de-vista sobre algo que escreveu no passado.

"Não é coisa que eu faça comumente... mas depende da época... Não é que eu vá lá atrás pesquisar... pra escrever diferente... mas é possível que vá pensando sobre as mesmas coisas e só vai mudando o enfoque".

Dóra Leidens pergunta se ela pára para pensar sobre a responsabilidade que tem antes de emitir suas opiniões. "Procuro não pensar sobre o peso dessa responsabilidade. Comecei escrevendo de forma circunstancial e acabou dando certo. Eu escrevia uma crônica e aí me pediam mais uma... aprendi a escrever na prática.. no susto... Então eu era mais gaiata... mais irresponsável, digamos... de chutar o balde... Hoje passados 15 anos já não sou tão gaiata... procuro ser fiel a quem me segue... e a não perder a honestidade do texto. Mas tenho um pouco mais de cuidado... Só quando escrevo, ou com muito entusiasmo, ou com muita raiva, deixo pra lá a autocensura... Mas eu mesma não me levo muito a sério".

Na platéia um aluno pede a fórmula do segredo de escrever. "Primeiro tem que ler muito... não só os clássicos... ler de tudo... sem preconceitos... e escrever... praticar diariamente... e ter a humildade... às vezes reconhecer que não se tem talento..."

 

Talvez aqui ela estivesse se referindo a si mesma, porque mais adiante viria a dizer que apesar de sua iniciativa não ter sido de todo mal sucedida, ela não se considera com capacidade para ser uma romancista (ainda). "Saber escrever todo mundo sabe... e pensa que aquilo ali é uma barbada... Tem gente com 14 anos que já se acha um bom escritor...mas é preciso ter uma certa vivência... uma certa experiência para saber o que dizer... é preciso ter dom e sorte...".

Martha Medeiros aconselha a quem quer ser escritor a utilizar o blog na internet. "Tem muita gente que passou para a literatura impressa através do blog. Se a pessoa sente que é isso mesmo que quer, tem que ir em frente".

"A palavra-chefe (ou guia) para quem quer escrever é a seguinte: onde tem emoções não tem idade, não tem sexo e nem importa o poder aquisitivo".

Uma professora comunica que está ali com seus alunos da Escola Marcílio Dias. Conta que começou a trabalhar suas crônicas com os jovens de 14 e 15 anos e que eles a admiram. "Ah isso é muito bom... isso prova que temos os mesmos questionamentos... A crônica é um farol para descobrir o que cada um pensa sobre o mundo...". 

De repente, o assunto dá uma guinada e se direciona para Torres, a cidade. "Eu viajo muito gente... posso dizer que Torres tem um potencial turístico enorme que não existe em outro lugar do mundo. Eu sei que é muito importante o saneamento básico mas é preciso cuidar também do que está em cima... o calçadão tem que estar bem cuidado pra gente caminhar sem tropeçar... as ruas tem de estar bem pavimentadas... tornar os lugares bem acessíveis pra gente tomar um chope no final de tarde..." Nesse ponto sua fala foi interrompida por fortes aplausos.

Alunos da Escola Marechal Deodoro da Vila São João querem saber como ela faz para escrever. "Não é muito fácil... Há gente que imagina que escrever é ficar deitado numa rede esperando a inspiração cair do céu... Escrevo pra jornal... Tenho que cumprir prazos... então é preciso disciplina... Tanto as crônicas que escrevo para O Globo (Rio) quanto para a Zero Hora (Porto Alegre) para serem publicadas no domingo, tenho que entregá-las na segunda-feira anterior. Para esses dias tenho de tratar de assuntos mais genéricos, principalmente relações humanas... já as crônicas de quarta-feira posso entregá-las na terça, então posso tratar de assuntos mais atuais..."

Martha Medeiros disse que forma seu próprio banco de dados para escrever. "É uma caderneta que carrego na bolsa aonde estou sempre anotando frases de um livro que esteja lendo ou uma idéia que me surge em qualquer lugar... Mas tem dias que nada funciona ou que eu tenho que viajar... Então eu tenho de 8 a 10 textos guardados "na manga" sobre temas genéricos... senão seria o desespero... tenho que ter disciplina... os jornais precisam sair com as crônicas... Há dias que falta assunto...como vocês veem eu estou sempre correndo atrás do prejuízo... e isso,às vezes, me angustia".

"Os dias em que mais produzo textos é aos domingos... nesses dias produzo bastante. Todo mundo pensa que quem é escritor tem um staft pra fazer as coisas pra ele... não é assim. Sou uma mulher igual as outras todas que tem que levar filhos na escola... ir à lavanderia..."

 

Sobre os livros disse que a maioria é sobre suas crônicas publicadas em jornais. Na platéia alguém lembra que os livros são publicados a cada dois anos e quer saber como são escolhidos os títulos. "No caso dos livros sou eu que decido tudo. O título é sempre o título de uma das crônicas. A finalidade dos livros é garantir a autenticidade e a originalidade de minhas crônicas. Porque já tem muita crônica com meu nome circulando na internet, ou que não são minhas, ou que estão com o final modificado. Com os livros eu provo a autenticidade. Todas as crônicas que estão nos livros estão na sequência da ordem cronológica em que foram publicadas. Em média publico cem crônicas por livro. Escolho para publicar em livro as de mais vida útil e que sirvam para alguma reflexão".

Mais uma pergunta. Alguém quer saber o que exatamente ela lê? "Assuntos sobre psicanálise, leio sublinhando direto. Não gosto de ler crônicas, nem contos e nem poesias. Gosto de ler romances, prefiro os autores americanos... mas leio tudo... Roth, Paul Oscar, Saramago, Clarice Linspector, Chico Buarque, Machado de Assis... as editoras me mandam livros... leio todos os autores jovens que caem nas minhas mãos..."

Outro comentário... alguém que leu Divã disse que a personagem principal não era feliz no casamento e caiu pro mundo, fez uma revolução. Martha Medeiros contradiz. "Não. Ela não era infeliz no casamento" e começa a explicar. Diz que com a evolução da ciência e da medicina tudo mudou. "Hoje as pessoas conseguem chegar aos 90 anos, então as chances de fazer escolhas são muito maiores do que há alguns anos. Hoje temos chances de fazer mais escolhas. A personagem não nega a felicidade anterior. Hoje as pessoas repensam até a profissão. Trocam de profissão. É normal que repensem o casamento. Consideram que foi cumprida uma etapa da vida, em que o casamento não era mais igual ao começo... tanto que Divã é uma estrada aberta.." Segundo Martha Medeiros o livro não tem um final definitivo. "A personagem não se considera infeliz... ela está vivendo".

Provocada a falar sobre o machismo Martha Medeiros surpreende mais uma vez. "As mulheres é que são muito machistas... Nós somos mães, nós é que criamos nossos filhos com esse espírito... os meninos podem ter quantas namoradas puderem... já as filhas são criadas mais reservadas... Essa questão do machismo só vai mudar através das mulheres na hora de educarem os filhos..."

No meio da conversa uma aluna propôs uma "brincadeira", com base numa entrevista que é publicada na última página do Caderno Donna. Martha Medeiros dá uma gargalhada. "Ah Mas aquela ali as pessoas têm um mês para responder e vocês querem que eu rebata de bate-pronto aqui..."  Ri muito... "Mas bem vamos lá..."

- Do que você tem medo?

- Que a violência possa atingir as pessoas que mais amo.

- Quando riu pela última vez?

- Quando ri pela última vez? (pausa, pensa um pouco). Agora há pouco aqui...e explode a gargalhar.

- E quando chorou?

- Quando tive alguma frustração... choro pelas frustrações.

- (pergunta inaudível, mas deve ser sobre o time de sua preferência).

- Quando dou essa resposta a metade me aplaude e a outra metade me vaia... Internacional...

(A platéia aplaude e vaia ao mesmo tempo)

- Um lugar...

- Búzios (no Rio)

-Qual foi sua última compra fashion?

- Gente olhem pra mim..vocês acham que sou fashion... eu sou é bem básica... (ri de novo).

- Qual foi sua última compra básica que não gostou?

- Ah foi uma compra em liquidação... uma camiseta que comprei... usei uma vez só e passei adiante...

- Domingo perfeito ?

- Churrasco com os amigos e... escrever minhas crônicas.

- Mania...

- Roer unhas... antes eu roia mais... agora quase não...

- Um hábito?

- A vida não pode ser apenas um hábito.

Martha Medeiros (1961) é gaúcha de Porto Alegre. Atuou na área de publicidade, mas em 1993, depois de três livros publicados, decidiu se dedicar somente à literatura. Tem 16 livros publicados. Seu primeiro livro, Strip-Tease foi publicado em 1985. O nono livro, Trem-Bala (1999) foi adaptado com sucesso para o teatro. Já o 11º livro, Divã (2002), deu origem a uma peça e depois a um filme, estrelados pela a atriz Lilia Cabral, no papel de Mercedes. Escreveu um livro infantil, Esquisita como Eu (2004), e os últimos são: Tudo que Eu Queria te Dizer (2007) e Doidas e Santas (2008). Ela escreve crônicas para o jornal Zero Hora de Porto Alegre e para O Globo do Rio de Janeiro.

*Jornalista diplomado

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