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Entrevista concedida
ao Mídia
Sem Máscara
Por
Sandro Guidalli
Janer
Cristaldo está lançando na Internet uma compilação
de suas crônicas
publicadas no Baguete ao longo do ano passado, portal gaúcho
para onde
escreve regularmente. Mídia Sem Máscara procurou o jornalista
e escritor
para uma entrevista que segue, na íntegra, abaixo:
Mídia
Sem Máscara - Do que se trata o lançamento das
crônicas de 2002 em
forma virtual? Conte-me sobre isso em detalhes.
Janer
Cristaldo - É uma antologia das crônicas que
publiquei no Baguete.
Como sabes, por tua própria experiência, a Internet tem
sido o último
refúgio de quem pensa com independência. Claro que a
censura lá está, como
sempre esteve onde há pensamento. Mas neste caso é inútil.
Foste expurgado
do Comunique-se? Alvíssaras: a Internet te deixa um monte de
portas abertas.
Não fosse a rede, hoje não terias tribunas.
O
mundo editorial só publica autores de esquerda - ou inócuos
- mas nunca
quem conteste o pensamento de esquerda. Algum editor que poderia ser
eventualmente tentado a publicar este tipo de autor, pensa duas vezes
antes
de publicar. Pois será boicotado pela imprensa. E acaba não
publicando.
Te
dou dois ou três exemplos. Poderia dar vinte ou cinqüenta.
Mas fico
nestes dois ou três. Onde estão as resenhas sobre "O
Imbecil Coletivo", do
Olavo de Carvalho? Ou sobre "O Manual do Perfeito Idiota Latino-americano",
de Montaner, Apuleyo Mendoza e Álvaro Vargas Llosa? Ou ainda
"Uma Questão de
Justiça", de Isabel Vincent? São livros importantes
que, para a grande
imprensa, parecem não ter existido. O livro da Isabel, correspondente
no
Brasil do jornal canadense The Globe and Mail, denuncia toda a farsa
montada
em torno dos seqüestradores de Abílio Diniz. Ora, isto
não interessava às
esquerdas brasileiras, nem mesmo a Fernando Henrique, que tudo fez
para
libertar os terroristas. Mesmo distribuidores e livreiros se assustam
ante a
pressão das esquerdas. Tenta procurar um destes livros nas
livrarias. Não
vais encontrá-los.
Assim,
uso mão desta liberdade extraordinária que a edição
eletrônica
permite. O e-book tem um custo editorial igual a zero. O editor não
precisa
se preocupar com custos de editoração, gráficos,
distribuidores e livreiros.
Não fosse o e-book, eu permaneceria silente para sempre. A
meu ver, os
escritores ainda não se deram conta que, na Internet, ainda
existe liberdade
de expressão e nela a censura não pode ser exercida.
MSM
- Uma curiosidade. Como tens avaliado a imprensa brasileira nestas
primeiras semanas de PT?
Janer
Cristaldo - Aderiu totalmente. Lula de repente virou inteligente,
culto, audacioso. Monoglotismo virou virtude: "Ele teve a coragem
de falar
português em Davos". Mas que outra língua iria falar
o pobre diabo, logo ele
que mal consegue flexionar verbos em português? Aliás,
a necessidade de
negar esta incapacidade tão notória acabou por fazê-lo
cair numa armadilha.
Há algumas semanas, falando de seus ministros, chamou de Mares
Guias o Mares
Guia. Foi uma tentativa inconsciente de tentar flexionar corretamente
o
número. Após a eleição, até mesmo
acadêmicos da USP, como o Antonio Cândido,
apressaram em descobrir-lhe talentos insuspeitados. Virtudes inefáveis
contaminaram até mesmo a Primeira Companheira, que de repente
também virou
inteligente, sensata, elegante.
Mas,
se observarmos a imprensa brasileira, nada de novo. A imprensa que
louvou Collor foi a mesma que apoiou - e possibilitou - o golpe contra
Collor. Sem entrar nos méritos ou deméritos do homem,
claro que se tratou de
um golpe. Tanto que, até hoje, mais de dez anos depois do impeachment,
nenhum juiz conseguiu condenar Collor por qualquer dos crimes pelos
quais
foi acusado. Mas algum jornalista ousa falar em golpe? Nem mesmo os
historiadores. Talvez daqui a uns 50 anos surja alguém com
suficiente
independência mental para afirmar o que realmente ocorreu naqueles
dias.
A
grande imprensa brasileira tem suas virtudes e seus momentos de brio.
Mas
só ousa contestar o poder quando o poder já está
cambaleante.
MSM
- Como v. acha que a imprensa irá se comportar diante dos primeiros
problemas do PT na condução do país?
Janer
Cristaldo - Como disse, a imprensa só ousa contestar
o poder quando
este está cambaleante. Quando os propósitos demagógicos
de Lula, elaborados
por marqueteiros, se revelarem um ridículo total, a imprensa
vai aderir à
grita. E, a meu ver, isto não está longe de acontecer.
O governo não começou
mal. Começou péssimo. Esse tal de Fome Zero destrói
qualquer esperança que
se poderia depositar neste novo governo. Lula não deve se espantar
se esta
mesma imprensa que o tratou a pão-de-ló, amanhã,
quando o governo estiver
degringolando, esteja pedindo sua cabeça.
MSM
- Dos jornais, revistas e TV´s brasileiros, algum se destacaria
por
manter um mínimo de senso crítico?
Janer
Cristaldo - Todos os jornais têm suas ilhas, ou seus
momentos, de
senso crítico. Apesar dos pesares, não fosse a imprensa,
os grandes
corruptos permaneceriam intocados. Por exemplo, ACM, Jader Barbalho
e
quejandos. Não fosse a imprensa, jamais perderiam seus postos.
Ora, dirás
que eles os recuperaram. Isto se deve à vileza dos eleitores,
para os quais
honestidade é palavra que não diz mais nada. A reeleição
de ACM e Barbalho é
uma prova inconteste de que o povão não tem maiores
pudores em eleger
canalhas.
Já
a televisão é de uma vileza nauseante. Mas que se pode
esperar de uma TV
que vive às custas de Ratinho, Gugu Liberato, shows do milhão,
Big Brothers?
Em verdade, O buraco é mais embaixo. Se tais excrescências
têm audiência, é
porque satisfazem aos baixos instintos de um público inculto.
Eu não me
espanto com a indigência cultural da TV brasileira. Cada país
tem a TV que
merece. Como também o governo que merece. A eleição
de Lula é conseqüência
natural de um eleitorado que não conhece sequer a história
recente do
Brasil.
Eu
diria que jornais como Folha de São Paulo e Estadão,
apesar dos pesares,
são bastante independentes. O problema é que as redações
estão minadas de
petistas ou simpatizantes e este fator se reflete na manipulação
da
notícia - muitas vezes contra a filosofia dos próprios
donos do jornal. Mas,
como vimos, as denúncias contra ministros de Lula já
saltaram nos primeiros
dias de governo. Mas há muito de amnésia também.
O novo ministro da Cultura,
por exemplo, já foi preso por porte de maconha. Não
vi esta referência em
jornal algum. Ora, todo jornal de porte tem gordos arquivos. Impossível
conceber que os redatores não os tenham pesquisado ao noticiar
o novo
ministério.
MSM
- Como avalias o antiamericanismo na imprensa agora diante da iminente
guerra contra o Iraque?
Janer
Cristaldo - O antiamericanismo incondicional é o que
restou para as
viúvas carpirem, após a Queda do Muro. Hoje, há
manifestações no mundo todo
contra a guerra contra Saddam Hussein. Viste alguma manifestação
quando
Saddam fez guerra contra o Irã? Ou quando Saddam invadiu o
Kuait? O
antiamericanismo cego é o grande trunfo de Saddam. Aliás,
este senhor tem
uma sina curiosa. Ora é presidente, ora é ditador. Quando
levou seus
soldados à morte contra o Irã dos aiatolás, era
presidente. Durante a Guerra
do Golfo, virou ditador. Finda a guerra, foi anistiado, voltou a ser
presidente. Agora, ante a iminência de uma nova guerra, virou
de novo tirano
execrável.
Que
é um tirano, não há dúvida alguma. Se
dúvida houvesse, bastaria olhar
para as últimas eleições no Iraque, onde Saddam
foi eleito com nada menos
que 100% dos votos. Só tiranos podem contar com tal "unanimidade".
Mas a
preocupação dos EUA, no caso, não é derrubar
tiranias. Tirano por tirano, os
americanos têm um ali ao lado de Miami, que já completou
44 anos no poder.
Enfim,
a guerra parece estar próxima e dentro em breve teremos a seguinte
diagramação nos jornais: nas páginas à
esquerda, bombardeiros, porta-aviões,
tanques, generais, quépis. O mal. Nas páginas à
direita, as mulheres
iraquianas, as velhinhas iraquianas, as criancinhas iraquianas. O
bem
absoluto. Esta diagramação é um recurso vulgar,
repetitivo, produzido para
comover leitores e ganhar adesões. Mas continua funcionando.
Este
antiamericanismo é inconsistente, meramente retórico.
As viúvas do
Woodstock gaúcho, que também atende por Fórum
Social Mundial, que o digam.
Munidas de uma boa centena de PCs flamantes, navegando em ambiente
Windows,
insultavam ... os Estados Unidos.
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