PENAL
E PROCESSUAL PENAL. JÚRI. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. MINISTÉRIO PÚBLICO E
DEFESA. HOMICÍDIO QUALIFICADO PELO MEIO CRUEL.
1. apelo DE NORTON GUEDES. NEGATIVA DE AUTORIA e
exclusão da qualificadora do meio cruel.
1.1. preliminar. intempestividade. procedência. No momento em que a defesa apresentou contra-razões de
recurso ministerial, tomou ciência inequívoca da decisão de pronúncia,
contando, a partir desta, o seu prazo recursal. Se, entretanto, não interpôs o
recurso no qüinqüídio legal, intempestiva é a sua irresignação. Inteligência do
art. 598, § 5º, alínea “c”, do CPP.
2. APELO ministerial. INCLUSÃO DAS QUALIFICADORAS DO
MOTIVO TORPE E DO RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DO OFENDIDO.
2.1. MOTIVO TORPE. VINGANÇA. IMPROCEDÊNCIA. A vingança nem sempre é motivo torpe, depende do que a
provocou. Assim, no caso, quem mata ou tenta matar porque tem desentendimentos
anteriores – acerca do que não há maiores esclarecimentos – ou teve algum amigo agredido, momentos antes, com um
soco, ainda que mereça severa censura por esse gesto, não pode ser acoimado de
ter por motivo abjeto, ignóbil ou repugnante.
2.2. RECURSO QUE DIFICULTOU OU TORNOU IMPOSSÍVEL A
DEFESA DO OFENDIDO. PROCEDÊNCIA. É
certo que a superioridade de armas e a quantidade de agentes, por si só, não
caracteriza a dificuldade de defesa da vítima. Todavia, no caso, a vítima foi
colocada em desvantagem, pois são quatro réus, todos armados, contra uma só
vítima desarmada, por conseguinte, em dificuldade de defesa.
Não conheceram do apelo defensivo, por intempestivo, e deram
parcial provimento ao ministerial para incluir na pronúncia a qualificadora do
recurso que dificultou ou impossibilitou a defesa da vítima. Unânime.
RECURSO EM
SENTIDO ESTRITO
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TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL
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699.149.233 |
DOM PEDRITO |
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NORTON CHARLES MACHADO GUEDES |
RECORRENTE/RECORRIDO |
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MINISTÉRIO PÚBLICO |
RECORRENTE/RECORRIDO |
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CLAUDIO NEDI GONÇALVES ALVES |
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GELSON LUIZ ALVES CAMINHA |
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VALNEI FERREIRA CORREA |
RECORRIDOS |
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A C Ó R D Ã O.
Acordam os Desembargadores da Terceira Câmara Criminal do
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade, em não
conhecer do apelo defensivo, por intempestivo, e dar parcial provimento ao
ministerial para incluir na pronúncia a qualificadora do recurso que dificultou
ou impossibilitou a defesa da vítima.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes
Desembargadores JOSÉ EUGÊNIO TEDESCO, Presidente, e JOSÉ DOMINGUES GUIMARÃES
RIBEIRO.
Porto Alegre, 24 de junho de 1999.
Des. saulo brum leal,
Relator.
R E L A T Ó R
I O.
DES. SAULO BRUM LEAL (RELATOR) – CLÁUDIO
NÉDI GONÇALVES ALVES, GELSON LUIZ ALVES CAMINHA, VALNEI FERREIRA CORREIA e
NORTON CHARLES MACHADO GUEDES, foram denunciados por lesões corporais
seguida de morte (art. 129, §
3º, do CP).
1. DENÚNCIA. Isso porque, no dia 04 de
fevereiro de 1989, por volta das 2h30min, no Rancho do Trevo, próximo ao trevo
da BR-293, em Dom Pedrito, os denunciados, em comunhão de vontades, VALNEI, com
um canivete de pressão, CLAUDIO, com uma faca, NORTON e GELSON com socos e
pontapés e garrafadas, agrediram a vítima JOÃO PEDRO GOULARTE DE SOUZA,
atingindo-a no cérebro, ocasionando-lhe as lesões corporais que resultaram na
sua morte.
Motivou o fato a recusa da companheira da vítima, ELIS REGINA TAVARES MADEIRA, em dançar com o denunciado Norton."
2. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA, INTERROGATÓRIO E
INSTRUÇÃO CRIMINAL. Recebida a denúncia em 23.11.89 (fl. 01, foram os acusados
citados e interrogados (Gelson Luiz –
fl. 53, Cláudio – fl. 59 e Valnei – fl. 127. Norton não compareceu, foi citado
por edital e decretada a sua revelia), apresentando defesas prévias (Gelson Luiz e Cláudio – fl. 76, Valnei – fl. 86 e Norton –
fl. 105).
Em audiência foram ouvidas cinco testemunhas (José Amilton – fl. 89, João de Deus – fl. 94, Elis Regina –
fl. 126, Cleomar – fl. 126v. e Ernesto Jacinto – fl. 128).
3. ALEGAÇÕES FINAIS. Em alegações
finais, o Ministério Público, entendendo que a instrução apurou tratar-se de
crime de homicídio, requereu nova vista (fls. 133/134).
4. ADITAMENTO. O Ministério Público aditou a
denúncia (fls. 138/139), imputando aos acusados a prática de delito de
homicídio triplamente qualificado (art.
121, § 2º, I - torpe, III (vingança) - cruel e IV – recurso que dificultou a
defesa do ofendido, do Código Penal).
Isso porque, no dia 04 de fevereiro de 1989, por volta das 02h30 min, no Rancho do Trevo, próximo da BR-293, em Dom Pedrito, em comunhão de vontades, os denunciados Valnei, com um canivete de pressão, Cláudio, com uma faca, Norton, com uma garrafa, e Gelson a socos, para se vingarem de divergências anteriores com a vítima, e também do fato dela ter desferido um soco em José Amilton Velo Silveira, vulgo Pato, de quem são amigos, mataram João Pedro Goulart de Souza, desferindo-lhe vários golpes, produzindo-lhe ferimentos na região cervical, fratura no nariz, comoção cerebral e hematoma no lábio, causando na vítima sofrimento desnecessário, uma vez que, já gravemente ferida, tentava fugir para fora do salão, e, desarmada, não podia se defender.
5. RECEBIMENTO DO ADITAMENTO, INTERROGATÓRIO E INSTRUÇÃO CRIMINAL. Recebido o aditamento em 15.8.94 (fl. 140), foram os acusados citados (Cláudio – fl. 144v, Valnei – fl. 145v., Gelson Luís – fl. 146v. e Norton – fl. 178v.) e interrogados (Cláudio – fl. 148, Valnei – fl. 149, Gelson Luís – fl. 150 e Norton – fl. 179), apresentando defesas prévias (Valnei – fl. 151, Gelson Luís – fl. 159, Cláudio – fl. 168 e Norton – fl. 183/184 e 223).
Durante a instrução, foram ouvidas duas testemunhas
(Cláudia Valéria - fl. 221 e Eloi Pinhetro – fl. 247).
6. RAZÕES ESCRITAS. Em razões escritas do art. 406
do CPP, o Ministério Público pugnou pela pronúncia dos acusados como incursos
nas sanções do art. 121, § 2º, I – torpe (vingança), II - fútil, III - cruel e
IV – mediante recurso que dificultou a defesa do ofendido, do CP, por entender
caracterizado os elementos probatórios para tanto (fls. 248/252).
A defesa do acusado Cláudio Nédi diz que o acusado não agiu na forma descrita na denúncia, pois estava embriagado e tão logo começou o tumulto, retirou-se (fls. 254/255).
Norton Guedes, por sua defesa técnica, sustenta a negativa
da prática do fato, pedindo a improcedência da denúncia (fl. 257).
Gelson, por sua vez, diz que as provas são dúbias e frágeis,
pedindo a absolvição (fl. 259).
Por fim, Valnei diz que inexistem nos autos prova de que tenha participado do delito (fl. 261).
7. SENTENÇA. PRONÚNCIA. Sentenciando,
o magistrado julgou parcialmente procedente a denúncia (fls. 263/272),
pronunciando os réus CLÁUDIO NÉDI
GONÇALVES ALVES, GELSON LUIZ ALVES CAMINHA, VALNEI FERREIRA CORREIA e NORTON
CHARLES MACHADO GUEDES por homicídio qualificado por meio cruel (art. 121, § 2º, incs. III – cruel, do CP).
8. RECURSO. Irresignados, recorrem em sentido
estrito o Ministério Público (fl. 272v.) e a defesa do réu Norton Charles (fl.
330).
O primeiro postula a reforma da pronúncia, a fim de ser
reconhecida as qualificadoras do motivo torpe (vingança) e do recurso que
dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido (fls. 283/285). Em
contra-razões, as defesas de Cláudio Nedi (fls. 289/291), Valnei (fl. 308),
Gelson Luís (fl. 320) e Norton Charles (fls. 323/325) requerem o improvimento
do recurso.
A segunda, postula a absolvição sumária, pela tese de
negativa de autoria e, subsidiariamente, a exclusão da qualificadora do meio
cruel (fls. 331/334). Em contra-razões, o Ministério Público, requer,
preliminarmente, pelo não conhecimento
do recurso, por intempestivo, e no mérito, pelo improvimento (fls. 338/342).
A decisão foi mantida (fl. 343).
9. PARECER. Neste grau de jurisdição, o Ministério
Público, manifesta-se pelo não provimento do recurso ministerial e pelo
provimento do recurso interposto por Norton Guedes (fls. 345/348).
É o relatório.
V O
T O.
DES. SAULO BRUM LEAL (RELATOR) – Recorre a
defesa de NORTON GUEDES, postulando a absolvição por negativa de autoria e,
subsidiariamente, a exclusão da qualificadora do meio cruel e o Ministério
Público requerendo a inclusão das qualificadoras do motivo torpe e do recurso que
dificultou a defesa do ofendido.
1. apelo DE NORTON GUEDES. NEGATIVA DE AUTORIA e EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA DO MEIO CRUEL.
1. 1. preliminar. intempestividade. procedência. O douto
Promotor de Justiça Paulo Sérgio Cassol Lubianca, em contra-razões (fls.
340/341), alega a intempestividade do recurso defensivo.
Com razão o Ministério Público.
O prazo, em se tratando de carta precatória, começa a fluir
da data da efetiva intimação e não de sua juntada aos autos, nos termos do art.
598, § 5º, letra “a”, do CPP.
Como a defesa teve ciência da decisão de pronúncia em
14.9.98 (fl. 322) - quando
apresentou contra-razões ao apelo ministerial - e interpôs
recurso somente em 23.10.98 (fl. 330), intempestivo é a sua irresignação, pois
o prazo recursal é de 5 dias. Consigna-se que o réu foi intimado, pessoalmente,
em 02.10.98 (fl. 328v.).
Por tais fundamentos,
não conheço do recurso, por intempestivo.
2. APELO ministerial. INCLUSÃO DAS QUALIFICADORAS DO
MOTIVO TORPE (VINGANÇA) E DO RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DO OFENDIDO.
2.1. MOTIVO TORPE. VINGANÇA. IMPROCEDÊNCIA. O aditamento à denúncia descreveu que os réus teriam cometido o homicídio por motivo torpe, “para se vingarem de divergências anteriores com a vítima, e também do fato dela ter desferido um soco em José Amilton Velo Silveira, vulgo pato, de quem são amigos (...)”.
Andou bem o magistrado a quo Dr. Cláudio Luís Martinewski, em
relação a qualificadora do motivo torpe - vingança (fls. 269/270), quando
afirmou (...) que a mesma não merece
prosperar, seja pelos próprios termos em que foi formulada, seja porque a prova
amealhada aos autos não a conforta.
“Com efeito, cediço que a vingança nem sempre é motivo torpe,
dependendo do que a provocou. In casu, se pudéssemos considerar como
comprovados os motivos alinhados, ver-se-ia que quem mata ou tenta matar porque
tem desentendimentos anteriores – acerca do que não há maiores esclarecimentos
– ou teve algum amigo agredido, momentos antes, com um soco, ainda que mereça
severa censura por esse gesto, não pode ser acoimado de ter por motivo abjeto,
ignóbil ou repugnante.
“Assim a jurisprudência:
“PRECATÓRIA. PRONÚNCIA. HOMICÍDIO. QUALIFICADORAS.
MOTIVO TORPE. VINGANÇA – 1. Omissis. 2. A vingança saldo quando decorrente de
motivo evidentemente ignóbil, abjeto, não poderá caracterizar, tão-só ela, a
qualificadora do motivo torpe, eis que
não se insere, a vingança, no sinonímia de torpeza. Recurso parcialmente
provido. Voto vencido” (RJTJRS 137/81).
“Por fim, verifica-se que não há prova de que a vítima e os acusados
tivessem desentendimentos anteriores, nem que a motivação do crime tenha sido o
fato da vítima um soco em ‘Pata’.
Com efeito, em relação aos acusados, como se extrai do conjunto
probatório, o início do fato se deu quando Norton pretendeu dançar com Elis
Regian Madeira, que acompanhava a vítima, como ela própria declara (fl. 15),
momento em que houve o desentendimento e um soco por parte de Norton na vítima,
seguindo-se as demais agressões.
“O fato envolvendo ‘Pata’ foi anterior e não há prova de que ele
fosse amigo ou estivesse com os demais, portanto, trata-se de fato paralelo aos
fatos versados nestes autos.
“Por qualquer ângulo que se vislumbre a questão, impõe-se o
afastamento da pretendida qualificadora.”
Por esses fundamentos, rejeito a alegação de que o homicídio foi cometido por motivo torpe (vingança).
2.2. RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DO OFENDIDO.
PROCEDÊNCIA. Realmente o aditamento à denúncia não descreve com muita
clareza a qualificadora do recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa
do ofendido, porque não refere de que modo os réus agiram para dificultar ou
impossibilitou a defesa da vítima – disse que a vítima, já gravemente ferida, tentava
fugir para fora do salão, e, desarmada, não podia se defender -.
Entretanto, não há como negar que, pelo menos, implicitamente está contida na
descrição, pois narra que os réus estavam armados – Valnei com canivete de
pressão, Cláudio com uma faca, Norton, ora recorrente, com uma garrafa e Gelson
a socos -, que desferiram várias golpes produzindo na vítima
ferimentos na região cervical, fratura no nariz, comoção cerebral e hematoma no
lábio, e, também, que a vitima, já gravemente ferida, tentava fugir para fora
do salão, e, desarmada, não podia se defender.
É certo que a superioridade de armas e a quantidade de agentes, por si só, não caracteriza a dificuldade de defesa da vítima, todavia, no caso, há indícios da qualificadora. São quatro agentes, todos armados, contra uma só vitima e desarmada, ou seja, a superioridade de armas e de agentes, neste caso, colocou a vítima em desvantagem e por conseguinte dificultou ou tornou impossível a sua defesa.
A prova testemunhal, em sede de admissibilidade de acusação – pronúncia -, atesta a qualificadora, porque Elis Regina (juízo – fl. 126), companheira da vítima, disse que estavam no salão de baile sentados – testemunha e vítima – quando chegou o réu Cláudio e convidou-a para dançar. Mesmo com a negativa de sua parte continuou ele insistindo. Daí a vítima levantou-se e afirmou que ela não iria dançar quando, então, Cláudio desferiu um soco no rosto da vítima, fazendo com que caísse ao solo. Assim que a vítima caiu, chegaram os demais réus e passaram a agredi-la com socos, garrafas e facadas.
Portanto, em tese, há indícios da qualificadora do recurso
que dificultou ou impossibilitou a defesa
da vítima.
Por tais fundamentos, dou
parcial provimento ao recurso ministerial incluir na pronúncia a qualificadora
do recurso que dificultou ou impossibilitou a defesa da vítima.
Des.
JOSÉ EUGÊNIO TEDESCO (Revisor)– De acordo.
Des.
JOSÉ DOMINGUES GIMARÃES RIBEIRO – De acordo.
Des.
JOSÉ EUGÊNIO TEDESCO (Presidente). – Recurso em Sentido Estrito n.º 698.586021
de Palmeira das Missões. “À unanimidade, não conheceram do apelo defensivo, por
intempestivo, e deram parcial provimento ao ministerial para incluir na
pronúncia a qualificadora do recurso que dificultou ou impossibilitou a defesa
da vítima."