O TEMPO NEM ME VIU PASSAR

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PREFÁCIO

 

               Satisfeito com o privilégio de ler O TEMPO NEM ME VIU PASSAR, nos originais, me surpreendi ao tomar conhecimento de que seu autor, Gilson Rangel Rolim, é, também, compositor, tendo, inclusive, classificado uma das suas músicas num  festival de televisão, mais precisamente em 1968, na extinta TV Excelsior. Pois foi exatamente traçando semelhanças entre a letra de duas das suas composições, “Rio Sagrado” e “De Volta aos Braços Dela”, e os textos do seu novo livro, que percebi alta sensibilidade, principalmente para a forma de narrar os fatos ligados à memória. É quando Gilson passa, para o leitor, momentos de poesia em prosa, não piegas ou de percebências  maquinadas ou programadas, mas suave e natural em si  mesma, sem necessidade de adjetivação maior.
                Não é à-toa que Gilson andou enriquecendo o acervo das páginas literárias niteroienses, principalmente nos jornais Praia Grande em Revista e O Fluminense, neste último, ao meu  lado, ocupando espaços na página  Prosa & Verso
, com muita dignidade.
                Uma ocasião, em  visita a Cachoeiro do Itapemirim, questionei com  meus acompanhantes a necessidade de conhecer a casa de Rubem Braga, decantada em suas varandas e pomares, nas suas crônicas. Cachoeiro e a casa  ruberiana me explicaram  a capacidade do cronista poetar em sua prosa. Pois Gilson Rangel Rolim é de Mimoso do Sul, cidade também do Espírito Santo,  cortada até recentemente pela mesma ferrovia - o trem “Cacique”, ligava o Rio de Janeiro a Cachoeiro. Exatamente na terra de Gilson aguardei, na estação, a chegada da composição, para satisfazer meus anseios ferroviários. Vi Mimoso do Sul, tal qual Cachoeiro, como cenário-berço fácil para poetas e artistas. Explica-se, portanto, a sensibilidade do autor ora comentado.
                Analistas das obras de arte dizem que a sala-de-visitas é o princípio do gostar ou não, por parte do visitante. No caso do escritor, as primeiras páginas funcionam como sala-de-visitas. E a de Gilson está bem  mobiliada, que é o termo  merecido, salvo opiniões melhor abalizadas, para a apresentação intitulada “ O Tempo e a Memória”. Com satisfação e emoção, transcrevo um trecho:

“Inverno de 1951, mês de julho. Era um dia frio e de nevoeiro. Estávamos numa das antigas barcas da velha Cantareira. Nair - minha, então, futura sogra, Guiomar, minha noiva, e eu. Elas iam a passeio visitar parentes no Rio, mas precisamente no bairro de Sampaio, e tomariam o bonde na Praça Quinze. Eu, como fazia habitualmente, ia para o trabalho.

                O importante dessa imagem, que a memória me traz tão nítida, era o clima de alegria que me envolvia. (V. todo o texto na pag. 11)
                Que minha introdução ao trabalho do Gilson tenha se comportado decentemente, também com promissora sala-de-visitas.
                Nas residências felizes, as saletas contíguas à sala-de-visitas dão acesso aos ambientes de pássaros e pomares. E é aí, antes do descortínio total à vida, rica  vida, que Gilson colocou ao visitante, a página seguinte, “Um poema de Despedida”, segundo ele mesmo, “a propósito da  passagem de minha querida Guiomar”:

                “Estes são versos que eu gostaria de não ter  escrito.
                 Uma despedida definitiva dói no fundo da alma,
                 dilacera as fibras do coração de quem fica.
                 Por  um  momento, a muito custo, se contem o grito,
                 e a emoção  fica trancada no fundo da alma.
                 O corpo sente o golpe, chora e se mortifica.”

                (O texto completo do poema está na pagina 12)

                Pronto. Está o leitor  preparado, predisposto ao texto do Gilson. Tornou-se benevolente. Vai acabar sem a certeza da própria opinião. Mas não precisará se preocupar. Será fácil o aprecio da obra, provavelmente marcante mais em prosa do que em verso, porém sem motivos para desastres ou protestos, seguramente, ao contrário, para gostos e bom-gostos.

                Se em forma de poema, Gilson fala das olimpíadas Brasil
                “Os atletas, olimpicamente, se alinham

                para a largada que indicará o vencedor, (...)

onde protesta contra a pretensa igualdade dos desiguais, em prosa relembra retratos-época do Rio de Janeiro e visita intimidades psicológicas, como as de Herculano, em “Espelho Amigo”. Se volta à constatação quanto à igualdade humana, nos versos de “Mea Culpa”, também  faz ligações entre épocas futebolísticas nacionais e o passar-vida de Euclides, personagem apaixonado, místico, que ao se deixar violentar pelo tempo, nem percebe que as oportunidades se esvaíram, a caminho do declínio final.
                Por todo o seu trabalho, Gilson Rolim pincela quadros vivos do dia-a-dia. Tanto do passado, como do presente. Talvez para mostrar as semelhanças e comprovar que, na realidade, não existem modernismos, nem desenvolvimentos, porque o ser humano continua o mesmo, com seus medos, manias, destemperos, irreverências e mentiras, que são muitas, ou verdades, que são poucas, porque procura a elas resistir, como em “Bendito Acaso”, onde Otávio toma o café da manhã, ao mesmo tempo olha o jornal e tenta acompanhar o noticiário da televisão.

                Gilson visita a verdade definitiva e inolvidável em “Enfim, a Igualdade”:

                “Com a terra por cima
                somos todos iguais.
                Pretos e  brancos, pobres e ricos
                nenhuma diferença faz.”

                A beleza dos versos:

                ”Caminhava no silêncio da madrugada,
                sem mesmo saber o que é que eu procurava.”

                Busca  fundo, em “Chorando no Coração”:
                “Nem sempre vertendo lágrimas nós choramos,

                o choro às vezes nem se fica percebendo.”

                Cata protestos em “Panorama Espacial”:

                “Na ogiva do foguete,
                uma criança que morreu de fome
                vai subindo pro céu.”

                Volta ao tema, na semelhança de “Vergonha”:

                “Uma velhinha dormiu em minha porta
                e eu tive vergonha de ser homem.”

                Faz  prevalecer o amor  em “Prestando Contas”, tema semelhante de “Código Secreto”, ”O Pássaro que mudava de Cor”, “A Governanta” e  “A Incrível História de Zé do Anjo”.
               Enfim: em todos os trabalhos onde faz prevalecer a simplicidade, Gilson dá maioridade à sua arte. Alguns poderão considerar derrapos, uma ou outra derrapagem para o anedótico, o que nem de leve diminui seu talento,  percebido com facilidade no conjunto final da obra.
                O TEMPO NEM VIU PASSAR, de Gilson Rangel Rolim, é um bom momento literário, leva o leitor a viajar sobre os próprios tempos e a fechar o livro com a sensação de que percorreria tantas páginas ainda houvesse. Isso é bom. Ele aguardará novos trabalhos, candidatar-se-á a novas visitas que, na certa, ainda  virão. Todas carregadas com o talento familiarizado de Gilson.

 

Em julho de 2003.

 

Iderval Pereira Garcia.

 

 

 

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