DE VOLTA À ESCOLA

 

     Tanto tempo se passou desde que deixamos aquela tradicional escola! Até uns poucos anos atrás era comum aos que ali estudaram, perguntarem-se por onde andariam seus colegas da velha escola. Onde andaria Ernesto - o "boca larga", que ganhou o apelido por  comer sua merenda e a de quem mais pudesse, era um glutão; o mesmo que fez promessa solene de um dia abrir um restaurante e convidar-nos a todos para a inauguração. Até hoje não se sabe de alguém que tenha recebido o convite. O que foi feito de Frederico - o "pé de pato", cujo apelido nasceu por causa seus pés largos e andar gingado. Esse dizia que, mesmo formando-se em medicina, haveria de ser goleiro num time famoso; interessante que nunca vimos seu nome no noticiário esportivo. E o "palmeira risonha" - apelido do Edson, que era assim chamado porque aos quinze já passara de um metro e oitenta e por qualquer coisa dava gargalhadas. Sua meta era construir arranha-céus, talvez por analogia com sua altura.  Esses três eram mais lembrados porque estudaram  naquela escola desde o jardim de infância. Outros havia, no entanto, que muito tempo permaneceram nela até concluírem os respectivos cursos. Nomes como os de Otávio -  o "palito",  Gabriel - o "fininho",  Mário - o "gordo", Estevão - o "saco de ossos", figuravam neste grupo. É certo que este narrador também tinha apelido; muito embora magricela, talvez por isso mesmo fosse paradoxalmente chamado de "redondo". Essas indagações sobre o destino de tais ex-alunos deixaram de ser feitas de uns quatro anos para cá em decorrência dos fatos que narro a seguir.

     Quem primeiro viu a nota no jornal foi o "palmeira risonha". Dizia a nota como destaque de uma coluna famosa:  "O tradicional Colégio Modelo está atravessando uma fase difícil e se não conseguir superá-la poderá vir a fechar".  Após lê-la, esse antigo colega teve uma idéia e, por conta própria, pagou no mesmo jornal a publicação da seguinte nota :  "Atenção ex-alunos do Colégio Modelo. A tradicional escola está passando por muitas dificuldades. Em razão disso faço um apelo àqueles que, aposentados ou dispondo de tempo, entrem em contato comigo pelo telefone 700.9999 para que possamos marcar uma reunião e decidir sobre uma ajuda àquela escola que tanto nos ajudou na nossa formação básica. (a) Edson Cerdeira, o 'Palmeira'." Fui o primeiro a contatá-lo. Fiquei sabendo que ele, depois de manter por mais de trinta anos a atividade de construtor em Friburgo,    estava   de   volta   a  nossa  cidade  e,  embora  não  aposentado, reduzira,  significativamente  suas   atividades   profissionais.    Um    pouco      do       tempo que lhe sobrava agora, ele estava disposto a oferecer para ajudar a velha escola. De minha parte, aposentado que era havia alguns anos, prontifiquei-me a colaborar.   Sugeri-lhe   que     republicasse   o   chamado  aos   ex-colegas  e colocasse também o meu telefone. O resultado dessa mobilização foi que seis velhos companheiros se reuniram em minha casa e , à parte os relatos de cada um sobre suas vidas profissionais e familiares, todos felizes com o reencontro, decidiram marcar uma visita ao diretor da escola e falar-lhe de nossa intenção de ajudá-lo na recuperação do tradicional estabelecimento.

     Assim, uns poucos dias depois, lá estávamos reunidos eu, Edson - o  "Palmeira" - engenheiro civil, Ernesto - o "Boca Larga" - dono de restaurante , Estevão - o "Saco de Ossos" - executivo financeiro de uma grande empresa, recém aposentado, Gabriel - o "Fininho" - publicitário de muito prestígio, em vias de se aposentar,   e um outro ex-aluno, bem mais novo que nós, José Carlos Cardoso Pimenta - cujo apelido desconhecíamos,  empresário bem sucedido, ainda em atividade, mas disposto a fazer o que pudesse em favor do nosso velho Colégio Modelo, além, é claro, do Professor Antenor dos Santos Carvalho, atual diretor da escola. Mais que a qualificação profissional dos participantes desse grupo de  "socorro", pesava a condição de pessoas com experiência de vida, a maturidade e o desejo de servir. Aliás, servir é, com certeza, um corolário da idade madura.  Mas, afinal, que ações seriam tomadas? Para questões econômico-financeiras, havia um contador e um economista; para  os problemas do prédio, havia um construtor; para relações com o público havia um dono de restaurante, um publicitário  e um empresário, os três muito bem relacionados nos meios sociais. O plano aprovado previa a realização de eventos culturais para obtenção de renda, uma reorganização administrativa visando à redução de custos, uma reforma das instalações e um plano de divulgação dessas medidas com vistas a recuperar alunos perdidos nos últimos anos. Aprovou-se, também, uma reunião com o corpo docente com vistas a um acordo para por em dia os pagamentos e, a médio prazo, uma melhoria salarial. Como fosse necessário com urgência um reforço de caixa, foi feita uma  "vaquinha" com os patrocinadores da reunião, a custo financeiro zero, para resgate num prazo de um ano.

     O planejado foi realizado com sucesso e, menos de um ano depois o colégio de nossa infância e adolescência estava recuperado. Não demos, contudo, por encerrado nosso trabalho e firmamos um pacto de colaboração mútua pelo qual cada dois de nós permaneceríamos dando assistência à direção da escola, revezando-nos a cada trimestre. Quando tomou conhecimento do sucesso obtido por nosso grupo, o  mesmo colunista que anunciou a iminente  falência  da  escola,  deu  uma  nota  com bastante destaque falando no trabalho de solidariedade do grupo que a reergueu.

     Hoje, ao passar em frente ao velho ( mas renovado ) Colégio Modelo e vendo-o naquela saudável agitação estudantil , orgulho-me de ter contribuído para sua recuperação juntamente com os que vivem seu momento da maturidade: o Palmeira Risonha, a Boca Larga, o Saco de Ossos, o Fininho e o  ‘sem apelido’.  Pelo relato, dou fé. (a) Redondo ( o contador do grupo ).

 

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