RADIO DAYS

Maurício Valladares é um dos grandes nomes do rádio FM do Brasil. Ele foi um dos fundadores da extinta Fluminense FM, emissora que marcou época como a primeira rádio assumidamente de rock do Rio de Janeiro. Com a sua ousadia inicial, a emissora também foi agente ativa no cenário da música jovem do início dos anos 80, lançando e apresentando várias bandas, muitas delas em atividade até hoje. A íntegra desta entrevista, em que ele também fala sobre sua carreira de fotógrafo e agitador cultural está no site do programa de rádio Ronca Ronca.

A seguir, leia o trecho em que ele fala sobre sua saída da Rádio Fluminense.

O Carioca: Como foi a passagem da fotografia para o rádio. Você teve alguma experiência radiofônica antes da Fluminense?

Valladares: Eu sempre curti rádio, mas nunca tinha pensado em fazer alguma coisa até a Fluminense, em 82. Lá não tinha ninguém com experiência de rádio além do Luiz Antônio Melo. A equipe eram alguns amigos dele que gostavam de música.

O Carioca: E era tudo na brodagem?

Valladares: Eu nunca ganhei dinheiro. Ganhava a grana da gasolina até Niterói.

O Carioca: A Fluminense foi uma referência essencial pra gente durante muito tempo. Em que momento a coisa começou a ir pro vinagre?

Valladares: Em 85. Enquanto eu, a Liliane Yusim e o Sérgio Vasconcellos, batalhávamos para tocar Plebe Rude, Obina Shock, U2 e Gregory Issacs, o outro lado queria tocar Supertramp, Água Brava, Deep Purple e James Taylor.

O Carioca: Mas no início era assim?

Valladares: Sempre teve. Até que em 85, todas as coisas que a gente ralava pra se tornar populares, já começavam a tocar em outras rádios. O exemplo disso foi o U2. O André Midani foi pra Nova York em 85 e trouxe um disco do U2 ou vídeo, sei lá. E quem fez a promoção foi a Cidade e não a Fluminense. Aí eu falei: "Vem cá gente boa, o que a gente tá fazendo, as outras também estão. A gente precisa fazer uma coisa que as outras venham a fazer daqui a dois anos. Tem que armar um outro caminho".

O Carioca: A Fluminense era um oásis. As rádios eram muito chatas. E o legal que já tinham uma série de bandas legais rolando lá fora. A foi ela que tocou tudo, Thompson Twins...

Valladares: Isso é uma coisa engraçada. Hoje se você pegar qualquer pessoa no Rio e perguntar: "O que foi a Fluminense?" Ela vai dizer: "Fluminense foi uma rádio do caralho, lançou Paralamas, tocava Gregory Issacs, Lee Perry...Mas não era isso. A Fluminense tocava Supertramp, James Taylor. A excessão se tornou, na história, a imagem da rádio. A Fluminense nunca tocou, por ela, Thompson Twins. Isso era uma briga minha, da Liliane, do Serginho. Outro dia eu ouvi o Barone dizer na MTV: "A Flu era a rádio que tocava Specials". Tocava entre 500 outras merdas. Aí, em 85, eu disse que a gente precisava de um projeto diferente. E a gente pensou em fazer uma rádio de black music. O caminho era da música negra.

O Carioca: Eu me lembro dessa discussão de que o futuro era negro. O Hermano Vianna levantou essa bola naquele espaço estrelado que rolava no Caderno B de sexta-feira.

Valladares: Então a gente pensou em mudar a programação em 70%. De Aretha Franklin a Fela Kuti e música brasileira. Aí um dia eu vejo o Alex Mariano fazendo o que seria a nova programação: Genesis pra lá, James Taylor pra cá, um Issac Hayes no meio, Água Brava, Sangue da Cidade. Eu disse: "Alex, não estou entendendo. Isso não leva a lugar nenhum". Ele disse que a programação ia ser aquela, rolou uma pancadaria violenta. Depois, quando eu cheguei pra fazer o meu programa ele disse: "Não vai ter programa não". Então foda-se. Fui embora. Outras pessoas tentaram fazer algumas coisas legais. Mas a rádio entrou naquele espírito de emburrecimento das pessoas...ROCK AND ROLLLLLL...que não leva a lugar nenhum.

O Carioca: Você também conseguiu influenciar as programações das rádios Panorama e Globo durante um certo tempo. Até que ponto a mesmice das rádios é ignorância dos pessoas ou o que rola é grana, máfia?

Valladares: É ignorância mesmo. O rádio carioca está na mão de pessoas, na maioria dos casos, como o futebol. O sonho do Caixa D'Água é fazer uma final de campeonato carioca, Flamengo X Vasco, em Volta Redonda às 23 horas de um domingo. Sem ninguém. Essas pessoas que dominam as rádios não ouvem rádio. Como a maioria absoluta das pessoas que trabalham com discos não compra discos. Se juntar 30 executivos do mercado fonográfico e dizer: "Quem entrou numa loja pra comprar um disco nos últimos três meses levanta a mão", vai ficar todo mundo de mão abaixada. Assim como o CaixaD'água faz um campeonato que não vai ninguém, essa rapaziada faz rádios que ninguém ouve. Digo, uma rádio de informação, não uma prestadora de serviço como as AMs, que são do caralho. O cara que acabou com a Globo FM disse pra mim: "Pô Maurício, você mistura muitas coisas. Toca Nelson Gonçalves depois toca uma banda punk da Finlândia, não sei o quê. Quando você toca uma coisa velha, deveria tocar Cris Montez". Falei, tô fora. Não fode. Um cara desse tá preocupado com a 98 FM e não em fazer uma rádio que a gente quer ouvir.

O Carioca: E a Globo continua em último lugar de audiência. Se o cara tá em último e não tem nada a perder, porque não bota logo pra foder?

Valladares: Porque não sabe botar pra foder. Ninguém tá preocupado em fazer uma coisa nova.

O Carioca: Mas não faz porque não tem público ou não tem público porque ninguém faz?

Valladares: As pessoas se acomodaram. Muita gente nem sabe se tem rádio em casa. Olha o som e não sabe como ligar a FM. O rádio virou um ser em extinção. Você ouve no carro. E com fita e CD, tão ouvindo cada vez menos. Porque não tem o que ouvir. É tudo uma questão cultural. Eu estava lendo um encarte do disco do Jimi Hendix de gravações da BBC, que conta toda a história dessas gravações históricas, de Beatles a Pink Floyd. A maioria dos artistas quando gravaram na rádio, não tinham disco. Era preocupação da rádio de mostrar uma coisa nova.

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