Porta Verde Amarelo

Artigo: GRAMSCI  E O PRÍNCIPE MODERNO 
Assunto: Gramscismo Fonte:   Ipojuca Pontes
Remetido por: Miguel Netto Armando Email:  [email protected]

GRAMSCI E O PRÍNCIPE MODERNO 

* Ipojuca Pontes

 

     Antonio  Gramsci, “il gobbo” ( o corcunda), teórico italiano nascido na Sardenha no final do século 19, cujo pai, Francesco, foi condenado a cinco anos de reclusão por peculato e extorsão, é o ponto de referência que está por trás dos métodos e conceitos hoje levados à prática pela maioria dos partidos totalitários latino-americanos, entre eles o Partido dos Trabalhadores.

     Nos anos 60, quando tomei conhecimento de seus escritos e exerci durante algum tempo, no extinto Diário Carioca, o imperdoável ofício de “crítico partipante” de cinema, fiquei perplexo com algumas de suas opiniões sobre arte em geral e o cinema, em particular. Sem levar em consideração a  existência de filmes como “Nascimento de uma Nação” e “Intolerância”, de Griffith, ou obras como “ O Imigrante”, de Chaplin, já disponíveis à época, Gramsci, que escrevia sobre teatro entre 1916/18 no Avanti!, jornal de Turim, associava o engenho cinematográfico ao pior do teatro de revista, considerando, numa visão estreita, que o cinema não passava de um lazer vulgar, sem alcance quanto a possibilidade de se tornar uma expressão artística.

     Muito tempo depois, lento “ O Prisioneiro- A Vida de Antônio Gramsci”, de Aurélio Lepre      ( Editora Record, Rio, 2001), fiquei igualmente perturbado com algumas opiniões do pensador comunista quanto à arte popular, em especial no que se refere ao jazz, genuína expressão da grande arte popular afro-americana, como sendo, para ele, Gramsci, uma ameaça à cultura ocidental. Em certo trecho, ele desenvolve, xenófobo, seu arrazoado: ( O jazz) é uma linguagem que mais rapidamente comunica imagens e impressões totais de uma civilização não apenas estranha à nossa, mas certamente menos complexa do que a asiática, primitiva e elementar, ou seja, facilmente assimilável e generalizável, da música e da dança para todo o mundo psíquico”.E no seu reducionismo mecanicista ou demente, completa: “É impossível imaginar que a repetição continuada dos gestos físicos que os negros fazem dançando em torno das jazz-bands vá permanecer sem resultados ideológicos”.

     Para consolidar tal preconceito cultural, Gramsci ( que passou oito dos seus trinta e sete anos de vida nos cárceres de Mussolini, quando escrever os célebres Cadernos) critica, na prisão, um sentenciado comum apaixonado pelo jazz:- “Companheiro – chamou a atenção, ironizando- “qualquer dia você corre o risco de virar negro”.

     O pensador comunista se gabava de ter contribuído para a popularização do teatro de Pirandello, mas hoje, visto a distância, não é despropositado afirmar que Gramsci não conhecia nem entendia de arte, popular ou erudita. De fato, seus conhecimentos nesse campo são escassos ou limitados pelo preconceito e pelo servilismo ideológico, como exemplificam suas considerações sobre o jazz. Salvo algumas óperas, Gramsci não tomou conhecimento dos grandes compositores e do acervo das muitas sinfonias, nem tampouco das obras de arte marcantes da humanidade, e desconfio que conhecia apenas de forma arrevasada, ou parcial, Aristóteles, Platão, Spinoza, Kante e- porque não dizer- Hegel e o próprio Marx.

     O forte de Gramsci está em ter criado, por força da censura imposta pelo fascismo, uma linguagem cifrada e até obscura para a estratificação ideológica  e permeio das teorias de Marx e Engels, com o apelo estratégico da “revolução passiva”, objetivando a macia tomada do poder, e que fazem, no Brasil, as delícias da bem remunerada e pedante esquerda “acadêmica”. No frigir dos ovos, os objetivos de Gramsci são os mesmos de Marx, Engels, Lênin ou mesmo Fidel Castro: a extinção do capitalismo e a implantação de uma “Estado Regulado”. Só que, em lugar de chamar marxismo de marxismo, Gramsci o substitui pelo desígnio de “filosofia de práxis”, em vês de “classe” usa a expressão “grupo social”,etc,etc., redimensionando e codificando, no aporte teórico, para fins revolucionários, os conceitos de “hegemonia”, “sociedade civil”, “estado ampliado”, “intelectual orgânico”e o que chama, inspirado em Maquiavel, o “Moderno Príncipe”- que outra coisa não é senão o velho partido totalitário ou qualquer similar no gênero, como, por exemplo, o PT do companheiro Lula.

     E para entender a tocante ambigüidade do PT, este Moderno Príncipe que associa a ação prática de Waldomiro Diniz à sublime idéia de uma “sociedade mais justa”, hoje na ordem do dia, nada melhor do que reproduzir as palavras de Gramsci, transcritas de um dos seus Cadernos: “ O Moderno Príncipe( o partido), desenvolve-se, subverte todo o sistema de relações intelectuais e moais, uma vez que o seu desenvolvimento significa, de fato, que todo ato é concebido como útil ou prejudicial, como virtuoso ou criminoso, somente na medida em que tem como ponto de referência o próprio Moderno Príncipe e serve ou para aumentar o poder ou para opor-se a ele. O Príncipe toma o lugar, nas consciências, da divindade ou do imperativo categórico, torna-se a base de uma laicismo moderno e de uma completa laicização de toda a vida e de  todas as relações de costume”.

     A coisa parece complicada, mas não é. Basta olhar a ação do PT no governo e a reação (“senso comum”) da sociedade brasileira e passamos a perceber com clareza a extensão da monstruosidade em andamento.

     ( Publicado no Jornal do Grupo Inconfidência, nº 68, de 20/04/2004) 

* Escritor, Cineasta e Jornalista. É autor do livro “Politicamente Corretíssimo”, edição da Topbooks.

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