A POESIA ETERNA

Por Marco Dias

Os Lus�adas
Lu�s Vaz de Cam�es


PREF�CIO
(edi��o - 1881)
A vida de Cam�es n�o � uma simples indica��o de dados biographicos; ella est� ligada a todos os accidentes historicos da nacionalidade portugueza. Nasceu no mesmo anno em que morria Vasco da Gama, em 1524, como se os grandes feitos realisados precisassem de ser completados pela eternidade da gloria. Foram seus paes Sim�o Vaz de Cam�es, segundo neto do trovador galleziano Vasco Pires de Cam�es, e D. Anna de S� e Macedo, da familia dos Gamas do Algarve. Na vida do Poeta sentem-se estas duas influencias ethnicas: no caracter passivo e ao mesmo tempo inquieto, como se nota no subjectivismo dos seus cantos lyricos, e nas tempestades constantes da sua vida que o tornaram tambem personagem da sua epop�a. Nascido no primeiro quartel do seculo XVI, na fecunda epoca da Renascen�a, Cam�es acompanha essa actividade dos espiritos como humanista conhecedor das litteraturas da antiguidade, das sciencias que se restabeleciam, e da jurisprudencia que se vigorisava pelo regimen parlamentar. A educa��o de Cam�es fez-se em Coimbra, parte no mosteiro de Santa Cruz, para onde convergiam todos os filhos da aristrocacia portugueza, e na Universidade de Coimbra depois da reforma de 1537. A epoca da sua formatura fixa-se at� 1542, data eloquente que nos mostra como escapou � esterilisadora ac��o dos jesuitas em Portugal, onde em 1555 se apoderaram do ensino publico, offuscando a fecundidade creadora dos Quinhentistas, matando nas consciencias das novas gera��es o sentimento nacional, a ponto de se achar totalmente extincto em 1580, quando a na��o recebeu o invasor Philippe II em arcos triumphaes. Depois de 1542, Cam�es veiu frequentar a c�rte de D. Jo�o III, na qual o beaterio extinguira o explendor dos ser�es do pa�o, em que a aristocracia portugueza revelara uma extraordinaria cultura; apenas em volta da Infanta D. Maria se formara a titulo de distrahil-a, uma pequena c�rte de senhoras, como as Sig�as, Angela Vaz, Paula Vicente, D. Leonor de Noronha, D. Francisca de Portugal. Foi n�este cenaculo que Cam�es teve os seus triumphos, tomando amores com D. Catherina de Athayde, filha do camareiro-m�r do Infante D. Duarte, D. Antonio de Lima. O odio do poeta aulico Caminha, provocou em volta de Cam�es intrigas de que o beaterio da rainha se valeu, dando em resultado ser Cam�es desterrado da c�rte, e andar errante pelo Ribatejo at� se resolver a ir militar em Africa, nas guarni��es de Ceuta, depois de 1546. Em uma embuscada dos arabes, perdeu o olho direito. Em Africa come�ou a ver a decadencia do dominio portuguez, e ali sentiu a necessidade de eternisalo; quiz lan�ar-se em maiores emprezas, indo batalhar no oriente, inscrevendo-se para acompanhar em 1550 o novo viso-rei D. Afonso de Noronha. Por circumstancias extraordinarias n�o seguiu na armada, mas j� em Lisboa n�o pode esquivar-se � fatalidade dos acontecimentos; tendo em 1552 ferido o mo�o dos arreios de D. Jo�o III, Gon�alo Borges, foi preso no tronco da Cidade at� 7 de Mar�o de 1553, d�onde saiu a custo, para embarcar para a India como �homem de guerra� em 24 de Maio d�esse anno na n�o Sam Bento. Foi durante a solid�o do carcere que teve conhecimento da primeira Decada de Barros, que evidentemente lhe prestou os primeiros elementos historicos dos Lusiadas. A viagem da India foi tempestuosissima, chegando de toda a armada apenas a n�o Sam Bento a Goa; entrou logo em campanha contra o Chemb�, occupando-se em 1554 no doentio cruzeiro no estreito do mar roxo, coincidindo o seu regresso a Goa com as festas da investidura do governo de Francisco Barreto, para as quaes escreveu directamente o seu Auto do Filodemo, satyrizando depois a sociedade que Barreto pretendia reformar, com a sua composi��o dos Disparates da India. Barreto, querendo organizar a administra��o da feitoria de Mac�o, nomeou o poeta Provedor-m�r dos Defuntos e Ausentes d�essa apartada colonia, cargo que reclamava uma coragem decidida e ao mesmo tempo certa cultura juridica. Cam�es partiu para Mac�o em 1556, d�onde regressou ao fim de dois annos debaixo de pris�o, �mexericado de amigos,� como elle o declarara a Manoel Corr�a. Durante os dois annos de Mac�o occupou-se a escrever o poema dos Luziadas na gruta que hoje � um monumento, trazendo comsigo seis cantos, que salvou no naufragio soffrido nas costas de Cambodja. Um mais terrivel golpe o esperava em Goa, onde recebeu a noticia da morte de D. Catherina de Athayde, �muito mo�a no pa�o�; esteve em pris�o at� que o mandou soltar o viso-rei D. Constantino de Bragan�a, passando em Goa o inverno de 1559. O conde de Redondo em 1561 empregou-o no seu despacho, usando por este tempo o poeta a sua influencia em favor do venerando e sabio Garcia d�Orta; o viso-rei D. Antonio de Noronha nomeou-o capit�o na sobrevivencia da Feitoria de Chaul, de que n�o chegou a tomar posse. De 1564 a 1567 � totalmente ignorada a sua vida, suppondo-se plausivelmente que n�este periodo viajara no archipelago das Molucas. O seu poema estava prompto, e um s� desejo o affligia, regressar a Portugal, � ditosa patria sua amada. Acompanhou, n�este intuito, Pedro Barreto para Mo�ambique, onde foi encontrado em 1569 por Diogo do Couto �t�o pobre, que comia de amigos�; Couto e outros amigos se cotisaram entre si para trazerem para Portugal na n�o Santa Clara �este principe dos poetas do seu tempo�, como os proprios comtemporaneos lhe chamavam. A chegada a Lisboa foi a 7 de abril de 1570; Lisboa tinha sido desvastada pela �peste grande� de 1569, mas o poeta ainda logrou encontrar sua m�e viva �muito velha, e muito pobre�, como diz um documento official; em 23 de septembro de 1571, obteve Cam�es licen�a para a publica��o dos �Luziadas� que s� appareceram � luz por julho de 1572. Foi ent�o que se lhe deu uma ten�a de 15 mil r�is pela �habilidade e sofficiencia das cousas da India.� O poema provocou contra Cam�es terriveis malevolencias da parte de outros poetas, como Caminha, Bernardes, Corte Real e S� de Menezes. Na expedi��o de Africa de 1578, Bernardes foi preferido a Cam�es para cantor da empreza de Dom Sebasti�o. Depois da derrota de Alcacer, de 4 de Agosto, Cam�es viu o futuro da nacionalidade portugueza entregue � trai��o do Cardeal D. Henrique, e em volta do poeta agruparam-se os partidarios da independencia. Adoeceu ent�o n�esse periodo conhecido na historia pelo nome do �tempo das altera��es�, morrendo em 10 de junho de 1580, ao saber que os exercitos de Philippe II estavam em Badajoz para virem sobre Portugal. �Ao menos morro com a patria,� escreveu Cam�es ao seu amigo D. Francisco de Almeida, que procurava resistir � invas�o castelhana; foi sepultado obscuramente na egreja de Santa Anna, da pobre irmandade dos sapateiros. O livro dos �Luziadas� tornou-se para os portuguezes o deposito dos germens da sua liberdade, e para Portugal ficou o eterno preg�o da historia, o monumento imperecivel do seu passado. Tres gera��es passaram, para que a intelligencia portugueza comprehendesse a synthese profunda contida no nome e na obra de Cam�es � tal � o sentido do jubileo nacional do Centenario de 1880. Theophilo Braga.

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