A POESIA ETERNA

Por Marco Dias

SIDÓNIO MURALHA

Biografia

 

1920-1982

Portugal Portugal

Sidónio Muralha nasceu em Lisboa, em 1920 e faleceu em Curitiba, no Brasil, em 1982.

A carreira literária de Sidónio Muralha iniciou-se em 1941, com a colectânea de poemas intitulada O Beco. A partir de 1962 foi viver para o Brasil onde residiu até à sua morte.

Dedicou grande parte da sua obra à literatura infantil, tendo recebido vários prémios nacionais e internacionais, nomeadamente o Prémio o Ambiente na Literatura Infantil, pela obra Valéria e a Vida.

Sidónio Muralha fez parte do grupo do Novo Cancioneiro e a sua obra encontra-se ligada ao neo-realismo.

 

Obra:

Ficção
Do Outro Lado da Rua
Bicos, Bichinhos e Bicharocos, 1950
Os Olhos das Crianças , 1963
Quando São Paulo só Tinha Quatro Milhões de Habitantes, 1966
O Homem Arrastado, 1972
Valéria e a Vida, 1977
 

Poesia
Beco , 1941
Passagem de Nível , 1942
Companheira dos Homens , 1950
Poemas, 1971
 


O Pássaro Ferido , 1972
 

 

 

Poesias Eternas

 Amanhã

Dois Poemas da Praia da Areia Branca

Prelúdio

Romance

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Dois Poemas da Praia da Areia Branca

 

1

Na praia da Areia Branca

os búzios não falam só de mar:

- falam das pragas, dos clamores,

da fome dos pescadores

e dos lenços tristes a acenar.

 

Búzios da Praia da Areia Branca:

- um dia,

haveis de falar

unicamente do mar.

 

 

2

No fundo do mar,

há barcos, tesoiros,

segredos por desvendar

e marinheiros que foram morenos ou loiros

 

Ali, não são morenos nem são loiros

- são formas breves, a descansar,

sem ambições para os tesoiros

e de cabelos verdes dos limos do mar.

 

Serenos, serenos, repousam os mortos,

 

- enquanto o mar

ensina o mundo a falar

a mesma língua em todos os pontos.

 

PASSAGEM DE NÍVEL, Novo Cancioneiro,1942

topo

 

 

 

 

Prelúdio

 

A minha Poesia é uma árvore cheia de frutos

que um sol de tragédia amadurece;

mas eu não os arranco nem procuro:

- o meu sol de tragédia aquece, aquece,

e o fruto cai de maduro.

 

No resto, sou empregado de escritório

que não procura desvendar abismos,

e passo o dia (glorioso ou inglório)

a somar algarismos...

 

A minha Poesia é um árvore cheia de frutos

que um sol de tragédia amadurece;

 

mas eu não os arranco nem procuro:

- sei q miséria da estrada percorrida;

o meu sol de tragédia aquece, aquece,

 

- e o fruto cai de maduro

no chão da minha vida.

 

PASSAGEM DE NÍVEL, Novo Cancioneiro,1942

topo

 

 

 

Amanhã

 

Na hora que vem de longe,

cresce e vem, cresce e vem,

 

- os que tiverem frio hão-de lançar os meus versos ao lume,

e a chama há-de subir...

- os que tiverem fome hão-de lançar os meus versos à terra,

como se fossem estrume,

e a terra há-de florir...

 

Os meus poemas de tragédia são degraus

da hora que vem,

- cresce e vem,

- cresce e vem... -

Nos meus poemas cresceu, e sofreu, e aprendeu

nos meus poemas revoltos,

por isso vem de longe, nua, nua,

e traz os cabelos soltos...

 

Hora que vens de longe,

de longe vens, de rua em rua:

- hás-de passar e hás-de parar por toda a parte,

nua, formosamente, nua,

 

- para que já não possam desnudar-te.

 

BECO, LÍRICAS PORTUGUESAS, PORTUGÁLIA EDITORA, 3ª SÉRIE, PAG. 263

topo

 

 

 

 

Romance

 

Depois daquela noite os teus seios incharam;

as tuas ancas alargaram-se;

e os teus parentes admiraram-se

e falaram, falaram...

 

Porque falaram duma coisa tão bela,

tão simples, tão natural?

Tu não parias uma estrela

nem uma noite de vendaval...

 

Mas tudo terminou porque falaram.

Tu fraquejaste e tudo terminou.

- Os teus seios desincharam;

só a tristeza ficou.

 

Ficou a tristeza duma coisa tão bela,

tão simples, tão natural...

 

- Tu não parias uma estrela,

nem uma noite de vendaval...

 

PASSAGEM DE NÍVEL, LÍRICAS PORTUGUESAS, PORTUGÁLIA EDITORA, 3ª SÉRIE, PAG. 264

topo

 

 A Poesia Eterna, por Marco Dias . Todos os direitos reservados.

1