JOÃO
PENHA
Biografia 1838-1919 João Penha de Oliveira Fortuna nasceu em 1838 e faleceu em 1919. Formado em Direito pela Universidade de Coimbra dirige entre 1868 e 1873 "A Folha", publicação que veicula as novas tendências da época, parnasianas, e onde colaboram os grandes poetas do tempo. Poeta parnasiano foi um cultor do soneto. De entre as suas obras destacamos: Rimas, Novas Rimas, Ecos do Passado, Últimas Rimas e Canto do Cisne.
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Poesias Eternas
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Tribuno popular, dos mais
distintos,
Nele encarnava, há
muito, a idéia nova,
E se falava, era contar
com sova
Em reis no trono, ou já
por terra, extintos.
"Foram padres,
diziam, esses famintos
Quem inventou que a vida
se renova:
Que estúpida mentira! Além
da cova
Nada há: morre o corpo e
os seus instintos."
No seu discurso de ontem,
memorável,
Sem que se ouvisse o mínimo
sussurro,
Penetrou, com pé firme,
no insondável,
E dando um berro, e na
tribuna um murro,
"Morra Deus!"
vozeou inexotável,
E o eco, ao longe,
repetiu: "que burro!"
Por uns caminhos, já por
mim trilhados,
Por alto Dom de Apolo, o
deus radioso,
Com passo firme, intrépido
e animoso,
Transpus do Olimpo os áditos
sagrados.
E vendo-o entre os
deuses, indignados
Da minha audácia de
mortal odioso,
Para ele avancei, e
respeitoso
Lhe disse em verso, em
versos sublimados:
"- Venho pedir-te,
ó resplendente nume,
Uma das tuas musas, que
divina
Meu estro eleve do
Parnaso ao cume":
"Dá-ma toda gentil,
nova e menina."
- "Tens lá na terra
uma, que resume
Todo o teu ideal: a idela
Rosina."
A Guimarães Fonseca
Vede-o, além, no
esconso, à luz mortiça
Do velho lampadário que
vacila!
No lábio tem o insulto,
e na pupila
O raio ardente que as
paixões atiça.
Vede-os, que são rivais!
Fatal cobiça
Violenta os arrancou à
paz tranqüila,
E no rude brigar, que os
aniquila,
Já tingem de vermelho o
chão e a liça!
– «Acima o canjirão!»
– com voz acesa
Diz a mais fera na
tremenda luta,
«Acima!» – e pousa-o
sobre a mesa.
Mas, vendo soçobrar a
massa bruta
Do insolente rival, dos
vinhos presa:
– «Venci! diz
vomitando; é minha a truta!»
Rimas
Quando eu fazia trovas,
nessa idade
Em que a vida é sonho de
poesia,
Fiz-lhe versos de amar,
em que a dizia
Um lírio branco, a flor
da castidade.
Era junto ao Penedo da
Saudade
Que eu muitas vezes,
perpassando, a via:
Lá era o ninho. Assim a
cotovia
O faz longe, bem longe da
cidade.
Quanto eu a amava então!
Em ânsia ardente
Eu só tinha um desejo: o
da conquista
Daquela virgem pura, anjo
inocente!
Certo dia, em que a vi,
fui-lhe na pista,
E logo, aproximando-me
tremente:
– «Onde vai?» –
perguntei. – «Vou à revista».
Viagem
por Terra ao País dos Sonhos
Sem pena alguma, sem
amargo pranto,
A minha lira abandonei de
outrora.
Oh! quantas vezes a minha
alma cora
Das alegres canções que
amara tanto!
Nem àqueles que me amam
cause espanto
Se nesta fase em que me
encontro agora,
Cercada a fronte dum clarão
de aurora,
Eu, de Tenório me
transforme em santo!
Que mudança, senhora, em
mim fizeste:
O vate da alegria, ei-lo
defunto;
Outro mais grave as suas
formas veste!
Cantei o paio atroz, o
vil presunto;
Agora és tu, só tu,
musa celeste
A minha inspiração, a
meu assunto!
Novas Rimas
Andas, meu bom Antero de
Quental,
Nas regiões obscuras do
infinito
Cá eras meio ateu, mas lá,
contrito,
Já te vês imortal, ante
o Imortal.
Esse caso psicológico e
fatal
Está de há muito em
livros de oiro escrito:
Filosofia e crença não
são mito,
Uma irrisória criação
mental.
Sem veres o fantástico
Nirvana,
Alijaste Manu, e dizes
triste:
«Não tem limites a
cegueira humana!
Na terra que fiz eu, da
lança em riste?
Oh! como o pensamento nos
engana!
De tudo que sonhei... só
Deus existe!»
Últimas Rimas
Ninguém vive sem amor,
Neste mundo sub-lunar.
Cada pomba tem seu par,
Cada zagala um pastor.
O doirado pica-flor
Ama a rosa-de-toucar;
Enfim, na terra e no mar,
É Ele o rei, o senhor.
Pois que amar é lei sem
metas,
Amemos, cantando aos
ventos
As nossas musas dilectas.
Até os próprios
jumentos
Têm, como nós os
poetas,
Burras dos deus
pensamentos.
Canto do Cisne
A Poesia Eterna, por Marco Dias . Todos os direitos reservados.