A POESIA ETERNA

Por Marco Dias

JERÓNIMO BAÍA

Biografia

1620/30-1688

Portugal Portugal

Jerónimo Baía, nasceu em Coimbra em 1620/30 e faleceu em 1688. É um dos principais autores da literatura barroca.

 

Poesias Eternas

Falando Com Deus

Ao Menino-Deus Nascido

Ao rigor de Lísi

Sonhando Que Via a Márcia

A uma Crueldade Formosa

A uma Trança de Cabelos Negros

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ao rigor de Lísi

 

Mais dura, mais cruel, mais rigorosa

Sois, Lísi, que o cometa, rocha ou muro

Mais rigoroso, mais cruel, mais duro,

Que o Céu vê, cerca o mar, a terra goza.

 

Sois mais rica, mais bela, mais lustrosa

Que a perla, rosa, Sol ou jasmim puro,

Pois por vós fica feio, pobre e escuro,

Sol em Céu, perla em mar, em jardim rosa.

 

Não viu tão doce, plácida e amena,

(Brame o mar, trema a terra, o Céu se agrave),

Luz o Céu, ave a terra, o mar sirena.

 

Vós triunfais de sirena', luz e ave,

Claro Sol, perla fina, rosa amena,

Mor cometa, árduo muro, rocha grave.

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Sonhando que via a Márcia

 

Pintais, sono gentil, com belo ornato

Meu claro sol na vossa sombra escura,

Que posto que da morte sois retrato,

Retrato sabeis ser da fermosura.

 

Eu, vendo o grato rosto e peito ingrato,

Quando fermosa a sigo a temo dura;

Porém firme no amor, fácil no trato,

Me coroa a esperança, a fé me jura.

 

Cante pois por tal glória, por tal sorte,

Cante vosso louvor, minha Talia

No Ocaso, no Oriente, Sul e Borte;

 

Chame-vos clara luz, não sombra fria,

Causa da vida, não irmão da morte,

Filho da noite não, mas pai do dia.

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A uma trança de cabelos negros

 

Diversa em cor, igual em bizarria

Sois, bela trança, ao lustre de Sofala,

Luto por negra, por vistosa gala,

Nas cores noite, na beleza dia.

 

Negra, porém de amor na monarquia

Reinais senhora, não servis vassala;

Sombra, mas toda a luz não vos iguala;

Tristeza, mas venceis toda a alegria.

 

Tudo sois, mas eu tenho resoluto

Que sois só na aparência enganadora

Negra, noite, tristeza, sombra, luto.

 

Porém na essência, ó doce matadora,

Quem não dirá que sois, e não diz muito,

Dia, gala, alegria, luz, senhora?

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Falando com Deus

 

Só vos conhece, amor, quem se conhece;

Só vos entende bem quem bem se entende;

Só quem se ofende a si, não vos ofende,

E só vos pode amar quem se aborrece.

 

Só quem se mortifica em vós floresce;

Só é senhor de si quem se vos rende;

Só sabe pretender quem vos pretende,

E só sobe por vós quem por vós desce.

 

Quem tudo por vós perde, tudo ganha,

Pois tudo quanto há, tudo em vós cabe.

Ditoso quem no vosso amor se inflama,

 

Pois faz troca tão alta e tão estranha.

Mas só vos pode amar o que vos sabe,

Só vos pode saber o que vos ama.

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Ao Menino-Deus nascido

 

Não choreis, belo Menino,

Se de amante vos prezais,

Porque amor que chora mais

É sempre amor menos fino:

Limpai o rosto divino,

A quem a minha alma adora,

Que se vossa Mãe vos chora,

Meu Deus, com tantos rigores,

É porque ao nascer das flores,

Costuma chorar a Aurora.

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A Uma Crueldade Formosa

Madrigal

 

A minha bela ingrata

Cabelo de ouro tem, fronte de prata,

De bronze o coração, de aço o peito;

São os olhos luzentes,

Por quem choro e suspiro,

Desfeito em cinza, em lágrimas desfeito,

Celestial safiro;

Os beiços são rubins, perlas os dentes;

A lustrosa garganta

De mármore polido;

A mão de jaspe, de alabastro a planta.

Que muito, pois, Cupido,

Que tenha tal rigor tanta lindeza,

As feições milagrosas,

Para igualar desdéns a formosuras,

De preciosos metais, pedras preciosas,

E de duros metais, de pedras duras?

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 A Poesia Eterna, por Marco Dias . Todos os direitos reservados.

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