DOM
JOÃO DA CÂMARA
Biografia 1852-1908 Dom João Gonçalves Zarco da Câmara, nasceu em Lisboa em 1852 e faleceu em 1908. Engenheiro de profissão foi poeta, dramaturgo, contista e cultivou o romance histórico tendo ainda sido professor no Conservatório de Lisboa.
|
Poesias Eternas
|
no pálido clarão, que o
fundo esmalta,
a minha fantasia que se
exalta,
vê passar mil visões,
como em fileira.
Como as fagulhas correm
na madeira
e morrem, passam elas na
ribalta;
nem uma só lembrança
ali me falta
de tanto que passei na
vida inteira!
Oh! deixem-me sonhar um
sonho infindo!
Dormir é reviver. Quero,
dormindo,
viver o meu passado tão
risonho!
Não me despertes, anjo
da saudade...
Tanto sonho já foi
realidade;
já foi realidade... e
agora é sonho!
O rio é negro e nem de
espuma um claro o esmalta,
Que a noite é negra e um
negro incauto encobre a Lua;
Apenas uma vela em mastro
de falua
De tanto negro, negro, em
tanto alvor, ressalta.
De lume fátuo, incerto,
onde o contorno falta,
Assim no escuro da alma
uma ilusão flutua;
O enxame da cobiça em
torno tumultua,
E a fantasia, entanto,
aspira a luz mais alta.
Fazendo volta ao mar,
voltar-me a noite bela
Das auras bem pudera o cântico
em surdina,
Que as nuvens extravia e
os sonhos maus debela.
E, rota da luz a luminosa
mina,
Eu vira, em meu
transporte, altiva, a branca vela,
Correr, sorrir, brilhar
no ardor da tremulina.
in, À SOMBRA DO ORPHEU, Antologia, Guimarães
Editores, p. 66 e 67
A Poesia Eterna, por Marco Dias . Todos os direitos reservados.