FERREIRA
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Biografia
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Poesias Eternas
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Do
fundo de meu quarto, do fundo
de
meu corpo
clandestino
ouço
(não vejo) ouço
crescer
no osso e no músculo da noite
a
noite
a
noite ocidental obscenamente acesa
sobre
meu país dividido em classes
Aí
o homem sério entrou e disse: bom dia.
Aí
outro homem sério respondeu: bom dia.
Aí
a mulher séria respondeu: bom dia.
Aí
a menininha no chão respondeu: bom dia.
Aí
todos riram de uma vez
Menos
as duas cadeiras, a mesa, o jarro, as flores
as
paredes, o relógio, a lâmpada, o retrato, os livros
o
mata-borrão, os sapatos, as gravatas, as camisas, os lenços.
Leia-o
também em holandês
O
galo
no
salão quieto.
Galo
galo
de
alarmante crista, guerreiro,
medieval.
De
córneo bico e
esporões,
armado
contra
a morte,
passeia.
Mede
os passos. Pára.
Inclina
a cabeça coroada
dentro
do silêncio:
——
que faço entre coisas ?
——
de que me defendo ?
Anda.
No
saguão.
O
cimento esquece
o
seu último passo.
Galo:
as penas que
florescem
da carne silenciosa
e
duro bico e as unhas e o olho
sem
amor. Grave
solidez.
Em
que se apóia
tal
arquitetura ?
Saberá
que, no centro
de
seu corpo, um grito
se
elabora ?
Como,
porém, conter,
uma
vez concluído,
o
canto obrigatório ?
Eis
que bate as asas, vai
morrer,
encurva o vertiginoso pescoço
donde
o canto rubro escoa
Mas
a pedra, a tarde,
o
próprio feroz galo
subsistem
ao grito.
Vê-se:
o canto é inútil.
O
galo permanece — apesar
de
todo o seu porte marcial —
só,
desamparado,
num
saguão do mundo.
Pobre
ave gurreeira!
Outro
grito cresce
agora
no sigilo
de
seu corpo; grito
que,
sem essas penas
e
esporões e crista
e
sobretudo sem esse olhar
de
ódio,
não
seria tão rouco
e
sangrento
Grito,
fruto obscuro
e
extremo dessa árvore: galo.
Mas
que, fora dele,
é
mero complemento de auroras.
A Poesia Eterna, por Marco Dias . Todos os direitos reservados.