THIAGO
DE MELLO
Biografia
1926
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Poesias Eternas
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Fica decretado que agora
vale a verdade.
agora vale a vida,
e de mãos dadas,
marcharemos todos pela
vida verdadeira.
Fica decretado que todos
os dias da semana,
inclusive as terças-feiras
mais cinzentas,
têm direito a
converter-se em manhãs de domingo.
Fica decretado que, a
partir deste instante,
haverá girassóis em
todas as janelas,
que os girassóis terão
direito
a abrir-se dentro da
sombra;
e que as janelas devem
permanecer, o dia inteiro,
abertas para o verde onde
cresce a esperança.
Fica decretado que o
homem
não precisará nunca
mais
duvidar do homem.
Que o homem confiará no
homem
como a palmeira confia no
vento,
como o vento confia no
ar,
como o ar confia no campo
azul do céu.
Parágrafo único:
O homem, confiará no homem
como um menino confia em outro menino.
Fica decretado que os
homens
estão livres do jugo da
mentira.
Nunca mais será preciso
usar
a couraça do silêncio
nem a armadura de
palavras.
O homem se sentará à
mesa
com seu olhar limpo
porque a verdade passará
a ser servida
antes da sobremesa.
Fica estabelecida,
durante dez séculos,
a prática sonhada pelo
profeta Isaías,
e o lobo e o cordeiro
pastarão juntos
e a comida de ambos terá
o mesmo gosto de aurora.
Por decreto irrevogável
fica estabelecido
o reinado permanente da
justiça e da claridade,
e a alegria será uma
bandeira generosa
para sempre desfraldada
na alma do povo.
Fica decretado que a
maior dor
sempre foi e será sempre
não poder dar-se amor a
quem se ama
e saber que é a água
que dá à planta o
milagre da flor.
Fica permitido que o pão
de cada dia
tenha no homem o sinal de
seu suor.
Mas que sobretudo tenha
sempre o quente sabor da
ternura.
Fica permitido a qualquer
pessoa,
qualquer hora da vida,
uso do traje branco.
Fica decretado, por
definição,
que o homem é um animal
que ama
e que por isso é belo,
muito mais belo que a
estrela da manhã.
Decreta-se que nada será
obrigado
nem proibido,
tudo será permitido,
inclusive brincar com os
rinocerontes
e caminhar pelas tardes
com uma imensa begônia
na lapela.
Parágrafo único:
Só uma coisa fica proibida:
amar sem amor.
Fica decretado que o
dinheiro
não poderá nunca mais
comprar
o sol das manhãs
vindouras.
Expulso do grande baú do
medo,
o dinheiro se transformará
em uma espada fraternal
para defender o direito
de cantar
e a festa do dia que
chegou.
Fica proibido o uso da
palavra liberdade,
a qual será suprimida
dos dicionários
e do pântano enganoso
das bocas.
A partir deste instante
a liberdade será algo
vivo e transparente
como um fogo ou um rio,
e a sua morada será
sempre
o coração do homem.
Santiago do Chile, Abril de 1964
Não faço poemas como
quem chora,
nem faço versos como
quem morre.
Quem teve esse gosto foi
o bardo Bandeira
quando muito moço;
achava que tinha
os dias contados pela tísica
e até se acanhava de
namorar.
Faço poemas como quem
faz amor.
É a mesma luta suave e
desvairada
enquanto a rosa orvalhada
se vai entreabrindo
devagar.
A gente nem se dá conta,
até acha bom,
o imenso trabalho
que amor dá para fazer.
Perdão, amor não se
faz.
Quando muito, se
desfaz.
Fazer amor é um dizer
(a metáfora é falaz)
de quem pretende vestir
com roupa austera a
beleza
do corpo da primavera.
O verbo exato é
foder.
A palavra fica nua
para todo mundo ver
o corpo amante cantando
a glória do seu poder.
A Poesia Eterna, por Marco Dias . Todos os direitos reservados.