A POESIA ETERNA

Por Marco Dias

THIAGO DE MELLO

Biografia

 

1926

 

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Poesias Eternas

Arte de Amar 

Os Estatutos do Homem :

Artigo I

Artigo II

Artigo III

Artigo IV

Artigo V

Artigo VI

Artigo VII

Artigo VIII

Artigo IX

Artigo X

Artigo XI

Artigo XII

Artigo XIII

Artigo Final

 

 

 

 

   

 

 

 

 

Os Estatutos do Homem                         

 

 

Artigo I 

 

Fica decretado que agora vale a verdade. 

agora vale a vida, 

e de mãos dadas, 

marcharemos todos pela vida verdadeira. 

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Artigo II 

 

Fica decretado que todos os dias da semana, 

inclusive as terças-feiras mais cinzentas, 

têm direito a converter-se em manhãs de domingo. 

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Artigo III  

 

Fica decretado que, a partir deste instante, 

haverá girassóis em todas as janelas, 

que os girassóis terão direito 

a abrir-se dentro da sombra; 

e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro, 

abertas para o verde onde cresce a esperança. 

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Artigo IV   

 

Fica decretado que o homem 

não precisará nunca mais 

duvidar do homem. 

Que o homem confiará no homem 

como a palmeira confia no vento, 

como o vento confia no ar, 

como o ar confia no campo azul do céu. 

 

        Parágrafo único:  

        O homem, confiará no homem 

        como um menino confia em outro menino. 

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Artigo V  

 

Fica decretado que os homens 

estão livres do jugo da mentira. 

Nunca mais será preciso usar 

a couraça do silêncio 

nem a armadura de palavras. 

O homem se sentará à mesa 

com seu olhar limpo 

porque a verdade passará a ser servida 

antes da sobremesa. 

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Artigo VI  

 

Fica estabelecida, durante dez séculos, 

a prática sonhada pelo profeta Isaías, 

e o lobo e o cordeiro pastarão juntos 

e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora. 

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Artigo VII  

 

Por decreto irrevogável fica estabelecido  

o reinado permanente da justiça e da claridade,  

e a alegria será uma bandeira generosa  

para sempre desfraldada na alma do povo. 

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Artigo VIII   

 

Fica decretado que a maior dor 

sempre foi e será sempre 

não poder dar-se amor a quem se ama 

e saber que é a água 

que dá à planta o milagre da flor. 

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Artigo IX   

 

Fica permitido que o pão de cada dia 

tenha no homem o sinal de seu suor.   

Mas que sobretudo tenha  

sempre o quente sabor da ternura. 

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Artigo X  

 

Fica permitido a qualquer  pessoa, 

qualquer hora da vida, 

uso do traje branco. 

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Artigo XI   

 

Fica decretado, por definição, 

que o homem é um animal que ama  

e que por isso é belo, 

muito mais belo que a estrela da manhã. 

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Artigo XII   

 

Decreta-se que nada será obrigado  

nem proibido, 

tudo será permitido,  

inclusive brincar com os rinocerontes  

e caminhar pelas tardes  

com uma imensa begônia na lapela. 

 

        Parágrafo único:  

        Só uma coisa fica proibida: 

        amar sem amor. 

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Artigo XIII   

 

Fica decretado que o dinheiro 

não poderá nunca mais comprar 

o sol das manhãs vindouras. 

Expulso do grande baú do medo, 

o dinheiro se transformará em uma espada fraternal 

para defender o direito de cantar 

e a festa do dia que chegou. 

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Artigo Final 

 

Fica proibido o uso da palavra liberdade,  

a qual será suprimida dos dicionários  

e do pântano enganoso das bocas. 

A partir deste instante 

a liberdade será algo vivo e transparente 

como um fogo ou um rio, 

e a sua morada será sempre  

o coração do homem.

 

Santiago do Chile,  Abril de 1964

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Arte de Amar

 

 

Não faço poemas como quem chora,

nem faço versos como quem morre.

Quem teve esse gosto foi o bardo Bandeira

quando muito moço; achava que tinha 

os dias contados pela tísica

e até se acanhava de namorar.

 

Faço poemas como quem faz amor.

É a mesma luta suave e desvairada

enquanto a rosa orvalhada

se vai entreabrindo devagar.

A gente nem se dá conta, até acha bom,

 o imenso trabalho que amor dá para fazer.

 

Perdão, amor não se faz.

Quando muito,  se desfaz.

Fazer amor é um dizer

(a metáfora é falaz)

de quem pretende vestir

com roupa austera a beleza

do corpo da primavera.

 O verbo exato é foder.

A palavra fica nua

para todo mundo ver

o corpo amante cantando

a glória do seu poder.

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