MURILO
MENDES
Biografia
1901-1975 Murilo
Monteiro Mendes nasceu no Brasil a 13 de maio de 1901. Ainda menino,
transfere-se para Niterói, onde conclui seus estudos secundários. Em 1953
muda-se para a Europa, percorrendo vários países; vem a falecer em Portugal, a
13 de agosto de 1975.
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Poesias Eternas Mulher Vista do Alto de uma Pirâmide
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Ninguém sonha duas
vezes o mesmo sonho
Ninguém se banha duas
vezes no mesmo rio
Nem ama duas vezes a
mesma mulher.
Deus de onde tudo
deriva
E a circulação e o
movimento infinito.
Ainda não estamos
habituados com o mundo
Nascer é muito
comprido.
Mulher Vista do Alto de uma Pirâmide
Eu vejo em ti as épocas
que já viveste
E as épocas que ainda
tens para viver.
Minha ternura é feita
de todas as ternuras
Que descem sobre nos
desde o começo de Adão
Estas engrenada nas
formas
Que se engrenam em
outras desde a corrente dos séculos.
E outras formas estão
ansiosas por despontarem em ti.
Quando eu te contemplo
Vejo tatuada no teu
corpo
A historia de todas as
gerações.
Encerras teu filho,
tua neta e a neta de tua neta.
Mulher, tu es a
convergência de dois mundos.
Quando te olho a
extensão do tempo se desdobra em mim.
O poeta futuro já se
encontra no meio de vós,
Ele nasceu da terra
Preparada por gerações
de sensuais e de místicos:
Surgiu do universo em
crise, do massacre entre irmãos,
Encerrando no espírito
épocas superpostas.
O homem sereno, a síntese
de todas as raças, o portador da vida
Sai de tanta luta e
negação, e do sangue espremido.
O poeta futuro já
vive no meio de vós
E não o pressentis.
Ele manifesta o equilíbrio
de múltiplas direções
E não permitirá que
logo se perca,
Não acabará de
apagar o pavio que ainda fumega,
Transformando o aço
da sua espada
Em penas que escreverão
poemas consoladores.
O poeta futuro apontará
o inferno
Aos geradores de
guerra,
Aos que asfixiam órfãos
e operários.
Mamãe vestida de
rendas
Tocava piano no caos.
Uma noite abriu as
asas
Cansada de tanto som,
Equilibrou-se no azul,
De tonta não mais
olhou
Para mim, para ninguém!
Cai no álbum de
retratos.
Nunca mais andarei de
bicicleta
Nem conversarei no
portão
Com meninas de cabelos
cacheados
Adeus valsa "Danúbio
Azul"
Adeus tardes preguiçosas
Adeus cheiros do mundo
sambas
Adeus puro amor
Atirei ao fogo a
medalhinha da Virgem
Não tenho forças
para gritar um grande grito
Cairei no chão do século
vinte
Aguardem-me lá fora
As multidões famintas
justiceiras
Sujeitos com gases
venenosos
É a hora das
barricadas
É a hora da
fuzilamento, da raiva maior
Os vivos pedem vingança
Os mortos minerais
vegetais pedem vingança
É a hora do protesto
geral
É a hora dos vôos
destruidores
É a hora das
barricadas, dos fuzilamentos
Fomes desejos ânsias
sonhos perdidos,
Misérias de todos os
países uni-vos
Fogem a galope os
anjos-aviões
Carregando o cálice
da esperança
Tempo espaço firmes
porque me abandonastes.
Minha terra tem
macieiras da Califórnia
Onde cantam gaturamos
de Veneza
Os poetas da minha
terra
São pretos que vivem
em torres de ametista,
Os sargentos do exército
são monistas, cubistas,
Os filósofos são
polacos vendendo a prestações.
A gente não pode
dormir
com os oradores e os
pernilongos
Os sururus em família
têm por testemunha a Gioconda.
Eu morro sufocado
em terra estrangeira.
Nossas flores são
mais bonitas
Nossas frutas mais
gostosas
Mas custam cem mil réis
a dúzia
Ai quem me dera chupar
uma carambola de verdade
e ouvir um sabiá com
certidão de idade !
A Poesia Eterna, por Marco Dias . Todos os direitos reservados.