Cruz e Souza
Biografia 1861-1898
Cruz e Souza nasceu em 24 de novembro
de 1861, na cidade de Nossa Senhora do Desterro, conhecida atualmente por
Florianópolis capital do estado de Santa Catarina. Seu pai, Guilherme,
era escravo e a sua mãe, Carolina, era lavadeira. Por isso, foi criado como
filho adotivo na casa do Marechal Guilherme Xavier e Sousa. |
Poesias Eternas |
ÂNGELUS Um sol em sangue alastra, mancha prodigiosamente o luxuoso e largo damasco do Firmamento. Opulentos, riquíssimos esplendores de púrpurasluminosas dão uma glória sideral à tarde. E, pela sugestão cultual, quase religiosa da hora os deslumbrantes efeitos escarlates do grande astro que desce, de envolta com douramentos faustosos, fazem lembrar a magnificência romana, a ritual majestade dos Papas, um festivo desfilar católico de bispos e cardeais, através dos resplandecentes vitrais do Vaticano, com os báculos e as mitras altas, sob os pálios aurilavrados. Cruz e Souza
ORAÇÃO AO MAR Ó Mar! Estranho Leviatã verde! Formidável pássaro selvagem, que levas nas tuas asas imensas, através do mundo, turbilhões de pérolas e turbilhões de músicas! Órgão maravilhoso de todos os nostalgismos, de todas as plangências e dolências... Mar! Mar azul! Mar de ouro! Mar glacial! Mar das luas trágicas e das luas serenas, meigas, como castas adolescentes! Mar dos sóis purpurais, sangrentos, dos nababescos ocasos rubros! No teu seio virgem, de onde derivam as correntes cristalinas da Originalidade, de onde procedem os rios largos e claros do supremo vigor, eu quero guardar, vivos, palpitantes, estes Pensamentos, como tu guardas os corais e as algas. Nessa frescura iodada, nesse acre e ácido salitre Vivificante, Eles se perpetuarão, sem mácula, à saúde Das tuas águas mucilaginosas onde geram-se prodígios Como de uma luz imortal fecundadora. Cruz e Souza
SOM Trago todas as vibrações da rua, por um dia de sol, quando uma elétrica corrente de movimento circula no ar... Mas, de todas as vibrações recolhidas, só me ficou, vivendo a música do som no ouvido deliciado, a canção da tua voz, que eu no ouvido guardo, para sempre conservo, como um diamante dentro de um relicário de ouro. Cá está, cá a sinto harmonizar, alastrar em som o meu corpo todo, como flexuosa serpente ideal, a tua clara voz de filtro luminoso, magnético, dormente como um ópio... Muitas vezes, por noite em que as estrelas Marchetam o céu, tenho pulsado à sensação de notas errantes, de vagos sons que as aragens trazem. As fundas melancolias que as estrelas e a noite Fazem descer pelo meu ser, da amplidão silenciosa do firmamento, dão-me à alma abstratas suavidades, vaporosos fluidos, sinfonias solenes, misticismos, ondas imensas de inaudita sonoridade. Cruz e Souza
A Poesia Eterna, por Marco Dias . Todos os direitos reservados.