ANTÓNIO SARDINHA
Biografia |
Poesias Eternas |
Chegaram os camelos junto ao poço,
Quando Rebeca tinha a urna cheia.
Foram momentos esses de alvoroço,
Bem raros de encontrar em terra alheia.
Também meu coração, menino moço,
Nos cardos do caminho se golpeia.
Ouço-te os passos, dentro de alma eu ouço
O eco dos teus passos sobre a areia.
Busquei-te no deserto longamente...
Como Rebeca outrora, condoída,
Surgiste, calma, na poeira ardente.
De ânfora baixa, à boca da cisterna,
Ficaste assim, para toda a tua vida,
Matando a minha sede, que é eterna!
CHUVA DA TARDE
Tudo o que sou o sou por obra e graça
da comoção rural que está comigo.
Foi a virtude lírica da Raça
a herança que eu herdei do sangue antigo.
Foi esta voz que em minhas veias passa
e atrás da qual, maravilhado eu sigo.
Como um licor de encanto numa taça,
assim se quer esse condão comigo.
Olhai-me: - Eu vim de honrados lavradores.
De avós e netos, sempre os meus Maiores
fitaram o horizonte que hoje eu fito.
«O que estaria além da curva estreita?»
- E da pergunta, a cada instante Feita.
nasceu em mim a ânsia prò Infinito.
A
EPOPEIA DA PLANÍCIE
Versos do trinco da
porta,
- Louvado seja o Senhor!
A casa é Deus quem ma
guarda,
Ninguém a guarda melhor!
Batem os pobres à porta,
- Batem com ar de
humildade.
"Eu sei que é pouco
irmãozinho!
É pouco, mas de
vontade!"
Quem é que a porta
abriria,
Com modos de atrevimento?
São coisas da criadagem!
Não foi ninguém, - é o
vento!
Mexem no trinco da porta.
- "Levante, faça
favor!"
A entrada nunca se nega
Seja a visita quem for!
Não vês a porta
batendo?
Que aragem essa que
corta!
Em toda a volta do dia,
Não pára o trinco da
porta!
Trinco da porta caindo
Sobre a partida de alguém...
Oh, quantos vão e não
voltam?!
São os que a morte lá
tem!
QUANDO
AS NASCENTES DESPERTAM,
LÍRICAS PORTUGUESAS, PORTUGÁLIA EDITORA, P. 156
A Poesia Eterna, por Marco Dias . Todos os direitos reservados.