O sertão está em toda a parte... |
Sobre Grande Sertão: Veredas em 1956. Carta ao amigo Silveirinha, o embaixador Antonio Azeredo da Silveira: "Eu passei dois anos num túnel, um subterrâneo, só escrevendo, só escrevendo eternamente. Foi uma experiência transpsíquica, eu me sentia um espírito sem corpo, desencarnado - só lucidez e angústia" |
Acordei último. Alteado só se podia nadar no sol. Aí, quase que não se
passavam mais os bandos de pássaros. Mesmo perfiz: que o dia ia dever ser bonito, firme.
Chegou o Cavalcânti, vindo do Cererê-Velho, com recado: nenhumas novidades. Para o
Cererê-Velho recambiei aviso: nenhumas novidades minhas também. O que positivo era, e do
que os meus vigiadores do rededor davam confirmação. Antes, mesmo, por mais, que eu
quisesse ficar previnido, o dia era de paz. Grande Sertão: Veredas |
"A experiência documentária de GR, a observação da vida sertaneja, a paixão
pela coisa e o nome da coisa, a capacidade de entrar na psicologia do rústico - tudo se
transformou em significado universal graças à invenção, que subtrai o livro da matriz
regional, para fazê-lo exprimir os grandes lugares-comuns, sem os quais a arte não
sobrevive: dor, júbilo, ódio, amor, morte, para cuja órbita nos arrasta a cada
instante, mostrando que o pitoresco é acessório, e na verdade, o Sertão é o
Mundo". |
O terceiro livro de Guimarães Rosa, uma narrativa épica que se estende por 600 páginas, focaliza numa nova dimensão, o ambiente e a gente rude do sertão mineiro. Grande Sertão: Veredas reflete um autor de extraordinária capacidade de transmissão do seu mundo, e foi resultado de um período de dois anos de gestação e parto. A história do amor proibido de Riobaldo, o narrador, por Diadorim é o centro da narrativa. Para Renard Perez, autor de um ensaio sobre Guimarães Rosa, em Grande Sertão: Veredas, além da técnica e da linguagem surpreendentes, deve-se destacar o poder de criação do romancista, e sua aguda análise dos conflitos psicológicos presentes na história. |
Diadorim a vir - do topo da rua, punhal em mão, avançar - correndo amouco...
Aí, eles se vinham, cometer. Os trezentos passos. Como eu estava depravado a vivo,
quedando. Eles todos, na fúria, tão animosamente. Menos eu! Arrepele que não prestava
para tramandar uma ordem, gritar um conselho. Nem cochichar comigo pude. Boca se encheu de
cuspes. Babei... Mas eles vinham, se avinham, num pé-de-vento, no desadoro, bramavam, se
investiram... Ao que - fechou o fim e se fizeram. Grande Sertão: Veredas |
" O sertão é do tamanho do
mundo" |
É o regional, o verdadeiro, o autêntico regional, que se projeta e conquista dimensão universal, sintetizada na condição humana - o homem é o homem, no sertão de Minas ou em qualquer outro lugar do mundo. |
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Eu estou depois das tempestades. O senhor nonada conhece de mim; sabe o muito ou o pouco? O Urucuia é ázigo... Vida vencida de um, caminhos todos para trás, é história que instrui vida do senhor algum? O senhor enche uma caderneta... O senhor vê aonde é o sertão? Beira dele, meio dele?... Tudo sai é mesmo de escuros buracos, tirante o que vem do Céu. Eu sei. Grande Sertão: Veredas |
O lançamento de Grande Sertão Veredas causa grande impacto no cenário literário brasileiro. O livro é traduzido para diversas línguas e seu sucesso deve-se, sobretudo, às inovações formais. Crítica e público dividem-se entre louvores apaixonados e ataques ferozes. Torna-se um sucesso comercial, além de receber três prêmios nacionais: o Machado de Assis, do Instituto Nacional do Livro; o Carmen Dolores Barbosa, de São Paulo; e o Paula Brito, do Rio de Janeiro. A publicação faz com que Guimarães Rosa seja considerado uma figura singular no panorama da literatura moderna, tornando-se um "caso" nacional. Ele encabeça a lista tríplice, composta ainda por Clarice Lispector e João Cabral de Melo Neto, como os melhores romancistas da terceira geração modernista brasileira. |
Diadorim tinha morrido - mil-vezes-mente - para sempre de mim; e
eu sabia, e não queria saber, meus olhos marejavam. |
"Não me envergonho em admitir que Grande Sertão Veredas me rendeu um montão de dinheiro. A esse respeito, quero dizer uma coisa: enquanto escrevia Grande Sertão, minha mulher sofreu muito, porque eu estava casado com o livro. Por isso dediquei-o a ela, como sou um fanático da sinceridade lingüística, isso significou para mim que lhe dei o livro de presente, e portanto o dinheiro ganho com esse romance pertence a ela, somente a ela, e pode fazer o que quiser com ele". |
Ainda que não publicasse nada até 62, o interesse e o respeito pela obra rosiana só aumentavam, em relação à crítica e ao público. Unanimidade, o escritor recebe, em 61, o Prêmio Machado de Assis, concedido pela Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto da obra. Ele começa a obter reconhecimento no exterior. |
" A inspiração é uma
espécie de transe. Ela rezava rezas da Bahia. Mandou todo mundo sair. Eu fiquei. E a mulher abanou brandamente a cabeça, consoante deu um suspiro simples. Ela me mal-entendia. Não me mostrou de propósito o corpo e disse... Diadorim - nú de tudo. E ela disse: - "A Deus dada. Pobrezinha..." Diadorim era mulher como o sol não ascende a água do rio Urucuia, como eu solucei meu desespero. Grande Sertão: Veredas |
Em 62, é lançado PRIMEIRAS HISTÓRIAS, livro que reúne
21 contos pequenos. Nos textos, as pesquisas formais características do autor, uma
extrema delicadeza e o que a crítica considera "atordoante poesia". No ano
seguinte, em maio, candidata-se pela segunda vez à ABL(Academia Brasileira de
Letras), sendo eleito por unanimidade. O ano de 1965 marca a expansão do nome e do
reconhecimento de Rosa no exterior; já o ano de 67 anuncia-se grandioso para Guimarães
Rosa. Em abril, vai ao México, representando o Brasil no I Congresso Latino-Americano de
Escritores. Na volta, é convidado, junto com Jorge Amado e Antonio Olinto, a integrar o
júri do do II Concurso Nacional de Romance Walmap. No meio do ano, publica seu último
livro, também uma coletânea de contos, TUTAMÉIA. Nova efervescência no meio
literário, novo êxito de público. Tutaméia, obra aparentemente hermética,
divide a crítica. Uns vêem o livro como "a bomba atômica da literatura
brasileira"; outros consideram que em suas páginas encontra-se a "chave
estilística da obra de Guimarães Rosa, um resumo didático de sua criação". O escritor decide, então, tomar posse na Academia Brasileira de Letras, no dia 16 de novembro de 67, dia do aniversário de João Neves da Fontoura, seu antecessor. No dia 19, Guimarães Rosa morreu, em decorrência de um enfarte. |
"O mundo é mágico. TEXTO EXTRAÍDO, NA ÍNTEGRA, DO PROGRAMA
"ÍNDICE CULTURA - Editoria Especial" |
REFERÊNCIAS DE ILUSTRAÇÕES
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