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Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons. A Descrição de Gales (Wales)

 
 

A Descrição de Gales (Wales)

Geraldus Cambrensis



Livro I: Capítulos I a VII

Fonte: Project Gutenberg etext of Description of Wales by G. Cambrensis, November, 1997. [Etext 1092#) The text of footnotes has been removed from this version of the e-Text until their copyright status can be ascertained.]

Esse etexto foi elaborado por David Price da edição de J. M. Dent (1912). E-mail: ccx074@coveentry.ac.uk.

Tradução: Márcia Siqueira de Carvalho. E-mail: marcar@uel.br

OBS.: Não há as notas no e-texto original.


Livro I.

Capítulo I.

Sobre o comprimento (longitude) e a largura (latitude) de Gales (Wales), a natureza de seu solo, e as três tribos remanescentes de britânicos.

A Câmbria, que, um termo comum e corruptela, e menos apropriado, é nos tempos modernos chamado de Gales, tem em torno de duas centenas de milhas de comprimento e uma milha de largura. O comprimento do Porto de Gordber (1) em Anglesey até o Porto de Eskewin (2) em Monmounthshire está a oito dias de viagem em extensão; a largura do Porto Mawr, (3) ou o grande Porto de São Davi, até Ryd-helic, (4) que em latim significa VADUM SALICIS, ou o vau do salgueiro, e em inglês é chamado Willow-forde, está a quatro dias de viagem. É um país fortemente defendido pelas suas altas montanhas, vales profundos, amplas florestas, rios e pântanos; tanto que desde os tempos em que os saxões tomaram posse da ilha os britânicos remanescentes, que se retiraram para suas regiões, nunca puderam ser subjugados tanto pelos ingleses quanto pelos normandos. Aqueles que habitavam a parte mais sul da ilha, que teve o seu nome dado pelo chefe Corinaeus, (5) ofereceu menor resistência, pois o seu país era mais desprotegido. A terceira divisão dos britânicos, que obtiveram uma parte da Bretanha na Gália, foram enviados para lá, não depois da derrota de sua nação, mas muito antes, pelo rei Maximus, e, por causa da dura e continuada guerra em que eles resistiram com ele, foram recompensados pela real com aqueles distritos na França.
 
 

Capítulo II

Sobre a Antiga Divisão de Gales em Três Partes.

Gales era antigamente dividida em três partes quase iguais, levando em consideração de que foi paga, na sua divisão, mais do que a justa quantidade ou proporção de território. Elas eram Venedotia, agora chamada Gales do Norte; Demetia, ou Gales do Sul, que em britânico é chamada Deheubarth, ou seja, a parte sul; e Powys, o distrito sul ou leste. Roderico o Grande, ou Rhodri Mawr, que foi rei de todas a Gales, foi o responsável por essa divisão. Ele tinha três filhos, Mervin, Anarawt e Cadell, entre os quais ele dividiu o principado. Gales do Norte ficou para Mervin; Powys para Anarawt; e Cadell recebeu a parte de Gales do Sul, junto com os bons votos de seus irmãos e do povo; isso embora esse distrito fosse bem maior em tamanho do que os outros, ou Uchelwyr, (6) homem de posição superior que lá habitava, e que geralmente se rebelava contra seus senhores, irmãos, e de difícil controle. Mas Cadell, com a morte de seus irmãos, obteve o controle de toda Gales, (7) como o fez o seu sucessor até a época de Tewdwr, cujos descendentes, Rhys, filho de Twedwr, Gruflydd, filho de Rhys, e Rhys, filho de Gruffydd, o príncipe reinante em nossa época, aproveitou apenas (como o pai) a soberania sobre Gales do Sul.
 
 

Capítulo III

Genealogia dos Príncipes de Gales



A geração dos príncipes de Gales do Sul é a seguinte: Rhys, filho de Gruffydd, Gruffydd, filho de Rhys; Rhys, filho de Tewdwr; Tewdwr, filho de Eineo, Eineon, filho de Owen; Owen, filho de Howel Dda, ou Howel o Bom; Howel, filho de Cadell. Filho de Roderic o Grande. Então o príncipe de Gales do Sul tem a sua origem ligada a Cadell, filho de Roderic o Grande. O príncipe de Gales do Norte descende de Mervin dessa maneira: Llewelyn, filho de Iorwerth; Iorwerth, filho de Owen; Owen, filho de Gruffydd; Gruffydd, filho de Conan; Conan, filho de Iago; Iago, filho de Edoual; Edoual, filho de Meyric; Meyric, filho de Anarawt; Anarawt, filho de Mervin; Mervin, filho de Roderic o Grande. Anarawt não deixou herdeiros, o príncipe de Powys teve a sua descendência.

É digno de nota, que os bardos e trovadores de Gales (Welsh), ou os declamadores, têm as genealogias do príncipe acima mencionado, escrito na língua galesa (Welsh) em seus livros antigos e autênticos; e também conservam nas suas memórias desde Roderico Grande até B. M.; (8) e desde aí até Sylvius, Ascanius e Aeneas; e desde o último fizeram as séries genealógicas em linha de descendência, até Adão.

Mas por conta dessas remotas e enormes genealogias apresentarem muitas pessoas mais insignificantes do que históricas, nós as omitimos de propósito no nosso compêndio.
 
 

Capítulo IV

Quantas vilas 1, palácios reais, e catedrais existem em Gales.



Gales do Sul possui vinte e nove vilas (cantreds); Gales do Norte, doze; Powys, seis: muitos deles estão atualmente sob o domínio dos ingleses e francos. O país que atualmente é chamado de Shropshire anteriormente pertenceu a Powys, e o lugar onde está o Castelo de Shrewsbury tinha o nome de Pengwern, ou a parte principal de Alder Grove. Existiam três assentos reais em Gales do Sul: Dinevor, em Gales do Sul, retirada de Carleon; Aberfraw, (9) em Gales do Norte; e Pengwern, em Powys.

Gales possui ao todo cinqüenta e quatro vilas (cantreds). A palavra CANTREF deriva da palavra CANT, uma centena, e TREF, uma vila; e significa nas línguas britânica e irlandesa uma porção de terra que contém uma centena de casas rurais.

Existem quatro catedrais em Gales: a de S. Davi, no Mar da Irlanda, sendo o arcebispo Davi o seu patrono: antigamente foi uma igreja metropolitana, e o distrito apenas possuía vinte e quatro vilas, embora nessa época apenas trinta e três; em Ergengl, chamada em inglês de Urchenfeld, (10) diz-se que pertenceu anteriormente à diocese de S. Davi, e por vezes foi colocada dentro de Landaff. A Sé de S. Davi teve sucessivamente vinte e cinco arcebispos; e desde a época da retirada do manto episcopal para a França, até os dias atuais, vinte e dois bispos; cujos nomes e sucessão, assim como o motivo da retirada do manto arqui-episcopal, pode ser visto no nosso Itinerário. (11)

Em Gales do Sul também está situada a diocese de Landaff, perto do Mar Severn, e perto do Castelo de Caerdyf; sendo o bispo Teilo o seu patrono. Ela possui cinco vilas, e a Quarta parte de outra, denominada Senghnnyd.

Em Gales do Norte, entre Anglesey e as montanhas Eryri, está a vista de Bangor, sob o patronato de Daniel, o abade; ela possui apenas nove vilas.

Em Gales do Norte também está a pequena e simples catedral se Llan-Elwy, ou S. Asaph, contendo seis vilas, das quais Powys está subordinada.
 
 

Capítulo V

Das duas montanhas das quais se originam os rios importantes que dividem as fontes de Gales.



Gales está dividia e diferenciada pelos rios importantes, que têm as suas origens em dois tipos de montanhas, as Ellennith, em Gales do Sul, que os ingleses chamam de Moruge, como sendo as cabeças de mouros ou pântanos; e Eryri, em Gales do Norte, que são chamadas de Snowdon, ou montanhas de neve; sobre essas últimas dizem que são muito extensas, e se todos os rebanhos de Gales fosse reunidos, eles poderiam ser alimentados por seus pastos por um tempo considerável. Acima delas existem dois lagos, um dos quais tem uma ilha flutuante; e a outra possui peixes que têm apenas um olho, como já nos referimos no nosso Itinerário.

Nós também devemos ressaltar, que nesses dois lugares na Escócia, um no oceano oriental, e o outro no oceano ocidental, o peixe chamado mulvelli (mullets) tem apenas o olho direito.

O importante rio Severn nasce nas montanhas Ellennith, e passa pelos Castelos de Shrewsbury e Bridgenorth, pela cidade de Worcester, e a de Gloucester, famosa pelos seus artefatos de ferro, dá no mar a poucas milhas do último lugar, e dá seu nome ao Mar Severn. Esse rio foi por muitos anos o limite entre Câmbria e Loegria, ou Gales e Inglaterra; ele era chamado em British Hafren, pela filha de Locrinus, que nele foi afogada pela sua madrasta; o desejo foi se modificando, de acordo com o idioma latino, em S, como é usual em palavras derivadas do grego, ele era chamado Sarina, assim como hal se tornou SAL; hemi, SEMI; hepta, SEPTEM.

O rio Wye nasce nas mesmas montanhas de Ellennith, e corre pelos castelos de Hay e Clifford, através da cidade de Hereford, pelos castelos de Wilton e Goodrich, pela floresta de Dean, rica em ferro e gamos, e corre até o castelo de Stigul, de onde após chega ao mar, e forma em tempos modernos a fronteira entre a Inglaterra e Gales. O rio Usk não se origina nessa montanhas, mas daquelas da vila (cantref) de Bachan; ele corre pelo castelo de Brecheinoc, ou Aberhodni, isto é, a queda do rio Hodni no rio Usk (para Aber, na linguagem inglesa, significa todo lugar onde dois rios unem suas águas); pelos castelos de Abergevenni e Usk, pela antiga cidade de Legions, e deságua no Mar Severn, não muito longe de Newport.

O rio Remni corre na direção do mar partindo das montanhas de Brecheinoc, tendo passado pelo castelo e pela ponte de Remni. Da mesma cadeia de montanhas nasce o Taf, que tem o seu curso pela episcopal Landaf (que recebe esse nome), e se encontra com o mar abaixo do Castelo de Caerdyf. O rio Avon corre impetuosamente das montanhas de Glamorgan, entre a o famoso monastérios cisterciense de Margan e Neth; e o rio Neth, descendo das montanhas de Brecheinoc, s une ao mar, não a grande distância do castelo de Neth; cada um desses rios formando um longo rastro de areias movediças. Das mesmas montanhas de Brechenoc o rio Tawe corre na direção de Abertawe, chamada em inglês de Swainsey. O Lochor junta-se ao mar perto do castelo de mesmo nome; e o Wendraeth tem a sua confluência perto de Cyndwely. O Tywy, outro importante rio, nasce nas montanhas Ellennith, e separa a vila (cantref) de Mawr da de Bachan, passa pelo castelo de Llanymddyfri, e os palácio real e castelo de Dinevor, solidamente situado no profundo nicho de suas florestas, pelo nobre castelo de Caermarddin, onde Merlin viveu, e de quem a cidade recebeu o seu nome, e corre para o mar perto do castelo de de Lhanstephan. O rio Taf nasce nas montanhas Presseleu, não muito afastado do mosteiro de Whitland, passando pelo castelo de S. Clare, se encontra com o mar perto de Abercorran e Talacharn. Dessas mesmas montanhas corre o rio Cleddeu, circundando a província de Daugleddeu, e dando o seu nome uma vez que passa pelo castelo de Lahaden, e também por Haveford, até o mar; e na língua britânica eles têm o nome de Daugleddeu, ou duas espadas.

O importante rio Teivi nasce nas montanhas Ellennith, na parte mais alta da vila (Cantref) de Mawr e Caerdigan, não muito longe das pastagens e do esplêndido mosteiro de Stratflur, formando um limite entre Demetia e Caerdigan na direção do canal da Irlanda; este é o único rio em Gales que tem castores, um relato que está no nosso Itinerário; e também supera qualquer outro rio na abundância e na delicadeza de seus salmões. Mas como esse livro deve cair nas mãos de muitas pessoas que não se encontrarão entre si, eu pensei em inserir aqui muitas qualidades particulares e curiosas relativas à natureza desse animais, de como eles carregam seus materiais das florestas até ao rio, com que habilidade eles empregam esses materiais na construção de lugares de segurança no meio da corrente do rio, como astutamente eles se defendem contra os ataques dos caçadores nos lados oriental e ocidental; a singularidade de suas caudas, que fazem parte mais da natureza do peixe do que da carne. Para maiores informações ver o Itinerário. (12)

Das mesmas montanhas sai o Ystuyth, e correndo através da parte mais elevada de Penwedic, em Cardiganshire, se encontra com o mar perto do castelo de Aberystuyth. Das montanhas nevadas de Eryri corre o importante rio Devi, (13) dividindo por uma grande distância Gales do Norte de Gales do Sul; e das mesmas montanhas também o largo rio Maw, (14) formando no seu leito o maior e o menor rastro de areia chamado Traeth Mawr e Traeth Bachan. O Dessennith também, e o Arthro, corre através de Merionethshire e a terra de Conan. O Conwy, correndo do lado norte das montanhas Eryri, junta as suas águas com as do mar abaixo do esplêndido castelo de Deganwy. O Cloyd nasce no outro lado da mesma montanha, e passa pelo castelo de Ruthlan até o mar. O Doverdwy, chamado pelos ingleses de Dee, tem as suas nascentes no lago de Penmelesmere, e corre através de Chester, deixando a floresta de Coleshulle, Basinwerk, e um rico veio de prata nas suas vizinhanças, longe à direita, e pelos fluxos do mar formam um perigosíssimo baixio (quicksand); logo, o Dee faz a fronteira norte e o rio Wye a fronteira sul de Gales.
 
 

Capítulo VI.

Sobre a fertilidade e amenidade de Gales.



A parte sul de Gales próxima de Cardiganshire, mas particularmente Pembrokeshire, é a mais agradável, por causa de suas planícies e o litoral, mas Gales do Norte é mais defendida pela natureza, é mais produtora de homens cuja força física é famosa, e a natureza do seu sólo é mais fértil; por isso, como as montanhas de Eryri (Snowdon) podem oferecer pastagens para todas as cabeças de gado em Gales, se colocadas todas juntas, assim pode a Ilha de Mona (Anglesey) oferecer uma boa quantidade de trigo para todos os seus habitantes: em função disso existe um antigo provérbio britânico, "MON MAAM CYMBRY," ou seja, "Mona é a mãe de Gales." Merionyth, e a terra de Conan, é a região mais rude e a menos cultivada, e a menos acessível. Os nativos dessa parte de Gales são excelentes no uso de lanças longas, assim como aqueles de Monmouthshire são famosos pelo manejo do arco. É digno de nota que a língua britânica é mais delicada e mais rica em gales do Norte, sendo esse país menos misturado com estrangeiros. Muitos, porém, afirmam que o modo de falar de Cardiganshire, em Gales do Norte, localizado como está no meio e no coração de Câmbria, é o mais refinado.

O povo da Cornualha e da Armórica fala uma língua similar a dos britânicos; e pela sua origem e semelhança próxima, é inteligível ao Galês em várias instâncias, e quase no seu todo; e apesar de menos delicada e metódica, ainda ela se aproxima, como eu acho, mais do que o antigo idioma britânico. Nas áreas do sul da Inglaterra, e em particular em Devonshire, a língua inglesa parece menos agradável, ainda que possua mais marcas da antigüidade (nas áreas norte sendo muito corrompidas pela invasão dos dinamarqueses e Noruegueses), e são mais fiéis à língua original e no modo antigo de falar; uma demonstração positiva que pode ser deduzida através de as obras inglesas de Bede, Rhabanus, e o rei Alfredo, sendo escritas nesse idioma.
 
 

Capítulo VII

A origem dos nomes de Câmbria e Gales (Wales).



A Câmbria foi derivada de Camber, filho de Brutus, e Brutus, descendendo dos Troianos, pelo seu avô Ascanius, e pai, Silvius, liderou os remanescentes dos troianos, que haviam se demorado muito na Grécia, para a parte ocidental da ilha; e tendo reinado muitos anos, e dado o seu nome ao país e ao povo, na ocasião da sua morte dividiu o reino de Gales entre os seus três filhos. Ao seu filho mais velho, Locrinus, ele deu aquela parte da ilha que fica entre o rio Humber e o Severn, e que era chamado por ele Loegria. Para o segundo filho, Albanactus, ele deu as terras além do Humber, que tomou dele o nome de Albania. Mas para o filho mais novo, Camber, ele legou toda aquela região que fica além do Severn, e que se chamou depois de Câmbria; por isso o país é adequadamente e verdadeiramente chamado de Câmbria, e seus habitantes de cambrianos ou cambrenses. Alguns afirmam que seus nomes vêm de CAM e GRAECO, isto é, distorcidos de grego, por conta da afinidade das línguas, aproximadas pela longa residência deles na Grécia; mas essa conjectura, embora plausível, não está bem fundada na verdade.

O nome de Gales (Wales) não descende de Wallo, um general, ou de Wandolena, a rainha, como a história fabulosa de Geoffrey Arthurius (15) falsamente afirma, porque nenhum de seus personagens foram encontrados entre os galeses; mais isso se origina de uma denominação de bárbaros. Os saxões, quando eles dominaram a Inglaterra, chamaram esta nação, como eles fizeram com todos os estrangeiros, de galeses; e então os nomes bárbaros permaneceram entre o povo e seus países. (16)

Tendo relatado sobre a qualidade e sobre a quantidade da terra, a genealogia dos príncipes, as nascentes dos rios, e a derivação dos nomes desse país, nós deveremos agora considerar a natureza e o caráter da nação.



 1 Cantreds : Nome dado por Anglo-normandos às unidades de território pré-existentes; mais tarde foi usado para as divisões administrativas de certos condados da Irlanda. [Name applied by Anglo-Normans (usually when making grants of land) to pre-existing territorial units; later used of administrative divisions of certain counties in Ireland. ]

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Revisado em 05/10/2007


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