Pedralva Apenas ontem

 

Inácia Choca

 


Ilustração - Paulo da Rosa Faria. visite suas Obras!

 

   Inácia Choca
Centenário  - Setembro de 2008 texto: Chinho

Inácia Choca. Esta figura extraordinária, que, segundo dados obtidos no Escritório Paroquial e no Registro Civil, morreu em junho de 1952, aos 80 anos presumíveis. Fora casada com Sebastião Rodeiro e, por fim, morava no Bairro do Jaboticabal, num casebre paupérrimo, com uma irmã, também dependente da caridade publica. Nem no Escritório Paroquial nem na Diocese da Campanha foi encontrada a data de seu nascimento. Lembro-me bem de que ela, ao receber alguma esmola, agradecia em versos, com grande talento. “Uma esmola pelo amor de Deus!” Pede em verso que eu dou: “Me dá um pão de sabão./ Vou lavá minha ropinha/ pra acompanhá procissão. /Deus lhe pague, Deus lhe ajude/, Deus lhe dê muita saúde/.” Ao se despedir, nas casas onde se encontrava, estendia a mão e dizia: Adeus senhora, Eu vou-me embora,/ Pega na mão, Aperta e chora!...

Um dia ela chegou em casa de minha vó e eu, inadvertidamente, chamei: “Vovó, a Inácia Choca tá chamando”: E ela, respondeu, de pronto: “Eu nunca xingo ninguém,/ Nem sou o que ocê me diz; / sou quietinha e vivo bem, / Choca, mêmo, é seu nariz!”

Depois daquela resposta fiquei completamente sem graça, com a gargalhada de todos os da casa.

        Inácia tinha o costume de ficar de cócoras, a um canto da casa, na cozinha, quietinha, sem incomodar ninguém. Parecia uma galinha choca. Trazia consigo uma agudeza de espírito. Todos a admiravam. Um grande talento e uma miséria maior ainda. Hoje ela está recitando no céu, com os santos e anjos, para louvar a Deus.

        Mas segundo Ruth Guimarães, que morou na Fazenda Campestre, ao tempo de nossa primeira Usina de Açúcar e que se tornou uma grande escritora, autora de um delicioso romance denominado Água Funda, que trata de nossa vida, nossa gente, nossos costumes, ela nos descreve a nossa Inácia Choca, assim chamada porque vivia sempre de cócoras, a um canto das casas ou pelas cozinhas e, algumas vezes, sentada nas taipas do fogão. E sobre ela conta: Inácia, antes era apelidada por Sinhá. Eis o relato da própria Inácia, no romance:

        “Pegamo o trem da Rede Mineira, esse que sai de Itajubá pra Cruzeiro. eu e meu marido. O trem que sai, às duas e vinte. Quase no meio do caminho fica Soledade. Quem viaja por essa linha tem que parar pra fazê bardiação. Meu marido me deixou sentada no banco da estação e foi tirar passagem. Foi o que ele disse. Num é que o excomungado me deixou ali sentada? Esperei, esperei. Passou meia hora, uma hora, hora e meia e nada do homem vortá. Fiquei afrita. Os trens foram todo embora. Mas eu achava que ele num ia-me deixá aí, a Deus dará. Em Soledade todo o mundo me queria socorrê. Fiquei chorando, sem querê ajuda..”.

        Seu homem havia, na verdade, embarcado no trem para Cruzeiro. Um senhor quis lhe dar ajuda, vendo-a tão amargurada. Inácia pegou o casaco e foi andando atrás dele. Na casa, não comia, não dormia. Só chorava pelos cantos. Caiu doente. Mandaram para a Santa Casa. Quando saiu, abobalhada, andou por Soledade, uns tempos. A molecada a insultava, chamando-a de “Nhá Bardeação”. Mas ela não fazia conta, não xingava. Andava de lá pra cá. De um lado para o outro. Foi indo, foi indo, um dia sumiu. Não sei como apareceu no Campestre. Os parentes de Vicente Rosa a encontraram. Daí, passou a perambular de déu em déu., de casa em casa.

C   h   i   n   h   o

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