Vida e Obra de Bernardo Guimarães
  poeta e romancista brasileiro [1825-1884 - biografia]

 
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Poesia de João Joaquim da Silva Guimarães, pai de BG
Elegia
À morte de D. Pedro I

Deus, a quem sagra o Tempo este Penedo,
Que às nuvens tocar vejo solitário,
Imagem da Grandeza e do Segredo,

Aqui me tens sozinho e temerário,
Buscando neste espaço sinuoso
Verter oculto um pranto necessário.

Tenho este voto, que cumprir piedoso;
Dá-me, que o faça nesta estância escura,
Propícia à mágoa, e ao tempo perigoso.

Se em Roma já se viu à morte dura
Ser condenada a mãe, por que chorara
De extinto filho a infausta desventura,

Não se renove em mim a cena ignara,
Por lastimar um povo, a quem o susto
Faz hoje atassalhar, o que onte honrara.

Se curvados comigo ao fado injusto
Muitos não unem hoje aos meus lamentos,
Preces, que votam ao varão mais justo...

Eu sei que um dia, puros sentimentos
Saudosos lhe darão. Eu sei que gratos
Hão de lhe erguer honrosos monumentos.

Vós, da tristeza lúgubres retratos,
Negras sombras, letal melancolia,
Turvos painéis de dor, de angústia ornatos,

Eu vos imploro, me sejais propícios;
E na triste expressão de minha pena,
Vós mesmo, de pesar dareis indícios.

Se a lei, que à morte o corpo nos condena,
A vida eterna d'alma não marcasse,
Funesta de uma perda fora a cena.

Talvez um fido amigo não achasse
Outra consolação, que a lastimosa
De acabar com aquele, que acabasse.

Porém a mão suprema, assaz piedosa,
Com sábia precaução envia o meio,
Mitigador da mágoa venenosa.

Deixar o ignóbil mundo, o humano enleio,
E pela das virtudes esperança
Ir do empíreo habitar o claro seio,

Abandonar do barro a intemperança
Os fados, os trabalhos, e entre os santos,
Santo gozar da bem-aventurança,

Deixar de ouvir enternecidos prantos,
Intrigas, ódios, lástimas, gemidos,
Para dos anjos escutar os cantos,

Obter na glória eternamente unidos,
Sem o favor de humanas criaturas,
Os prêmios cá no mundo merecidos,

Ó Pedro, ó grande herói! são estas puras
Imagens, que do céu me estão chegando,
Para alívio de tantas amarguras!...

Porém...que nova dor me vai passando
Da idéia ao peito!...vendo em triste aperto
Lísia, a Esposa, os filhos soluçando?!...

Os lusos lá descubro em desconcerto,
Sem que na acerba dor atingir possam,
Se acaso um tal herói morreu decerto!...

Vejo uns, que co'a incerteza a mágoa adoçam,
Outros, que ao todo já desenganados
Do Tejo as águas com seu pranto engrossam;

E lá vejo os dos herói sócios honrados
Trajando dó, em torno ao monumento
Co'as mãos no rosto, de pesar cortados.

Ah!... rei, amigos, filhos, cara esposa,
Tudo acaba no mundo!... a morte dura
Impune perenal triunfo goza.

Ou torva guerra, ou febre lenta, impura
Faz que um palmo de terra se não pise,
Onde não haja humana sepultura,

Que uma só obra a vista não divise,
Sem que de seu autor memória triste
Nossa alma não confranja e penalize.

Mas, se à série fatal não se resiste,
Se o curso inevitável não se muda
Para que tanta mágoa em nós existe?!...

Fora por certo menos carrancuda
Qualquer perda, buscando no transporte
Do amigo idéia, que a saudade iluda.

Se a mágoa traz antes do tempo a morte,
E com ela nós damos insensatos
Da dor ao gume mais buído corte,

Fujamos destes lúgubres retratos,
E à luz do sol, que do zenith dardeja,
Das lágrimas se enxuguem os regatos.

Sim! do futuro o arcano amplo se veja;
Nunca mais o pesar em nós influa
A perda de um mortal, que em glória esteja.

Musa consoladora em mim reflua
Mais segura cristã filosofia,
Que da santa razão minha alma instrua.

Em vez de estéril, vã melancolia
Os feitos me ressurjam à lembrança
Do justo, que viveu como devia

Assim futuro gênio se abalança
Co'exemplo a praticar ações, que dobrem
Do mundo as honras, e dos céus a herança.

Se um pouca terra os restos teus se encobrem,
Os teus heróicos feitos, teus talentos
Nos hemisférios ambos se descobrem.

Não carecem heróis de monumentos;
Duram mais que as estátuas, que as colunas,
Exemplos nobres, sábios documentos.

Nem são os feitos seus, pra que os reúnas,
Ó fama, co'esses dos heróis antigos,
Roubadores de estados e fortunas.

Pompeus, Césares são do céu castigos,
Como são prêmios, quando à terra envia,
Franklins amáveis, da igualdade amigos.

Se livre um Deus no mundo o homem cria,
Aquele, que o reverte à liberdade,
Faz o que um Deus já fez, e ainda faria.

Tal cheio de valor e humanidade
A pátria vindicaste o seu direito,
Patriarca da lusa liberdade.

Nem há feito maior do que este feito,
No mundo uma tal obra concluída,
Nos céus achaste o prêmio satisfeito;
Nem te era mais precisa a mortal vida.  

   
João Joaquim da Silva Guimarães, segundo o seu filho Bernardo .


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