DE VOLTA DO FUTURO DO PRETÉRITO

ANO 3087, QUINTA LUA DE SATURNO, COLÔNIA TERRESTRE DE VIA-MOON, UNIVERSIDADE ESTELAR DE COMPUTAÇÃO DO LESTE, ALA NORTE, SEGUNDO ANDAR, DORMITÓRIO 652-B, ESCRIVANINHA.

Klauxo martelava com frenesi as teclas do seu surrado terminal. Ele era o único aluno da pós-graduação que insistia em usar aquela interface antiquada, a "tábua de chaves" (keyboard), como ele mesmo dizia. Faz 50 anos que inventaram a interface-a-face, onde o usuário olha uma imagem virtual em 3-D da CPU, representada por um ícone qualquer alterável via software. Uns gostam de enxergar a cpu como um velho sábio de longas barbas, outros como uma secretária de óculos, e alguns, excêntricos, como Roger Rabbit. Klauxo classificava esta tecnologia como "bosta", mesmo porque, nos tempos de calouro os colegas mudaram seu ícone para um enorme mondongo falante, e Klauxo detestava mondongos.

O projeto AVASSALATOR era a tese de mestrado de Klauxo. O ponto central da sua teoria era de que, encontrando um IF, deve-se processar logo o comando que segue, e DEPOIS testar se o IF dá TRUE. Se der, o comando já está processado, uma economia enorme de tempo de computação.

Klauxo não podia se demorar, breve seria a aula de "stress de algoritmos III", depois "fadiga de estruturas de dados IV", e por fim "aplicações em vídeo pautado".

A VIDA NA QUINTA LUA DE SATURNO NÃO ERA MOLE.

Via-Moon era uma colônia acadêmica. Havia dois enormes campus, um no leste e outro no oeste. Cada campus tinha um enorme computador. O do leste era EBERPB (Essa Bosta É Rápida Pra Burro), o do oeste era BURP (Basicamente Um Raio de Processador). Os estudantes de ambas as universidades se divertiam trocando "fiofiles", que eram pequenas mensagens contendo muita besteira, estórias ridículas do velho oeste, piadas, intimidações, ameaças e até insultos leves. Tudo ia bem até que o técnico deixou BURP maluco jogando xadrez hexadimensional, e o reconhecedor de padrões foi alimentado com o diretório /usr/fiofiles. O reconhecedor de padrões levou dois nanossegundos para descobrir a senha de acesso, que era IABADABADU e passou a analisar TODOS os setecentos Gigabytes de BOSTA que os alunos andavam intercambiando.

NINGUÉM IMAGINAVA O QUE ESTAVA PARA ACONTECER.

BURP ficou ofendido com o uso imbecil que os estudantes estavam fazendo dele. Cancelou todos os processos ("professor, por que a tela ficou toda preta de repente?"), queimou literalmente o diretório /usr/fiofiles, (cauterizando o disco com LASER), largou 3.000 volts na console (ocasionando a morte instantânea do técnico) e ejetou a CPU, que ficava do lado de fora do domo protetor (para aproveitar a temperatura externa de -280 graus Celsius). O pequeno hexágono prateado flutuou por um segundo perante o olhar aterrorizado dos alunos do campus, até que foi levado por ventos cósmicos.

MAU, MUITO MAU.

Hoje os alunos de ambas as universidades usam o EBERPB, o que ocasiona um profundo desgosto nos alunos do leste, que antes tinham o computador só para si.

A convivência promíscua de bytes e o tempo de resposta horrível têm tornado a vida um exercício de penitência. Para desafogar as mágoas e afogar o ganso, os alunos freqüentam uma boate clandestina, a "ET-ta", que tem este nome porque emprega exclusivamente moças extraterrestres. 

VAMOS ACOMPANHAR KLAUXO NUMA DE SUAS NOITADAS.

Camisa vermelha aberta até o umbigo. Correntão folheado a ouro no pescoço. Óculos escuros. Meio litro de colônia Lancaster Argentina. Klauxo esta irresistível. Chega com aquele andar requebrado, é um verdadeiro rolo compressor de corações. As gêmeas siamesas marcianas suspiram. A anã cíclope pisca o olho para Klauxo, mas obviamente ele não percebe. Ele passa indiferente, como um transatlântico de sensualidade desenfreada, e vai se sentar num canto.

PROCESSAMENTO INTERATIVO

Klauxo está agora sentado no canto do bar. Está pensando no que vai beber. É um velho dilema, que Klauxo enfrenta todos os dias. O robô-garçom se aproxima zumbindo. "Martian Milk", pede Klauxo. "Não tem", late o robô. "Alien Kamikaze?". "Não tem também". "Bosta!", pensa consigo Klauxo, "Que raio de espelunca!". Resolve ser mais simples: "Tequila Dream". "Só isso?", pergunta o robô. "Me traz dois e também meio litro de Vodka". O robô se afasta, e Klauxo pode se concentrar no show. Hoje é Greta, a garota de Mamaus, que faz o strip. Da cintura pra cima, uma Mamausiana é igual a uma Terráquea. Da cintura pra baixo, uma Mamausiana é igual a DUAS Terráqueas.

UM SHOW DE QUINTA CATEGORIA

Greta se torce numa coreografia que lembra uma lesma depois de salgada. Dois caras de Xerxes estão babando pela garota. O problema é que a baba deles é um forte suco digestivo que está abrindo um buraco na mesa. Assim que o robô ver isto, vai botá-los para fora. Mas por enquanto segue o show, com Klauxo analisando friamente os contornos das quatro pernas de Greta. "BOSTA! Deve dar uma despesa calçar esta mocréia", pensa consigo, bebericando delicadamente o segundo drinque, "mas pelo menos são duas bundas tendo que aturar a chatice de apenas uma cabeça". Klauxo faz o gesto clássico para o robô-garçom. Este se aproxima, e Klauxo escorrega duas notas para dentro do coletor de dinheiro, enquanto aponta para Greta. O robô se chacoalha, rindo baixinho.

UM PLANO SÓRDIDO

Klauxo dirige seu veículo através da planície desolada da quinta lua de saturno. Greta está ao seu lado, tagarelando sem parar. "Bosta!", pensa Klauxo, "uma boca só, mas fala por quatro". O interesse que move Klauxo agora é inconfessável. Ele quer ABUSAR da garota, porque não suporta mulheres tagarelas. Ele quer HUMILHÁ-LA, FAZÊ-LA CHORAR, PISAR EM SEU CORAÇÃO JOVEM E CHEIO DE ILUSÕES, DILACERAR A INOCÊNCIA QUE DESABROCHA COMO FLOR DESAMPARADA NESTE MUNDO CRUEL E DESUMANO. Sim, Klauxo agora encarna o que há de mais sórdido e vil na psique humana, e aparentemente isso não lhe é custoso.

NESTE MOMENTO, A INFÂNCIA PROBLEMÁTICA DE KLAUXO VEM À TONA

Klauxo era um rapaz, com problemas, alguns dos quais infelizmente ele não conseguiu superar. O irmão de Klauxo, Glauxo, batia nele. A mãe de Klauxo batia em Klauxo e em Glauxo. O pai de Klauxo batia na mãe de Klauxo, nele e no irmão. Os vizinhos batiam na família de Klauxo. O pessoal da outra quadra batia no pessoal da quadra de Klauxo.

ISSO SEM FALAR NO RELACIONAMENTO PROBLEMÁTICO COM AS MULHERES

A primeira experiência sexual de Klauxo foi com a empregada, mas ela não ficou sabendo. A segunda experiência foi com um João-bobo inflável, com a cara do Bozo. A terceira experiência foi com um moedor de carne, o que deixou seqüelas irreparáveis. Seguindo sua carreira de abjeto sexual, Klauxo molestou um pedaço de fígado de vaca. Depois, Klauxo descobriu que não havia nada mais estimulante do que observar os frangos espetados assando na padaria. A pele dourada dos galináceos, girando lentamente na grelha elétrica, provocava uma reação tão forte na mente distorcida do pequeno maníaco, que ele, várias vezes, recortava o logotipo do Frango Minu e colava por cima do rosto das garotas na Playboy.

SIM, O FRUTO DOENTIO DE UMA SOCIEDADE INDIFERENTE

Ouçam: enquanto explorávamos o passado indigesto de Klauxo, ele e Greta já chegaram na Suíte Africana do motel USINA-ME MUCHO. Ele se dirige ao frigobar e pega um litro de Graspa. "Você nunca bebe água?" pergunta estupidamente Greta. "Não", responde Klauxo, "peixes fodem nela." Klauxo passa a chave na porta e pega um relho e algemas da parede. Greta é tão burra que acha que vão brincar de escravo e Feitor. Sim, Klauxo será o Feitor e Greta a escrava, mas não vai ser de brincadeira. Nosso herói se transforma, finalmente, na besta selvagem, violenta e imprevisível que durante tanto tempo havia reprimido. Para azar de Greta, serão nos seus dois lombos que Klauxo vai descarregar a fúria que jorra incontida das lembranças amargas de uma vida miserável. Francamente, tenho pena de Greta.

A PRIMEIRA FAZ TCHAN, A SEGUNDA FAZ TCHUM

Klauxo arranca brutalmente o robe prateado de Greta, que, assustada, dá um grito. Foi um erro. Aquele grito apaga, de uma vez por todas, qualquer vestígio de humanidade que ainda poderia restar na mente insana de KIauxo, varrida por uma raiva impossível de expressar com apenas oito casas decimais (?). Agora vai ser pra valer. Agora ninguém pode prever o que vai acontecer. As mãos de Klauxo se fecham como garras no cabo do chicote. O olhar de Klauxo fica vazio como o de um predador. Um décimo de segundo antes de trucidar a pobre garota, ele olha para a única coisa que cobria a nudez assustada de Greta: um colar com um pequeno hexágono prateado.

B U R P  !!!

Não, não arrotei. Era BURP, o processador da Universidade do Oeste que havia sido levado por ventos cósmicos e que Greta havia encontrado e posto num colar, porque achou bonitinho. Num segundo, a raiva se evanesce do semblante de Klauxo, que volta ao normal. Depois, houve aquela lenga-lenga burocrática entre Universidades, muita bebedeira, cerimônias de agradecimento a Klauxo, muita bebedeira, a formatura de Klauxo, muita bebedeira, o casamento de Klauxo e Greta, muita bebedeira, as treze filhas que o casal teve, muita bebedeira, a falência de Klauxo por não poder pagar 28 pares de sapato por ano, muita bebedeira, etc...

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