Para Deus ou para os olhos?


 

O que significa "servir a Deus"? Seria por acaso empreender algum esforço físico notável para agradar-Lhe? Ou seria manter um coração casto para com as coisas que desagradam a Ele, buscando sincera e honestamente, e com afinco, corrigir aquelas falhas inerentes a todo ser humano, com o alvo, mesmo impossível de atingir, de apresentar um comportamento igual ao de Jesus Cristo?

Não resta dúvida que o ideal de serviço prestado a Deus foi atingido por Jesus, que não só apresentou um corpo casto e uma consciência livre de pecados, mas também trabalhou arduamente, desgastou-se fisicamente, sem nunca demonstrar indolência ao cumprir a tarefa que foi-lhe dada: Dar testemunho de seu Pai. Entretanto, é válido considerar que Jesus tinha um corpo perfeito. Não que fosse imune ao esgotamento físico, longe disto, os momentos anteriores ao seu sacrifício ilustram vivamente o quanto seu corpo se ressentia do flagelo a que foi submetido. Porém, não estava sob a lei do pecado e da morte e por este motivo não sentiria os efeitos do envelhecimento e da doença, pragas que se abatem sobre todos nós, humanos comuns. Portanto, existe, e deve ser levada em consideração, uma enorme diferença entre o trabalho de pregação que demandou enorme esforço físico por parte de Jesus no curto período de tempo em que viveu entre nós e o que deve considerar-se como "servir a Deus" nos nossos dias. À guisa de exemplo, um homem poderia iniciar um trabalho de pregação similar ao de Jesus com a mesma idade dele, trinta anos, talvez durante alguns anos pudesse consegui-lo, mas certamente não poderia mais fazê-lo quando atingisse uma idade mais avançada ou fosse acometido por algum tipo de mal. Mesmo que a mente o impelisse a continuar, suas limitações físicas seriam uma barreira intransponível e seria razoável entender que o tempo dedicado ao trabalho seria possivelmente muito reduzido ou até mesmo nulo em alguns casos. 

As Testemunhas de Jeová afirmam-se como a única religião cristã a obedecer as ordens de Jesus Cristo, a saber: "Ide portanto, e fazei discípulos...", conforme o texto bíblico de Mateus 28:19,20. Mais do que isso, afirmam-se como a única que segue ao pé da letra, em imitação ao próprio Jesus e aos seus discípulos da época, pregando de "casa em casa" conforme Atos 20:20. Pelo menos a segunda afirmação  é a mais pura verdade, pois movidos por um ardor pouco comum em membros de outras religiões, as Testemunhas de Jeová não se refreiam de "gastarem-se", ou seja, queimarem energias por trabalhar no serviço de campo, levando a sua mensagem às outras pessoas de porta em porta. Grupos de homens e mulheres vestidos com asseio, aos pares, portando pastas e bolsas e batendo de porta em porta é uma cena muito conhecida das pessoas que os identificam imediatamente como Testemunhas de Jeová, o que prova a singularidade do trabalho em relação a outros grupos religiosos ditos cristãos. 

Existe ainda uma outra característica ímpar nas Testemunhas de Jeová que atende pelo nome de "Relatório de Serviço". Uma pessoa só é admitida como uma Testemunha, ou seja, obtém autorização para ser batizada como tal pelos anciãos da congregação, quando já é um "Publicador", quer dizer, alguém que trabalhe regularmente no serviço de campo e apresente um relatório de horas no final de cada mês. Claro que entre as Testemunhas de Jeová existe diferentes condições, de modo geral todas elas trabalham na chamada obra de pregação, mas enquanto algumas delas apresentam relatórios mensais com muitas horas de serviço, outras relatam um número menor, outras ainda apresentam o número mínimo, no caso uma hora por mês, suficiente apenas para que não sejam contadas como publicadores irregulares. "Publicadores irregulares"? Sim. Conforme citamos acima, a condição de Testemunha de Jeová verdadeira, considerada como espiritualmente íntegra pelas demais Testemunhas e pelos homens que dirigem a Sociedade Torre de Vigia, está diretamente relacionada com a regularidade do trabalho na pregação de casa em casa, ou em alguma outra modalidade, e a apresentação de um relatório de horas no fim de cada mês. Se uma Testemunha não entregar um relatório por não haver trabalhado em alguma modalidade de pregação, será considerada irregular até que alcance uma sequência de seis meses ininterruptos relatando, somente então deixará a condição de "irregular". É importante ressaltar que todos os meses os anciãos coletam os relatórios e enviam apenas as quantidades totais para a sede da Sociedade no Brasil, porém eles compilam as horas, ou a falta delas, para um "Cartão de Publicador", uma espécie de prontuário individual, que serve como histórico do trabalho do publicador e este cartão é examinado a cada seis meses pelo Superintendente de Circuito, que é o representante da Sociedade Torre de Vigia. E é inegável que um publicador em condição irregular ou apresentando uma média de horas baixa, difícilmente receberá alguma incumbência na congregação, conhecida com privilégio de serviço, ou alguma designação de caráter espiritual, seja um cargo na própria congregação ou para alguma assembléia ou congresso. De maneira geral, aquele que não trabalha regularmente na obra de pregação e que não tem pelo menos uma hora por no relatório de serviço, é visto como uma Testemunha fraca na fé, com dificuldades espirituais, alguém que, apesar de nominalmente ser uma Testemunha de Jeová, corre sério risco de não receber a recompensa da parte de Deus para aqueles que fazem a Sua vontade, no caso a vida eterna.

Voltando a atenção para aqueles que já estão em idade avançada ou em condição física debilitada por algum mal, não tendo condições físicas de estarem ativos na pregação da mesma forma que outrora, a Sociedade Torre de Vigia anunciou no Ministério do Reino de abril de 2002 (Reprodução ao lado), que estes poderão apresentar relatórios de serviço desde contenham pelo menos 15 minutos de trabalho no mês.

É provável que as Testemunhas de Jeová ao lerem este anúncio tenham aplaudido a atitude da Sociedade, afinal isso mostra a sua generosidade e compreensão. Mas, será que é assim mesmo? Por encarar o fato por este lado, as Testemunhas deixam de observar a questão muito maior que se apresenta por trás deste anúncio. Se a Sociedade passou a considerar os debilitados como publicadores regulares, se fizerem pelo menos 15 minutos, somente à partir de abril de 2002 isto quer dizer que até pouco tempo atrás eles não eram considerados desta forma. O que eram então? Publicadores inativos, que é como são considerados os que deixam de entregar relatórios por mais de seis meses seguidos? Se estes com a saúde debilitada estivessem mesmo assim dando testemunho, porém não conseguindo atingir o mínimo de uma hora por mês, mesmo assim seu tempo e esforço não eram aceitos?

Alguém pode dizer: "Mas a Sociedade sabia que a pessoa estava debilitada, que não estava trabalhando na obra de pregação porque não tinha condições para isso". Pois bem, então não há necessidade de alterar o arranjo. O que é mais importante, o fato de um doente esforçar-se para pregar sua crença a uma enfermeira por "pelo menos" 15 minutos enquanto Deus observa sua dedicação, ou os anciãos saberem através de um pedaço de papel que ele está fazendo seu trabalho? Quem nos julga, é Deus ou os anciãos e por extensão a Sociedade? E se a pessoa, debilitada ao extremo, não conseguir falar de sua fé pelos 15 minutos por mês, continuará sendo considerada como um publicador inativo?

Os 15 minutos concedidos pela Sociedade para considerar os relatórios dos debilitados não são importantes, não é este o problema, a questão maior é o relatório de serviço mensal. É por meio deste tipo de controle que os anciãos, e de resto muitos nas congregações, acabam por saber sobre a quantidade de horas que uma Testemunhas trabalha no campo. Com isso alguém passa a ser considerado fraco ou forte na fé, mesmo que na realidade isso não seja uma avaliação correta. Jesus sabe com certeza sobre os nossos passos. Ele avalia nosso coração e não um papel onde alguém soma as horas trabalhadas em divulgar as suas crenças. No modelo da Sociedade, alguém pode esforçar-se para fazer muitas horas para colocar no relatório, mesmo que não o faça de coração pleno, apenas para obter vantagens ou reconhecimento de homens. "Servir a Deus" certamente tem uma amplitude muito maior do que apenas trabalhar na obra de pregação. Por certo é muito mais do que relatar uma certa quantidade de horas no fim do mês. O formato que a Sociedade Torre de Vigia adotou para controlar as horas de pregação das Testemunhas de jeová tem muito mais a ver com agradar os olhos de homens do que mostrar que serviço prestado a Deus.

 

 


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