Um ou dois cérebros?

Artigo original por Eric Chudler, PhD (site Neuroscience for Kids), tradução por Fernando Lage Bastos (NeuroKidsBr)


(O Hemisfério Esquerdo)

Quantos cérebros você tem? Um ou dois? A resposta é bastante simples: Você tem somente um cérebro. Porém, este cérebro está dividido no meio em dois hemisférios cerebrais. Cada hemisfério é especializado para algumas tarefas específicas. Eles se comunicam entre si através de um feixe que tem entre 200 e 250 milhões de fibras nervosas chamado de "corpo caloso" (Há também um outro feixe menor, chamado de comissura anterior que liga dos dois hemisférios).


(O Hemisfério Direito)

Você é destro ou canhoto? Como você já deve ter percebido, a maioria das pessoas (cerca de 90% da população) é destra, ou seja preferem utilizar a mão direita. Uma outra denominação que pode ser utilizada é que estas pessoas tem a mão direita dominante. Outras pessoas são canhotas, ou sem a mão esquerda dominante. Uma pequena parcela da população não tem preferência por nenhuma das mãos, sendo chamados de ambidestros. Embora pouca gente saiba, a maioria das pessoas também tem um olho e um ouvido que é dominante.

Exatamente porque as pessoas tem a preferência por utilizar uma mão sobre a outra ainda é um mistério. O Dr. William Calvin, desenvolveu uma teoria fascinante sobre a origem desta preferência e escreveu um texto chamado The Throwing Madonna (em inglês) para explicar sua teoria.

Os cientistas já sabem há muito tempo que o lado direito do cérebro controla do lado esquerdo do corpo e vice-versa, ou seja, é um arranjo que os neurocientistas chamam de contralateral. Assim, uma lesão de um lado do cérebro, normalmente vai afetar os movimentos e o sentidos do lado oposto do corpo.

Em 95% dos destros, o lado esquerdo do corpo também é dominante para a linguagem. Até mesmo entre os canhotos, a taxa de dominância do hemisfério esquerdo para linguagem é de cerca de 65%. Nas décadas de 1860 e 1870, dois neurocientistas, (Paul Broca e Karl Wernicke) observaram que quando algumas pessoas tinham uma lesão em duas áreas do hemisfério esquerdo, eles desenvolviam problemas de linguagem como sequela. Eles também notaram que pessoas que tinham lesões nas mesmas áreas do lado direito, não desenvolviam problemas de linguagem. Estas áreas ficaram conhecidas como área de Broca e Área de Wernicke em homenagem aos descobridores. A área de Broca tem importância para a produção de linguagem e a de Wernicke para o entendimento da linguagem.

Hemisfério Esquerdo

Linguagem
Matemática
Lógica
Dominância Cerebral


Cada hemisfério do cérebro é dominante para alguns comportamentos. Por exemplo: aparentemente o hemisfério direito é dominante para habilidades espaciais, reconhecimento de faces, visualização mental e música. O lado esquerdo é mais especializado em habilidades de linguagem, matemática e lógica. Claro que estas são generalizações e em pessoas normais, os dois lados trabalham em conjunto trocando informações através do corpo caloso. Muito do que sabemos sobre as especializações dos hemisférios cerebrais vem de experiências em pessoas que passaram por uma cirurgia, onde o corpo caloso era cortado. Estas cirurgias eram realizadas com o objetivo de se tratar pessoas que sofriam de epilepsia e que não estavam obtendo resultados com o uso de remédios. Esta cirurgia, evitava que uma crise epilética em um dos hemisférios chegasse ao outro, permitindo que o paciente se mantivesse mais produtivo.

Hemisfério Direito


Habilidades espaciais
Reconhecimento de faces
Visualização mental
Música

Os experimentos com cérebros divididos.

Roger Sperry (que ganhou o Nobel de Medicina e Fisiologia 1981) e Michael Gazzaniga são dois neurocientistas que estudaram pacientes que passaram pela cirurgia de corte do corpo caloso em uma série de experimentos que ficaram conhecidos como "Split-Brain Experiments" (algo como "experimentos com cérebros divididos). Após a cirurgia, estes pacientes eram aparentemente normais, eles podiam andar, ler, falar, fazer esportes e realizar todas as tarefas diárias que faziam antes da cirurgia. Somente após estudos cuidadosos, onde os estímulos para cada lado do cérebro foram estudados é que os reais resultados destas cirurgias puderam ser avaliados.

O Dr. Sperry utilizou um aparelho que permitia apresentar estímulos visuais para apenas um dos hemisférios cerebrais através da apresentação destes estímulos em determinados pontos do campo visual. Como as informações da metade mais externa do campo visual de cada olho é processada pelo hemisfério contralateral (através da passagem pelo quiasma óptico), e a metade mais interna é processada pelo mesmo hemisfério do olho, se os estímulos forem apresentados em pontos fixos do campo visual é possível selecionar qual hemisfério irá receber a informação que está sendo apresentada.

Vamos supor que um paciente que sofreu a cirurgia de divisão do corpo caloso "típico" (ou seja com o processamento de linguagem no hemisfério esquerdo), está sentado, olhando para a frente e focalizando em um ponto localizado no meio de uma tela. Quando a figura de uma colher é apresentada do lado direito da tela, a informação cruza o quiasma óptico e acaba sendo processada no hemisfério esquerdo. Quando o paciente é perguntado sobre o nome do objeto que ele viu, ele não tem problema em dizer que se trata de uma colher. Porém, se a colher fosse apresentada do lado esquerdo da tela (ver figura), a imagem irá ser processada pelo hemisfério direito. Agora se perguntarmos ao paciente o que era a figura apresentada, ele irá nos responder que não havia nada na tela! Mas, se pedirmos para o paciente pegar um objeto usando apensas a mão esquerda, ela irá corretamente pegar a colher. Isto acontece porque a informação tátil da mão esquerda é processada pelo hemisfério direito do cérebro, o seja o lado que "viu" a colher na tela. Porém, se perguntarmos ao paciente o nome do objeto, mesmo que a colher esteja em sua mão esquerda, ele não conseguirá nos dizer, pois o hemisfério direito não consegue nomear o objeto, já que ele não é verbal.

Um outro tipo de experimento feito em pacientes com o "cérebro dividido", utiliza figuras quiméricas, como a figura ao lado. Nesta figura, a face do lado esquerdo é de uma mulher e do lado direito, de um homem. Desta forma, se o paciente focalizar no ponto que está no centro da figura, a informação visual da face feminina vai para o hemisfério direito e o da face masculina vai para o esquerdo. Quando o paciente é pedido para apontar se a figura é de uma mulher ou de um homem, ele vai apontar a figura de uma mulher, porém se perguntarmos sobre a figura, ele irá nos responder que é de um homem (através da linguagem). Assim dependendo da tarefa que for pedida, um ou outro hemisfério dominar. No caso de apontar, o hemisfério direito normalmente é dominante enquanto que o esquerdo é dominante em respostas verbais.

chimeric figure

Antes que cirurgias no cérebro sejam realizadas é importante determinar qual dos hemisférios é dominante para a linguagem, para que o neurocirurgião possa evitar danos à áreas da fala. Uma das formas de se fazer isto é através do Teste de Wada. Neste teste um anestésico de ação rápida é injetado na artéria carótida esquerda ou direita. A esquerda fornece sangue para o lado esquerdo do cérebro e vice-versa. Desta forma, um dos hemisférios pode ser anestesiado temporariamente para se testar a linguagem. Caso o hemisfério esquerdo seja o responsável pela linguagem, quando ele fica anestesiado no teste de Wada, o paciente não consegue falar. Caso contrário o paciente vai conseguir falar e responder perguntas, mesmo que apenas um dos hemisférios estejam funcionando.

 

Uma outra forma de testar o hemisfério responsável pela linguagem é através da estimulação elétrica do córtex cerebral durante a cirurgia. O cirurgião pode colocar um eletrodo um várias áreas do córtex em um paciente consciente. O paciente vai informando o cirurgião sobre o que ele está sentindo ou pensando conforme o cérebro vai sendo estimulado. Quando o cirurgião estimular certas regiões do hemisfério reponsável pelo linguagem, distúrbios de linguagem e vocalizações não intencionais podem ser produzidas pelo paciente. A colocação de eletrodos no cérebro não dói pois o cérebro não possui receptores para a dor (nocireceptores).

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