A SUPERAÇÃO DO PARADIGMA TRADICIONAL
A
dicotomia entre realismo e idealismo nem sempre é muito clara, não é muito útil
no sentido de contribuir para uma cientificidade das relações internacionais. O
realismo estuda aspectos conflituais e o idealismo estuda os aspectos
coorporativos da sociedade interna.
Críticas
ao Paradigma Tradicional
Os
“novos cientistas teceram críticas ao debate entre o idealismo e o realismo.
·
Tanto os idealistas como os realistas diziam que as
relações entre os actores podiam ser de conflitualidade ou de
cooperatividade. A forma de agir em conflito ou cooperação é que diferia
entre idealistas e realistas.
·
Os cientistas diziam que os realistas e os idealistas
simplificavam demais as relações, ao afirmarem que estas ou eram conflituais ou
eram cooperativas, excluindo a hipótese que eles, cientistas, estavam a
verificar, isto é, que as relações são simultaneamente conflituais ou
cooperativas.
·
Uma outra crítica que se tecia aos tradicionalistas é que,
ambas as correntes, partiam da aplicação da teoria do estado-natureza, e que
essa origem comum se tinha dividido em várias tradições de pensamento da
política internacional (desde a perspectiva marxista, passando pela perspectiva
anglo-saxónica, até à perspectiva europeia). Mas a verdade é que podem
tecer-se outras teorias acerca da vida do Homem na terra que não a do
estado-natureza.
·
Dizem, ainda, os críticos (mais precisamente os
behavioristas) que o Debate Tradicional não tem importância científica em
termos de relacionamento dos actores. Ao fazerem tal afirmação abrem
caminho para o debate entre tradicionalistas e behavioristas. Assim sendo, os behavioristas
consideram o debate entre os idealistas e os realistas perfeitamente académico
e inútil. Este debate tem de ser superado, pois, aquilo quer
serve agora são as propostas behavioristas porque a realidade já é outra.
O
CIENTIFISMO E O BEHAVIORISMO
Os paradigmas idealista e
realista utilizam as mesmas metodologias e as mesmas técnicas de análise.
Essas metodologias assentam na análise da história, da filosofia, partem do
princípio que é a razão que conduz as relações internacionais.
Agora, critica-se a excessiva
confiança na razão e crê-se que é preciso conferir uma maior cientificidade às
relações internacionais. Parte-se do princípio que dar cientificidade é uma
questão de dar provas: a verificação leva à probabilidade/métodos
quantitativos, o que é deixado de lado no realismo e no idealismo.
Na verdade, aquilo que denominamos
por Superação do Paradigma Tradicional
corresponde à tentativa de melhoramento do debate entre idealistas e
realistas, através da introdução de uma série de métodos científicos.
Os defensores da perspectiva científica das relações
internacionais defendem três princípios:
·
observação
sistemática:
a conduta humana deve ser observada sistematicamente e, tanto quanto possível,
de uma forma abrangente.
·
necessidade
empírica:
as generalizações devem ser definidas com base em observações empíricas, no
pressuposto essencial de que devem ser demonstradas.
·
necessidade de
um método científico.
As propostas devem ser vistas
segundo dois aspectos:
à
um plano de aplicação empírico: necessidade de definir
parâmetros que deverão ser expressos em concreto.
à
a teoria das relações internacionais deve ser baseada em
provas lógicas e matemáticas, e em procedimento de verificação empírica.
Perspectiva científica das relações internacionais segundo Celestino
del Arenal:
·
interdisciplinaridade: adaptação de teorias, de
conceitos, de propostas, de ideias e de metodologias de outras ciências.
·
possibilidade de uma relação que se pode estabelecer
entre fenómenos estudados por outras disciplinas com fenómenos semelhantes da
cena internacional.
·
é preciso definir unidades de análise, que passa por
uma definição clara dos conceitos, daí também ser preciso definir o que é que
pode ser considerado uma unidade de análise. Esta definição é muito importante
para dar cientificidade à teoria das relações internacionais.
·
nível de análise: deve fazer-se uma análise do presente
e dos fenómenos históricos do passado, de modo a poder comparar as duas
análises. Nesta análise deve ter-se o cuidado de manter o equilíbrio da atenção
dos investigadores, de modo a que estes não centrem a sua investigação numa das
análises, desvalorizando, assim a outra.
·
é necessário recolher dados e organizá-los em bases de
dados, para uma futura utilização.
·
preocupação com a metodologia (método =
caminho para): não se sabe qual é a metodologia mais adequada e nunca se
conseguirá descobrir, pois se tal acontecesse a ciência acabaria.
·
há uma necessidade de articular a investigação com a
formulação de novas teorias. Deve existir uma investigação constante que
possa contribuir para um aperfeiçoamento da conceptualização (criar mais e
melhores conceitos), pôr a investigação ao serviço da elaboração de teorias,
que deverão aplicar-se à realidade concreta.
BEHAVIORISMO
É uma corrente dentro do
cientifismo. Os Behavioristas querem conferir rigor e regras de conduta para
tornar as Relações Internacionais mais efectivas como ciência autónoma e para
fornecer respostas, soluções aos problemas da sociedade internacional.
O behaviorismo pretende fazer uma
análise de comportamento, das atitudes, das reacções dos actores das relações
internacionais. Esta análise deverá ser feita de uma forma sistemática e
abrangente, e dela nascerão generalizações que permitem construir uma teoria.
Em todo este processo é
imprescindível ter em atenção o método e verificação empírica, através da qual
se fazem as generalizações. Há uma necessidade de apresentar provas para a
cientificidade das relações internacionais.
·
introduziu uma maior preocupação de rigor e cientificidade
nas relações internacionais, para tornar as relações mais úteis para a
sociedade; os instrumentos/métodos de investigação eram insuficientes.
·
preocupa-se em investigar e analisar o comportamento, está
em causa o estudo das atitudes, das reacções psicológicas de um determinado
fenómeno. Esta é a preocupação fundamental do behaviorismo e não a de criticar
o realismo e o idealismo. Isto de uma forma sistemática e abrangente, de modo a
conseguirmos generalizações que são baseadas na experiência empírica
(observação) e que são comprovadas através do método científico.
·
baseia-se numa percepção multidisciplinar, é uma perspectiva
teórica que se aplica a todas as áreas das ciências.
·
sustentavam que os métodos e as técnicas de análise
tradicionais eram puramente históricos, pelo que reduziam o debate a uma
perspectiva ideológica. Os behavioristas pretendem sair dessa perspectiva
ideológica passando para uma perspectiva científica e rigorosa, no sentido de
obter resultados palpáveis e possíveis de aplicar.
·
insuficiência na conceptualização: não existia uma definição
exacta dos conceitos que nos permitisse fazer previsões.
Easton
define oito características gerais do behaviorismo:
à
análise das
regularidades, daquilo que é uniforme, isto é, dum fenómeno que não sofre
determinadas oscilações. Isto é susceptível de dar origem a
generalizações/previsões (ex.: a conduta política permite identificar
uniformidade de comportamentos).
à
verificação: a validade
das generalizações tem de ser verificada, com referência a uma conduta
relevante.
à
técnicas: é preciso
saber como recolher e analisar dados, que é feito através de uma determinada
técnica. As técnicas são a aplicação de um determinado método. É necessário
rever e aperfeiçoar as técnicas, pois deve-se partir do princípio que os meios
de recolha e interpretação das informações não são infalíveis.
à
quantificação: registo dos
dados, formulação e apresentação dos resultados. Isto é uma contribuição
fundamental, partindo do princípio que os dados estão certos. Tudo deve ser
medido e quantificado, mas o valor dos resultados a que chagamos não é um valor
intrínseco, o valor dos resultados, propriamente ditos, só adquire relevância
quando aplicado a situações concretas. A quantificação não é a última palavra
na ciência, pois em Relações Internacionais são precisos outros valores que não
são matemáticos.
à
valores: é preciso
não confundir os valores éticos e a explicação científica/empírica. Embora
devam ser analisados de forma distinta, com critérios distintos, ambos devem
integrar a ciência das relações internacionais, e é de ambos que nasce a
análise das relações internacionais.
à
sistematização: a investigação
deve ser sistemática. A teoria e a investigação devem contribuir para a
construção de um corpo de conhecimentos coerente.
à
ciência pura: aplicação
dos conhecimentos teóricos e a compreensão da realidade internacional. São componentes essenciais da ciência. Por um
lado temos as condutas políticas e depois temos a aplicação dos conhecimentos
adquiridos a essa realidade. Quer isto dizer que a compreensão e a explicação
das condutas políticas são, logicamente, anteriores aos esforços da aplicação
do conhecimento político e aos problemas práticos da sociedade.
à
integração: diz respeito
à necessidade das relações internacionais apreenderem toda a realidade humana,
nos seus aspectos mais variados, por isso têm necessariamente o contributo das
várias ciências, que garantem a validade dos seus resultados -
transdisciplinaridade.
Os behavioristas criticaram o facto de os juízos de valor
influenciarem os resultados finais de um determinado estudo. Era preciso
evitar esta situação.
Propunham que se desenvolvessem
os métodos indutivos e dedutivos por forma a que a influência do sujeito
tivesse um menor peso no estudo das relações internacionais.
O objectivo era tornar a ciência
das relações internacionais numa ciência cada vez mais neutra, com uma
intervenção cada vez mais reduzida do sujeito em benefício da estatística, do
cálculo probabilístico. Era necessário reduzir o peso da ideologia.
Assim, as relações internacionais
enquanto ciência social careciam da aplicação de um rigor que só as ciências
exactas poderiam permitir. É preciso reforçar a análise quantitativa,
aplicar a matemática às ciências sociais de forma a poder diminuir tudo
o que acima está indicado. É preciso tornar as relações internacionais num
sistema de perguntas ajustáveis a critérios quantitativos e científicos.
Dentro desta corrente da necessidade
de encontrar dados empiricamente, há um cientista chamado David Singer que introduz no estudo das relações internacionais o
conceito da quantificação das variáveis.
O tratamento deve ser quantitativo
para se poder elaborar modelos em torno desse tratamento quantitativo dos
dados.
Os behavioristas caíram no
exagero ao darem excessiva importância à quantificação, pelo que foram
criticados.
Há uma divergência de carácter
ideológico entre os tradicionalistas
e os behavioristas. Os
primeiros, caracterizados pela ciência política, têm uma perspectiva
pessimista, acreditam que o mundo tende para o caos. Os segundos
caracterizam-se pelas ciências exactas.
Þ
Os cientistas não
vêem nenhuma especificidade nas relações internacionais. Acham que não há
grande diferença entre política internacional e política interna.
Þ
Os behavioristas
vêem o estado e a sociedade internacional como duas realidades distintas.
Þ
A concepção
tradicionalista é europocêntrica: os americanos e soviéticos criticaram o
europocentrismo porque ambos queriam tornar-se o centro do mundo. Assim,
verificar-se-ia apenas uma substituição ou pelo americanocentrismo ou pelo
sovietismo.
Þ
Os behavioristas
criticavam o protagonismo dado ao estado, o que é limitado.
Þ
Os tradicionalistas
partem do estado como único actor.
Þ
Os cientistas
partem para o modelo conflitual/cooperativo: a ideia de cooperação começa a
desenvolver-se após a II Guerra Mundial, quando começam a surgir as
Organizações Internacionais.
Þ
No final da década de 50 os behavioristas adoptaram uma atitude mais flexiva: começaram a ver
que existia uma certa semelhança entre o paradigma tradicional e o
behaviorismo. Perceberam que eram visões que se podiam conciliar.
Þ
É preciso esquecer a rivalidade que existe entre os
behavioristas e os tradicionalistas porque tal não faz sentido. Ambas as
teorias se complementam, ambas contribuíram para novas teorias que surgiram
mais tarde (ex.: teoria dos jogos).
Þ
Os behavioristas
centram a sua análise na conduta, no comportamento dos actores das relações
internacionais, enquanto os tradicionalistas partem de uma análise estadual,
única e exclusivamente.
Þ
A teoria sistémica
vai dar uma série de respostas às relações internacionais que as anteriores
teorias não deram:
·
é preciso considerar que o mundo constitui um todo, e que
este todo é constituído por pares. Não podemos chegar ao conhecimento do todo
só pela soma dos conhecimentos das partes. A análise tem de ser feita em duas
partes, mas nenhuma serve de caminho para a outra (uma coisa é o todo, outra
são as partes).
·
não podemos pensar que uma análise individual das políticas
externas de cada estado nos permite compreender as políticas no seu todo.
·
na teoria sistémica das relações internacionais o estado
perde o seu papel de actor central das relações internacionais, pis não
conseguia dar resposta a tudo. As multinacionais eram mais importantes que o
estado pois tinham um maior poder e uma maior capacidade de influenciar os
governos, do que os estados que surgiram após a II Guerra Mundial. Assim, é
inevitável que a teoria das relações internacionais tivesse de ser reformulada
(era preciso deixar de ver o mundo somente pela perspectiva das relações entre
os estados, seria uma visão muito simplista). A ideia de estado-nação está em
decadência.
Críticas à abordagem Cientifista:
Estas críticas são tecidas pelos
tradicionalistas:
à
Dizem que o esforço behaviorista se traduz por uma sobrevalorização
dos aspectos quantitativos e que os resultados deste esforço, de
quantificar com rigor, por si só não são suficientes para a análise.
à
Sustentam que a atitude behaviorista/cientifista
corresponde a uma desvalorização da perspectiva intuitiva, da sabedoria
literária, o que afasta o método científico da realidade internacional.
à
Os cientistas, ao tentarem substituir a análise histórica,
feita pelos tradicionalistas, pelo método quantitativo, estão a ignorar os
aspectos históricos, pelo que não são capazes de contextuar, o que limita
o alcance da investigação e os seus resultados.
à
Os cientistas vão abolir os juízos de valor: negam que se
possam integrar juízos de valor numa abordagem científica. Mas a verdade é que
só com os juízos de valor integrados numa perspectiva tradicionalista e juntos
ao rigor cientifista, é que se pode encontrar um sentido e uma interpretação da
realidade internacional.
A perspectiva cientifista critica directamente os
tradicionalistas nestes pontos:
·
a ausência da concepção do “linkage” (articulação esfera
interna/internacional);
·
o europocentrismo da conceptualização tradicionalista:
os tradicionalistas conceberam uma realidade internacional baseada só na
perspectiva da Europa;
·
a ignorância dos realistas face aos processos da decisão
em política externa. A análise da política externa é uma das áreas
disciplinares complementares das Relações internacionais e os realistas acham
que os processos de decisão da política externa são os mesmos processos da
política interna. A verdade é que quer a política externa quer a interna têm
processos específicos de decisão;
·
os tradicionalistas vêem o estado como único actor. Tal
concepção está errada, pelo que os cientifistas vão analisar o comportamento
entre os diferentes actores, estaduais e não estaduais.
·
criticam o facto dos realistas considerarem que as
condutas políticas interna e externa são diferentes porque os contextos também
são diferenciados.
O fim do debate entre os
cientifistas e os tradicionalistas dá início ao período do Pós-behaviorismo. Neste período chega-se à conclusão que as teorias
dos paradigmas deixados para trás não podem ser “arrumadas” mas sim para
conviver com as novas teorias que vão surgir, pois todas se completam umas às
outras.
PÓS-BEHAVIORISMO
O Pós-behaviorismo começa por tecer
críticas ao behaviorismo na década de 60. Década em que os behavioristas
começam a ser caracterizados pelo seu abstraccionismo, pelo seu afastamento da
realidade, por se estarem a tornar teóricos demais e não encontrarem maneira de
aplicar as suas conceptualizações à realidade.
A TEORIA DOS SISTEMAS APLICADA ÀS RELAÇÕES
INTERNACIONAIS
É difícil decidir quais os factos
mais relevantes na dinâmica das relações internacionais, já que existem
diversas perspectivas quanto a isso.
A teoria sistémica tem o objectivo de vir corrigir o tipo de
análise centrada no indivíduo (característica do behaviorismo), aquilo que
se pretende agora é analisar o todo, é preciso fazer uma abordagem
holística.
·
o todo vai além da mera soma das partes;
·
o todo obedece a leis e a uma dinâmica própria;
à
A sociedade é algo para além dos indivíduos que a
constituem, pelo que tem características e capacidades específicas. Os
indivíduos estão submetidos às leis e às instituições que regem a sociedade.
à
A metodologia sistémica nas ciências políticas tem por base
a cibernética, ou seja, o estudo do controlo interno dos sistemas onde as
várias operações interactuam sistematicamente.
·
O termo, aparentemente inventado por Norbert Wiener e Arthur
Rosenthal, admite que os sistemas podem ser isentos quer às influências
externas quer ambientais, sendo possível enunciar leis de valor geral acerca do
funcionamento dos sistemas. A expressão “feedback” exprime o retorno do
“output” do sistema (agente estabilizador do sistema porque reduz as
exigências), como “input” exprime os apoios ou exigências recebidos (agente que
pode ser destrutivo porque causa a instabilidade do sistema).
David Easton
Inputs Outputs
exigências legislativo
executivo
judicial
apoios comunidade política
A teoria sistémica tem como
objectivo organizar uma visão da sociedade internacional, tendo como premissas
a coerência e a persistência, no sentido de manutenção do sistema. Isto vai dar
ênfase a algumas interacções e interdependências dentro do sistema.
Esta análise dá-nos uma globalização
e uma abstracção que nos permitirá construir uma teoria das Relações
internacionais mais científica.
Coloca em evidência os fenómenos da
interdependência e da transnacionalidade porque, pela primeira vez, há uma
análise do conjunto e não uma análise individual de cada um dos actores.
Quando os historiadores falam em
sistemas internacionais pretendem descrever as relações que se estabelecem
entre diversos estados políticos, como o sistema do Tratado de Westefália, por
exemplo.
Não se pretende analisar regras e
modelos de funcionamento do sistema, mas sim verificar que os estados variam o
seu comportamento consoante o ambiente seja bipolar ou multipolar. A análise
sistémica tem por base a distinção entre o sistema e o ambiente/contexto.
No estudo das relações
internacionais ou reduzimos o sistema às relações entre os governos dos
estados, como afirma Morton Kaplan,
ou autonomizamos subsistemas, considerando assim um ambiente externo, ou estudamos
o sistema internacional global, admitindo que existe ambiente interno mas não
existe ambiente externo.
Perspectiva de Raymond Aron
à
Raymond Aron, na sua abordagem aos sistemas internacionais,
recusa-se a aceitar análises apriorísticas. Servir-se-á sempre de modelos
fornecidos pela experiência, quer da análise do presente quer do passado.
à
A sua abordagem será histórico-sociológica e
político-estratégica.
à
O Sistema Internacional é um conjunto de unidades políticas
que mantêm entre si relações regulares e que são todas susceptíveis de estarem
implicadas numa guerra total.
à
Já no plano interno, o sistema político significa
organização, o modo como as relações entre as partes são governadas. Este
sistema político interno não é unicamente e exclusivamente aquilo que está na
constituição.
à
A competição é o factor que dá coerência ao sistema, que se
organiza sempre em torno do conflito. Pois, a guerra é o factor de
autonomização das Relações Internacionais.
à
O Sistema Internacional é uma realidade oligopólica, em que
alguns (mais fortes) dominam o resto (mais fracos).
CARACTERÍSTICAS DO SISTEMA:
Þ
Configuração
das relações de força:
·
limites do
sistema:
só depois de 1945 é que vai aparecer um sistema internacional que abarque todo
o planeta.
·
distribuição
das forças entre os actores: relações entre as potências que têm
sempre associado o cálculo do poder e da força. Esta distinção dita a criação
de agrupamentos, a criação de alianças.
·
configuração
geográfica relativa: determina, muitas vezes, os limites do sistema (capacidade
diplomática e militar). Esta configuração pode ser superada por inovações
técnicas ou, então, por um imprevisto político.
¨
Sistemas de
configuração multipolar: adquirem
expressão no sistema da Balança de Poderes e traduz-se numa competição, numa
rivalidade diplomática entre as várias unidades do sistema com o mesmo nível de
potência.
¨
Sistemas de
configuração bipolar: é um sistema
em que duas unidades de potência superior estabelecem o equilíbrio entre elas,
através de coligações, obrigando as unidades pequenas e médias a aliar-se a uma
delas. A hierarquia vai ser determinada de acordo com a capacidade de persuasão
de cada uma das partes.
¨
Sistema de
Não-alinhamento: é a chamada
ideologia do oportunismo, pois, não se integra em nenhum dos dois sistemas,
aproveita o melhor de cada um dos sistemas.
Þ
Grau de
Coerência Interna:
·
Sistemas
Homogéneos:
os estados obedecem à mesma concepção de política e à mesma ideologia, pelo que
criam um sistema com uma grande estabilidade. Estes sistemas favorecem a
diminuição da violência, e são os mais previsíveis porque são estáveis. Neste
tipo de sistema há uma distinção entre o adversário político (oposição) e o
inimigo nacional (algo de fora que constitui uma ameaça aos interesses
nacionais).
·
Sistemas
Heterogéneos: são sistemas constituídos por estados que se organizam
segundo princípios diversos e, muitas vezes, contraditórios. O inimigo é,
também, o adversário. A derrota atinge os interesses políticos e não só a
Nação.
Note-se que o próprio sistema homogéneo
comporta um certo grau de heterogeneidade, o que está patente na legitimidade
interna.
Þ
Relações
Intrassistémicas: são relações que se operam dentro dos sistemas.
·
As relações entre os actores do sistema internacional nunca
foram de anarquia pura, houve sempre uma ordem num determinado padrão de
comportamento. Ordem que resulta de uma regulamentação para as relações entre
os actores quer estaduais quer não estaduais.
¨
Perspectiva
Sociológica: o sistema internacional vai ser o espaço interestadual
constituído por sociedades submetidas a soberanias distintas. As relações entre
essas sociedades são relações transnacionais, e essa sociedade transnacional é
regulamentada por uma série de convenções, por um costume, e por um direito
específico, que contém desde logo as condições e autorizações para que essas
relações se realizem organizadamente. Esse direito é o Direito Internacional
Privado.
·
O relacionamento entre os estados tem também uma série de
regras de comportamento, onde se destaca o Direito Internacional Público. Este
é um tipo de regulamentação específica entre os estados, cujo relacionamento
oscila entre a paz e a guerra.
¨
O Direito Internacional Privado e o Direito Internacional
Público: extensão de cobertura da lei interna, reflecte o alargamento dos
interesses comuns da sociedade internacional.
·
Verificou-se a necessidade de estabelecer regras que
garantissem a existência pacífica dos estados.
à
O facto dos estados assinarem os tratados não significa que
os vão cumprir. Por exemplo, a Carta dos Direitos da Criança da UNICEF é o
tratado internacional mais assinado e é, também, o mais violado. Muitas vezes,
a aceitação do estado referente ao acatamento das regras depende do interesse
do estado e de quem impõe essas regras.
à
Interpretação
das regras:
cada estado interpreta as regras de acordo com os seus interesses. Muita vezes,
a interpretação das regras é usada como uma arma para negociar diplomaticamente
ou para fazer guerra subversiva (ambiguidade
construtiva).
à
A interpretação das regras e o seu cumprimento está
dependente de parcerias ideológicas.
Perspectiva de Morton Kaplan
à
Morton Kaplan não adopta uma visão sócio-histórica como o
faz Raymon Aron.
à
Embora Kaplan não esconda a imperfeição dos esquemas
apriorísticos, prefere, mesmo assim, analisar apriori a teoria geral dos
sistemas e a análise sistémica, por considerar escassos os elementos históricos
disponíveis.
à
A teorização das relações internacionais exige que se parta
de um quadro teórico para chegar à realidade, quadro esse que é um sistema
observante que pretende responder a perguntas como: porque é que um sistema se
desenvolve, como funciona e porque é que se declina.
à
Kaplan identificou as regras essenciais do sistema, as
regras de classificação dos actores, as capacidades e a informação como sendo
variáveis dos sistemas.
·
As regras essenciais do sistema descrevem a relação entre os
actores ou agentes.
·
As regras de transformação representam a capacidade do
sistema em se adaptar às mudanças do ambiente, assim, cada sistema tem regras
de transformação e adaptação.
·
E a hierarquia que existe entre os caracteres estruturais
dos agentes influencia o seu comportamento.
Balança de Poderes
Sistema
Bipolar Flexível ou Maleável
Ponto de
equilíbrio
A
prato da balança - B C -
prato da balança
D
Fiel da
balança
O acesso aos pratos da balança está
aberto quer a um estado ou a um conjunto de estados. O Fiel da balança também
pode ser um estado ou um conjunto de estados, neste último caso denomina-se por
Directório.
Sempre que o equilíbrio se altera, o
fiel da balança tem como função levar auxílio para que o equilíbrio se reponha.
Isto é uma política de equilíbrio, muito conservadora, que foi o que
aconteceu na época do Euromundo em que a Inglaterra era o fiel da balança.
Este conceito foi utilizado a partir
de 1815 para designar o tipo de política do Concerto Europeu.
Balança de Poderes
Sistema
Multipolar
(elaborado por Jones)
Guerra Fria:
equilíbrio de poderes militares
A
Europa
Ocidental China
Japão E. U. A. U. R. S. S. Leste Europeu
América Latina Pacto
de Varsóvia
Nato
3.º Mundo
Aquele sistema bipolar, depois de
formado, torna-se num sistema multipolar.
As contradições internas
resolvem-se com base na partilha do mundo por áreas, que são as seguintes:
à
zonas de
soberania:
pertencem a um estado limitado por uma fronteira, em regra imposta pela força;
à
zonas de
influência:
são aquelas onde os estados exercem influência. Quando a sua área de soberania
não chega, os estados procuram sítios onde consigam exercer influência, por
exemplo, África. Com o Congresso de Berlim verifica-se uma verdadeira corrida a
África, com vista à exploração de matérias primas.
à
zonas de
confluência: são aquelas onde se tocam duas zonas de influência, para
onde convergem duas tentativas de influência.
à
zonas
marginais:
são aquelas que, em princípio, estariam livres para serem exploradas. Foram
aquelas áreas onde se pôde constatar guerras “por procuração”. Actualmente não
há zonas marginais.
Actualmente a balança de poderes é
mais segmentada, isto é, são quase temáticas. Além das balanças sectoriais há,
também, as balanças regionais.
Perspectiva de Marcel Merle
Na sua análise, Marcel Merle
preocupa-se em especificar a delimitação, a constituição e a estrutura do
sistema. Assim:
Þ
Delimitação do
Sistema:
tem a ver com a dimensão do sistema.
·
O sistema actual, em termos de dimensão, é planetário
(engloba todo o planeta e todos os actores imaginários).
·
Até ao final das duas Guerras, o sistema era o euromundo,
havendo vários subsistemas em torno deste.
·
A vantagem do euromundo era a de que permitia que os
conflitos que surgissem no sistema principal fossem resolvidos nos subsistemas,
são as chamadas “guerras por procuração”.
·
O sistema europeu fechou-se sobre si próprio, deixa de haver
ambiente externo, em grande parte, devido à descolonização, que provoca a
proliferação dos estados soberanos. Os recursos são limitados, isto é, o espaço
é finito e os recursos também, o que leva a um fenómeno se solidariedade porque
vivemos todos no mesmo planeta e trabalhamos todos para o mesmo.
·
A partilha de África serviu como válvula de escape para
atenuar as tensões internas da Europa.
·
O problema de não haver ambiente externo, é que qualquer
conflito que aconteça numa parte do sistema vai repercutir-se no sistema todo.
Isto também provoca alterações nas relações entre estados, o que leva, também,
a uma alteração das regras para se manter o sistema em equilíbrio. O facto de
não haver ambiente externo serve como característica autonomizadora das
Relações Internacionais.
Þ
Constituição
do Sistema:
é um sistema heterogéneo composto por vários actores:
·
estados: têm como função controlar os espaços e enquadrar as
sociedades distintas.
·
Organizações Internacionais: funcionam mais como
superestruturas que reflectem a divisão do espaço e das sociedades que os
estados traduzem, do que propriamente como sedes de um qualquer poder político.
Não são um centro político autónomo mas servem de centro de harmonização das
políticas dos estados.
·
Sociedades Transnacionais/Multinacionais: funcionam dentro
dos sistemas como as unidades onde se centra o poder económico e financeiro.
Têm uma grande importância no ambiente sistémico porque elas operam através das
fronteiras em concorrência com as suas congéneres, mas também com os próprios
estados.
Consequências das acções
intrassistémicas:
- crescimento
local;
- unificação
global (padronização da produção e consumo);
- domínio (têm
uma grande capacidade de negociar, fazendo-o directamente com o estado e
passando, muitas vezes, por cima do próprio estado);
Para as multinacionais não existem
normas jurídicas nem normas de boa conduta.
O facto de existir interesses
diferentes gera concorrência, apesar das acções de solidariedade.
Þ
Estrutura do
Sistema:
O sistema internacional é
atravessado por fluxos muito variados, pelo que definir uma estrutura dos
sistema é difícil porque existem elementos de diferenciação/diversificação
e elementos de unificação. Só é possível definir uma estrutura do
sistema a partir do balanço destes elementos.
à
Elementos de
Unificação:
·
Tecnologia: no plano da
comunicação a tecnologia veio unificar todo o sistema, fazendo-se sentir em
todas as actividades da acção humana.
·
Sociedades
Transnacionais: “impõem” padrões de comportamento, de apetência para
determinados produtos e actividades. Promovem a expansão da “economia liberal”.
·
Organizações
Internacionais: a sua criação deriva dos estados sentirem que têm
interesses comuns.
à
Elementos de
Diferenciação/Diversificação:
·
estados: continuam a traduzir a partilha do espaço em
unidades políticas autónomas. Isto provoca uma hierarquia de potências e uma
fragmentação da decisão.
·
como elementos de diferenciação podem considerar-se, ainda, três
tipos de clivagens (lutas), a saber:
·
Clivagens de
tipo económico e grau de desenvolvimento: este tipo de clivagens separa
desde logo os países ricos dos países pobres. Alguns autores atribuem
este tipo de clivagens à diferente repartição dos recursos naturais, outros
atribuem à estrutura do sistema mundial capitalista.
·
Clivagens
ideológicas: foram as responsáveis pela formação dos blocos capitalista,
socialista e do movimento dos não-alinhados. Este tipo de clivagens serve
para internacionalizar os problemas internos e para interiorizar os conflitos
internacionais.
·
Clivagens
culturais:
fazem-se sentir, desde logo, pela noção de pertença a uma língua, a uma raça, a
uma minoria, entre outras, diferentes. Estas clivagens culturais produzem o
mesmo fenómeno de “linkage”, gerando, também, pólos de
solidariedade (ex.: Commonwealth e Comunidade Francófona), é uma
uniformização regional.
Dentro da comunidade internacional há
estados que pertencem a várias unidades de solidariedade ao mesmo tempo.
No meio disto tudo há identidades
combinatórias.
Marcel Merle define, ainda, as características das
interacções dos actores do sistema:
à
A distinção entre política interna e política externa
torna-se pouco relevante. Nota-se agora uma interdependência entre os
fenómenos internos e externos.
à
Tentar fazer uma abordagem aos fenómenos políticos,
diplomáticos e estratégico militares já não é suficiente. Há outros factores
que devem ser considerados (ex.: tecnologia, ... ). O sistema internacional
já não é um monopólio dos políticos e militares.
à
Verifica-se uma atenuação da distinção entre público e
privado. Os comportamentos privados enquadram-se dentro de todos os
sectores públicos, do estado.
Na abordagem internacional não se
pode privilegiar um elemento em favor de outros, porque estes estão em
constante interactividade. É impossível autonomizar um elemento e dizer que
aquele é o responsável único por determinado fenómeno.
As Relações Internacionais operam
em três dimensões:
·
interno-nacional;
·
internacional;
·
transnacional;
A própria transformação das
Relações Internacionais resulta mais pela alteração do ambiente e menos pela
alteração do comportamento dos actores. O comportamento dos actores está
em função do meio.
Deixamos de nos centrar naquilo que
é individual ou naquilo que é internacional, e passamos a centrar-nos no todo,
no relacionamento dos actores.
O PARADIGMA DA DEPENDÊNCIA
Contextualização
Depois de 1945 emergem duas
superpotências, os Estados Unidos e a Rússia. Pela segunda vez, a Europa saiu
desmoralizada de um conflito à escala mundial. Só sobreviveu graças à
intervenção de um poder extraeuropeu. A sua economia estava de rastos.
Aqueles que tinham os seus impérios
coloniais (Espanha, Itália, Portugal, França e Grã-Bretanha) caíram porque:
·
começaram a surgir na Ásia, na América Latina e em África
vários movimentos políticos e nacionalistas cujo objectivo era lutar para
adquirir a independência. Este nacionalismo foi de alguma maneira alimentado
por uma potência que era o Japão (colonizou a Coreia, o Taiwan e outras ilhas).
O Japão pretendia afastar do oriente a influência europeia, assim começou a
difundir uma ideologia (“A Ásia é para os Asiáticos”).
·
as superpotências apoiam esses movimentos de libertação. A
Carta das Nações previa a autonomia desses povos.
Uma forte pressão internacional no
processo de descolonização fez com que surgissem novos estados. Está em causa a
rivalidade entre as superpotências. É por um lado uma guerra colonial e por
outro o conflito que caracteriza a Guerra Fria.
A China e a Índia assumem um papel
de líderes no movimento dos Não Alinhados, criado pela conferência de Bandung,
em 1955.
Este movimento pretende auxiliar os
movimentos independentistas, criar novos estados e formar uma nova alternativa
ao bipolarismo (tal não resultou).
Este conjunto de novos estados
vai enfrentar problemas graves:
·
o problema do nacionalismo.
·
começou a falar-se pela primeira vez do problema do
desenvolvimento e do subdesenvolvimento (a expressão “terceiro mundo” deve-se a
Alfred Sauvy).
·
enfrentaram o problema do desenvolvimento económico: nos
países subdesenvolvidos a população é constituída maioritariamente por idosos,
e onde não há população activa suficiente para pagar as reformas dos velhos.
·
segurança social: o problema demográfico está também
associado ao problema da fome.
·
as estruturas industriais estão também sujeitas a uma
debilidade, assim surge a ideia de cooperação 8os países coloniais deveriam
recuperar os laços com as antigas colónias - conceder assistência humanitária).
Criou-se, assim, por influência marxista, um novo termo - neocolonialismo.
É neste contexto que surge o paradigma da
dependência.
Os países que acederam à independência
começam a pedir um tratamento diferenciado (ex.: comércio deve ser recíproco).
Este tratamento diferenciado teve efeitos muito negativos para a Europa.
O Paradigma da Dependência tem de ser
sempre analisado à luz do bipolarismo.
Ao mesmo tempo
que o Paradigma da Dependência se desenvolve, desenvolve-se um outro
designado por Paradigma da Interdependência, que adopta uma visão menos
pessimista e mais idealista.
Os
três paradigmas (P. Tradicional, P. Dependência e P. da Interdependência)
coexistem mas nenhum por si só consegue explicar a realidade. O paradigma da
dependência não vem, portanto, substituir o paradigma tradicional mas sim
“trabalhar” em conjunto com o mesmo.
A
grande diferença que se verifica entre estes três paradigmas é que o estado vai
deixar de ser a unidade de análise para dar lugar ao sistema internacional.
Temos
uma realidade para estudar, a qual vai evoluindo, o que nós temos que fazer é
adaptar os nossos meios de estudo à nova realidade.
Um
grupo de economistas sul-americanos que trabalhavam nas Nações Unidas num
conselho económico-social durante a década de 50/60 foram convidados a fazer um
estudo sobre o Sob e sobredesenvolvimento económico da América Latina, que vem
confirmar o paradigma da dependência.
O Paradigma da Dependência, também
chamado de neo-marxista ou estruturalista,
surge como uma perspectiva
económica do desenvolvimento, daí que no início não tenha tido uma grande
influência no estudo das relações internacionais.
O
problema é económico e as soluções propostas são (político) económicas. O
subdesenvolvimento económico depende das relações entre as economias das
relações internacionais.
O Paradigma da Dependência corresponde a
uma visão assimétrica, isto é, os dependentistas sustentam que existe
uma desigualdade e uma assimetria entre os estádios de desenvolvimento que
determina o relacionamento entre os estados. Esta assimetria permite que
alguns estados dominem outros (um estado torna outro seu dependente).
A nova ordem económica internacional é o
desejo de equilibrar e de introduzir uma nova justiça na cena internacional.
Os países que solicitam esta nova ordem são os países subdesenvolvidos que se juntam
pela primeira vez em Bandung (1955).
O
sistema funciona, mas o problema original que era a falta de impacto desses
países a nível internacional não desapareceu. Havia uma grande injustiça na
cena internacional a nível das relações económicas.
As
condições foram criadas para satisfazer os estados do norte, que têm
todo o interesse em que os estados do sul se mantenham “no anonimato”.
Notas:
Não
se deve cair na definição de desenvolvimento como o desenvolvimento económico.
Desenvolvimento é quando se tem a capacidade de poder escolher e decidir entre
mais de uma opção.
Os
países Não Alinhados não são os países do terceiro mundo. A posição de não
alinhamento é uma posição político-estratégica.
É
preciso, também, não cair na definição dos países do norte como sendo os países
em que é visível a industrialização. Não é a indústria mas sim a tecnologia que
caracteriza os países do norte.
CARACTERÍSTICAS DO PARADIGMA DA DEPENDÊNCIA
1. o mundo é um
sistema único, dominado pelo capitalismo.
2. o mundo é de
natureza conflitual, cujas causas do conflito são os interesses desse sistema
capitalista mundial.
3. o sistema é
conservador e reconhece que ele próprio tem mecanismos para promover a mudança.
4. para o
capitalismo existir é preciso que haja uma desigualdade económica fundamental
em termos globais. Os produtores nas trocas comerciais (os capitalistas) têm de
ver preenchidos os seus interesses. Para continuar a haver estas trocas é
importante que os dependentes tenham algum aumento do nível de vida. Isto não é
uma alteração da ordem económica, é o que se faz para que ela se mantenha. Quer
isto dizer que quer os países ricos quer os países pobres aumentam, mas o fosso
entre eles aumenta. Note-se que esta é uma visão pessimista da realidade
social.
5. a unidade de
análise é o próprio sistema capitalista mundial. Só pode acontecer uma mudança
se todo o sistema se modificar e não só um estado. Por isso, a abordagem deste
paradigma faz-se sempre de uma forma sistémica (do sistema9 e não analisando os
actores. É de notar que quando se fala de actores, sob a perspectiva deste
paradigma, fala-se de todas as entidades que entram na relação e não apenas dos
estados.
6. não há
distinção entre a esfera estatal e a esfera internacional. Para os
dependentistas a economia internacional é uma continuação da economia
doméstica, do estado. Isto não significa que o estado seja apenas uma
superestrutura que tem por base as relações de classe (influência marxista), é
um actor fundamental.
7. a dinâmica do
processo inter-sistémico é um dinâmica conflitual, implica a manutenção dos
laços de dependência, laços entre Norte e Sul, centro e periferia.
Na
visão do Paradigma da Dependência, nas
Relações Internacionais há sempre um que ganha e outro que perde. Este
tipo de distribuição dos benefícios, em que para um receber mais o outro
tem que receber menos, nega a existência de valores, de interesses e
objectivos globais. No Paradigma da Dependência só há interesses
privados.
Influência Marxista no Paradigma da Dependência
Um paradigma
não pode partir de uma ideologia. O neo marxismo (o marxismo reformulado) vai
influenciar este paradigma. A perspectiva ideológica mais próxima deste
paradigma é o marxismo.
Sendo
o sistema das relações internacionais um sistema capitalista, após a II Guerra
Mundial, a Rússia pensa pegar nos países descolonizados e libertá-los do jugo
do capitalismo, libertando os oprimidos.
É
chegado o “fim do capitalismo”, é a hora da revolução.
·
As reflexões sobre a injustiça social das relações
internacionais e as soluções que são propostas não surgem no espaço
geo-político marxista.
·
Surgem pelos ideólogos economistas sul-americanos. Por isso
é um neo marxismo, não é o marxismo ortodoxo da Rússia.
A Rússia não tinha colónias porque
não precisava, o seu espaço era imenso. Após a II Guerra Mundial surge a Guerra
Fria. AS colónias não tinham um lado. Como a ideia soviética de libertação dos
oprimidos e quebra do jugo dos colonizadores ocidentais é muito mais franca aos
povos descolonizadores, estes vão tomar o partido soviético.
O novo país emergente não alinha do
lado soviético. Alinha contra o país que o colonizou, que era ocidental e
capitalista. Esta situação reflecte-se na Assembleia Geral da ONU.
·
O capitalismo não é odiado pelo marxismo. É considerado um
passo decisivo para a história do homem:
à
Lenine, no Imperialismo no último estágio do Capitalismo,
escreveu que o capitalismo tem contradições internas tão grandes que vai acabar
por se auto destruir. O imperialismo é o último estágio deste processo, pois
quando as classes oprimidas das colónias se revoltarem, o capitalismo perde as
colónias. Assim, o capitalismo acaba, também, com o colonialismo.
à
Esta teoria de Lenine não se verificou, e a influência que o
marxismo tem no Paradigma da Dependência é a de um marxismo revisto à luz da
realidade. As colónias acabaram mas não o capitalismo.
à
O Paradigma da Dependência leva, pela primeira vez, para as
Relações Internacionais uma análise integrada das relações económicas e
políticas. Aquilo que ele aborda directamente são as relações económicas
subjacentes às políticas.
à
Baseiam a teoria da dependência numa concepção transnacional
dos relacionamentos em que há potencialidades desiguais entre os estados, que
se vai traduzir não apenas na diferença entre os estados comuns como também na
injustiça social. Mas, para que o capitalismo se mantenha é preciso que esta
diferença de potencialidades e injustiça social se mantenham. Daqui resulta que
os ricos são cada vez mais ricos e os pobres são cada vez mais pobres.
à
Wallerstein e Modelsky chamam ao sistema que se
estuda nas R.I. no Paradigma da Dependência, sistema-mundo; Fernand Braudel chama economia-mundo.
à
Não há uma teoria marxista das R.I.. O que interessa é a
explicação que o marxismo vai dar no sentido de dizer que a luta de classes
deixou de ser a nível interno dos estados e passou a ser uma luta a nível
global. O que existe é um sistema-mundo onde há uma classe capitalista
generalizada que explora uma classe trabalhadora, também, generalizada.
à
Wallerstein e Modelsky descobriram que o capitalismo começou
há 500 anos, ao logo dos quais tem havido várias potências que têm dominado o
mundo (domínio hegemónico), e que se substituem umas às outras. O sistema
capitalista mundial sempre se manteve e continuará a manter-se.
à
O neo-marxismo diz que é impossível acabar com o capitalismo
se não houver uma mudança estrutural do sistema. Então, das duas uma: ou vamos
viver com a estrutura que temos, ou mudamos a estrutura dos sistema. O que o
neo-marxismo faz é adaptar a uma situação nova, as premissas originais do
marxismo.
à
Os teóricos da dependência dizem que o capitalismo começou
com o mercantilismo. Quando a supressão das necessidades vitais é feita através
de uma actividade que visa a obtenção de lucro pela satisfação das
necessidades, segundo a teoria de Max Weber, começa o capitalismo.
à
O sistema capitalista tende a sustentar-se a si próprio, a
auto conservar-se, precisando da acentuação progressiva da diferença dos níveis
de desenvolvimento, é sempre necessário que alguém precise de alguém. Embora
tenha contradições internas, o capitalismo consegue “sobreviver”, absorvendo
essas mesmas contradições.
à
Os teóricos vão tentar saber quais são as causas do
subdesenvolvimento, e o que é que é preciso fazer para se chegar ao
desenvolvimento.
à
Dizem que é errado considerarmos o desenvolvimento ou a
falta de desenvolvimento como fruto das relações económicas entre as nações. O
capitalismo é um sistema planetário que tem vida própria, independentemente de
ter sociedades nacionais que integram este sistema, ele funciona por si só.
Este sistema-mundo tem mecanismos económicos, políticos e culturais próprios,
dos quais derivam as desigualdades entre os estados.
Ao Paradigma da Dependência chama-se
Estruturalismo. Isto porque Marx considerava que a superestrutura ideológica,
neste caso, capitalista era resultado de várias subestruturas.
Mas tal não é verdade, pelo que o
paradigma vai contra o marxismo tradicional. Não é a superestrutura que informa
a realidade, mas a realidade que tem um certo paralelismo com o marxismo.
Como o capitalismo é capaz de
absorver as suas contradições, ele não acaba: isto vai contra a teoria
marxista.
Wallenstein
e Modelsky salientam que esta
capacidade de absorção capitalista se verifica desde há 500 anos, desde o fim
da economia feudal e início do mercantilismo.
Por isso é uma teoria sistémica: o sistema capitalista mantém-se, tem
uma capacidade homeostática. Para o sistema manter uma conservação
sistémica, teve que se manter a dependência de alguns países.
Não foi nos países do leste (de
ortodoxia marxista) que se fez a reformulação marxista, mas foi no ocidente.
Com base na teoria do sistema surgem
as teorias dos Sistemas-Mundo (Wallenstein e Modelsky).
Todos os actores, vivendo dentro do
sistema-mundo, actuam pela lógica do sistema. O desenvolvimento dos actores
gera o desenvolvimento do sistema-mundo. Este sistema foi criado com a expansão
do processo capitalista (primeiro económico, segundo político-cultural).
Por isso surge a mundologia, que abarca todo o
mundo e considera que dividi-lo está errado.
PERSPECTIVAS TEÓRICAS DA DEPENDÊNCIA
Estes
mundiólogos são também estruturalistas pois partem da análise estrutural. Não
interessam tanto os actores em separado mas a estrutura do sistema. O mundo é
uma estrutura social transnacional com uma dinâmica própria.
O que se quer estudar não são os
actores mas as causas e os processos de desenvolvimento.
Com o passar da Guerra Fria, o
Leste/Oeste desvanece-se e ganha importância o Norte/Sul. Tal facto origina
teorias como a Teoria da Dependência, a Teoria do Centro - Periferia
e a Teoria do Sistema - Mundo.
Teoria da Dependência, dos sul-americanos:
Na década de 50, Paul Baron escreveu Political
Economy of the Growth (1957), onde põe em causa a linearidade do marxismo
que considera que o capitalismo se auto-destruiria.
Se Marx tivesse razão, os países
mais desenvolvidos estariam mais perto do comunismo. Mas ele nota que quanto
mais desenvolvido for o país mais longe ele está do comunismo. Nota também que
os países menos desenvolvidos são estruturalmente diferentes dos mais
desenvolvidos.
Ao mesmo tempo, os economistas
sul-americanos, partindo doutro ponto, chegam, basicamente, à mesma conclusão.
Consideram o atraso da América do sul devido, mais do que a deficiências
internas, ao facto de os acordos, desde a II Guerra Mundial, prejudicarem os
fornecedores de matéria-prima, beneficiando os produtores de tecnologia (foram
estes que ditaram as regras do mercado).
Chegaram a esta conclusão depois de
terem verificado que a correcção das políticas económicas internas não
alteravam substancialmente a situação.
Isto acontece porque:
·
os mercados internos dos bens de consumo da América do sul
são limitados. O excedente da produção deveria ser enviado para exportação, mas
estes não se conseguiam impor no estrangeiro, devido à concorrência dos países
mais desenvolvidos.
·
mesmo a nível interno, são comprados produtos estrangeiros,
ou mesmo que não possam ser comprados (por serem caros, pela acção das medidas
proteccionistas), a intenção de compra é orientada para ele.
·
a procura, que é baixa, é de produtos de capital intensivo
(o investimento é grande em relação ao número de postos de trabalho que cria) o
que provoca um problema social, pois o emprego é escasso.
·
de qualquer forma, os bens essenciais são estrangeiros e são
pagos em moeda estrangeira.
Há exemplos de economias fechadas: a
Coreia do Norte, a Alemanha dos últimos anos da guerra, a Espanha franquista.
Mas no momento em que se integram no mercado, os seus produtos mostram-se
inferiores, mas como os meios estão lá podem ser optimizados.
De qualquer maneira, vive-se em
autarcia por rejeição do ambiente e não por política determinada. A solução
teria de ser encontrada fora do país, e teria de ser uma solução estrutural.
Esta teoria constatou que a causa do
subdesenvolvimento e a resposta para o desenvolvimento não eram apenas as
estruturas económicas internas dos estados, mas sim os termos das relações
económicas entre os estados.
Os países subdesenvolvidos não produzem
bens vitais, por isso continuam sempre dependentes dos bens vitais do exterior.
Para diminuírem essa dependência têm que começar a produzir aqueles bens, mas
para isso têm que importar tecnologia e capital. Assim, continuam sempre
dependentes.
Teoria de Centro - Periferia
Esta teoria foi pensada como um
ponto de partida para o problema do desenvolvimento: Samir Amin, Fernando
Henriques Cardoso, André Gunnar
Frank.
Foram buscar teorias económicas do
século XIX a Friederich Liszt e a William Carry.
Para o liberalismo de Adam Smith era preciso a liberdade em
tudo: alfândegas, produção...
Liszt
e Carry disseram que se houvesse
total liberdade de comércio todos eram livres de comprar ou não. Haveria
competição e assim cada um produziria mais daquilo que produzia melhor e menos
do que produzia pior. Os países mais aptos em determinado produto concentram-se
na produção deste e os outros países “deixavam-no”.
Não era possível que um mercado
assim fosse potencialmente bom para todos. Poder-se-ia boicotar um produto e o
seu país produtor não tinha a quem vender. Aqueles que exigiam a queda das
barreiras alfandegárias podiam criar, eles próprios, barreiras alfandegárias.
Isto funciona, de facto, nas
relações centro - periferia que Gunnar
Franck chamou Metrópole -
Satélite. Este processo teria sido iniciado por Portugal e Espanha, que
traziam dos satélites mais valia e que era utilizada no desenvolvimento da
metrópole. Isto iniciou o processo de desigualdade entre os países, onde a
metrópole desenvolvia mas o satélite não: era o chamado desenvolvimento do
subdesenvolvimento.
Com a descolonização a situação
piora, pois o que era feito de graça na colónia, agora passa a ser pago. Com a
descolonização o país fica completamente dependente economicamente.
Existem excepções não explicadas por
esta teoria, como é o caso dos NIC (New Industrialized Countries): tendo o
desenvolvimento económico, não se vê esse desenvolvimento reflectido no
contexto social (Singapura, Taiwan, Malásia, ...). Outra excepção são os países
escandinavos, que não tendo matérias-primas de valor, são desenvolvidos.
Johan
Galtung diz que o subdesenvolvimento dos países mais pobres é mantido
como um resultado secundário/marginal do funcionamento do sistema económico
internacional. Elabora, então, um esquema das relações centro -
periferia sob duas perspectivas: a internacional e a interna/doméstica.
Perspectiva Internacional
O mundo está dividido em centro e
periferia. O centro é composto por um pequeno número de países que possuem as
seguintes características:
·
são ricos;
·
possuem uma capacidade tecnológica muito sofisticada;
·
têm uma grande variedade de bens e serviços;
·
mantêm relações comerciais com vários países do mundo;
·
têm autonomia e uma flexibilidade muito grande de absorver
os choques económicos da comunidade internacional;
·
como se relacionam com países menos industrializados, podem
desenvolver um determinado tipo de indústrias (capital e mão de obra
intensivos) porque sabem que os outros não o podem fazer, assim, têm uma
concorrência muito restrita, pelo que obterão lucros.
·
os próprios factores de produção (tecnologia, mão de obra
especializada, capital, ...) podem ser exportados.
Os países da periferia possuem as
seguintes características:
·
são menos industrializados;
·
pobres em capital, tecnologia e mão de obra qualificada e em
capacidade de gestão;
·
a sua economia é baseada numa monocultura;
·
exportam produtos do sector primário ou produtos pouco
industrializados;
·
mantêm relações com um país do centro, normalmente o
ex-colonizador, tornam-se dependentes do país rico e não têm condições para
escolher o seu parceiro.
·
têm preferência por se relacionar com o país ex-colonizador
porque existem laços que facilitam a comunicação (ex.: língua).
·
independentemente do parceiro que escolher, ficará sempre
com a pior parte da troca. Assim, os países pobres são cada vez mais pobres e
os países ricos são cada vez mais ricos.
Perspectiva Interna/Doméstica
As relações entre a periferia e o
centro de um país diferem consoante os países sejam do centro ou da periferia.
O centro do país do centro por vezes
é a capital, mas nem sempre. O centro é o conjunto de regiões dentro do país
onde se encontram as indústrias e a tecnologia de capital intensivo.
A periferia do país do centro é,
geralmente, a zona envolvente deste centro, e é composta por territórios
rurais, e no caso de existir indústria esta tem a ver com a extracção de
minério ou está relacionada com algo que se produz nas terras ou tem a ver com
as indústrias mais avançadas, mas cujos níveis de produção são mais baixos. As
populações da periferia são mais pobres, menos instruídas, são, pois, mais
carenciadas.
A relação entre os habitantes da
periferia e os habitantes do centro é pacífica, ambos consideram ter elos de
ligação, sendo o mais forte deles a pertença ao mesmo país. Aquilo que os
distingue é o grau de desenvolvimento.
Esta diferença do nível de vida é
ultrapassável porque as pessoas têm liberdade de movimento. Contudo, existem
núcleos de população de um país mais carenciado.
Como é que os habitantes do
centro fazem para que essas diferenças não se traduzam na degradação da coesão
do país?
Fazem concessões à periferia
(compram votos), precisam que a periferia os legitime. O centro promove uma
política de manutenção das expectativas.
A concordância e estabilidade
política dentro de um país do centro é mantida através desse jogo político.
Nos países da periferia estas
relações são muito diferentes. Os habitantes do centro recusam-se a partilhar
com os habitantes da periferia a sua riqueza.
Estar no centro de um país da
periferia é um privilégio e não é uma escolha. Viver no centro ou na periferia
de um país não é só uma diferença geográfica mas também uma diferença social.
Porque é que o centro se recusa a
partilhar a sua riqueza com a periferia?
Porque não existem tantos factores
de coesão e há uma diferenciação social e económica muito grande entre o centro
e os países da periferia são relações entre o país do centro e o centro do país
da periferia, não se relacionando com a periferia do país da periferia.
Assim, o país do centro encarrega,
subtilmente, o centro do país da periferia a manter-se assim.
As condições sociais dos países da
periferia facilitam a manutenção deste tipo de relações.
Esta explicação das relações
centro/periferia é aceitável sob uma perspectiva geral, já que se verifica uma
harmonia de interesses entre os estados. No entanto, esta explicação não
considera todas as relações possíveis entre o macro e o micro.
à
O centro dos países ricos controla de tal maneira o centro
dos países pobres que se esse centro não estiver satisfeito, pode, a qualquer
momento, destruí-lo e colocar outro no seu lugar.
Estas relações de legalidade da
autoridade nos países do centro e a efectividade da autoridade pela utilização
da força nos países da periferia gera a estabilidade do sistema.
à
Como resultado desta dicotomia centro/periferia vai haver um
desenvolvimento social desigual com uma fragmentação/divisão social muito
profunda nos países subdesenvolvidos. Toda esta instabilidade ajuda a que a
relação seja mantida numa base estrutural: centro (organizado, ordenado, com
conflitos sociais de baixa densidade), periferia (há uma grande estratificação
social, grandes conflitos sociais, e por isto vai ajudar a elite a manter o
domínio sobre a população, como convém ao centro).
à
No Sistema Internacional cada país periférico sujeita-se à
desigualdade e exploração do mercado, não existindo nenhum processo objectivo
de desenvolvimento económico destes países.
à
A única hipótese de mudança é as populações dos países do
3.º Mundo convencerem as suas elites a aliarem-se a fim de conseguir
desenvolver o país, mas isso implicaria a perde de privilégios que são
concedidos à elite pelo centro. Por isso, mantém-se a estabilidade para que
estes privilégios continuem a fluir. Isto faz com que a situação
centro/periferia se mantenha dentro da maior estabilidade possível. O
desequilíbrio social funciona como estabilizador do sistema.
Johan
Galtung classifica estas relações como sendo de domínio estrutural em três
aspectos negativos que vão reforçar a subordinação dos mais pobres:
1. Divisão Vertical do Trabalho: os actores
dividem-se em dois grupos: o grupo fornecedor de matérias-primas básicas, de
mão-de-obra barata (periferia), e o grupo fornecedor de tecnologia, capital,
mão-de-obra especializada (centro).
2. Fragmentação: ausência de relacionamento económico
horizontal, não há uma coordenação de interesses entre os países do sul, estes
preferem relacionar-se com os países do norte, competem entre si para obter
esse relacionamento.
Ao contrário dos países do sul, os
países do norte estão bem coordenados, relacionam-se com os países do sul
mediante uma estratégia pré-definida pelos países do norte (ex.: acordos de
Lomé).
3. Penetração: vem do conceito ”penetrating society
state” de Arthur Ashley. O facto do país do centro ter uma capacidade de
satisfazer necessidades do país do sul (bolsas de estudo, fazer uma escola,
relações culturais, ...) vai trazer um aumento das relações entre os dois
países. A penetração começa por ser, normalmente, no campo comercial, mas vai
alargar-se a todos os campos, condicionando o estado mais fraco dessa relação.
Thomas Weisskopf: refere, ainda, outros factores de
subordinação dos países pobres aos países ricos:
à
capacidade que o país do centro tem na formação das elites
do país da periferia, que vão enquadrar ideologicamente o país e o
comportamento social do país. Os países da periferia para satisfazer as
necessidades das elites terão de importar bens, pelo que irão aumentar a sua
dívida externa.
à
Brain Drain: atracção que o país do centro exerce
sobre as elites intelectuais dos países da periferia, o que faz com que muitas
vezes os “bolseiros” não regressem ao país de origem. Aqueles são aliciados
para o não fazerem. Assim, o país da periferia fica também subordinado ao país
do centro em termos de inteligência. Esta inteligência do país da periferia
favorece, ainda, o país do centro na medida em que um “bolseiro” quando
regressa ao seu país irá importar tecnologia que já conhece, que será,
normalmente, do país que o acolheu, o país do centro.
Todos estes factores de subordinação
levam à criação de uma “Labour Aristocracy”, o que significa que um pequeno
número de trabalhadores do país da periferia irão receber um ordenado maior,
passando a constituir uma burguesia, que terá um peso bruto que se traduzirá na
manutenção do status, contribuindo para os interesses do centro.
Perspectiva do Sistema-Mundo
O Sistema-Mundo aparece
integrado no Paradigma da Dependência como uma tentativa de explicação da
realidade internacional contemporânea baseada na anterioridade histórica.
A interpretação da realidade mundial
contemporânea só pode ser feita a partir de uma análise histórica.
Þ
Emmanuelle
Wallerstein:
à
Wallerstein, juntamente
com Modelsky, tem uma abordagem estruturalista das Relações Internacionais.
à
É nitidamente neo-marxista, e parte do princípio que a
unidade de análise não é o estado mas sim o sistema-mundo.
à
Wallerstein preocupa-se
com questões como por exemplo o porquê da nobreza perder tendencialmente o seu
poder. Ora, isto acontece porque há várias crises de cereais, que originam a
fome, e surgem, também, as pestes. Isto faz com que os camponeses se revoltem
contra a nobreza.
Os burgueses, por sua vez, para além de
produzirem bens, vão produzir serviços e colocam-se à disposição de quem tem
dinheiro para lhes pagar, ou seja, a nobreza.
à
Para Wallerstein
o capitalismo nasce a partir da imaginação criativa da nobreza, que quer
transferir-se para os centros de poder, nem que para isso tenha de trabalhar
como os burgueses fazem. Há um movimento que faz com que a nobreza se transfira
do seu estatuto para onde está o poder, na burguesia.
à
Considera que o Sistema-Mundo não é mais do que um
sistema capitalista contemporâneo, baseado na economia-mundo. A
economia-mundo é uma divisão internacional do trabalho, divisão única à
qual não corresponde uma cultura única nem uma política mundial. Há vários
povos diferentes a contribuírem para essa economia, mas não há uma estrutura
política que os englobe a todos. Na ausência desta estrutura política,
é o mercado que está encarregue de redistribuir os lucros da produção.
Funcionamento do Sistema-Mundo:
à
Wallerstein define o modo
de produção capitalista a partir do momento em que o produto se destina à troca
e não ao consumo. A produção é feita consoante a sua rentabilidade no mercado -
só se produz aquilo que se consegue vender. Se o mercado não absorver o produto,
não se produz. A dinâmica do mercado é, então, a optimização de um produto que
se mantém no mercado, mas a concorrência deve fazer com que as pessoas tenham
alternativas, escolhas.
à
Na ausência da estrutura política é o mercado que
redistribui os excedentes.
à
O mercado é único mas funciona sobre uma diversidade de
culturas.
Mas às vezes o mercado proporciona muitos problemas a alguns povos e muitas
riquezas a outros. Mas há quem diga que isso não é importante, afirmando que
aquilo que realmente interessa é que o mercado funcione. Tal concepção está
errada.
à
Para que a harmonia e o equilíbrio do mercado não represente
o objectivo omnipresente que se sobrepõe até mesmo aos direitos das pessoas, há
entidades que interagem no sentido de evitar tal situação. Essas entidades são
os estados, que actuam nos interesses das pessoas.
à
Os estados, como unidades políticas, vão interferir no
desenvolvimento normal do mercado, no livre-cambismo, porque não há uma
estrutura política sobre este sistema.
à
Esta interferência do estado nas leis do mercado faz
distorcer os mecanismos desse mercado. Muitas vezes essa interferência é
motivada pelo interesse que cada estado tem de participar no capitalismo,
ocupando um posição de vantagem.
à
Enquanto agentes de mercado, os estados querem que a
competência dos outros não interfira com as suas obtenções de lucro. Todos
podem vender, mas é preciso que o seu “produto” seja o mais aceitável. Assim,
gera-se a competitividade.
à
O estado desvirtua a liberdade de trocas. Permite
que as leis de mercado não sejam as únicas a existir.
à
Nem todos os estados estão de acordo uns com os outros no
que diz respeito à redistribuição dos excedentes, pois:
¨
um dos interesses dos estados quando fazem a redistribuição
dos excedentes é manter o mercado a funcionar. Um estado só redistribui os
excedentes para manter a instabilidade dentro dos limites aceitáveis, se ele
der total liberdade ao mercado verificar-se-á não a redistribuição mas sim a
distribuição dos excedentes, o que levará à formação de grandes fossos de
riqueza, o que se traduz numa instabilidade que o estado não pode controlar.
¨
outro interesse dos estados nessa redistribuição dos
excedentes é o preenchimento de interesses próprios ou de determinadas elites.
à
As pessoas só são importantes para participar no jogo de
mercado, e para isso têm de ser condicionadas.
à
Existem solidariedades culturais que têm poder suficiente
para alterar as regras de mercado.
à
É o mercado que tem de se adaptar aos factores culturais
e servir as “vontades” dos povos, e não são as culturas que têm de se
adaptar aos novos mercados.
à
Os estados visam proteger os seus interesses, e a sua arma
de protecção é política, e a guerra é a continuação da política.
à
Wallerstein diz que a
superação do poder político pelo poder económico é um salto criativo da
imaginação capitalista das classes no poder. O mercado está, a partir de agora,
nas mãos de quem detém o poder político, e surge como uma forma alternativa de
apropriação dos excedentes. Para isto são necessárias três condições:
·
expansão
geográfica:
é preciso levar os mercados a todos os locais, e é preciso haver procura de
produtos diferentes para que possam haver trocas.
·
especialização
económica dos espaços: é a chamada divisão internacional do trabalho, isto é, cada
espaço especializa-se naquilo que melhor produz, para poder realizar trocas
(ex.: se o açúcar é um recurso e se é no Brasil que há condições para essa
produção, então, especializa-se o Brasil na produção do açúcar). Isto exige a
detenção de poder político.
·
desenvolvimento
do estado absoluto: é preciso acabar com a pulverização de poder, é preciso uma
liderança que reunisse o poder necessário para decidir sobre determinadas
questões. É a concentração do poder que leva ao nascimento do estado moderno do
tipo ocidental.
A génese do capitalismo terá sido o triunfo de um novo grupo
social.
Neste novo modo de produção e de
mercado, o sistema opera segundo duas lutas:
·
há uma oposição entre a burguesia e o proletariado.
·
há, também, uma oposição entre o centro e a periferia.
Estas lutas
têm conseguido gerir o sistema, através de uma recomposição
hierárquica espacial.
Na concepção do Sistema-Mundo, Wallerstein verifica que o centro não é
sempre centro e a periferia não é sempre periferia, bem como o proletariado não
é sempre proletariado.
Os centros geográficos do poder
não estão sempre localizados no mesmo sítio. Esta reorganização periódica
da hierarquia dos centros de poder não pretende acabar com as lutas e as
rivalidades acima referidas, pretende sim é manter o sistema capitalista.
Este sistema capitalista permitiu,
ao longo dos últimos 5 séculos, responder a uma série de crises económicas
cíclicas.
Quando o sistema está em
desequilíbrio é preciso restabelecer a estabilidade. E a forma de
restabelecer a estabilidade é comprando-a.
Há duas formas de “comprar” a
estabilidade:
·
é preciso haver repressão: mas tal nem
sempre funciona pelo que se verifica uma ruptura que, por sua vez, leva a uma
nova planificação dos centros. Há uma reforma que visa manter a estabilidade no
futuro.
·
é preciso haver reforma: remodelar o
mercado, o sistema para que não volte a acontecer uma situação de crise.
Os ciclos de repressão e de reforma
justificam-se para que o mercado possa continuar a funcionar.
Quando se pretende
reprimir é o estado quem actua, quando se pretende compensar são os
agentes de mercado quem actuam.
Contudo, há limites de actuação: até
onde é que podemos comprar os autores da instabilidade?
É preciso “alimentar” o sistema de
forma a manter a sua credibilidade. Criar expectativas é criar compromissos.
Ex.: o preço da compra dos autores da instabilidade deve estar de acordo com os
interesses do comprador.
É preciso manter uma diferença
substancial entre os lucros finais e o investimento que se faz para manter as
pessoas a comportarem-se da maneira que devem, de modo a manter a expectativa
do investimento.
O sistema é
instável por natureza porque tem uma dinâmica própria. Se eu acabo com a
instabilidade tenho um sistema
socialista, se eu não acabo com a instabilidade tenho um sistema capitalista.
Aquilo que me interessa é manter o
sistema capitalista, então, acabo com a instabilidade mas dentro de um
certo limite.
à
O sistema de Wallerstein compõem-se por: centro,
semi-periferia e periferia.
à
Wallerstein criou o termo
semi-periferia, definindo-o como uma dimensão espacial que tem, também uma
função estabilizadora. A semi-periferia é tratada pelo centro de uma forma que
convém aos interesses deste: o centro dá-lhe um certo poder de modo a que a
semi-periferia possa agir livremente mas sem ferir os interesses do centro.
à
A semi-periferia é, ao mesmo tempo, exploradora e
explorada, e também um meio estabilizador do sistema.
à
A semi-periferia é mais um instrumento político para evitar
a pulverização de determinadas crises do que uma necessidade económica, ela
existe não por ser necessária ao funcionamento do sistema económico, mas por
ser um instrumento político preciso à contenção da instabilidade, dentro de
determinados limites.
à
O estado é o meio de fazer as redistribuições entre estes
três estratos: o centro, a semi-periferia e a periferia. O estado pode ser
utilizado como meio de intervir no mercado, e pode, também, servir para
promover a estabilidade, e ser utilizado no interesse geral ou para potenciar
um grupo de interesses contra outro.
à
Existem, também, outros factores (culturais, solidariedades
sociais, etc.) que podem alterar as regras de mercado e utilizar instrumentos
de correcção e intervenção do estado no mercado. Ex.: “leader less public”.
à
Wallerstein diz que o
estado é um produto residual do capitalismo, a razão de ser do estado é
participar enquanto elemento funcional no arranque deste Sistema-Mundo.
à
O sistema no seu funcionamento, com interferência do estado,
já atingiu uma independência tal, que é capaz de moldar o estado. O sistema
deixou de defender o estado e passou a utilizá-lo.
No entanto, as relações estatais são
importantes e fundamentais para manter a estabilização do sistema.
à
Wallerstein diz que a
Economia-Mundo não depende da existência de estados, a essência do capitalismo
é a relação entre os estados.
à
Wallerstein defende,
ainda, a ideia de que não é a subida ao poder da classe proletária que irá
desencadear o desenvolvimento do sistema.
Críticas a Wallenstein:
·
não consegue ter uma teoria estrutural que explique a
totalidade do sistema.
·
não se pode explicar as relações internacionais por uma
teoria que tem unicamente em conta o factor económico. Wallerstein esquece de
tudo o resto, e não toma em conta outros factores, não faz uma análise do
conjunto.
·
os factores culturais alteram o funcionamento do mercado mas
não as regras.
Þ
Modelsky: teoria dos
ciclos
à
Modelsky sustenta que
a importância do plano político é dominante mas não exclusiva, incluindo os
elementos económicos e culturais para explicar a evolução.
à
Afirma que há uma ordem dentro da sociedade, a qual
necessita de liderança.
à
Tal como o faz Wallerstein, Modelsky defende que o estado deixou de ser a unidade de análise
fundamental, papel assumido agora pelo sistema internacional.
à
O ponto de partida de Modelsky
é a estrutura dos últimos 500 anos da história no plano global.
à
A teoria dos ciclos é uma abordagem histórica dos
desenvolvimentos económicos e sociais. O ciclo, para além de se repetir,
introduz algo de novo cada vez que se produz, modificando e condicionando a
promoção do ciclo seguinte.
à
Modelsky caracteriza os ciclos de duas maneiras:
1. processo de
repetição conservador (de um ciclo para o outro há sempre parâmetros
idênticos).
2. dinâmica: em
cada ciclo há um ciclo dinâmico, ou seja, a repetição não é total. O que se
repete é o ciclo (movimento), mas dentro de cada um, não há repetição
relativamente ao ciclo anterior, é sempre diferente. Esta diferença decorre da
dinâmica política e social dos fenómenos perante a chegada da modernidade.
Ou
seja, os ciclos são conservadores no aspecto da sua repetição, mas são, também,
um processo progressivo de aprendizagem. Nunca mais pode haver um ciclo igual a
outro; quando entramos no próximo levamos uma experiência adquirida do anterior
e lidamos com os problemas de maneira diferente em termos de achar soluções.
É
esta a teoria que explica o progresso destes 500 anos.
à
Modelsky considera necessária a liderança. E quando fala
desta necessidade refere-se ao papel específico de uma grande potência. Mas
liderança não é hegemonia nem domínio.
Todos os estados têm necessidade de
satisfazer os seus interesses e todos os estados perceberam que era necessário
obterem um determinado padrão de relacionamento com outros estados, para
poderem satisfazer aqueles interesses. Isto leva a uma complexificação deste
padrão de relacionamentos que resultou na satisfação daqueles interesses,
reduzindo o espaço da anarquia e aumentando a ordem, levando à criação de uma
base de legitimidade. Aparece um estado líder capaz de manter a ordem pela
legitimidade.
à
O critério que subjaz à liderança é a satisfação dos
interesses gerais baseada na legitimidade. Esta capacidade de liderança é
reconhecida pelos outros estados, pois são estes que reconhecem no líder as
capacidades para fornecer as condições para que a ordem se estabeleça.
à
O principal contributo que a liderança dá ao sistema é a
capacidade de organizar e prever antecipadamente os grandes problemas do
sistema, da organização mundial.
à
As características da liderança são:
1. é necessário
distinguir liderança de domínio e de hegemonia. Os critérios para esta
distinção são o interesse comum e a legitimidade. Quando um estado actua no
interesse comum e nas suas acções verifica-se legitimidade, é a liderança.
Quando um estado actua no interesse próprio, ainda que tenha maior liberdade de
acção, tem menos legitimidade, é a hegemonia. Na liderança não há sobreposição
de uma potência em relação às outras, mas sim uma capacidade muito grande de
fornecer a ordem internacional.
2. não é um
governo mundial nem uma estrutura organizacional.
3. é um conjunto
de funções desempenhadas por um estado que tem a capacidade de fazer as coisas
certas nas alturas certas, sendo isto o que confere legitimidade à liderança.
4. não é uma
demonstração de poder, mas a realização de serviços sociais para servir de
modelo à política global e dar-lhe impacto. Estes serviços são:
·
a elaboração de programas: identificação, definição e
clarificação das grandes problemáticas do futuro, o que inclui a fixação de
prioridades.
·
mobilização: capacidade de construir coligações de
suporte ao sistema global existente.
·
tomada de decisão: sobre a direcção da política no
sistema-mundo durante um determinado período. Esta decisão tem de ser aplicada,
sendo necessário para isso, a potência líder possuir capacidade administrativa
para a execução das decisões.
·
inovação: é imprevisível nos seus resultados.
à
O ciclo longo funciona como um processo de equilíbrio
evolutivo entre políticas legitimadas e políticas de poder (não são legitimadas
pela comunidade internacional mas sim pela nacional), ou seja, dentro de um
ciclo há uma potência líder com todas as características para assumir a
liderança.
à
No actual sistema mundial, Modelsky reconhece 5 grandes
ciclos:
5. Portugal (séc.
XVI) ---- Espanha
6. Holanda (séc.
XVII) --- França
7. Inglaterra (séc. XVIII) - Alemanha rivais
a estas potências líderes
8. Inglaterra
(séc. XIX) --- Alemanha
9. E. U. A. (séc. XX) ----- U. R. S. S.
à
Cada ciclo tem uma estrutura: começa por
haver uma guerra global, depois dá-se a afirmação do poder mundial, que é
consolidado em termos políticos e económicos, levando à legitimação. Depois
começa a haver uma perda gradual da legitimidade, devido a uma possível
fragmentação interna que leva à perda das capacidades de manter a ordem ou à
afirmação de outras potências que podem vir a liderar. Por fim, dá-se a
desconcentração ou fragmentação do poder pois há competição entre vários pólos
que põem em causa a capacidade do líder manter a ordem. Isto leva ao fim de um
ciclo e ao início de outro.
Condições
necessárias para liderar:
1. posição geo-estratégica: o ideal é que o estado tenha um
território seguro, uma plataforma de onde ele possa observar e debater os
problemas mundiais. A característica geográfica ideal seria a de uma ilha, uma
posição insular. Isto ditou sempre a posição de Inglaterra em relação aos
problemas europeus.
2. coesão social interna: necessidade de haver uma
sociedade coerente, estável, digna de ser seguida. Tem de ser uma sociedade
capaz de uma acção colectiva e com bom relacionamento entre a chefia e as
bases, com a capacidade de fazer coligações e gerar consensos.
3. alcance do poder do sistema político: tem de ser de
alcance global, tem de ter forças efectivas de alcance global, capacidade de
projectar o poder num sentido muito mais vasto. Modelsky acha que o ideal em
temos de alcance de poder são os países marítimos.
4. economia forte: de importância mundial e com
indústrias de alta tecnologia, e com capacidades de comércio internacional.
5. capacidade de inovação e resposta aos problemas mundiais
emergentes:
está ligado à experiência que se recolhe e que é interiorizada, passando a ser
prática costumeira. Modelsky diz que este é um “ingrediente secreto” porque não
se pode quantificar e avaliar.
à
Durante a vigência da liderança, a potência líder vai
usufruir de determinadas vantagens e vai-se consolidando em determinados
sentidos. Um deles é ir adquirindo mais segurança, que transmite aos outros.
à
Na sua análise, Modelsky considera, ainda, a componente
política, e diz que a interpenetração entre os factores políticos e económicos
é muito importante.
à
O que se verifica nos ciclos é que há uma alternância entre
a prevalência do domínio do factor político e do factor económico. Esta
alternância gera, também, uma alternância entre expansão económica e
crescimento político.
à
As R.I. são estruturadas num sistema capitalista mundial,
sistema este que gera assimetrias na redistribuição dos excedentes e, por isso,
que gera dependências dos mais pobres em relação aos mais ricos.
à
Aos olhos de Modelsky, se isto se mantiver e se não houver
inovação política, vai aumentar a desconcentração e fragmentação do poder, dado
o aparecimento de pólos de poder que vão aumentando e querendo ser
alternativos. Vai haver competição pela liderança, e a preocupação com o
interesse comum tende a desaparecer.
à
Não existe um sistema político que corrija estas
assimetrias, todas as acções que há são conjunturais, existem para actuar
naquela conjuntura e não na estrutura porque não há um sistema político
mundial.
Modelsky aponta as seguintes
soluções:
·
diferenciação
interna das funções que cabem à liderança, e a especialização de um grupo de
países nessas funções (constituição de
áreas funcionais). No fundo, isto é uma divisão internacional do trabalho
aplicada ao nível da liderança. Assim, diversos países irão partilhar a
liderança, o que não significa que a competição irá desaparecer. Mas tal
solução levantaria um problema, que se traduz na coordenação de funções e a
chegada a um consenso.
·
constituição
de coligações, em que a liderança seria partilhada por um grupo de
países. Contudo, Modelsky não aponta a forma ideal para isto acontecer.
Pressupõe-se que seja a integração.
Comparações
entre Modelsky e Wallerstein
1. Ambos
reconhecem a existência de um sistema mundial único que é a base global, que
vigorou no mundo pelo menos 500 anos, com os seus componentes políticos,
económicos e culturais.
2. Conferem
importância diferenciada a estes componentes, e entre si não chegam a um
consenso para saber qual deles é o dominante. Wallerstein diz que é o económico
e Modelsky diz que é o político.
3. Têm em comum a
centração das relações/interacções no conceito de sistema mundial.
Independentemente de entre quais os elementos se dão estas interacções,
concordam que se realizam no contexto do sistema-mundo. Estas interacções devem
ser analisadas numa perspectiva histórica e cultural. É uma perspectiva
dinâmica que se manifesta em ciclos - Modelsky vai buscar os ciclos para a sua
teoria; Wallerstein admite a sua existência porque concede a uma ou outra
potência o primado da hegemonia em cada um dos séculos, embora não fale em
ciclos.
4. Verifica-se um
holismo porque a análise compreende um período assinalável (500 anos), tempo
suficiente para haver uma evolução histórica e cultural evidente.
5. Há também um
aspecto direccional, pois todos os sectores políticos, económicos, culturais e
sociais, estão incluídos na análise.
6. Também se
verifica inovação porque os limites do objecto das R.I. alargaram-se pela
inclusão de todos aqueles sectores interactivos.
Críticas ao Paradigma da Dependência
Feitas
pelos realistas, defensores do Paradigma Tradicional.
1. Dizem que o
P.D. tem um carácter inconsistente de que existe um novo tipo de sociedade.
A sociedade é a mesma, os comportamentos é que são diferentes.
2. As condições
da sociedade não mudaram assim tanto como os adeptos da teoria da dependência
querem fazer crer. Podem existir novas instituições mas o certo é que a
diferença e o fosso de desenvolvimento sempre existiram.
3. Não foi a
colonização que provocou as diferenças de desenvolvimento, aproveitou e
aprofundou-as. A descolonização internacionalizou-as.
4. O P.D. não
se pronuncia sobre fenómenos clássicos da perspectiva internacional, que
são centrais. Não se pronuncia sobre a paz ou a guerra. Baseia a sua análise
numa simplificação da perspectiva internacional, o que reduz a sociedade actual.
5. O P.D. não
é capaz de explicar que os países do 3.º Mundo têm economias prósperas, nem que
os países do “1.º Mundo” sobrevivem sem ter uma economia capitalista (NIC-
New Industrialized Countries).
6. Este paradigma
não serve para explicar a sociedade actual, pois fixa-se apenas nas
relações económicas internacionais. Constrói as suas teorias baseadas na
dicotomia entre parte dominada e parte dominadora, deixando de lado uma série
de problemas que também marcam a sociedade actual.
No
P.D. a sociedade continua a ser conflitual, simplesmente o conflito deixa de
ser baseado em diferenças político-ideológicas e passa a ser baseado em
diferenças de interesse económico. Estes conflitos são resolvidos através de
uma sociedade que é dominada pelos países industrializados, e a tendência é
para isto se manter, não há evolução.
PARADIGMA DA INTERDEPENDÊNCIA
Este paradigma surge simultaneamente com o Paradigma
da Dependência. Ambos concordam que o Paradigma Tradicional já não é
suficiente, mas discordam com realidade que agora surge.
Enquanto o Paradigma da Dependência acentua a natureza
desequilibrada da ordem internacional, em que uns dominam e outros são
dominados, o Paradigma da
Interdependência diz que todos são interdependentes (há países
totalmente dependentes e há países que são quase independentes).
As condições após a II G.M. produzem um contexto
acelerado de mudança e as problemáticas que surgem não cabem dentro de uma
dicotomia simplista de que o conflito é a base da relação. Isto vai desaparecer
devido a uma série de causas:
·
os países não vão ser capazes de defender
isoladamente os seus interesses nacionais.
·
O interesse nacional continua a ser a base da
decisão dentro de cada país, mas cada vez mais os
países têm que contar com a dimensão exógena (os “inputs” que lhe vão limitar a
capacidade de escolha e de decisão interna em relação ao seu interesse
nacional).
·
Vai haver um aumento de actores das R.I., não só
em quantidade mas também em qualidade. Aparecem mais estados e organizações
intergovernamentais, actores transnacionais, o que provoca uma intensificação
das interacções entre estes novos actores.
·
Há uma consciencialização progressiva das
elites para o facto da globalidade dos problemas. Os problemas não podem
ser resolvidos unilateralmente por um estado, pois o facto de haver actores não
estaduais obriga os estados a abrirem-se e limitam o seu campo de acção e
capacidade de resolver os seus problemas. Isto gera fenómenos de
interdependência - o estado passa a depender também de outros actores e
estes a depender dos estados. O estado só por si não vai ser capaz de
responder aos seus problemas.
·
O fenómeno de “linkage” torna-se cada vez mais
intenso, as fronteiras deixam de fazer sentido. A política interna de um estado
não pode ser pensada a partir de premissas internas, tem que ser a partir de
uma perspectiva da comunidade internacional. Também a política externa não ode
contar apenas com a política interna, mas também com o ambiente externo
(internacional). Esta ligação do
ambiente doméstico e internacional é uma característica fundamental da
interdependência.
à
O Paradigma da Interdependência surgiu no mundo
anglo-saxónico. São os vencedores da II G.M. que vêm dizer que quanto mais
livre for o comércio melhor para todos, já que todos são interdependentes.
à
Consideram que há algo novo na sociedade que é
muito importante, que é a diferença entre ricos e pobres, e pretendem analisar
a causa dessa diferença.
à
Aquilo que caracteriza a sociedade internacional
do pós-guerra não é, somente, essa diferença entre ricos e pobres, há outros
factores mais relevantes.
à
A tendência do mundo interdependentista é para o
equilíbrio, e não para a manutenção do desequilíbrio (como diziam os
dependentistas).
Características do Paradigma da Interdependência:
1.
aceleração dos ritmos de desenvolvimento
económico, social, científico e tecnológico. Este desenvolvimento vai potenciar
um fenómeno na realidade internacional que é a inevitabilidade da
interdependência e da cooperação entre os actores.
2.
enfraquecimento do papel do estado
que já não é capaz de desempenhar as funções que lhe são correspondentes. O aparecimento
de novos actores tende a limitar a acção dos estados. A convergência e a
complementaridade destes dois aspectos vem provar e confirmar a ruptura com a
perspectiva estato-cêntrica do Paradigma Tradicional.
3.
a cooperação vai originar uma possível
abertura do estado ao exterior, o que leva ao aumento da interdependência,
a redução da margem de manobra e autonomia do estado. Por isso, torna-se
difícil separar a política interna da política internacional.
Transformações das R.I. no Pós-Guerra:
1.
O estado entra em competição com novos
actores das R.I., que têm poder suficiente para competir com os estados. Ao
competir, o estado perde poder porque altera os seus meios de actuação. Isto
leva o estado a cooperar com outros actores, para conseguir atingir os seus
objectivos.
2.
Os outros actores que aparecem são muito
diversificados, quer na sua origem, quer na sua capacidade de
projecção de poder, etc.. São em grande número e originam centros de poder.
Intensificam-se as relações transnacionais, o que acentua o fenómeno de
“linkage” (as ligações entre os problemas internos e os externos são cada vez
mais fortes. Os estados são cada vez mais vulneráveis à política externa.
3.
Alterou-se o tipo de economia e a natureza das
relações propriamente dita. A economia é a organização e o ambiente em
que as pessoas vivem. Estamos numa época em que a economia é de fluxo e não
de armazenamento. Quanto às relações, aquilo que realmente interessa não
é o emissor e o receptor mas sim o fluxo, que contém a mensagem. Esta é
mais importante que o contacto entre os actores.
4.
A identificação de interesses comuns transforma
a realidade internacional. Quando nós não temos o poder suficiente para
resolver um conflito a nosso favor, temos que fazer a segunda melhor escolha.
Isto faz com que a hierarquia dos objectivos se altere circunstancialmente.
5.
Existem, ainda, os interesses comuns globais
(ambientais, tráfico de drogas, doenças contagiosas). São problemas que
interessam resolver aos cidadãos, a toda a comunidade internacional. Assim, a
comunidade internacional actua não sob uma estratégia estadual mas sim de
cooperação, passam por cima de qualquer conflito que os estados possam ter
entre si.
A globalização
das problemáticas veio por em dúvida as “power politics”, toda esta capacidade
está desvalorizada porque a sua utilização é menos aplicável.
Consequências que este paradigma trouxe para a abordagem das R.I.
como ciência:
1.
inovação:
introdução de novas perspectivas de actuação no campo das R.I.. Houve uma
redefinição e uma ampliação do campo de estudo, o que obrigou à adaptação dos
conceitos à nova realidade internacional.
2.
desaparecimento
da distinção entre o que é interno e o que é internacional.
Passamos do sistema internacional clássico para um sistema mundial global,
afirmando uma perspectiva holística do fenómenos sociais inseridos nesse
sistema.
3.
os teóricos da interdependência deixam de ver a
sociedade internacional como uma sociedade de base conflitual, para passarem a
vê-la como um sistema em que os
comportamentos cooperativos se sobrepõem aos próprios comportamentos
conflituais. Isto resulta da ampliação das estruturas e dos processos que
operam no sistema internacional. AS fronteiras passam a ser puramente
imagináveis. Os estados têm comportamentos cooperativos porque não têm outra
hipótese.
4.
campo
dos actores: houve uma multiplicação quer quantitativa quer
qualitativa dos actores.
5.
campo
dos valores: houve uma alteração dos valores vigentes,
daqueles que prevalecem no sistema. Passa-se de valores individualistas para
valores universais que dizem respeito aos interesses comuns.
Críticas ao Paradigma da Interdependência:
Os maiores críticos a este paradigma são os realistas,
defensores do Paradigma Tradicional.
1. As
várias afirmações que postulam a alteração da sociedade internacional não
são consistentes, não são totalmente verificáveis. Uma coisa é considerar
que existe uma diferença fundamental na sociedade ao considerar que existem
mudanças que são provocadas pela alteração qualitativa dos actores e pelo
aumento das interdependências. Outra coisa é achar que essas mudanças
produzidas por essas alterações constituem um novo tipo de política
internacional que precisem de um novo paradigma. Os realistas dizem que
o estado continua a ser o actor decisivo dentro deste sistema.
2. Mesmo
os “problemas comuns globalizantes” só podem ser resolvidos de acordo com as
formas tradicionais, como a diplomacia, a pressão económica, a ponderação entre
recompensas e consequências, etc.. O P.I. recorre aos métodos já utilizados
pelo Paradigma Tradicional.