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quinta-feira, 20 de novembro de 2003

Tempo Acima da Nuvens

19/03/89 – Quebec, Canadá – Um poderosa e indesejada corrente elétrica flui pelos cabos de alta tensão queimando transformadores em uma usina de força. Seis milhões de pessoas ficam sem energia elétrica por mais de 9 horas.

Recentemente um satélite japonês teve uma pane irrecuperável. Os técnicos acreditam que houve uma descarga elétrica que danificou os circuitos do satélite.

O que estes dois fatos isolados tem em comum? Ambos aconteceram durante severas tempestades solares que atingiram a Terra.

O que é uma tempestade solar? Como se forma? De onde vem?

Parece óbvio que o Sol é o astro mais energético do Sistema Solar. Sob todos os aspectos estamos sob sua influência, não só do ponto de vista gravitacional. Recebemos do Sol quantidade enormes de energia. Além da luz visível, uma variada quantidade de radiações: infravermelha, ultravioleta, raios gama, raios X, ondas de rádio, tudo isso chega ao topo da nossa atmosfera mas nem tudo chega ao solo. Isto é muito bom para nós uma vez que a maior parte desta radiação é danosa a vida.

O Sol é constituído de gases (principalmente hidrogênio e hélio) muito quentes e ionizados. Isto quer dizer que as cargas elétricas destes gases estão separadas: núcleos atômicos e elétrons movem-se livremente. Este estado da matéria recebe o nome de Plasma.

Cargas elétricas em movimento produzem correntes que por sua vez geram campos magnéticos. O plasma tem a propriedade de carregar consigo campos magnéticos. Constantemente fluem partículas subatômicas (núcleos de hidrogênio, partículas alfa, elétrons, prótons) do Sol carregando consigo campo magnético. É o chamado Vento Solar. Este plasma solar em movimento flui através do espaço interplanetário.

A Terra tem seu próprio campo magnético produzido em seu núcleo altamente condutor de eletricidade que gira rapidamente. O núcleo da Terra é constituído essencialmente de ferro e níquel e produz um campo semelhante a de uma barra imantada cujo eixo se inclina somente alguns graus em relação ao eixo de rotação do planeta. As linhas de campo formam um desenho de camadas (semelhante a um cebola) ao redor da Terra, é o que chamamos magnetosfera. Estas camadas de campos superpostos agem como uma "gaiola magnética" afastando o vento solar da superfície e da atmosfera.

A região de equilíbrio entre a magnetosfera e o vento solar é chamada magnetopausa. Esta superfície tem um formato vagamente assemelhado a um parabolóide com o "vértice" voltado para o Sol. Pouquíssimas partículas solares penetram esta região. Nas regiões polares onde as linhas de campo magnético estão quase verticais em relação ao solo partículas solares podem penetrar e atingir a atmosfera. Estas partículas quando colidem com os átomos da nossa atmosfera produzem uma luminosidade semelhante a das lâmpadas florescentes. São as AURORAS (boreais se acontecem no hemisfério norte, austrais no sul).

http://www.cetp.ipsl.frhttp://www.hq.nasa.gov http://astronomy.swin.edu.au

Todos os satélites utilitários (comunicação, meteorologia, observação da terra etc.) estão dentro da magnetopausa, protegidos das radiações solares.

O Sol é extremamente dinâmico. Seu interior em constante reação termonuclear está submetido a variações de pressão, rotação e campos magnéticos. As linhas de campo no interior solar poderiam ser comparadas a linhas elásticas sendo enroladas e comprimidas pela rotação solar. Lembremos que o Sol não é um corpo rígido e como tal tem rotações diferenciadas conforme a profundidade e latitude. Isto faz com que as linhas de campo sob a superfície solar "saltem" para fora da superfície devido a repulsão mútua. Isto cria regiões isoladas de intensidade magnética extremamente alta. Esta é a explicação mais aceita para as MANCHAS SOLARES, áreas menos brilhantes da superfície solar. Nelas a temperatura está em torno de 4000ºC contra a média de 6000ºC.

As manchas solares costumam surgir em pares de polaridades opostas. Estes pares formam conjuntos complexos. Acima destes conjuntos de manchas surgem arcos de campos magnéticos saindo de uma mancha e entrando na mancha de polaridade oposta.

(a) (b) - Imagens da coroa solar em raios X e da fotosfera em outro cumprimento de onda - satélite Yohkoh em 04/01/94.
(c) (d) Gráficos dos respectivos campos magnéticos de topo e perfil.(David H. Hathaway - NASA) -

Estes arcos levam toneladas de plasma solar para centenas de milhares de km acima da superfície e são chamados proeminências.

O número de manchas na superfície solar tem sido registrado desde os primórdios da astronomia telescópica com Galileu (sec.XVII). Notou-se que a média mensal de manchas tem um período de aproximadamente 11 anos de atividade solar. Durante um máximo, que pode durar de 2 a 4 anos, o número de manchas aumenta. Mais manchas, mais proeminências. É exatamente nas proeminências que acontecem o que se usou chamar de explosões solares, quando estes poderosos campos magnético comprimem e aquecem o plasma.

Imagem ultravioleta obtida pelo satélite SOHO (Solar and Heliospheric Observatory) mostrando a evolução de um flare em 1996. (ESA/NASA) -

As grandes porções de plasma que se concentram nestas explosões atingem temperaturas altíssimas emitindo grandes quantidades de raios X e ondas de rádio facilmente detectadas por satélites e radiotelescópios. Ocasionalmente estes laços de plasma rarefeito, quente e cheio de partículas energéticas se "rompem" espalhando pelo espaço uma espécie de "chama solar" denominada de FLARE. Movendo-se a velocidades enormes podem atingir a órbita da Terra em um dia ou dois. Se o plasma se mover na direção da Terra e chegar a atingi-la temos uma TEMPESTADE SOLAR, um aumento considerável da temperatura, densidade e campo magnético do vento solar Este fenômeno é precedido de um flash de raios X e ondas de rádio. Quando o plasma atinge a magnetopausa deforma-a podendo expor os satélites mais externos (geoestacionários) a um fluxo perigoso de prótons que podem causar danos na eletrônica de bordo. Nestas situações o fluxo de partículas que penetra nos pólos aumenta e as auroras ser tornam mais intensas e visíveis em latitudes ainda menores.

Os satélites de órbita mais baixa podem ser prejudicados por uma variação nas camadas atmosféricas mais altas podendo aumentar o atrito atmosférico influenciando na órbita e no tempo de vida do satélite. Naves e estações tripuladas ficam em alerta quanto ao risco de radiação nocivas aos astronautas. Durante estes eventos evitam atividades extraveiculares.

Neste contexto temos um novo ramo do conhecimento dentro das ciências espaciais: uma espécie de "meteorologia espacial" que estudaria o "clima" acima das nuvens. Acompanhar as condições do meio interplanetário tornou-se uma preocupação real. Vários órgãos fazem o acompanhamento deste "clima" 24 hs por dia através de satélites especialmente desenhados para isso.

Referências Bibliográficas:

Foto tirada durante o IV Enast, Salvador, BA.

Autor/Colunista: Naelton Mendes de Araujo
Nascido em 18/09/1963
Bacharel em Astronomia, Obs. Valongo/UFRJ, 1992.
Analista Orbital (Star One/Embratel)
Interessado em Astronáutica, Divulgação, História, Ensino, Física Solar, Planetas, Radioastronomia e Relógios Solares.
Residente no Rio de Janeiro, RJ
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