Forma de dança cênica,
geralmente baseada em técnica acadêmica (a danse d'école), com coreografia
definida e acompanhamento musical.
O jogo entre tradição e inovação,
presente em todas as artes, tem sido também a dinâmica que manteve vivo o
balé e permitiu sua evolução. As duas tendências aprenderam a conviver
harmonicamente, extraindo de sua inter-relação um fértil campo criativo.
O balé é uma forma de dança,
concebida e treinada em academias, apresentada ao público como espetáculo
teatral, quase sempre musicado, no qual se conjugam cenários, figurinos e
iluminação. Sobre o tema musical, o coreógrafo cria um conjunto de
movimentos, executados pelos bailarinos, que constituem uma linguagem simbólica
pela qual se pode transmitir um argumento.
Primórdios. Uma das primeiras
formas de expressão do balé, surgida na corte francesa no século XIV, foi a
mascarade de cour, dança mais ou menos improvisada apresentada por nobres no
decorrer dos bailes. No final do século seguinte apareceram os entremezes,
mais elaborados, apresentados durante festas e comemorações reais. Na Itália,
o primeiro balé de que se tem notícia foi organizado por Bergonzio Di Botta
em 1489, para comemorar o casamento do duque de Milão.
Levado da Itália por Catarina de
Medici, o balé chegou à corte francesa pelas mãos do músico italiano
Balthazar Beaujoyeux, que criou o Ballet Comique de la Reine. O espetáculo
tornou-se um marco na história do balé e da ópera, com cenários numerosos
e riquíssimos, cinqüenta figurantes e quase dez mil espectadores, que
durante cinco horas assistiram a um monumental desfile de danças, música e
carros alegóricos.
Durante os reinados de Maria de Medici
e Henrique IV, o balé se restringia a danças curtas e cenas grotescas,
pretexto para brincadeiras e farsas obscenas que muito agradavam à corte. Com
Luís XIII os espetáculos ganharam luxo, mas os temas continuaram os mesmos,
com a finalidade de fazer rir. O próprio rei aceitava o papel de dançarino
ou de bobo da corte. A indumentária era extravagante e tinha grande importância
para a compreensão do enredo.
No decorrer de uma dessas apresentações,
poetas que assistiam ao espetáculo compuseram versos sobre os episódios
representados e os distribuíram depois entre os espectadores. A idéia teve
grande sucesso e daí por diante os versos passaram a ser encomendados
especialmente para os personagens do balé.
Dessa forma, o espetáculo ficou
integrado por três partes: entrées, que por danças e gestos apresentavam um
pequeno drama completo; esse episódio se encerrava com violões que
anunciavam o fim da primeira parte e o início dos récits, nos quais o mesmo
tema se explicava por meio do canto e da declamação, sem danças e
geralmente interpretados por mulheres; finalmente os vers encerravam a
apresentação, com textos compostos para louvar os atores.
Balé na corte de Luís XIV.
Foi tamanha a importância atribuída ao balé durante o reinado de Luís XIV
que recebeu o nome específico de ballet du roi. O monarca participava
ativamente da maioria das danças, que tomaram proporções de grandes espetáculos.
As apresentações, até então restritas à corte, foram franqueadas ao público.
Em 1661 foi fundada a Academia Real de
Dança e Música, dirigida por Jean-Baptiste Lully com rigorosa disciplina,
por onde passavam bailarinos e músicos. Surgiram na época nomes ligados
principalmente à dança, entre os quais o próprio Lully, compositor italiano
que se destacou por valorizar o papel do músico. Novos instrumentos, como
cornetas, oboés, cornes e liras, foram incorporados ao conjunto. A tal ponto
a música se tornou importante que o balé ganhou o aspecto de uma passagem de
ópera. Nasceu daí um novo gênero, a ópera-balé.
Charles-Louis Beauchamp, bailarino e
favorito de Luís XIV, organizou danças e coreografias. Louis Pécourt
substituiu-o como mestre coreógrafo e primeiro-bailarino. Os cenários, que
por sua complexidade se tornaram tarefa específica, passaram a ser executados
por Gaspare Vigarini. Molière compôs enredos para balés e acrescentou danças
a suas peças.
Em Le Triomphe de l'amour, apresentado
em 1681, pela primeira vez foram admitidas bailarinas profissionais, ao lado
dos mestres. Em 1701, Raoul Feuillet publicou uma Choréographie, em que
mostrava as linhas e figuras executadas pelos bailarinos no palco,
acompanhadas de desenhos dos movimentos de pés e joelhos. Nos últimos anos
do reinado de Luís XIV, diminuiu o interesse pelos espetáculos grandiosos.
Profissionalização do balé.
A morte de Luís XIV coincidiu com a profissionalização do balé. A Ópera
de Paris converteu-se no centro musical da dança durante todo o século
XVIII. Duas dançarinas, Marie Camargo e Marie Sallé, deram contribuições
importantes para o aperfeiçoamento da arte. A primeira criou o entrechat
quatre, o jeté e o pas de basque; encurtou os vestidos até acima dos
tornozelos, o que escandalizou as platéias, e calçou sapatos sem saltos.
Marie Sallé aboliu o penteado alto e adornado, o corpinho justo e a saia balão;
soltou os cabelos e vestiu uma espécie de túnica.
No século XVIII apareceu também
Jean-Georges Noverre, autor da primeira exposição de leis e teorias do balé,
Lettres sur la danse et sur les ballets, considerada até hoje a mais
importante obra do gênero. Noverre criou inúmeros bailados e argumentos,
mostrou que o balé não era um mero divertissement, mas uma arte nobre,
destinada à expressão e ao desenvolvimento de um tema. Assim, foi ele o
criador do ballet d'action, ou balé dramático, no qual a história se conta
por meio de gestos e não pela declamação ou pelo canto. Noverre reclamava
maior expressão integrada na própria dança, maior simplicidade e comodidade
nos trajes e mais vastos conhecimentos para os maîtres-de-ballet,
especialmente de anatomia. Para ele, cada balé devia ter um tema de fundo e
ser mais que um conjunto de danças desconectadas, esparsas e mecânicas. Ao
lado de Noverre, salientaram-se também Gaetano e Augusto Vestris, criadores
de novos passos.
Durante o reinado de Luís XVI, foram
apresentados diversos outros bailados, pelos quais Maria Antonieta muito se
interessava. A revolução francesa não trouxe grande evolução à arte da
dança, além de reformas nos trajes. Nessa época, foi fechada a Academia
Real de Música e Dança, que só seria reaberta com a Restauração. O período
napoleônico não deixou traços marcantes na arte coreográfica e o balé
entrou em decadência na França, até o século XIX. Seus mestres, contudo,
deixaram um inestimável acervo de experiências. Mesmo em desuso no período
da revolução francesa, o balé serviu como meio de propaganda política,
como no baile à la victime, no qual as mulheres dançavam com uma fita
vermelha atada ao pescoço, simbolizando a guilhotina. Em 1792, apareceu La
Marsellaise, com coreografia de Pierre Gardel, que tornou-se suspeito ao Comité
de Salut Public e foi proibido de representar suas obras. Psyché (1790) e La
Fête de l'être suprême (1794) foram exemplos do uso político da dança.
O trabalho de Noverre não teve
continuidade, pois o advento do romantismo trouxe a preferência por temas
apoiados no maravilhoso, no mundo fantástico dos sonhos e não mais na
mitologia clássica. A dança acadêmica contribuiu com seu vocabulário estável,
gestos e passos que seriam o substrato do balé romântico. Essa nova temática
cênica encontrou sua melhor expressão na figura feminina: a bailarina
tornou-se o principal elemento do conjunto e este ficou menos importante.
Salvatore Viganò, coreógrafo e músico
italiano do século XIX, devolveu ao balé a naturalidade que estava perdendo
pelo excesso de afetação. Suas coreografias sofreram a influência da paixão
que teve pela pintura e escultura. Gli uomini di Prometeo (As criaturas de
Prometeu) é um exemplo claro de plasticidade, e era tão particular seu
estilo que recebeu o nome específico de coreodrama. O bailado italiano tomou
grande impulso com Carlo Blasis, que foi diretor da Academia Imperial de Dança
e Pantomina, anexa ao Scala de Milão, e um dos mentores do balé russo. Nesse
período tornaram-se famosas as bailarinas italianas Maria Taglioni, Fanny
Cerrito, Carlotta Grisi, a austríaca Fanny Essler e a dinamarquesa Lucile
Grahn, todas elas atuantes na Ópera de Paris.
Em meados do século XIX, começaram a
aparecer na Europa as bailarinas russas, que, a partir de então, se impuseram
definitivamente nos teatros europeus. O sexo feminino predominou em virtude da
idealização da mulher, fenômeno próprio do romantismo. O avanço das dançarinas
obscureceu o talento dos bailarinos, o que somente terminou com Enrico
Cecchetti, Michel Fokine e, principalmente, Vaslav Nijinski. Por sua parte, os
compositores davam grande atenção à música de balé e seus mestres, como
Charles-Louis Didelot, Jules Perrot, Louis Duport e Arthur de Saint-Léon,
continuaram a desenvolver a técnica e a arte.
Maria Taglioni sintetizou a linha
romântica da época. Coube-lhe dançar nas pontas pela primeira vez e
estrear La Sylphide (1832), balé coreografado por seu pai, Filippo Taglioni,
e que se tornaria um marco do romantismo. A sapatilha de ponta deu às
bailarinas a possibilidade de executar proezas técnicas, e o tutu, peça
semilonga, de tule, com um corpete justo que possibilita total liberdade de
movimentos, tornou-se a indumentária obrigatória da bailarina clássica.
Jean Coralli, em 1841, criou Giselle,
considerado o maior dos bailados tradicionais por exigir qualidades emotivas
de seus intérpretes. Em 1845, Jules Perrot criou Pas de quatre, apresentado
com sucesso até os dias de hoje. Coppélia, outro espetáculo que ainda
perdura, de autoria de Arthur de Saint-Léon com música de Delibes, surgiu em
1870.
Balé dinamarquês. A Dinamarca
foi outro país de fundamental importância na história do balé. O mestre
italiano Vincenzo Galeoti, em 1775, promoveu o florescimento dessa arte em
Copenhague, onde ficou durante quarenta anos como bailarino, mestre e coreógrafo.
Seguidor das idéias de Noverre e com base na técnica italiana, formou um
verdadeiro ballet d'action. Seus bailados tinham ricas variações no
tratamento do enredo e empregavam com freqüência cenas de conjunto. As
coreografias tinham precisão rítmica e simetria caleidoscópica. Apesar
dessa significativa atuação, apenas uma peça de seu repertório sobrevive:
Cupido e o maître-de-ballet (1786). Discípulo de Gaetano Vestris, Auguste
Bournonville foi o responsável pelo segundo florescimento do bailado
dinamarquês, tendo começado sua carreira na Ópera de Paris.
Balé russo. Dotado de uma
escola técnica e de estilo próprio, o balé russo tem origem nos balés
francês e italiano, principalmente de Marius Petipa, Blasis e Cecchetti. O
balé russo teve início no século XVIII, tempo em que se criaram as escolas
dinamarquesa e sueca. As rigorosas exigências técnicas, aliadas aos dotes físicos
e ao temperamento do povo russo, ao lado da riquíssima tradição de danças
populares, produziram em dois séculos um balé que assombrou o mundo.
Durante mais de cem anos os
apreciadores do bailado na Rússia obedeceram às normas de Paris. Seus
mestres mais importantes foram: Carlo Blasis, Landet (fundador da Escola
Imperial de Dança de São Petersburgo), Canziani, Didelot, Jules Perrot,
Saint-Léon e, principalmente, Petipa, criador das imortais obras Quebra-Nozes
(1892), com Cecchetti e Lev Ivanov; O lago dos cisnes (1895), com Ivanov, e A
bela adormecida (1890), todos com música de Tchaikovski.
Ao mesmo tempo em que a técnica
francesa e a italiana eram absorvidas pelos bailarinos, instituía-se um
estilo russo de balé clássico, que unia e modificava os dois estilos
originais. Tchaikovski consagrou-se como o maior compositor russo, autor da
maioria dos grandes bailados de seu país. Inúmeros bailarinos de talento,
entre eles Alexandre Gorski, Nicolas Legat, Fokine, Presbrajenska,
Kchessinskaia, Karsavina e Chermichova, foram preparados por Petipa; com
Cecchetti se formaram Ana Pavlova, Lubov Egorova e Nijinski, todos eles
considerados grandes nomes da dança internacional. O método criado por
Cecchetti perdura até hoje.
Com Serguei Diaghilev, a época
imperial do balé russo atingiu sua culminância. Organizador e diretor do
bailado russo fora de seu país, a ele se deve o impulso que essa arte recebeu
no início do século XX. Desencantado com as regras estabelecidas para os
teatros imperiais, Diaghilev reuniu os melhores bailarinos, mestres, coreógrafos,
músicos, pintores e cenógrafos russos e formou com eles uma companhia sem
igual para mostrar ao mundo a arte russa em sua totalidade. Ajudado por
diversos mecenas durante vinte anos, maravilhou o mundo inteiro e revelou
talentosos dançarinos, músicos, libretistas e cenógrafos como Nijinski,
Igor Stravinski, Serge Lifar, Alessandra Danilova, Léonide Massine e muitos
outros.
Fokine revolucionou a coreografia e
realizou os ideais de Noverre. Seu grande mérito foi dar um estilo para cada
balé, fundindo por completo dança e música. Com ele, a dança passou a ser
interpretativa e não uma exibição de virtuosismo, ou seja, o balé passou a
ter uma unidade de concepção. Dança, música e artes plásticas foram
amalgamados harmonicamente por Fokine, o que lhe permitiu a criação do mais
célebre bailado de Ana Pavlova, A morte do cisne. Esse grande reformador tem
68 bailados representados, muitos dos quais são ainda exibidos no mundo
inteiro.
O balé moderno teve em Nijinski seu
precursor e só foi possível por causa do trabalho de renovação de repertório
feito por Diaghilev todos os anos, surpreendendo o público francês a cada
temporada. Seus bailados se tornaram progressivamente mais vanguardistas e
encontraram em Nijinski sua maior estrela. Embora tenha brilhado somente até
os 29 anos, Nijinski foi o maior bailarino de todos os tempos, além de coreógrafo
inovador. Seu L'Après-midi d'un faune (1912), com música de Débussy, causou
sensação, e muito mais ainda A sagração da primavera, com partitura de
Stravinski (1913). A partir desse trabalho, considerado o primeiro bailado
moderno, os bailarinos abandonaram as regras acadêmicas e passaram à livre
invenção coreográfica. Diaghilev montou, entre outros bailados, todos
famosos até hoje, alguns mais conhecidos no Brasil pelo nome original, outros
pelo nome em português: Les Sylphides, Cleópatra, O espectro da rosa, O
festim, O pássaro de fogo, Xerazade, Giselle, Carnaval, Jeux, Parade etc.
Também montou várias óperas.
Em 1929 morreu Diaghilev e sua
companhia se desagregou, apesar dos esforços de Serguei Grigoriev e Nijinski.
René Blum, diretor artístico do Teatro de Monte Carlo, assumiu a direção
de um grupo de remanescentes. Em Paris, ao mesmo tempo, Colonel W. de Basil
formava uma companhia rival. Em 1932, os dois grupos se uniram nos Ballets
Russes de Monte-Carlo. Aos membros do balé de Diaghilev aderiram alguns nomes
novos, como Tamara Toumanova, Irina Baronova e Tatiana Ryabushinska. Um ano
mais tarde, a companhia realizou uma turnê triunfal pelos Estados Unidos e em
1935 o grupo se extinguiu. Com o nome de Ballets Russes du Colonel de Basil,
um dos ramos partiu para a Austrália e depois para a América, onde
permaneceu durante a guerra, assumindo outros nomes.
Com os remanescentes da companhia,
Marcel Sablon constituiu, ainda durante a ocupação, os Nouveaux Ballets de
Monte-Carlo, absorvidos em 1947 pelo Ballet International, do marquês de
Cuevas, companhia particular sediada em Nova York, mais tarde chamada
International Ballet of The Marquis of Cuevas. Sablon também contribuiu para
o repertório do gênero com várias obras, pelo menos uma delas de valor
perene: o Tristan fou, de Salvador Dalí, com coreografia de Massine.
Ana Pavlova e os herdeiros de
Diaghilev foram os que, a partir de 1913, deram continuidade e grandeza ao balé
da época. Presbrajenska, Kchessinskaia, Egorova, Trefilova e Legat são
outros mestres russos que, radicados em Paris, contribuíram para o
desenvolvimento do balé. Novas obras nasceram: Presságios, Choreartium,
Francesca da Rimini, Sinfonia fantástica (música de Berlioz), entre outras.
Balé moderno
O século XX trouxe uma contestação
radical do academicismo e o nascimento de um novo balé, no qual a proliferação
de formas é dominante. Os dois países onde o balé moderno lançou raízes
foram os Estados Unidos e a Alemanha, embora o intercâmbio entre as
diferentes escolas fossem freqüentes.
Isadora Duncan. O balé moderno
deu seus primeiros passos nos Estados Unidos, justamente onde a influência clássica
era mais fraca. No início do século, o francês François Delsarte preparou
a revolução estética, da qual Isadora Duncan, autodidata, seria a primeira
figura expressiva.
Desprezando as normas acadêmicas,
Isadora Duncan sugeria emoções em lugar de ordená-las racionalmente.
Improvisando sempre, eliminou de sua dança os elementos dramáticos,
convencionais e narrativos. Dançava só, sem parceiro ou corpo de baile, e
usava túnicas leves e pés descalços. Inspirada na dança grega antiga e nos
movimentos da natureza, criou uma arte original que influenciou decisivamente
grandes coreógrafos e bailarinos, como Fokine e Nijinski, e todo o balé
posterior. Em razão de sua pobreza técnica, no entanto, o balé de Isadora
Duncan não deixou escola.
Loïe Fuller, bailarina contemporânea
de Duncan, também contribuiu para o rompimento com o balé acadêmico. Suas
coreografias refletiram e influenciaram a revolução dos costumes e o novo
olhar sobre o corpo humano que caracterizaram o início do século XX
Expressionismo alemão.
Contemporâneo de Isadora Duncan, o suíço Émile Jacques-Dalcroze criou um
sistema de educação global do indivíduo, baseado na ginástica, no solfejo
e no ritmo -- a eurritmia. Seu método influenciou artistas como Mary Wigman,
Kurt Jooss, Rudolf von Laban e Marie Rambert, por cujo intermédio transcendeu
fronteiras e chegou aos Estados Unidos, com Hanya Holm.
O balé alemão sofreu influência de
dois importantes movimentos das artes plásticas: o dadaísmo e o
expressionismo. Em Munique, Laban estudou os gestos cotidianos e teorizou
sobre o espaço, a energia e o tempo, além de criar uma escrita para o balé:
a "labannotation". Mary Wigman, a mais importante coreógrafa do período,
foi aluna de Jacques-Dalcroze e de Laban. Defendeu o comando instintivo dos
movimentos e reduziu a orquestra à percussão. Sua Dança macabra provocou a
ira dos nazistas e o conseqüente fechamento de sua escola.
Discípulo de Laban, Kurt Jooss
pretendeu atribuir a cada gesto um sentido. Fundou o Folkwang Tanz Studio em
Essen, em 1927, e cinco anos mais tarde apresentou Mesa verde, sátira das
conferências diplomáticas e da guerra. Seus personagens usavam vestimentas
estilizadas, prenunciando os de Pina Bausch, que até a última década do século
sobrevivia como derradeira figura do expressionismo alemão.
Depois da segunda guerra mundial, o
balé alemão viveu um período de renascimento com John Cranko, inglês
nascido na África do Sul. Em 1961, Cranko assumiu a direção do balé da Ópera
do Estado de Württemberg, em Stuttgart, posto em que foi sucedido pela
brasileira Márcia Haydée, aclamada como uma das grandes bailarinas contemporâneas.
Balé americano. O estilo de
Laban e Wigman cruzou rapidamente o Atlântico e influenciou artistas que
trabalhavam em Nova York depois da segunda guerra mundial, entre eles o
ex-manipulador de marionetes Alwyn Nikolais. Seus balés se caracterizaram
pela abstração e pela determinação de rivalizar, no palco, com a arte do
pintor e do escultor. Murray Louis, principal intérprete de Nikolais, criou
em sua própria companhia obras que empregavam a linguagem circense.
Um balé mais especificamente
americano desenvolveu-se sobre as bases lançadas por Isadora Duncan. Nessa
corrente se enquadra Ruth Saint Denis, que com Ted Shawn fundou a Denishawn
School. Seus balés seguem um enredo preciso e abordam temas americanos ou
universais. Com Libertad, de 1937, Ted Shawn tomou posição em favor da república
espanhola. Charles Weidman produziu espetáculos, em que os personagens são
americanos, destinados ao grande público. Doris Humphrey, que em The Art of
Making Dance afirmou a ruptura com a Denishawn, pretendeu reencontrar o que
ela chama a etimologia do gesto: sobre o palco despojado, cair e levantar-se
seria a essência do movimento.
Com Martha Graham, o balé americano
encontrou sua grande intérprete. A ela se credita grande parte do vocabulário
do balé moderno, para o qual pretende uma outra intenção além da perfeição
técnica. Depois da segunda guerra mundial, Graham montou balés cada vez mais
ambiciosos, cujos personagens são Medéia, Édipo e Joana d'Arc e cuja temática
inspira-se na psicanálise. Fez de muitos de seus bailarinos grandes coreógrafos,
como Erick Hawkins, Paul Taylor, Alvin Ailey e Merce Cunningham.
De formação clássica e discípulo
de Graham, Merce Cunningham rompeu a aliança entre som e movimento e
introduziu o elemento casual, eliminando a possibilidade de uma interpretação
psicológica. Em Summerspace (1958), cada bailarino executa uma escala de
movimentos, cuja ordem de aparição é decidida por um jogo de dados.
Cunningham cercou-se de pintores e músicos, como John Cage, cuja influência
foi determinante sobre sua obra. Depois de Um dia ou dois, apresentado na Ópera
de Paris, tornou-se referência obrigatória no balé moderno francês.
O balé pós-moderno americano, sensível
aos movimentos políticos, substituiu a noção de espetáculo pela de
performance ou happening. O movimento, que se revelou rico de formas diversas
e contraditórias, encontrou na Europa uma ressonância maior que nos próprios
Estados Unidos, mais afeitos à exuberância vital de Twyla Tharp e Jennyfer
Muller, ou à comicidade de Pilobolus.
Balé francês. Palco do lançamento
mundial dos balés russos antes da primeira guerra mundial, Paris tornou-se um
centro onde coexistem e se misturam todos os estilos. Depois de 1945, a
companhia de um rico mecenas, o marquês de Cuevas, reprisou o mais puro
estilo acadêmico. Depois de um período dedicado aos musicais, Roland Petit
voltou à dança e dirigiu o Balé de Marselha, com o qual montou uma série
de novos espetáculos. Janine Charrat participou, na década de 1950, da
renovação do balé com Jeu de cartes (Jogo de cartas) e Algues.
Foi Maurice Béjart quem melhor
correspondeu ao gosto moderno e conquistou o público francês. Em 1955, o
Ballet sur la symphonie pour un homme seul, de Pierre Schaeffer, foi recebido
como um grito de angústia coletiva. Com Le Sacre du printemps (1959; A sagração
da primavera) e Le Boléro criou o Balé do Século XX, companhia que seduziu
e escandalizou platéias do mundo inteiro.
Balé no Brasil
Pode-se dizer que a história do balé
no Brasil começa em 1927, com a vinda da bailarina russa Maria Oleneva para o
Rio de Janeiro. Já naquele ano ela fundou a Escola de Danças Clássicas do
Teatro Municipal, que se tornou o principal centro de formação de bailarinos
no país.
Depois de Oleneva, vieram outros
europeus, como o tcheco Vaslav Veltchek, que a partir de 1939 deu novo impulso
ao balé no Brasil, como coreógrafo do Teatro Municipal do Rio de Janeiro e
organizador da escola de bailados da prefeitura paulistana. Mais tarde
participou da fundação do Ballet do IV Centenário de São Paulo e no Rio de
Janeiro fundou o Conjunto Coreográfico Brasileiro. Veltchek elaborou várias
coreografias baseadas no folclore brasileiro, como Uirapuru, de Villa-Lobos, e
Festa da roça, com música de José Siqueira. Outro nome importante é o de
Tatiana Leskova, que a partir de 1945 atuou no Teatro Municipal do Rio de
Janeiro, primeiro como bailarina e depois como mestre de balé e coreógrafa.
Juntamente com Igor Schwezoff, participou em 1946 da formação do Balé da
Juventude.
As inovações do balé moderno foram
trazidas ao Brasil em 1949 pelos Ballets des Champs-Elysées. Aqui ficou como
mestre um de seus integrantes, Pierre Klimov. Eugênia Feodorova chegou ao
Brasil em 1955, atuando como mestre de balé e coreógrafa do corpo de baile
do Teatro Municipal. E em 1962 foi chamado para trabalhar no Rio de Janeiro o
coreógrafo e maître-de-ballet William Dollar. O balé contemporâneo
desenvolveu-se com Nina Verchinina, ex-integrante do Ballet Russe du Colonel
de Basil, que deu uma das mais decisivas contribuições à dança brasileira,
com sua companhia particular. Outros nomes que sobressaíram foram os de Berta
Rosanova, Sandra Diecken, David Dupré, Dennis Gray, Artur Ferreira e vários
outros, como bailarinos ou como coreógrafos e divulgadores. Bailarinas
brasileiras que se destacaram no exterior foram Márcia Haydée, Beatriz
Consuelo, Ivonne Weyer e Eleonora Oliosi.
O Teatro Municipal de São Paulo
possui uma grande escola, fundada em 1940 e oficializada em 1947. A
Universidade Federal da Bahia, em Salvador, tem um curso de dança, agregado a
sua Escola de Teatro. E são milhares os cursos independentes em todo o
Brasil, sobretudo em São Paulo e no Rio Grande do Sul.
Técnica do balé
A técnica acadêmica do balé, como
concebida hoje, é russa e resultou da fusão dos estilos italiano e francês.
O estilo italiano desenvolveu-se acrobaticamente, caracterizando-se pelo
allegro, movimentos vivos, angulosos, com certa rigidez. Os braços estendidos
vigorosamente, a velocidade, a técnica, o virtuosismo são suas marcas. No
estilo francês destacam-se a graça, a leveza, os movimentos arredondados,
braços leves, o adagio.
Dessas duas escolas resultou uma fusão
ideal no estilo russo do século XIX: a graça de uma e o virtuosismo da
outra, aliados ao temperamento emotivo do povo russo. Os bailarinos russos
fizeram uma síntese, tirando de cada uma o que tinha de melhor.
O bailarino necessita de condições físicas
especiais, sem as quais seria impossível obter bons resultados. O en dehors,
isto é, a colocação das pernas viradas para fora, apresenta uma enorme
vantagem sobre o en dedans, que conseguiria, quando muito, virar os pés, mas
jamais as pernas, joelhos e coxas, para conseguir a execução correta das
posições básicas. A musculatura abdominal deve ser capaz de sustentar as
pernas numa boa altura. Esses músculos podem ser desenvolvidos como os
outros, mas é indispensável certa predisposição.
O pé deve ser bem arqueado, pequeno,
estreito e o tornozelo flexível, capaz de projetar o corpo a uma boa altura e
suportá-lo suavemente na queda. É necessário um exame sério da forma do
corpo e das condições físicas do indivíduo antes que este se decida a
seguir uma carreira cujo êxito depende de condições inatas. O
desenvolvimento das condições físicas deve ser cuidado com assiduidade e
rigor, por meio de exercícios específicos e gradativos, geralmente
acompanhados pelo piano, em roupas apropriadas, que são as malhas ou
collants.
Alguns desses exercícios são
executados com o apoio de barras de madeira ou metal. Todos os movimentos
partem de cinco posições básicas de pernas e de outras tantas de braços,
que não são obrigatoriamente executadas em correspondência. Para evitar
desvios ou ruptura da coluna vertebral, somente quando os pés, joelhos e
coluna estão bem posicionados executam-se movimentos mais complicados. A
maior parte dos movimentos pode ser executada no espaço, en croisé e en
effacé.
As aulas iniciam-se com pliés, que são
movimentos de flexão de pernas, realizados lentamente, com o objetivo de
aquecer e estender os músculos. Tem-se o demi-plié e o grand-plié, que
podem ser executados nas cinco posições dos pés. Para a flexibilidade da
coluna existem os cambrés e para o trabalho de musculatura das pernas, exercícios
como os battements, rond de jambe e développés. O port de bras unifica o
trabalho de todo o corpo, acentuando os movimentos dos braços e visando mais
propriamente a uma demonstração de expressão do que de técnica.
Os adágios, acompanhados pelo
andamento musical do mesmo nome, são seqüências de poses e movimentos, dos
quais os principais são a attitude e o arabesque, que podem ser executados en
effacé, en croisé e en écarté.
Os saltos coreográficos diferem
consideravelmente dos esportivos, pois têm como objetivos a élévation, que
representa a emoção, e o ballon, apenas para a elevação do corpo. Um
bailarino pode possuir o ballon sem necessariamente possuir a élévation e
vice-versa. Os saltos dividem-se em pequenos e grandes, e os principais são o
changement des pieds, o assemblé, os jetés, o sissonne, cabriole,
soubresaut, pas de chat, pas de basque, ballotté, ballonné, chassé,
glissade, failli, emboîté e balancé. Alguns desses passos podem ser
executados de forma simples ou acrescida de batteries, pequenos movimentos em
que se bate uma perna contra a outra, uma ou mais vezes, no momento do ballon,
no ar. Surgem então os battus, entrechats e brisés.
Os enchaînements, ou movimentos
encadeados, podem ser realizados segundo a criatividade do coreógrafo, mas
existem alguns que entraram para o vocabulário da dança clássica, tais como
o pas de bourreé, pas couru, coupé, passé e relevé.
Os movimentos de rotação realizados
através de pirouettes podem ser voltados en dedans ou en dehors e executados
a partir de qualquer posição dos pés. Os tours podem ser par terre, como os
chaînés, ou en l'air. Alguns desses movimentos, como o tour en l'air, são
exclusivamente masculinos, devido a seu vigor e dificuldade, enquanto as
pontas são executadas apenas por bailarinas, com o objetivo de dotá-las da máxima
elevação. Todo o peso do corpo se apóia sobre a ponta dos artelhos, em
sapatos especiais. Existem duas formas para se colocar em ponta: piqué e
relevé.
Na formação completa dos bailarinos são ensinadas também outras
disciplinas, como mímica, danças folclóricas, improvisação e teoria
musical.
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