As "questiones" aqui transcritas quer revelar um pouquinho das muitas facetas e abordagens de Thomas Merton, em assuntos necessários para a vida espiritual, e outros nem tantos, que tem mais a função cômica, para distrair um pouco e perceber o fino traço deste escritor nato.

 

Silencio

 *Merton é o “cantor” do silencio e da solidão. Num dos seus melhores livros, Homem algum é uma ilha, profundas reflexões sobre alguns aspectos da vida espiritual, ele é enfático ao defender que o silencio é um direito inalienável do homem, mas que este tem o dever buscá-lo:

 

"Os que amam o ruído que fazem são impacientes do resto. Desafiam constantemente o  silencio das florestas, das montanhas  e do mar. Passeiam com suas maquinas através da floresta silenciosa, em todas as direções, cheias de medo que um mundo calmo os acuse de vazios...”.

...O nosso barulho, os nossos negócios, os nossos planos e todas as nossas fátuas  explicações sobre os ruídos, os negócios e os planos que fazemos, tudo isso é ilusão...

...O silencio não deve existir na nossa vida só por causa dele mesmo. Ele é destinado a outra tarefa...

...Se a nossa vida é dissipada em palavras inúteis, jamais ouviremos qualquer outra coisa no fundo do nosso coração, onde Cristo vive e fala em silencio. Nunca seremos nada e, no fim, ao chegar a hora de mostrarmos que somos, apareceremos sem nada a dizer no momento da decisão crucial: haveremos dito tudo e estaremos exausto de falar antes mesmo de termos alguma coisa a dizer...

...Aqui jaz um defunto que fez da indiferença um ídolo. Sua oração em vez de inflamá-lo, apagou-lhe o coração. Seu silencio não é atento a nada, não escuta nada e nada tem a dizer.

Venham as andorinhas, e façam o ninho em torno desse homem, e ensinem seus filhotes a voar no deserto que ele fez da sua alma, e assim, ele não ficará inútil para sempre."

 

Premonição

*Ainda em Homem algum é uma ilha, encontramos um “traço” daquilo que se desvelaria no futuro. Escrito treze anos antes de sua morte solitária e trágica nos confins da Ásia, este parágrafo tem um amargo sabor premonitório:

 

"Uma morte silenciosa pode testemunhar uma paz mais eloqüente do que a morte marcada por expressões ‘de efeito’. Uma morte solitária, uma morte trágica pode podem ter mais a dizer da paz e da misericórdia de Cristo, do que muitas mortes tranqüilas."

 

Pseudo-mistico

 *neste parágrafo, retirado da Ascensão para a verdade, Merton, que está tratando da questão de Instinto e Inspiração, e da relação entre Razão e Vida Mística, nos presenteia como uma de suas perolas mais cômicas (por usar muitas alegorias para se enfatizar melhor), ao relatar o que deve se passar na cabeça duma pessoas “desentendida” quando está tendo uma “experiência” mística. É ótimo!:

 

"É, ainda, importante pensar que as inspirações do Espírito Santo pelo Sete Dons, não são, dramáticas e espetaculares, nem por seu objeto e nem por seu modo de atividade. Depois de ler a vida dos santos e as experiências dos místicos, algumas pessoas ficam convencidas de que a vida mística deve ser algo de uma opera wagneriana. Coisas tremendas acontecem todo o tempo. Cada nova monção dos Espírito é anunciada por trovões e faíscas. Os céus se abrem e a alma  evola-se do corpo numa explosão de sua terrena e resplandecente luz. Aí ela encontra deus face a face, no meio de um grande Turnverein de santos e anjos da trombeta, a voar e a cantar. Há, então, uma eloqüente troca de impressões entre Deus e a alma, num dueto que durará no mínimo sete horas, pois sete é um numero místico. Tudo isso pontilhado por terremotos, eclipses do sol e da lua, e explosões de bombas supersubstanciais. Eventualmente, depois de uma curto ensaio musical do Fim do Mundo e do Ultimo Juízo, a alma numa graciosa pirueta retorna ao corpo, e o místico volta a si para descobrir que está rodeado de irmãos cheio de admiração inclusive um ou dois a tomarem suas notas na previsão de algum futuro processo de canonização".

 

Sarcasmo:

 *neste trecho, tirado do seu Diário secular, Merton, com 25 anos de idade, está numa cidade do México, Camaguey, assistindo a uma espécie de teatro, recheado de muitos números circenses e danças “inesquecíveis”, por serem, na sua opinião, tão ruim e tão horrível de se ver. Trágico se não fosse cômico! Aqui percebemos a sua perspicácia e humor ao descrever tal cena. Vamos conferir?!:

 

"...Por mais que viva, jamais esquecerei, tão ruim que era... Uma das meninas tinha a cara redonda, a outra era realmente gorda, a terceira era magrinha e tinha pernas finas, uma espécie de cara de gato, atraente e bonita. Ela bem sabia que era mais graciosa que as outras. Sem que tivesse havido muitos aplausos, repetiram o numero do principio ao fim, como se já fosse de rotina, como se tivessem de faze-lo duas vezes. Era tão bonito e tão horroroso: para este lado, para aquele lado, volta pra cá, volta pra lá, tan tan tan; no fim davam uma volta e levantavam as saias como leves capinhas, nas pontas dos pés. Ding, ding. O fim.

Fugiram apressadamente do palco. Nunca vi coisa tal horrível, ou tão inesquecível, ou tão fascinante. Não é que dançassem mal. Dançavam ate muito bem; mas uma dança tão ruim que dava vontade de chorar, tão ruim e sem sentido! Que mexicanos!

Foi ainda pior, quando a gorducha dentro de novo correndo, vestida com um casaco preto peludo, curto e apertado, de vaqueiro mexicano, tão preto e tão apertado e tão peludo que a fazia assemelhar-se a um enorme rato. Realmente, seus movimentos eram todos de um enorme rato gigantesco e era isso que estava estampado no sorriso que lhe abria a face: “agora você vão ver que eu sou o rato gigante!

Esse numero era realmente mais horrível do  que o outro, sem ao menos uma boa dança para compensar a ruindade de toda a concepção. Fiquei duro com essa dança. Quando acabou, poderia ter chorado!

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