Esta página tem como objetivo não só informar ao público brasileiro quanto à Igreja Católica Greco-Melquita, mas também
 quanto a todas as igrejas católicas orientais. Essas igrejas são um patrimônio de todos os católicos. Gradativamente esta
 página pretende apresentar algumas delas.

A Igreja Siríaca Católica


Ícone Siríaco da Anunciação

Antigo ícone siríaco da Anunciação



I


Para falarmos da Igreja Siríaca Católica precisamos falar da grande controvérsia que deu origem a ela, a heresia monofisita. Advertimos que esta primeira parte deste artigo é baseada no célebre historiador inglês Edward Gibbon, que não é exatamente simpático ao catolicismo. Mas sua erudição e honestidade intelectual fazem dele um guia importante sobre aquela época.

No concílio de Éfeso em 431 D.C. foi condenado o nestorianismo, heresia que afirmava ter Cristo duas personalidades, a humana e a divina (ver a história da Igreja Caldeana Católica ). No entanto nessa mesma época estava se desenvolvendo o pensamento diametralmente oposto, de que Cristo teria uma só pessoa, a divina. Um dos campeões dessa doutrina era o monge Eutiques, um idoso e analfabeto arquimandrita (superior) de trezentos monges perto de Constantinopla. O patriarca de Constantinopla Flaviano convocou um sínodo de sua igreja, sínodo este que condenou Eutiques, afirmando que ele teria dito que Cristo não teria derivado seu corpo da substância da Virgem Maria.

Eutiques então apelou para um concílio geral, e nisso foi ajudado por um seu afilhado, que era o principal eunuco do palácio do Imperador, e pelo patriarca de Alexandria, Dioscorus. O Imperador Teodósio convocou então um concílio geral na cidade de Éfeso (o segundo naquela cidade). Tal reunião foi marcada pelo autoritarismo de Dioscorus. Este trouxe do Egito uma tropa de arqueiros e de monges implacáveis que cercaram a catedral onde estavam os participantes do concílio. O concílio condenou os que diziam ter Cristo duas naturezas (“que aqueles que dividem Cristo sejam divididos pela espada”). Eutiques foi absolvido sem hesitação, mas os bispos subordinados a Flaviano não queriam entregar seu patriarca à justiça de Dioscorus, e se agarraram aos joelhos deste enquanto este os encarava com ar feroz, e imploraram misericórdia. Este gritou que eles queriam fazer uma sedição e gritou pelos oficiais. A tal sinal uma turba de soldados e monges com paus, espadas e correntes invadiu a igreja, fazendo os bispos tremendo de medo se esconderem atrás do altar e dos bancos e assinarem um papel em branco em que depois foi escrita a condenação de Flaviano. Este foi entregue à turba, que o monge Barsumas, favorável a Dioscorus, incitava dizendo para vingar as feridas de Cristo. Dizem que o próprio Dioscorus chutou Flaviano. Este, ferido, fugiu mas morreu três dias depois. Foi vitória dos monofisitas.

A parte derrotada (= católica) no entanto apelou para o Papa Leão I. Convocou imediatamente um sínodo provincial que anulou o sínodo de Éfeso, considerando-o irregular. Mas tão importante quanto o apoio do Papa foi a morte do Imperador Teodósio quando seu cavalo tropeçou e ele foi sucedido por sua irmã Pulquéria, que dominava o marido e era favorável ao partido ortodoxo (= católico). Então Dioscorus caiu em desgraça e os exilados foram convocados. Foi convocado um novo concílio, para o qual os legados papais pediram a presença do Imperador. E os participantes foram levados para uma pequena localidade perto do mar, num morro, onde foi construída uma igreja para abrigar os seiscentos e trinta bispos. O lugar de honra ficou com os legados do Papa e do Imperador. Acusado formalmente, Dioscorus foi reduzido a criminoso. Novos patriarcas de Constantinopla e Alexandria foram eleitos. Dos dezessete bispos de Alexandria, monofisitas, quatro aderiram ao partido católico, e treze de joelhos imploraram a piedade do concílio, dizendo que seriam linchados quando voltassem a sua terra se renunciassem ao monofisismo. Houve pedidos de uma anistia geral mas foram rejeitados. Dioscorus foi condenado entre outros com base em acusações de orgulho, avareza, crueldade, e que gastava o dinheiro da igreja em dançarinas e que seu palácio e seu banho eram freqüentados por prostitutas, principalmente por Irene, um famosa mulher do prazer da cidade, que seria sua amante.

No entanto restavam os problemas doutrinários, e provavelmente a maioria dos bispos era a favor da doutrina monofisita. Por força dos legados papais, em uma votação eles votaram a favor das duas naturezas, em outra voltaram a uma natureza só, entre gritos de que as definições dos pais da igreja eram imutáveis. No entanto o Imperador estava inflexível, e os legados papais também, e uma comissão de dezoito bispos preparou novo decreto, em que Cristo tinha uma pessoa em duas naturezas, que foi aceito relutantemente pelos participantes. E este foi o concílio de Calcedônia.

Nos anos seguintes houve reações violentas. Jerusalém foi invadida, pilhada e queimada, com muitos mortos, por um exército de monges em favor de uma natureza só de Cristo. No Egito o novo patriarca de Alexandria, Protério, esteve em guerra contra seu próprio povo por cinco anos. Quando se soube que um monofisita importante tinha morrido o povo cercou a catedral três dias antes da Páscoa e o Patriarca foi assassinado no batistério, e seu corpo queimado e as cinzas espalhadas ao vento, sob o rumor de que esse assassinato tinha sido inspirado pela visão de um anjo. No seu lugar o povo colocou o monge Timóteo o Gato, monofisita.

Depois de trinta anos o imperador Zenão, para acabar com tantas lutas, propôs uma fórmula de conciliação, mas sem muito sucesso. A controvérsia ficou latente, e a qualquer oportunidade reacendia. Naquela mesma época acreditou-se que um anjo revelou aos homens o hino do Triságio (“Santo, Santo, Santo, é o senhor Deus do Universo”). Este seria o hino que seria cantado sempre, continuamente, em todos os tempos, pelos anjos e querubins diante do trono do Senhor. Acontece que logo logo foi adicionada a frase “que foi crucificado por nós!” e essa frase, que seria depois adotada universalmente, fora acrescentada por um bispo monofisita. E isso gerou conflitos terríveis. Na catedral dois coros rivais cantaram o Triságio, com e sem o acréscimo, um querendo forçar o outro a desistir. Quando seus pulmões não agüentavam mais eles partiram para as pauladas e pedradas. O Imperador Anastácio puniu os católicos, entrando em conflito com o patriarca, que os defendeu. E a multidão invadiu as ruas, aos gritos de “este é o dia do martírio!”. A multidão tomou o poder na cidade, as chaves da cidade e seus estandartes foram tomadas dos guardas. Nos dias seguintes a multidão pilhou e saqueou e incendiou as casas dos partidários do imperador, cantando hinos enquanto o faziam. A cabeça de um monge amigo do Imperador foi levada na ponta de uma lança. Estátuas do Imperador foram quebradas enquanto ele se refugiava num subúrbio. Depois de três dias o Imperador, sem seu diadema, humilhado, suplicou o perdão de seus súditos no circo. Diante dele os católicos em coro cantaram o seu Triságio, sem acréscimo. E dois ministros foram entregues aos leões.

No entanto a fé monofisita continuou em muitas pessoas. Por volta do ano 540 houve nova perseguição. O patriarca de Antioquia, o monofisita Severo foi destronado e perseguido e fugiu, e seu amigo Xenaias foi estrangulado, trezentos e cinqüenta monges foram massacrados, além de bispos destronados e presbíteros jogados na prisão, mesmo contando com a discreta ajuda de Teodora, a Imperatriz. E no meio dessa miséria surgiu a figura de Tiago (Jacob) al-Baradai, que nas masmorras de Constantinopla recebeu secretamente o título de Bispo de Edessa e Apóstolo do Oriente.  Libertado lançou-se a uma frenética atividade missionária, nas costas de rápidos camelos fornecidos por um simpatizante. Visitou vilas, conventos e cavernas onde os adeptos do monofisismo se escondiam, e teria ordenado oitenta mil bispos, padres e diáconos, que eram ensinados também a odiar o legislador romano. Por conta de seu esforço a igreja monofisita é também conhecida como Igreja Jacobita. Foi ele o organizador da Igreja Siríaca Ortodoxa, não em comunhão com Roma, que existe até hoje. Seus sucessores formam uma linhagem de patriarcas monofisitas de Antioquia. A segunda maior autoridade nessa igreja é o Mafrian (em siríaco: frutuoso, delegado universal), instituído em 630 e sediado em Mosul, no Iraque, na mesma cidade do catholicós nestoriano, inicialmente com jurisdição sobre os fiéis monofisitas no Império Sassânida.

Perseguidos por Constantinopla os monofisitas ou siríaco-ortodoxos acolheram os invasores muçulmanos, que tinham inicialmente uma tirania mais leve. Mas depois houve perseguições e conversões em massa ao islamismo. Sua Igreja existe até hoje. Logo abaixo mencionaremos seu Patriarca e sua Página no Brasil.

II


A Igreja Siríaca Católica começa com tentativas de reunificação dos jacobitas com o catolicismo que começaram depois das cruzadas. Em 1444 em Florença, houve a tão almejada reunificação ao catolicismo. Mas a invasão turca logo depois fez com que essa tentativa durasse pouco. Entre 1563 e 1571 houve uma ativa correspondência entre o patriarca e os Papas Pio IV e V, e em 1583 o papa enviou um legado à igreja jacobita. Em 1656 André Akhidjan foi consagrado pelo patriarca maronita e seis anos depois foi eleito Patriarca Siríaco de Antioquia, enviando a Roma sua profissão de fé. Seu sucessor Inácio Pedro Chaahbadine foi perseguido violentamente pelo Xeque de Istambul, preso, torturado e colocado em marchas forçadas, ao final das quais morreu como mártir da fé em 1702. Depois disso a Igreja Siríaca católica ficou sem Patriarca até 1782. Neste ano foi eleito um único patriarca para as duas comunidades, Denis Miguel Djarve. Foi confirmado por Roma no ano seguinte, mas apenas quatro bispos ficaram com ele. Os outros elegeram um patriarca siríaco-ortodoxo. Assim, desde aquela época há duas igrejas siríacas - a católica e a ortodoxa. Perseguido, o patriarca siríaco católico teve de fugir para o Líbano, onde até hoje no convento de Charfe se encontra o ícone milagroso de Nossa Senhora Libertadora que fugiu trazendo no peito.

Após passar períodos em Alepo-Síria e em Mardin – Turquia, e oprimida por perseguições, a sede patriarcal se transferiu definitivamente para Beirute no Líbano durante a Primeira Guerra Mundial.

Em 1935 o Patriarca Inácio Gabriel Tappouni foi elevado a cardeal pelo papa Pio XI, tornando-se o primeiro cardeal desta Igreja. Faleceu em 1968.



Visita do Patriarca Dauod ao Brasil  

Da esquerda para a direita: Monsenhor Luiz Awad (pároco siríaco católico no Brasil), Patriarca Dom Moussa Dauod e Monsenhor Antonio Chahda, da Venezuela

Em outubro de 1998 foi eleito o novo Patriarca Inácio Moussa Dauod. Mas no final do ano seguinte ele foi nomeado pelo Papa para o cargo de Prefeito da Sagrada Congregação para as Igrejas Orientais. No consistório de fevereiro de  2001 foi elevado a Cardeal, mantendo no entanto o título particular de Patriarca. Devido a seu novo cargo renunciou à liderança da Igreja., Foi eleito portanto a 16 de fevereiro de 2001 o seu sucessor, Patriarca Inácio Pedro VIII.

Note-se que os Patriarcas de Antioquia dos Siríacos Católicos escolhem todos o nome de Inácio. É uma  homenagem tradicional a seu antecessor Santo Inácio da Antioquia. Tal tradição existe desde 1444, quando foi eleito o primeiro Patriarca a fazer essa homenagem, ainda quando a igreja siríaca era una e não em comunhão com o catolicismo.

O patriarca Inácio Moussa Daoud visitou o Brasil no início do ano 2000, sendo recebido pelo prefeito de Belo Horizonte e pelo governador de Minas Gerais. A Igreja Siríaca Católica está presente no Brasil na Paróquia do Sagrado Coração de Jesus, em Belo Horizonte, e também no Mato Grosso do Sul. Durante sua visita o patriarca consagrou Monsenhor ao Padre Luiz Awad, o único sacerdote católico siríaco no Brasil. Note-se que esta Paróquia também atende os fiéis católicos melquitas daquela cidade (ver endereço ).

A Igreja Siríaca Ortodoxa continua a existir, e seu Patriarca Siríaco Ortodoxo de Antioquia e de todo o Oriente é Inácio Zakka I, com sua sede em Damasco, na Síria. Os siríacos ortodoxos (não em comunhão com o catolicismo) também estão presentes no Brasil e têm uma página em português ( http://www.sirianort-santamaria.org.br ).


Resumo:

Igreja Siríaca Católica

Chefe espiritual: Sua Beatitude Inácio Pedro VIII, Patriarca de Antioquia dos Siríacos Católicos

Sede: Beirute, Líbano

Fiéis: 100.000


No Brasil:

Uma Paróquia: Igreja do Sagrado Coração de Jesus - Belo Horizonte (MG)

Patriarca Siríaco atual

Patriarca Inácio Pedro VIII de Antioquia dos Siríacos católicos


Fontes:
 
GIBBON, Edward. Decline and fall of the Roman Empire. Cap. XLVII. Enciclopédia Britânica, 1987. Coleção Great Books of the Western World.

KHATLAB, Roberto. As Igrejas Orientais, católicas e ortodoxas, tradições vivas. São Paulo: Ave Maria edições, 1997. 256p.

Sua Beatitude Dom Moussa Dauod visita Belo Horizonte - Revista CHAMS, abril, 2000, ano IX, n. 90 – pp. 16 e 17

New Syriac Patriarch of Antioch Elected - http://www.dailycatholic.org/issue/2001Feb/feb27nw1.htm

Correspondência particular com o pesquisador Roberto Khatlab, a quem esta Página agradece a foto do Patriarca atual e do ícone.
 

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