Bartomeu Rosselló-Pòrcel
“OH PREGUIÇA DO AR”
Oh preguiça do ar, como se esgarçam
o mel, o diáfano veludo, a seda
das nuvens que se alteiam e se enlaçam
à roda deste céu iluminada!
A câmara das sombras se condensa
com aquela claridade e aquele odor
desfeita no arfar leve do ar
parada em meio à nuvem gris que passa.
Os ladridos do vento se esvanecem
ausentes desta terra minha, morta
e não escuto mais fremir o espaço
remotíssimo, de uma asa que transporte
– chama de céu a céu, susto, bulício –
à alta solidão a voz mais forte.
RONDA COM FANTASMAS
As filhas do silêncio presente e vigilante
levam-me sempre àquela perversa distância
sabem do meu espanto, do meu espanto o instante,
de isolamento, melancolia e agonia.
Oh cidade dos terrores! Entre as avenidas
estéreis – árvores lívidas do entardecer – viverei
a hora impura das ásperas angústias mudas
com medo de morrer completamente só na rua.
Terror entre as salas vazias, ao ver o leito
com a morte, viva entre os lençóis, e serenatas
na praça, e o rumor de facas, do lado de fora,
mais terrível por tantas coisas adivinhadas
durante a fuga, pelas trevas, lá onde chora
o esqueleto mastigado pelos cães da morte.