Projeto de Observação: Trânsito de Mercúrio em 09
de Maio de 2016
Helio C. Vital / Seção de Eclipses da REA
Introdução e Circunstâncias Globais
Cerca de treze vezes por
século, o fugaz e arredio Mercúrio pode ser visto como um pequenino círculo negro
cruzando o disco solar, numa espécie de mini-eclipse, que recebe a denominação Trânsito
de Mercúrio.
Em 9
de Maio de 2016, mais um desses interessantes eventos poderá ser apreciado em
todas suas fases desde todo o Brasil e sob circunstâncias observacionais muito
favoráveis. Veja a Trajetória de Mercúrio pelo disco solar calculada por Espenak para o centro da
Terra. Ela pouco dependerá da posição geográfica do observador, embora por efeito
da paralaxe, diferenças de até 2 minutos possam ocorrer nos instantes dos
contatos.
Devido
ao fato de o trânsito ocorrer em Maio, quando o planeta encontra-se mais
afastado do Sol e mais próximo da Terra, o diâmetro aparente de Mercúrio será
de 12,0”, em contraste com o valor de 10” dos trânsitos que ocorrem
junto ao seu periélio, em Novembro. Mesmo assim, ele seu disco será visto 158,4
vezes menor que o do Sol (950,4”) e Mercúrio ocultará apenas
a diminuta fração de 1/25000 do disco solar.
Circunstâncias dos contatos para o Leste Brasileiro
A visibilidade do evento em várias cidades brasileiras do Leste
Brasileiro terá início às 08:14, Horário Oficial de
Brasília (TU-3h), quando ocorrerá o disco de Mercúrio tocará externamente o
disco do Sol a apenas 7 graus do ponto Leste do disco solar medido para o Norte.
Durante os 3 minutos e 12 segundos seguintes, o disco de Mercúrio estará cruzando o limbo do Astro-Rei em ângulo de 19,4°
relativo à normal. O contato II (08:17) ocorrerá
quando o disco de Mercúrio tangenciar internamente o limbo solar. Durante 7 horas
e meia, Mercúrio percorrerá de Leste para Sudoeste em frente ao disco solar uma
corda com extensão de aproximadamente 30 minutos de arco. A maior aproximação
do centro disco ocorrerá às 11:58 (Maior Trânsito) e
será igual a 1/3 do raio solar em ângulo de posição de 154°. Por fim, a saída
de Mercúrio terá início às 15:39 (segundo tangenciamento
interno dos limbos - contato III), completando-se às 15:42 (limbos tocam-se
externamente pela segunda vez - contato IV). A altura do Sol sobre o horizonte
de cidades do Leste Brasileiro variará em torno de 22° no início e no final do trânsito,
sendo de cerca de 52° no meio do fenômeno. Além disso,
o planeta percorrerá em frente ao disco solar 1 segundo de arco a cada 15
segundos de tempo em média.
Atividades Observacionais Sugeridas
Os equipamentos utilizados na monitoração de
manchas solares e eclipses solares parciais e anulares também podem ser usados
na observação desse evento. As atividades observacionais sugeridas são:
Cronometragens
dos Contatos
O contato I
ocorre quando o disco de Mercúrio tangencia externamente o limbo solar. Na
prática, esse instante não pode ser observado em luz branca, devido à
inexistência de superposição dos discos. Na prática, alguns segundos decorrem
até que se forme uma sutil deformação ou reentrância no limbo solar com
dimensões suficientes para ser percebida por um observador atento, munido de
instrumental adequado e sob condições observacionais favoráveis.
Recomenda-se que o
ponto onde deverá ocorrer o contato I seja identificado previamente. Ele terá
ângulo de posição de 83 graus, medidos ao longo do limbo no sentido
anti-horário (para Leste) a partir do Norte do disco solar. Registros
fotográficos ou filmagem em luz branca, com aumentos telescópios entre 100 e
400x, com apresentação simultânea da hora (com erro inferior a ±0,3s) devem ser
realizados, principalmente junto aos instantes dos contatos. Tais registros
serão usados para extrapolação do instante do primeiro contato.
O uso de filtros de
hidrogênio-alfa poderá permitir a identificação da silhueta de Mercúrio em
frente à cromosfera ou às proeminências mesmo antes do primeiro contato.
Nos instantes finais da
entrada (precedentes ao contato II) e nos instantes iniciais da saída
(seguintes ao contato III), observa-se que o disco de Mercúrio parece ligar-se
ao limbo solar por um apêndice escuro. O contato
(II/III) corresponderá ao instante
em que essa interessante ligação, denominada gota negra, (desaparecer/aparecer)
e o planeta (ficar/deixar de ficar) totalmente circundado pela luz do Sol,
respectivamente. O fim do trânsito ocorrerá em ângulo de posição de 225°, ou
seja, coincidente com o ponto Sudoeste do disco.
O Fenômeno da Gota Negra e Incertezas nas
Cronometragens
Mais proeminente
quando observada em condições atmosféricas e instrumentais precárias, a gota
negra é produzida pela perda de resolução da imagem dos limbos solar e
planetário, os quais se tornam difusos e “manchados”, interpenetrando-se e
formando uma região escura e indefinida entre eles junto aos contatos internos.
Esse fenômeno se deve aos efeitos combinados da turbulência atmosférica (~3,5”) e de difração instrumental (~1”), além de outras possíveis
limitações inerentes ao sistema óptico utilizado (~1”). Além dessas causas, análises
de observações de satélites também comprovaram que o fenômeno da gota negra
também resulta da difração da luz solar nas bordas solar e planetária, cujos
efeitos são potencializados pelo escurecimento brusco da fotosfera junto ao
limbo solar (~1”). Procure registrar com precisão de ±1s quando a gota negra
aparece e quando ela desaparece.
Em quadratura, essas
fontes de erro poderão gerar uma região indefinida com cerca de 4 segundos de
arco de extensão na imagem de um instrumento amador mediano sob condições
satisfatórias de estabilidade e transparência atmosféricas nas baixas alturas dos
contatos. Esse valor poderá então se aproximar de 1/3 do diâmetro aparente do
disco de Mercúrio.
Admitindo-se um erro
médio igual a 1/3 do comprimento dessa região indefinida, ou seja,
correspondente a 1/9 da dimensão do planeta ou do tempo de passagem em frente
ao limbo, estimamos um erro estatístico médio aproximado de 3 min./9 (0,3±0,1)
minuto (1 sigma) para os tempos dos contatos a serem
registrados.
Registro (filmagem e fotografia) da
evolução do trânsito
A monitoração do
evento com câmeras fotográficas ou filmadoras acopladas ao telescópio, deve ser
priorizada junto aos contatos, buscando também registrar o fenômeno da gota
negra. Por favor, envie suas observações, incluindo as características do seu
equipamento e condições atmosféricas para o e-mail: [email protected]
.
Circunstâncias para
Algumas Cidades Brasileiras
A Tabela 1 abaixo
lista as circunstâncias do trânsito de Mercúrio em 09 de Maio de 2016 calculadas
para algumas capitais brasileiras. Os cálculos são do autor e baseiam-se em algoritmos e elementos besselianos
divulgados por Jean Meeus (Transits,
Willmann-Bell, Inc., 1989), tendo sido utilizada a
previsão mais recente para ∆T (=68,34s).
Dados para mais cidades capitais podem ser encontrados no Almanaque
Astronômico 2016 do CEAMIG ou calculados
pelo Programa Helios_Transits.zip
desenvolvido pelo autor.
Tabela 1:
Circunstâncias para Cidades Brasileiras
Cidade |
Contato |
TU-3h Hora
de Brasília |
Altura
(o) |
Belo
Horizonte |
I |
08:13:50 |
25 |
|
II |
08:17:01 |
25 |
|
III |
15:38:49 |
23 |
|
IV |
15:41:59 |
22 |
Brasília |
I |
08:13:55 |
23 |
|
II |
08:17:06 |
24 |
|
III |
15:38:47 |
28 |
|
IV |
15:41:57 |
28 |
Florianópolis |
I |
08:13:50 |
17 |
|
II |
08:17:02 |
18 |
|
III |
15:39:05 |
22 |
|
IV |
15:42:16 |
22 |
Fortaleza |
I |
08:13:46 |
37 |
|
II |
08:16:57 |
38 |
|
III |
15:38:19 |
25 |
|
IV |
15:41:30 |
25 |
Porto Alegre |
I |
08:13:51 |
14 |
|
II |
08:17:02 |
14 |
|
III |
15:39:12 |
23 |
|
IV |
15:42:23 |
22 |
Recife |
I |
08:13:41 |
38 |
|
II |
08:16:52 |
39 |
|
III |
15:38:22 |
20 |
|
IV |
15:41:33 |
20 |
Rio de Janeiro |
I |
08:13:48 |
24 |
|
II |
08:16:59 |
24 |
|
III |
15:38:53 |
21 |
|
IV |
15:42:03 |
20 |
São
Paulo |
I |
08:13:51 |
21 |
|
II |
08:17:02 |
21 |
|
III |
15:38:57 |
23 |
|
IV |
15:42:08 |
23 |
Instruções para Uso do Programa de Trânsitos
O programa de trânsitos
poderá ser executado em sistemas que suportem o MS-DOS, como versões Windows de
32 bits. Sistemas de 64 bits, Mac ou Android exigirão
um programa emulador para criar o ambiente MS-DOS necessário para sua execução.
Ao acessar este link, um pequeno arquivo de apenas 24k, correspondente
a um diretório compactado, será baixado. Ao descompactá-lo na raiz do disco C:
ou D: de seu computador, aparecerão 1 arquivo
executável (HELIOS.exe) e 14 arquivos de dados (.txt),
os quais incluem Elementos Besselianos calculados por
Jean Meeus, a diferença Delta T(TT-UTC)(observada em eventos
passados ou extrapolada para eventos futuros), a hora do trânsito máximo e o número
do planeta (Vênus=2), necessários para cálculo de 10 eclipses de Mercúrio e 4
eclipses de Vênus. Todos os 15 arquivos deverão ser descompactados pro mesmo diretório.
Bastará então clicar sobre o nome do programa (HELIOS) para executá-lo. Caso
isso não ocorra e se o seu sistema for de 32 bits, verifique se todos os 15
arquivos estão situados num mesmo diretório de primeiro nível do disco,
exemplo: C:\Transitos\. Pois o HELIOS não rodará caso esteja localizado em
diretórios mais profundos, como C:\Astro\Transitos\, a menos que um emulador do
MS-DOS (como o DOSBox, por
exemplo) seja usado para redirecionar o sistema para o programa. Os nomes dos
arquivos de entrada são mnemônicos. Dessa forma, para o próximo trânsito,
digite m16 na entrada, sendo m para Mercúrio e 16 para 2016. Outros exemplos
são: m99 (trânsito de Mercúrio em 1999), v4 (trânsito de Vênus em 2004) etc.
História das Observações de Trânsitos
Saiba mais sobre a interessante
história das observações dos trânsitos de Mercúrio e como elas foram usadas
para determinação da Unidade Astronômica, lendo este excelente artigo do Prof. Oscar T. Matsuura.
Recomendação Importante
Olhar para o Sol sem
proteção adequada pode causar cegueira permanente,
por isso, não tente observar este evento sem o uso de um filtro apropriado para
a observação do Sol. Em caso de dúvida quanto à segurança de seu equipamento,
utilize a projeção da imagem do Sol, que é um recurso mais seguro e que
dispensa o uso de filtros para observação solar. Usando a ocular de menor
aumento (mais luminosa), projete a imagem do Sol diretamente sobre um anteparo
plano que proporcione uma imagem com contraste apropriado. Mesmo nesse caso,
contudo, atente para o fato de que o posicionamento correto do telescópio
deverá ser realizado com base na sombra que o instrumento projeta e nunca olhando-se através da ocular desprotegida.