Valença
de Ontem e de Hoje
CAPÍTULO 5
ASPECTOS ECONÔMICOS
ESPLENDOR, DECADÊNCIA E RESSURGIMENTO
Os
primeiros caminhos e picadas que davam acesso, dos sertões do rio Preto ao vale
do Paraíba, foram abertos pelos índios Purus
e Araris. Eram, ao que se supõe,
desvios irregulares nos escarpados das serranias.
Afirma-se
que, a construção de estradas pelo interior fluminense teve o seu maior vigor
em 1808, a cargo, principalmente, da “Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas
e Navegação”, criada em 23 de agosto daquele ano. Era o capitão de Ordenanças
Inácio de Souza Werneck incumbido da exploração de estradas.
Dentre
as obras públicas e os serviços que executou. o Intendente Geral da Polícia,
Paulo Fernandes Viana, desembargador do Paço, durante os treze anos de sua gestão,
está incluída no Memorial por ele
apresentado (Rev. do Instituto Histórico —
vol. IV), “a picada que, de Iguaçu, fizera abrir até rio Preto. (Minas) — para
o rei viajar de sege.”
“Só
em 1819, ou pouco depois, abriu-se, na região de Valença, uma estrada regular,
que se derivava do Caminho Novo das
Minas”, no dizer de Garcia Rodrigues o patriarca das estradas carroçáveis
ou de rodagem no interior do Brasil. Crismaram-na de estrada
nova. Levou-se, mais tarde, essa estrada a outras que se abriram de 1821 à
1824, para Desengano, Valença e Rio Preto. Seu tronco principal teve a denominação
de estrada do Comércio, por ter sido
projetada e executada pela “Junta do Comércio do Rio de Janeiro” e para
“atender às urgentes necessidades de dar maior expansão ao transporte do café”
— escreve Basílio de Magalhães.
As
primitivas vias de comunicação foram os caminhos
abertos por Inácio de Souza Werneck e José Rodrigues da Cruz, que
desbravaram o sertão valenciano, para dar passagem à civilização. Ao lado de
Inácio de Souza Werneck — o desbravador incansável — Custódio Ferreira
Leite, mais tarde barão de Aiuruoca, foi, sem dúvida, um dos pioneiros do
povoamento de Valença,
A
respeito do Barão de Aiuruoca, extraímos da Seleta
Brasiiense, de J. M. P. de Vasconcelos (ed. 1870 — págs. 52 a 55), a
seguinte biografia:
“Nasceu
na comarca do Rio das Mortes, da província de Minas, a 3 de dezembro de 1782.
Desde tenra idade revelou talento e perspicácia, que seriam aproveitados
frutuosamente, sê a escassez das luzes, mormente, em uma província central,
que alumiava o Brasil colônia, lhe permitissem dedicar-se às letras.
“Ao
fim de entregar-se à lucrativa indústria da mineração, partiu o jovem Custódio
com seus irmãos para as margens do rio Preto; mas, pouco se demorou aí, pois
como curioso observador, percorreu as províncias sul-americanas que pertenciam
à Espanha e que hoje constituem outros tantos Estados independentes. Aguilhoado
pelo espinho da saudade, e abandonando projetos de viagens mais longínquas,
volveu aos lares pátrios.
“Seu
lugar estava de antemão marcado. Necessitavam as províncias do Rio de Janeiro
e Minas de um homem, assaz dedicado aos seus interesses, para as pôr em
comunicação fácil e segura por meio de estradas e pontes.
“Gênio
empreendedor, o capitão-mór (posto que lhe fora conferido em sua mocidade) não
trepidava em embrenhar-se pelos sertões, ainda por esse tempo povoado de
selvagens, atravessar a nado caudalosos rios, expôr seus dias às feras.
“Abrir
fazendas era para o capitão-mór Custódio Ferreira Leite negócio de maior
facilidade, em que sentia suma satisfação. Amplamente, ganharam com isso, seus
amigos e protegidos, e mais de um personagem deveu a origem de sua fortuna à
magnanimidade do distinto mineiro.
“Seria
Custódio Leite um milionário se cuidasse só de seus interesses; porém,
esquecia de si, para só se lembrar dos outros, preferindo a satisfação de
fazer bem às positivas vantagens de colossal riqueza. Tinha em compensação a
posse da maior popularidade.
“O
fundador do Império distinguia-o com sua particular amizade, e agraciou-o com a
comenda da Ordem de Cristo, e com a patente de coronel de milícias.
“Sua
modéstia, e o cuidado que tinha em ocultar seus serviços, fez a
impossibilidade de seguir par e passo essa benfazeja existência.
“Abriu
a estrada chamada da Policia que se
dirige de Iguaçu a Minas; mandou fazer os aterros do Engenho do Brejo, e por muitos anos administrou os trabalhos das
estradas de Sapucaia e Feijão-cru.
Ofereceu à província do Rio de Janeiro a estrada que, às expensas suas,
mandou fazer de Magé até Sapucaia, assim como a ponte lançada sobre o rio
Paraíba no trajeto dessa estrada, cedendo gratuitamente do privilégio, que por
muitos anos lhe fora outorgado.
“Com
o produto de subscrições por ele agenciadas, e com seus auxílios pecuniários,
erigiram-se ou repararam-se as matrizes da Barra Mansa, Arrozal Vassouras,
Conservatória, Valença, Sapucaia e Mar de Espanha. Nesta vila, construiu ele,
a casa da Câmara com prejuízo de algumas dezenas de contos, concluindo-se
pouco depois de seu passamento, um formoso e vasto edifício, onde, em 1860, se
achava estabelecido o “Colégio Brandão”.
“Quando
lhe permitiam as inúmeras ocupações da vida positiva, entregava-se à leitura
de bons livros, especialmente daqueles que tratavam de agricultura e indústria.
Assim, introduziu ele melhoramentos na cultura do café, e iniciou a da batata
de Demerara nos municípios de Mar de Espanha e Leopoldina.
“Exerceu
muitos cargos eletivos, foi-lhe dado o título de Barão no Ministério do Marquês
de Paraná, e teve assento na assembléia provincial de Minas, aonde sua velha
experiência era sempre ouvida com respeito.
“Vítima
de uma congestão cerebral, faleceu a 17 de novembro de 1859, pobre e onerado de
dívidas “.
Abrindo
a antiga estrada chamada da Policia, que
se dirigia de Iguaçu a Minas Gerais, passando por Valença, trouxe para esta
cidade um grande impulso, ligando-a à Corte.
Em
4 de fevereiro de 1829, isto é, no ano seguinte ao da Lei Orgânica das
Municipalidades Brasileiras (1o de outubro de 1828), na sessão da Câmara
Municipal de Valença, foi aprovada a matéria relativa às posturas sobre
estradas de rodagem e caminhos de serventia pública e particular e construção
de pontes e estivas necessárlas,
ficando deliberado que os fazendeiros e proprietários de estâncias se
obrigariam a compor e ratificá-los com todas as benfeitorias, protegendo a
conservação das estradas públicas, de acôrdo com o plano do govêrno de S.
Majestade imperial, de maneira a facilitar o trânsito, obrigando-se, ainda, com
relação às estradas particulares, a conservá-las, de modo a proporcionar a
passagem de dois animais carregados, a par
um do outro, sem obstáculos e perigos, principalmente nos lugares onde não
haja possibilidade de desvios
Pela
deliberação de 12 de março de 1845, foi ordenada a construção da estrada de
Santo Antônio do Rio Bonito, em comunicação com a da Policia. Também, por força do decreto No. 879, de 17 de setembro
de 1856, construiu-se a estrada de Valença, passando por Ipiabas, até à
divisa de Piraí.
Em
1865, o Barão do Rio Prêto, filho do Visconde do Rio Prêto, construiu, às
suas expensas, a estrada no trecho compreendido entre a fazenda de “Santa
Rosa” e o povoado de Taboas. A estrada de Ipiabas até à ponte do Zacarias,
em Santa Izabel do Rio Prêto, começou a ser construída em 28 de maio de 1882.
As
“disposições gerais” da Lei de Meios da Província, de 9 de junho de 1839,
§ 24, do art. 3o, autorizaram o governo a aceitar dos moradores de
Santo Antônio do Rio Bonito (Conservatória) a oferta do restabelecimento de
uma antiquíssima estrada.
Em
14 de outubro de 1861, inaugurava-se a estrada de rodagem de Valença a
Desengano, cujas obras importaram em Cr$ 20.000,00 mais ou menos, importância
conseguida por subscrição popular entre os habitantes do município. E’ essa
a rodovia mais antiga de Valença.
Em
1886, a senhora Maria Bibiana Araujo de Lélis e Silva oferecia à servidão pública
um trecho da estrada que mandara construir à margem da linha férrea da “Rio
das Flores”, em terras da fazenda do “Paraíso”, então pertencentes a
Valença.
A
“Carta Corográfica da Província do Rio de Janeiro — de Pedro Alcântara
Bellegarde e Conrado Jacob Niemeyer — levantada em 1858 a 1861, segundo as
instruções contidas no decreto provincial de 30 de outubro de 1857, assinala,
entre outras, as estradas de rodagem para Barra do Piraí, Valença e São José
do Turvo.
Nas
redondezas do antigo arraial de Conservatória, a “Carta Corográfica” nos
mostra sinais indicadores de onze fazendas. Seriam, de certo, as mais extensas
propriedades rurais e de maior produção de café, naquela época.
Referindo-se
à primitiva estrada de rodagem de Valença, aqueles autores escrevem:
“A
estrada de rodagem de Valença parece ter sido aberta obedecendo em alguns
pontos à mesma direção do antigo caminho
dos índios Araris, assinalado no mapa
do sertão do Rio Prêto
(1808), da coletânea de documentos relativos ao capitão de ordenanças Inácio
de Souza Werneck. E’ das mais antigas estradas do município de Valença. Começa
na vila de Conservatória e no lugar chamado “Benfica”, segue em direção
à fazenda de “São José” e daí a Rancho
Novo. Deste posto se estende até à cidade de Valença, indo ter,
precisamente, seu fim, no começo da rua Nilo Peçanha. Essa estrada atravessa
terrenos pouco acidentados numa parte e planos em outros trechos. Destaca-se uma
variante que de “Bebedouro” passa pelas fazendas “Capelinha”, “São
Marcelo”, “Santana”, “Olaria”, “Santa Rosa”, “Santa Zelinda”,
“Cachoeirinha”, “Cantagalo” e “Chacrinha”, ligando, de novo, à
estrada de Valença.
“A
conhecida “estrada do Turvo” tem seu início na vila de Conservatória e
atravessa terrenos sinuosos e elevados, e, às vezes, planície, seguindo até
à localidade denominada “Bicame”.
O
sistema rodoviário do município de Valença deixa ainda muito a desejar, em
relação a outros municípios fluminenses, se considerarmos a necessidade inadiável
da diminuição de distâncias, no interesse direto dos rumos econômicos em
favor da prosperidade local.
Interessando às atividades agro-pecuárias e ao desenvolvimento turístico, as rodovias valencianas, conquanto assistidas pelos governos estadual e municipal, estão muito longe de favorecer ao maior desembaraço comercial e social de Valença. Não obstante, possui o município uma rede rodoviária que, se não é boa, ao menos satisfaz, em parte, à penetração do território municipal, principalmente na zona servida pela Rede Mineira de Viação, em cujos distritos, distantes da sede municipal, as comunicações estão sujeitas à desvantagem dos fatores tempo e espaço. Na época da sêca, as rodovias oferecem alguma facilidade ao trânsito, podendo escoar-se a produção interna, verificando-se, também, o movimento de forasteiros que, no verão, visitam a cidade.
Na
estação chuvosa, grande parte do município sofre o seu colapso rodoviário. O
tráfego, penoso e quase impossível, diminui consideravelmente. O intercâmbio
distrital paraliza por completo. A lavoura e a pecuária se vêem oprimidas.
Ninguém quer viajar. E’ arriscar...
Contudo,
os valencianos experimentam alentadoras esperanças, ante os planos rodoviários
que os governos estão esboçando. E’ de se acreditar que, em breve, tenha
Valença um plano rodoviário próprio, com que venha a beneficiar-se
definitivamente. A reconstrução da estrada Valença-Barra do Piraí, melhorada
a sua pavimentação e retiradas algumas curvas e subidas, observando-se o mesmo
no trecho de Valença a Rio Prêto, passaríamos a ter uma estrada-tronco, a
rodovia Valença-Barra do Piraí-Rio Preto.
A
estrada de Valença a Desengano, via Quirino, alargada e melhorado seu piso,
viria corrigir o sacrifício de uma volta de mais de 60 kms. obrigatória, pela
estação de Sebastião Lacerda, quando, para a cidade de Vassouras, via Quirino,
a viagem seria atenuada com a diferença, para menos, de mais de 30 kms.
Uma
outra estrada, a de Valença-Santa IzabeI, reformada inteiramente, facilitaria
as comunicações da sede municipal com os distritos de Conservatória e Santa
Izabel do Rio Preto, na zona da Rede Mineira. Constituiriam, assim, essas três
rodovias o sistema rodoviário suficiente, uma vez aperfeiçoado tecnicamente,
para atender às necessidades,
assinalando uma nova fase de progresso indisfarçável para o município de
Valença, quer na sua expansão econômica, quer no intercâmbio social entre o
Rio de Janeiro e municípios vizinhos. Não faltariam empresas de ônibus e de
transportes de mercadorias, organizadas, contribuindo para o desenvolvimento de
Valença,
O
tipo de pavimentação das rodovias de Valença é, em geral, o de terra batida,
com exceção do trecho compreendido entre as fazendas da “Vista Alegre” e
“Santa Teresa” (Esteves), que se apresenta com cascalho. A largura das
estradas, geralmente, permite o cruzamento de veículos a uma velocidade de 20
kms horários, mais ou menos. Alguns trechos exigem, entretanto, a parada e o
desvio dos veículos, e, muitas vezes, a marcha-a-ré. Excetuando-se as rodovias
Valença-Taboas e Valença-Barra do Piraí (até o Vira-Táboa),
as demais estradas têm fortes rampas e curvas de pequenos raios,
apresentando muitas delas forma irregular. E’ absoluta, a ausência de
sobrelevação nas curvas.
Trecho da estrada de rodagem Valença-Barra do Piraí
A
estrada Valença-Barra do Piraí, que é a principal e a mais movimentada, liga
entre si os municípios de Valença e Barra do Piraí. Essa rodovia, ao partir
da cidade de Valença, atinge logo a estação ferroviária de Chacrinha e, em
seguida, a de Esteves. passando, antes, pela serra do Vira-Táboa, que fica entre a fazenda de “S. Manoel de Baixo” e
uma antiga caieira, pouco além da.
estação de Esteves. Antes, porém, da serra do Vira-Táboa, a estrada se bifurca, tomando as seguintes direções:
uma, à direita, que vai à Conservatória, e outra, à esquerda, que se destina
à cidade de Barra do Piraí. Aproximando-se desta localidade, surge ainda a
subida do “Lara Fortes”. Pouco antes da fazenda da “União”,
a estrada se bifurca à direita, tomando a direção de Ipiabas.
A
rodovia Valença-Desengano, via Quirino, quase intransitável na época seca, é
constituída de um trecho da estrada Valença-Barra do Piraí (entre a cidade de
Valença até à segunda bifurcação, próxima a um açude situado depois de
Esteves), daí prosseguindo para Quirino e Desengano, de onde segue para a
cidade de Vassouras, à margem da bitola larga da Central do Brasil e do rio
Paraíba.
A
estrada Valença-Conservatória-Santa Izabel tem início na rodovia Valença-Barra
do Piraí, justamente no local próximo à antiga fazenda “Santa Teresa”,
pouco depois da estação de Esteves. Bifurca-se aí, tomando à direita e
passando pelo lugar denominado Rancho
Novo, depois de haver atingido a estrada, que conduz às fazendas de
“Santana” e “Vista Alegre”.
A rodovia Valença-Ipiabas tem início no entroncamento da estrada Valença-Conservatória-Santa Isabel, no lugar denominado Rancho Novo, próximo à fazenda de “Bom Jardim”, passando pelas fazendas da “Cachoeira” e “Floresta”, para depois alcançar a sede do distrito de Ipiabas.
Gráfico demonstrativo dos sistemas rodoviário e ferroviário
de Marquês
de Valença, quando Conservatória ainda estava anexada
ao município de Barra do Píraí — 1944.
A
estrada Valença-Pentagna-Rio Preto, ao partir de Valença, segue em direção
à ponte de João Bonito, sobe a serra
da “Charneca” e passa pela fazenda da “Bemposta”, atingindo, em seguida,
a sede do distrito de Pentagna. Prosseguindo, passa pela “Cooperativa de Laticínios
S. S. Rio Bonito”, a dois quilômetros de Pentagna, e pela fazenda das
“Cruzes”, transpondo a serra do “Rio Preto“, pela fazenda do sr. Vasco
Monteiro e por outras propriedades, até alcançar a sede do distrito de Parapeúna
(ex-Rio Preto), que se encontra à margem esquerda do rio Preto.
A
rodovia Valença-Santa Teresa começa na cidade de Valença, passa pela fazenda
de “Santa Rosa”, alcançando, em seguida, a estação ferroviária de
Taboas, daí prosseguindo até à sede do município de Rio das Flores (ex-Santa
Teresa). De Rio das Flores dirige-se para Porto das Flores, alcançando a
estrada “União e Indústria”, com destino à Juiz de Fora.
O
trecho rodoviário Ipiabas-Barra do Piraí passa pelas fazendas
“Cachoeirinha” e “Ibitira”, alcançando os terrenos da fazenda “União”,
onde se liga à estrada Valença-Barra do Pirai.
Além
dessas estradas, outras há, de relativa importância, que se dirigem para as
fazendas, cortando o município em várias direções. Dessas estradas, as
principais são: a da fazenda de “Sant’Ana”, a da fazenda do “Vargas”,
a da fazenda da “Harmonia”, a da fazenda do “Destino”, a da fazenda do
“Cláudio” e muitas outras.
Relativamente
ao tipo de pavimentação, em geral, as estradas do município de Valença são
de terra batida consolidada, destacando-se a de “Valença-Barra do Piraí”,
que é ensaibrada com sermorão
fino.
Damos, a seguir, quadros demonstrativos da rede rodoviária do município de Marques de Valença:
RODOVIAS ESTADUAIS | EXTENSÃO | CONDIÇÕES TÉCNICAS | OBRAS DE ARTE | |||||
Total | Dentro do Município | Rampa Máxima (%) | Raio Mínimo (ms.) | Largura (ms.) | No. de pontes e pontilhões | No. de boeiros | ||
Média | Mínima | |||||||
VALENÇA - B. DO PIRAI | 36 | 20 | 10 | 30 | 6 | 3 | 5 | 320 |
VALENÇA - RIO PRÊTO | 33 | 33 | 20 | 30 | 4 | 3 | 7 | 200 |
VALENÇA - RIO DAS FLÔRES | 18 | 12 | 10 | 30 | 6 | 5 | 14 | 100 |
RODOVIAS MUNICIPAIS | EXTENSÃO | CONDIÇÕES TÉCNICAS | OBRAS DE ARTE | |||||
Total | Dentro do Município | Rampa Máxima (%) | Raio Mínimo (ms.) | Largura | No. de pontes e pontilhões | No. de boeiros | ||
Média | Mínima | |||||||
VALENÇA - SANTA IZABEL | 56 | 56 | 45 | 30 | 2,5 | 1,8 | 7 | 75 |
VALENÇA - DESENGANO | 25 | 25 | 45 | 30 | 2,5 | 1,8 | 3 | 25 |
VALENÇA - IPIABAS | 37 | 37 | 45 | 30 | 2,5 | 1,8 | 2 | 9 |
No orçamento do Estado do Rio de Janeiro, relativo ao ano de 1952, figura a verba de Cr$ 20.000.000,00, destinada ao reparo e asfaltamento da rodovia Barra do Piraí-Marques de Valença, que, desse modo, retirada a maioria das curvas, será encurtada em 8 kms, passando a ter o total de 28 kms de extensão.
E’
inegável que o primeiro grito para a construção de uma estrada de ferro
(bitola estreita), ligando a cidade de Valença à antiga E. F. D. Pedro II,
atual Central do Brasil, houvesse partido do seio da Câmara Municipal de Valença,
em sua sessão de 8 de janeiro de 1863.
A
Câmara, considerando o alcance dessa iniciativa, graças aos esforços do
vereador João Batista de Araujo Leite, fez imediatamente caloroso apelo ao
Governo Imperial, solicitando a construção de um ramal que ligaria Valença à
estrada de ferro “D. Pedro II”, em Desengano. Foi, então, nessa ocasião,
nomeada uma comissão que ficou incumbida de presidir os trabalhos da benemérita
campanha, constituindo-se dos seguintes cidadãos: Barão do Rio Preto (mais
tarde Visconde), então presidente da Câmara, dr. Aureliano Cândido Tavares
Bastos, dr. Manoel Antônio Fernandes, Herculano Furtado de Mendonça, Peregrino
José da América (depois Visconde de Ipiabas) e majores Antônio Leite Pinto e
Antônio Carlos Ferreira.
Na
sessão da Câmara de 19 de junho daquele ano, leu-se uma portaria do governo da
Província, na qual, se declarava que a representação valenciana sobre a
construção de um ramal férreo para a cidade de Valença fora encaminhada ao
Ministro da Agricultura.
Em
19 de junho de 1865, por proposta do vereador dr. Guilherme de Almeida Magalhães,
foi pedido o privilégio de uma estrada de ferro entre Valença e Desengano, com
ligação à de “D. Pedro II”, e como se conclui da leitura da ata da sessão
da Câmara, de 4 de setembro desse mesmo ano, foi concedido esse privilégio.
Entretanto, o sr. Luiz Damasceno Ferreira, autor da História de Valença, publicada em 1924, nos dá notícia de que
esse privilégio deixara de ser concedido, sem outros esclarecimentos.
Pela
portaria do Governo da Província, lida em sessão de 4 de dezembro de 1866,
sabe-se que a Diretoria da Estrada de Ferro “D. Pedro II”, permitira
chegassem os trens, uma vez por dia, à estação de Desengano, depois de feitas
as respectivas manobras em Vassouras, a fim de receberem passageiros e cargas.
Nessa
época, fundava-se, então, a Estrada de Ferro União Valenciana (bitola
estreita), cuja companhia, com sede na cidade de Valença, teve a sua primeira
diretoria assim constituída: presidente — dr. Ernesto Frederico da Cunha;
secretário — Antônio Manoel de Menezes; diretor — Paulo José de Faria
Brandão; engenheiro-chefe e gerente – João de Carvalho Borges Junior; e
fiscal do governo provincial — dr. Artur Alvim. A Mesa destinada à Assembléia
Geral era composta dos srs. dr. Carlos Augusto de Oliveira Figueiredo —
presidente; Lúcio Martins Esteves — 1o secretário; Jerônimo José
de Macedo — 2o secretário.
Eram membros do Conselho Fiscal os cidadãos — dr. Inácio de Loyola Gomes da
Silva, Agostinho José Lopes da Silva e Maximiano de Siqueíra Silva da Fonseca.
Pelo
decreto n. 8.641, de 27 de abril de 1866, o governo concedia privilégio, por
espaço de 90 anos, à Companhia União Valenciana que se obrigava, então, a
construir uma estrada de ferro que, partindo da cidade de Valença, fosse
comunicar-se com a Estrada de Ferro D. Pedro II (bitola larga), em Desengano.
A
construção da antiga estrada de ferro “União Valenciana” foi autorizada
pelo decreto N. 3.945, de 11 de setembro de 1867. A 4 de janeiro de
1868, tomaram-se as primeiras medidas para o inicio das obras de construção da
“União Valenciana”, ficando, pelo decreto No. 4.246, de 19 de outubro de
1868, assentadas as bases para as tarifas desse ramal.
A
25 de outubro de 1868, organizou-se a Cia. Estrada de Ferro União Valenciana, e
a sua diretoria recebia propostas para a construção do leito da estrada de
ferro, marcando o prazo até 8 de novembro para seu recebimento.
Pelo
decreto de 21 de outubro de 1868, foi fixado o capital da Companhia, cujo fundo
social era de Cr$ 600.000,00, mais tarde elevado para Cr 800.000,00, e o
governo da Província do Rio de Janeiro, por força da lei N. 1.459,
de 15 de janeiro de 1869, adquirira 1.000 ações no valor nominal de Cr$
200,00.
Pelo
decreto N. 4.393, de 19 de julbø de 1869, foram definitivamente
aprovados os planos da estrada, organizados pelo engenheiro-chefe da Cia. —
Herculano Veloso Ferreira Pena. Achava-se a estrada dividida, para efeito de
construção, em oito seções, atingindo cada uma a 3 quilômetros de extensão,
com exceção da sexta seção, que era de 4 quilômetros.
A
primeira enxadada com que se iniciaram as obras verificou-se no dia 4 de
fevereiro de 1869, às 9 horas da manhã, nas proximidades da cidade de Valença,
sendo, em seguida, atacada a construção em vários pontos da linha projetada.
O trecho entre Desengano (antiga Juparanã) e Valença, que constituía a 1a
seção, compreendia as estações de Quirino, Esteves, Chacrinha e Valença,
foi dado ao tráfego no dia 18 de maio de 1871, inaugurando-se, assim, o
primeiro ramal da “União Valenciana”. A sua construção importou em Cr$
742.531,44.
Houve
grandes festas comemorativas, com a presença de Sua Majestade o Imperador D.
Pedro II, que assistira à inauguração, tendo-lhe sido oferecido, pela
diretoria da “União Valenciana”, num dos armazéns da estação de Valença,
um lauto banquete, a que compareceram altas autoridades e grande número de
convidados especiais da Corte. Esse banquete importou em Cr$ 6.500,00.
Sobre
a personalidade do engenheiro construtor da E. F. União Valenciana, Herculano
Veloso Ferreira Pena, o engenheiro Araujo Viana, em sua monografia intitulada
“Saneamento de Valença”, publicada em 1894, conta-nos o seguinte episódio:
“O dr. Herculano Pena era tão paciente, levava a
sua calma a um ponto tão elevado que, contam, ao traçar aquele engenheiro a
estrada de ferro “União Valenciana”, coincidiu passar o eixo da estrada próximo
à casa de um lavrador este, que não era homem de meias medidas e, com certeza,
um pouco exaltado, zangou-se com a diretriz do traçado e vociferou:
- O que admira, o que parece ser uma embirrância é
que, sendo tão grande este mundo, havendo tanto lugar onde passem estradas de
ferro, queiram meter uma estrada junto de minha casa !...
Ao que replicou o engenheiro:
- Meu amigo, o que admira, o que parece ser uma embirrância
de sua parte é que, sendo tamanho este mundo, havendo tanto lugar para edificar
casas, viesse Vmcê edificar a sua em lugar por onde havia de passar uma estrada
de ferro.
Esta razão teve tal força, que o lavrador desistiu
da sua oposição, e, segundo consta, tornou-se até o melhor auxiliar do
engenheiro”.
E
prosseguindo, Araujo Viana nos relata:
“Assim como acabei de referir a esta pequena anedota para caracterizar bem o espírito da época, estereotipado naquela figura de lavrador, que — ainda bem !— reconsiderou mais tarde o seu ato impensado, vou narrar, conforme rezam os jornais do tempo e o primeiro relatório da Cia. União Valenciana, a guerra inconsciente movida pelos carroceiros, que, com o transporte de cargas, entre Valença e Desengano, e vice-versa, queriam concorrer com a estrada de ferro, asfixiando-a em seus começos. Senão, leiamos: “Acresce que mesmo desse pouco (movimento de exportação) uma parte considerável ainda é transportada por tropas e carroças que, não encontrando entre a estação terminal de Valença e os diversos centros produtores ocupação constante, devido isto à mencionada escassez de cargas, tentam, a todo custo, estabelecer, entre Valença e Desengano, uma concorrência insensata e impossível de sustentar-se...”
A primeira locomotiva que correu entre
Desengano e Valença em 1871
A
“União Valenciãna” foi construida por iniciativa particular, havendo sido
os seus principais patrocinadores o Visconde do Rio Preto e o comendador Manoel
Antônio Esteves.
Por
ocasião da inauguração dessa estrada, segundo noticiário da época, a cidade
nunca teve tamanha festividade, tal o brilho e a imponência das comemorações,
com a presença de D. Pedro II, que se fazia acompanhar de respeitável
comitiva. Raramente experimentaram os valencianos tanta emoção e regozijo,
assistindo às solenidades desse extraordinário acontecimento.
A
“União Valenciana”, que era construída em bitola estreita de 1,10m, tinha
a sua sede na cidade de Valença, sita à antiga
praça Cel. Leite Pinto, atualmente desaparecida com a construção de oficinas
da Central do Brasil. Sabe-se, pela leitura de Saneamento de Valença, que a União Valenciana foi a primeira
estrada de ferro, de bitola estreita que se construiu no Brasil, e que foi
apelidada por um membro do Senado de “uma
maravilha, na espécie”.
A
“União Valenciana” teve como engenheiros, além de seu construtor
dr. Herculano Veloso Ferreira Pena, comendador Pedro Moreno de Alagão, João
Gomes Ribeiro do Val, João de Carvalho Borges Junior e Antônio de Noronha
Gomes da Silva, e, como guarda-livros, por longos anos, o cidadão José de
Almeida Ribeiro Junior, mais tarde substituído pelo sr. Manoel de Andrade
Ribeiro.
Antes
da inauguração do primeiro trecho ferroviário, o trajeto entre a cidade de
Valença e o povoado dê Desengano se fazia por meio de carros de tração
animal, alugados a João Batista de Araújo Leite.
A
ligação das linhas da “União Valenciana” com a estrada de ferro “Rio
das Flores”, era, a esse tempo, já uma velha aspiração dessa última
empresa, cuja concessão fora obtida por decreto de 26 de julho de 1874. Em 7 de
julho de 1875, foi celebrado acordo para estabelecimento de tráfego mútuo
entre a “Central do Brasil” e a “Rio das Flores”.
O
trecho da ferrovia entre Valença e Rio Preto (Estado de Minas), com um percurso
de 39 kms, foi inaugurado em 1882, com a presença de SS. AA. Imperiais os Conde e Condessa d’Eu, que, com sua numerosa e
distinta comitiva, foram recebidos festivamente pelo povo da cidade de Valença.
No trajeto de Valença àquela cidade mineira, deu-se, no dia da inauguração, com o trem especial que os conduzia, lamentável incidente, ocorrido em virtude de incêndio no vagão que levava os foguetes e fogos de artifício, destinados às comemorações. Muitos dos que viajavam no trem despreocupadamente, alarmados, de surpresa, com o incêndio que lavrava em todo o vagão se precipitavam, atirando-se para fora, pelas janelas, com o trem em vertiginosa carreira. Algumas pessoas que se achavam no carro onde estava o material inflamável sofreram queimaduras bem sérias. A História de Valença, de Luiz Damasceno Ferreira, registra o fato, destacando-se os nomes de Custódio Antônio da Silva, do farmacêutico Teófilo Alves dos Santos e Joaquim Cândido de Oliveira, como vítimas de escoriações diversas. Parado o comboio, desceram logo Suas Altezas e demais pessoas, as quais, trataram de prestar imediatos socorros aos feridos.
Antiga estação da
“União Valenciana” - 1884
Um fato ocorrido, nessa situação embaraçosa, mereceu especial atenção dos circunstantes. Em meio à confusão que, de momento, se estabeleceu, Sua Alteza, a Cøndessa d’Eu, preocupada em dar assistência aos feridos, não percebeu que deixara cair, de suas mãos, o vistoso e rico leque de finas rendas. Entre os presentes havia um modesto cidadão, de nome João Norberto Brasiel, que, solícito, o apanhou e, correndo em direção à Condessa, beijou o leque, com reverência, entregando-lhe, em seguida, bastante emocionado. A Princesa, radiante de alegria, apertou a mão da Brasiel.
De
Valença a Rio Preto a estrada passou pelo mesmo traçado da projetada linha de
tração animal, com a bitola de 1,50m, para a qual havia sido concedido privilégio
pelo Decreto N. 5.593, de 11 de abril de 1874, de 30 anos, aos cidadãos
engenheiros João Gonçalves de Araujo e Agostinho Polidoro Xavier Pragana,
cujos direitos e obrigações foram mais tarde transferidos a Miguel Zacarias da Alvarenga e Francisco
Terezio Porto Neto.
Na
monografia Saneamento
de Valença,
encontramos os seguintes
comentários:
Comendador Manoel Antonio Esteves
“Deixa-se êsse comboio (ao referir-se o autor à Central do Brasil, bitola larga) e toma-se a “União Valenciana”, que começa a correr no município de Valença. Semelhantes impressões sentimos ao contemplar a natureza das terras fluminenses. A primeira estação é a de Quirino, ponto de parada conveniente a uma região agrícola de café. A pequena estação é situada num arraial que tem modesto campanário. O trem vai parar na estação de Esteves, nome dado em homenagem ao Comendador Manoel Antônio Esteves, cuja memória é venerada em Valença e que fizera doação à estrada daquêle edifício, construído à sua custa”.
Abrindo aqui um parênteses, orgulha-nos o fato de que, ao Comendador Esteves, foi conferido, pelo Governo Imperial, o título honorífico, em virtude de decisivo esforço e serviços de benemerência com que cooperou na efetivação da construção da E. F. União Valenciana. O Comendador Esteves foi, inegàvelmente, um dos baluartes dessa ferrovia, e mereceu, por isso, elogio honroso da Corte, cujo documento, datado de 21 de julho de 1871, está assim redigido:
—
“A princesa Imperial, regente, em nome do Imperador o senhor D. Pedro Segundo,
resolve nomear oficial da ordem da Rosa a Manoel Antônio Esteves, pelos serviços
relevantes prestados na construção da Estrada de Ferro de Valença que, por
iniciativa particular e sem auxilio do Govêrno, levou a efeito tão útil melhoramento
para a agricultura do pais”.
“Nêsse local
— continua o autor de Saneamento
de Valença — residem
agricultores, ilustres descendentes dêsse finado lavrador. Em outeiro próximo
está edificada a casa de vivenda da fazenda de “Santo Antônio”,
estabelecimento importante onde em sua maior parte o trabalho agrícola é
desempenhado por inúmeros colonos italianos.
Seja-nos
permitido, em passando, não omitir o nome do benemérito fazendeiro Antônio
Manoel de Menezes, diretor e um dos proprietários do referido estabelecimento.
A imigração italiana foi, para bem dizer, introduzida por este
cavalheiro,
no município de Valença. Todos devem recordar-se dos serviços ingentes por
ele prestados em 1889, indo e
vindo, inúmeras vezes, em plena canícula, da Ilha das Flores, para a cidade e
desta para Valença, levando em sua companhia magotes de colonos, aos quais se
afeiçoava e tratava carinhosamente, assistindo em suas doenças e fornecendo
mesmo contingentes dêsses válidos trabalhadores a vizinhos e amigos em pontos
afastados. O Govêrno Imperial quis galardoá-lo, mas deixou de o fazer porque o
sr. Menezes não aceitava nenhuma distinção honorífica que não fosse à
benquerença dos seus patrícios, cuja estima êle sempre apreciou em subido
grau.
“De
Esteves à Valença só existe uma parada intermediária que é a de Souza
Barros (Chacrinha), pequena estação encravada em terras pertencentes às
fazendas de “Campo Alegre” e “Chacrinha” onde, consta, abundam as
melhores e mais copiosas matas (160 alqueires), superior terreno para a cultura
do café. Outrora propriedade do Barão da Vista Alegre, foram compradas ùltimamente
pela importante firma Esteves, Irmãos & Cia., do Rio de Janeiro.
“Quem,
há 30 anos, transitasse pelas regiões percorridas hoje pelas vias férreas que
cortam ou margeiam os abandonados caminhos de rodagem, e que procurasse Vassouras e Valença, apesar da incômoda
viagem a cavalo e de tróli entre imensos atoleiros e pelo encontro malsinado
dessas récuas de burros, chamadas tropas,
ficava contentíssimo e encantado perante a enorme extensão de morros
cultivados de café, riqueza inaudita que fez, desses municípios, os mais prósperos
da antiga Província e quiçá do Brasil”.
Do
antigo jornalista valenciano dr. Dario Furtado de Mendonça, são os seguintes
trechos, publicados na Comarca de Valença:
“Até 1910 era péssimo o sistema de viação férrea
ao serviço do município de Valença. Três emprêsas, dessa ordem, que além
da Estrada de Ferro Central, cortavam o nosso território, arrastavam-se numa
luta recíproca, mesquinha, comprometendo assim, os interêsses locais, a cujo
incremento elas se destinavam. De sorte que a ação reparadora do tempo,
devendo influir no desenvolvimento da fértil região em que operavam tais emprêsas,
se achou materialmente frustrada pelos expedientes com que cada uma delas
julgava acertado preservar a sua vida, à custa da destruição das outras. Em
última análise, essas incansáveis manobras acabaram por constituir uma origem
de desordens para aquelas emprêsas e de ruína para o município de Valença,
sem remédio capaz de regenerar os métodos da sua viação rápida, com que
contava para a saída dos seus produtos”.
Em
março de 1910, com festiva vibração, ecoou, no município de Valença, a idéia
da encampação da antiga “União Valenciana” à Central do Brasil. Uma
representação nesse sentido foi dirigida pelos habitantes de Valença, Santa
Teresa e Rio Preto ao governo da União, pedindo a ligação da “União
Valenciana” a “Rio das Flôres”, de acordo com os estudos já feitos e
aprovados, ligação essa que, seria feita por meio do novo trecho entre a estação
de Taboas e a cidade de Valença. Como se verifica da narração feita por Max
Vasconcelos na sua obra intitulada Vias
Brasileiras de Comunicação, eis uma noticia relativa à asslnatura do
decreto que instituiu a “Rede de Viação Fluminense”:
“Em
1910, promoveram os drs. Eloy de Andrade e Alberto Furtado, assim como várias
personagens vassourenses e valencianas, uma representação ao governo federal,
solicitando a encampação da estrada de Ferro “União Valenciana” e do
“Rio das Flores” e suas ligações com a “Sapucaí” (Sul de Minas) e a
Linha Auxiliar, passando por Vassouras”.
Mais
tarde, em 17 de junho desse mesmo ano, o governo da República deliberou sobre
as medidas de construção necessárias para a organização da “Rede de Viação
Fluminense”, de bitola estreita (1,00 m), tendo por tronco a Linha Auxiliar da
Central do Brasil, constituída, provisoriamente, pelas seguintes estradas:
“União
Valenciana”, “Rio das Flores” (por uma linha entre Valença e Taboas —12
kms.), pelo trecho entre Governador Portela e a estação de Vassouras (passando
pela cidade deste nome, num percurso de 20 kms.), pelo trecho de Tres Ilhas à
antiga Barra Longa (Afonso Arinos), e
ligação da “União Valenciana” a Barra do Piraí, pela colocação de um
terceiro trilho na bitola larga da Central do Brasil, a partir de Desengano
(atual Barão de Juparanã).
Desnecessário
se torna dizer que foi indescritível o júbilo provocado pela notícia da
encampação.
No
dia 1o de agosto de 1910, chegou à cidade de Valença, uma comissão
chefiada pelos engenheiros Joaquim Silveira de Castro Barboza e Humberto Saraiva
Antunes, incumbida de proceder ao inventario do material e as antigas estradas
“União Valenciana e “Rio das Flores”.
Os
trabalhos de exploração da linha férrea entre Valença e Taboas tiveram lugar
no dia 1o de outubro de 1910, realizando-se, também, dez dias
depois, o início dos trabalhos de exploração do trecho entre Rio Preto e
Santa Rita do Jacutinga. Estava presente nessa cerimônia o presidente da Câmara
de Valença, cel. Frederico de la Vega, a quem, mais tarde, o engenheiro Mário
Castilhos do Espírito Santo ofereceu a estaca com que se assinalou a construção
desse trecho, estaca essa, com a data gravada, existente na Prefeitura.
A
incorporação das estradas de ferro “União Valenciana” e “Rio das
Flores” a Rede de Viação Fluminense, constituída pelo decreto No. 8.077,
de 24 de junho de 1910, verificou-se pelo decreto No. 8.286, de 6 de outubro de
1910.
A
12 de novembro desse ano, ficavam definitivamente concluídas as obras de
encampação da “União Valenciana” à Central do Brasil, realizadas em
virtude do decreto federal do então presidente da República dr. Nilo Peçanha,
assinado em 24 de junho de 1910, cumprindo assim, esse grande estadista
fluminense, a promessa que fizera aos valencianos quando em visita oficial à
cidade de Valença, em 1904.
Não
se podia conceder maior favor a uma cidade que, angustiada e esquecida, via
terminado o seu período de decadência, para entrar numa fase de franco
desenvolvimento.
A
notícia da encampação foi recebida, em Valença, entre as mais calorosas
demonstrações públicas. O povo, percorrendo as ruas da cidade, aclamava,
delirantemente, entre os sons da banda de música local e o espoucar dos
foguetes e girândolas, os nomes de Nilo Peçanha, Francisco Sá, Paulo de
Frontin, Barros Carvalhais, Alberto Furtado e comendador Antônio Jannuzzi.
As tarifas e os preços das passagens — assim nos relata Luiz Damasceno — da antiga “União Valenciana” foram reduzidos,
estabelecendo-se logo, diversos trens, inclusive “noturnos” que corriam aos
sábados e segundas-feiras. Verificou-se, então, notável movimento de
passageiros e cargas para Valença, que se tornou, desde logo, a cidade ideal
dos veranistas, vindos, periodicamente, do Distrito Federal.
A
antiga “Melhoramentos do Brasil”, como nos dá notícia Max Vasconcelos,
passou então, a denominar-se “Linha Auxiliar”, sendo efetivada, finalmente,
com a construção do trecho Governador Portela a Barão de Vassouras (42 kms),
a fusão da aludida linha, com a antiga “Valenciana”, que estendia, por 64
kms., de Desengano até Rio Preto, na bitola de 1,10m.
Para
dar passagem aos trens da “Auxiliar” foi intercalado um terceiro trilho no
leito da bitola larga, desde Barão de Vassouras, com uma extensão de 3 kms. e
200 metros.
Em
30 de maio de 1914, Valença recebia a visita do Marechal Hermes da Fonseca,
presidente da República, que, em companhia do presidente do Estado do Rio, dr.
Francisco Chaves de Oliveira Botelho, do dr. Paulo de Frontin, diretor da
Central do Brasil, acompanhados dos respectivos secretários, jornalistas e
pessoas gradas, de destaque na política e na administração pública. E’
que, nessa data inauguravam-se, com grandes festas populares, o novo edifício
da estação, as oficinas do antigo 10o
Depósito e vários edifícios da Central do Brasil, nas praças Dr.
Paulo de Frontin e extinta Cel. Leite Pinto.
Outro
aspecto da estação ferroviária E.F.C.B. de Marquês de Valença - 1914
As
oficinas da E. F. Central do Brasil que, até há bem pouco tempo, eram
consideradas centros de excelentes atividades e trabalhos modernos e uma das
maiores expressões econômicas daquela ferrovia, pela sua invejável produção
industrial, devem
a sua instalação ao ilustre engenheiro Mário Castilhos, quando
engenheiro-residente em Valença. Elas representavam, antes da retirada recente
de inúmeras máquinas, aliás importantes, como tornos e plainas, bem como
serraria e fundição, para outras oficinas da Central —
“um
dos muitos e relevantes serviços que a Central deve à atuação dinâmica e à
notável proficiência daquele saudoso engenheiro”
— no dizer de Max Vasconcelos.
Oficinas da C.R.D. - 4 (Divisão Auxiliar),
antiga I.F.V. da Central do Brasil
—
1914.
Inestimável patrimônio da cidade, que mais se valorizava pela capacidade técnica de seus dedicados operários, verdadeiros e operosos mestres, a sua produção, perfeita e econômica, era a melhor recomendação que se podia fazer ao operário ferroviário valenciano, que, em toda a Central do Brasil, gozava de inequívoca fama.
Oficina da
C.R.D.- 4 (Divisão auxiliar)
antigo 10o depósito da
Central do Brasil.
Como
dizíamos, aos ilustres visitantes foi, então, oferecido um lauto banquete
promovido pela Central do Brasil. Uma banda militar do Estado do Rio de Janeiro
abrilhantou os atos dêsse memorável acontecimento. O sr. marechal Hermes da
Fonseca e sua comitiva deixaram Valença, de regresso à Capital Federal, no
mesmo dia, às 20 horas, em trem especial, sob calorosa e entusiástica aclamação
popular.
Uma
vez incorporada à Central do Brasil, a “União Valenciana’’ teve
modificada a sua bitola para 1,00m, havendo sido a linha prolongada de Rio
Preto a Santa Rita do Jacutinga, numa extensão de 38 kms., efetuando-se aí a
ligação com a E. F. Sul de Minas, atual Rede Mineira de Viação Sul, e,
consequentemente, com as estradas de ferro “Oeste de Minas”, “Goiás” e
“Mogiana”.
Os
trabalhos de exploração da linha de Valença a Taboas tiveram início no dia 1o
de outubro de 1910 e o trecho de Rio Preto à Santa Rita do Jacutinga, no dia 11
do mesmo mês e ano, tendo sido aquela inaugurada em 1o de março do
ano seguinte, ligando as antigas estradas “União Valenciana” e “Rio das
Flores”, e este, em 1914, até Barboza Gonçalves, chegando os trilhos às
margens do Jacutinga, em 1918. O trecho de Comércio (Sebastião Lacerda) a
Taboas, da antiga “Rio das Flores”, foi, então, suprimido sendo atualmente
aproveitado para estrada de rodagem.
Passemos,
agora, a descrever o percurso da “Rede Fluminense”:
Ponte
do “Desengano” sobre o Paraiba
“O
ramal de Alfredo Maia à Santa Rita obedece ao seguinte percurso: depois de
passar pela estação de Barão de Vassouras e, em seguida, pelo viaduto da Polícia
(km. 129,851), atravessa, no km. 130,051, a bela ponte do “Desengano” (sôbre
o Paraíba), de 173m,20, em curva, dividindo o municipio de Valença com o de
Vassouras, e se dirige, então, para o território valenciano, pelo leito da
bitola larga que, para isso, intercalou um terceiro trilho no trecho
compreendido até Desengano.
“Entrando no município de Valença, a primeira estação, logo após o percurso de 2 km,102, é a de Desengano que é comum à Linha do Centro (bitola larga) com cujos trens a “Rede Fluminense” está em correspondência. Aliás, tradicionalmente, a bitola larga da Central é o percurso preferido pelos que viajam do Rio para Valença e vice-versa.
“Deixando Desengano, a bitola larga percorre, ainda dentro do município de Valença, um pequeno trecho à margem esquerda do rio Paraíba, apresentando belas paisagens. E “fugindo às escarpas e penhascos de insólitos contrafortes da serra das Cruzes, passa para a outra margem do rio, atravessando, no km. 135,367, a ponte do “Paraíso”, que mede 194 metros, para, de novo, entrar no município de Vassouras”. Esse trecho de estrada, isto é, de Desengano a Comércio (Sebastião Lacerda), foi solenemente inaugurado, com a presença de S. M. D. Pedro II, a 29 de novembro de 1866.
“Ao deixar Desengano, a bitola estreita toma a direção norte e começa a galgar a serra das Cruzes, oferecendo, à direita, linda vista panorâmica (km. 161). O trem, no km. 162,190, cruza, pela ponte do “Capim Plantado”, um pequeno afluente do Paraíba. Pouco além, eis que surge a margem do ribeirão “Quirino”, atingida pela linha no ponto em que se apresenta, transpondo o ribeirão, um estreito aqueduto (km. 164). (Este, segundo as velhas menções, é considerado, senão a primeira, uma das primeiras obras de cimento armado construídas no Brasil. Este aqueduto, outrora pertencente à Empresa Fluminense de Eletricidade, apresenta um vão livre de arco de 40 metros e é atualmente de propriedade da Light.
Aqueduto de cimento armado entre Barão de Juparanã e Quirino.
“Margeando
o ribeirão, o trem toma a direção oeste e vai até Quirino, no km. 166,163. O
trem prossegue por entre elevações do acidentado terreno. Interminável tapete
de capim gordura se estende pelos
morros outrora recobertos “pelo oceano verde-escuro de milhões e milhões de
cafeeiros”. O trem se aproxima do km. 170,365, onde antes se erguia a parada
de Carvalho Borges, ali erguida em homenagem ao engenheiro João de Carvalho
Borges Filho, um dos gerentes da antiga “União Valenciana”.
“Cento
e cinquenta metros após, atravessa-se o ribeirão “Quirino”, pela “Ponte
Alta”, com 33m,40 de comprimento, O trem prossegue em marcha ascendente para
ganhar o divisor das águas do Paraíba e
do Preto que é atingido, na cota 582
(km. 174), tomando, então, o trem a direção nordeste. Alcançando as
nascentes do ribeirão “Esteves”, o trem desce pela direita daquele ribeirão,
transpondo-o um pouco antes da estação de Esteves, no quilômetro 176,121. A
estação de Esteves tem este nome, como já tivemos a oportunidade de
mencionar, como homenagem e reconhecimento ao comendador Manoel Antônio
Esteves, pelos seus grandes serviços prestados por ocasião da construção da
“União Valenciana”.
“O
trem continua acompanhando o curso do ribeirão “Esteves”, atravessando-o
ainda antes de chegar à estação de Chacrinha (km. 179,074), nome da antiga
fazenda que fora fundada por Manoel Pereira de Souza Barros, Barão da Vista
Alegre, a 7 kms da referida estação.
Escreve
Max Vasconcelos, em sua obra “Vias Brasileiras de Comunicação”:
“Quando da remodelação da antiga “Valenciana”,
o dr. Frontin, diretor da Estrada, ordenou que se mudasse o nome da estação
para o de “Mário Castilhos”, em homenagem ao seu provecto auxiliar nos
trabalhos de organização da “Rede Fluminense”. Mas o ilustre engenheiro
recusou a homenagem”.
“Logo depois de Chacrinha, o trem corta, mais uma vez, o ribeirão
“Esteves” e prosseguindo, em marcha sempre ascendente, chega à cidade de
Valença, no km. 182,850. Em Valença, ponto inicial do sub-ramal de Afonso Arínos,
que é constituido, na sua maior extensão, pela antiga E. F. Rio das Flôres
que, já em 1874 —
no dizer de Max Vasconcelos — se pensava em ligar, em Valença, as suas linhas às da “União
Valenciana”. Êsse ramal, logo depois de deixar a estação de Valença, corta
o córrego “Barrozo”, afluente do rio das Flôres, e tomando a direção
nordeste segue mais ou menos o traçado da antiga estrada de rodagem de Valença
à Santa Teresa.
“No km. 187, o trem cruza a estrada de rodagem. Para
atravessar êsse km. (ponte de 7m,00), o ribeirão “Manoel Pereira”, cujo
curso é mais ou menos paralelo ao do rio das Flôres, a linha toma, por breve
trecho, a direção léste; transposto o ribeirão, o trem segue para o norte,
para alcançar a parada Eng. Dunhan, no km. 189,986, podendo-se ver,
na baixada, à esquerda, a fazenda “Santa Rosa”, outrora pertencente à viúva
Vito Pentagna.
“Tomando, de novo, a direção léste, o trem
prossegue, deixando, dentro em pouco, o município de Valença, para atingir o
de Santa Teresa.
“Voltemos, agora, à cidade de Valença e
prossigamos no percurso da linha de Santa Rita do Jacutinga. Partindo de Valença,
a linha corta o córrego “Barrozo“, e, tomando a direção noroeste, transpõe
o rio das Flôres por uma ponte de 19m,65 de comprimento, no km. 186,479.
Galgando, por uma rampa de 3m,840, a divisória das águas dos rios “Bonito”
e “Flôres”, o trem atravessa a estrada de rodagem no km. 188, e vai ter à
parada “General Osório”. Sobre
essa parada, escreveu Max Vasconcelos:
— “Osório foi o primitivo nome, tomado de um antigo sitiante da
localidade. Mas, a Central achou que era muito simples e pespegoulhe, proclìticamente,
um General. Como o pobre sitiante não
podia ser tão altamente promovido, pois que, preferindo talvez a grosseira
camisa de dormir à mais rutilante farda, nunca chegara sequer a furriel, a
Central resolveu que, depois da promoção, a parada constituísse uma
homenagem, não ao pobre Osório sitiante, mas ao nosso glorioso general”.
“Agora, em declive, o trem continua na direção
acima indicada. Depois de cortar mais uma vez a estrada de rodagem, o trem
atravessa o córrego “Cantagalo” e chega à Santa Inácia, no km. 192,981.
Ao sair desta estação, a linha sobe até atingir a cota 576; depois prossegue
na direção do rio Bonito, cuja margem direita é tangida por breve trecho até
à ponte, no km. 196,75 1, de 17m,60 de comprimento, pela qual é transposto o
referido rio. Antes dessa ponte o trem passa sôbre largo boeiro, por onde se
escoam as águas do ribeirão das “Cobras”; depois da ponte, a linha se
desenvolve em rampa forte, passando pela estação de Pentagna, antiga Rio
Bonito, no km. 1197,949. A partir de Pentagna, o trem toma a direção nordeste,
atravessa duas vezes o córrego “Fabiano” e procura, por difícil traçado,
o alto da serra da “Taquara”; atingida a garganta do Alto do Brilhante”
(cota 594), o trem começa a descer e passa pela pequena parada de Coroas, no
km. 203,800.
“Deixando Coroas, o trem segue rumo oéste. O
horizonte se alarga e se limita ao fundo pela longínqua “Serra Negra”.
Tomando a direção nordeste, passa o trem pela antiga parada Guimarães, no km.
206,464, e depois, já em rumo noroeste, transpõe uma ponte de 9,15m de
comprimento, construída sobre pequena cachoeira formada pelo ribeirão
“Macuco”. A linha corta a estrada de rodagem, primeiro, por passagem de nível,
depois, por meio de um viaduto que fica junto à plataforma da estação de Eng.
Alberto Furtado (antiga Santa Delfina), nome dado em homenagem ao dr.
Alberto Furtado, engenheiro da antiga “União Valenciana”. Uma ponte
interestadual, de armação metálica, liga as margens do rio”.
A antiga estação de Santa Delfina, no tempo da “União Valenciana”, foi pelos ares, em 10 de julho de 1912, quando da explosão de um vagão de 5.000 quilos, carregado de inflamáveis, que ali sofria descarga e conduzia grande quantidade de dinamite destinado à construção e prolongamento da linha férrea, no trecho Rio Preto-Santa Rita do Jacutinga, em início. O estampido dessa explosão foi ouvido num raio de mais de 10 quilômetros. Pereceram no acidente o guarda-chaves e dois auxiliares, sendo um destes, o próprio filho do infeliz serventuário da Estrada.
Contam
as testemunhas do desastre que, com a explosão, só ficaram de pé as paredes
das cabeceiras do edifício, desprendendo-se, porém, todo o emboço das mesmas,
exceto nos pontos em que, em ambas, havia a inscrição do nome da estação, o
que foi “atribuido a um milagre da santa do mesmo nome, enquanto que, os técnicos
e os gnósticos atribuíram a efeitos da tinta a óleo”.
Aspecto
da antiga estação
de Santa Delfina,
atual Eng. Alberto Furtado — 1903
A
gravura acima fixa, parado na gare, o
trem da carreira, a caminho de Desengano. Rebocava-o a locomotiva No. 2,
dirigida pelo veterano maquinista Godofredo Amaral. A fotografia supra é oferta
do finado Braga Neto, funcionário da Central do Brasil e uma das testemunhas
oculares da dolorosa explosão.
... “Continuando, e tendo à direita as águas tranqüilas
e negras do rio Preto, prossegue o trem, no sentido oposto ao do curso do rio.
Um pouco depois de transposto o ribeirão “Santa Delfina”, aparece aos olhos
do passageiro a cachoeira do “Criminoso”, ou melhor — as corredeiras
do “Criminoso”, formadas pelo rio Prêto. A pouca distância dessa
cachoeira, o trem segue para sudoeste, sempre marginando o “Prêto”. E
assim, será essa, a sua direção geral, até transpor o cittado rio já nas
proximidades da última estação do ramal.
.
“Sempre à margem do rio, passa por uma ponte
interestadual, coberta de zinco e fechada por meio de uma porteira, a qual foi
destruída pelos revolucionários de 30. O trem alcança depois a parada Coutinho,
a primitiva “Parada Souza Lima, em homenagem ao antigo fazendeiro da
localidade Barão de Souza Lima. Logo depois dessa parada, o trem transpõe o córrego
“São José”. No km. 218 havia a parada do “Ventura”. Prosseguindo, o
trem avança para transpor, no km. 220, o rio “Ubá”, por uma ponte de 10m
de comprimento.
“Dentro em pouco, no km. 221,308, surge a antiga
cidade mineira de Rio Prêto, servida pela estação de Parapeúna (ex-Rio Prêto),
da Rede Fluminense. De Parapeúna, prossegue o trem galgando o vale do rio
Preto; no km. 222,504 aparece o ribeirão “S. Pedro”, cortado por uma
ponte de 11m de comprimento. No km. 224,006, a linha atravessa uma ponte de 10m
e o ribeirão “Tinto” é atravessado no km. 229,500, bem como o córrego
“S. Luiz”, no km. 230. Transpondo ainda o ribeirão “Madalena”, por uma
ponte de 19,80m, no km. 231,630, o trem defronta, na outra margem do rio, a
povoação Taguá (contr. de ita, guaba, pedra ou argila, barreiro), para
alcançar, logo, a estação de Fernandes Figueira, antiga S. Luiz, no km.
232,040. O nome de “S. Luiz” foi dado a esta estação, em homenagem a Luiz
Ribeiro de Souza Rezende, Barão e depois Marques de Valença, fundador da
fazenda de “S. Luiz”, que se vê à esquerda.
“Continuando o seu percurso, o trem alcança o km.
235,754 onde um pequeno estribo, à esquerda da linha, serve à antiga fazenda
da “Glória”. Transposta uma ponte de 11m, no km. 235,800, o trem prossegue
e, de novo, no km. 236,900, passa por um pontilhão. Surge, no km. 238,426, a
primitiva “Cardoso”, hoje estação “Cel. Cardoso”, nome dado a essa
estação em homenagem ao Cel. Manoel Joaquim Cardoso, antigo proprietário das
fazendas “S. Fernando” e “S. Paulo”, e um dos maiores benfeitores da
cidade de Valença. Cerca de quatrocentos metros além da estação, transpõe-se
o ribeirão “S. Fernando”, por uma ponte de 41,80m, vendo-se, à distância,
uma pequena cachoeira formada pelo ribeirão. O trem segue, sempre à margem do
rio Preto, que corre no espaçoso vale formado pela serra “Taquara”, à
esquerda, e pelas serras “S. Lourenço” e dos “Teixeiras”, mais
afastadas, à direita. Ligando as duas margens do rio, havia uma ponte
interestadual, situada um pouco antes da fazenda de Santa Clara”.
“Essa ponte
— ainda se refere Max Vasconcelos — era de aroeira e fora construída em 1831. Por ela passara Caxias, em 1854,
com as forças que iam bater, em Minas, os revolucionários de Feijó. As forças
que defendiam o governo de 1930, mais avisadas, demoliram-na.
No
km. 242,256 encontra-se a estação de Santa Clara, que tomou o nome da antiga
fazenda de propriedade do Barão de Santa Clara. Max Vasconcelos conta-nos o
seguinte:
“Tereziano de Bustamante Fortes, abastado senhor de
grandes cabedais e de cerca de 1.800 escravos, foi o verdadeiro organizador, no
primeiro quartel do século passado, da importante propriedade agrícola que
depois veio a chamar-se “Santa Clara”. A viúva de Tereziano, mais tarde
Viscondessa de Monte Verde, deixou a fazenda, ao morrer, o seu irmão Carlos
Teodoro de Bustamante, Barão de Santa Clara. Por morte do Barão, passou a
fazenda para a propriedade de Joanico de tal, de Conservatória; como, porém,
estivesse hipoteca da ao Banco Crédito Real, foi ela executada e arrematada em
praça pelo Comendador José Augusto Leal, que a vendeu.
“Santa Clara é o tipo clássico da fazenda daquêles
tempos em que, fixando-se na vida sedentária, na bacia do “Paraíba” (metrópole
fecunda da energia cafeeira), o fazendeiro abastado, sem meio de comunicações
rápidas para a cidade, transformou o reino crasso do vegetal e do animal em núcleos
medievais de vida luxuosa e de opulência agrícola.
“Dali, de onde não chegavam os gritos ululantes do
escravo bàrbaramente castigado, chegam-nos hoje, através das obras de arte
existentes nessas fazendas, impressionantes provas da habilidade e da inteligência
dêsses humildes e martirizados obreiros de nossa riqueza agrícola de outros
tempos.
“Em cada silencioso recanto dessas principescas
moradas, está viva a memoria de sua história particular, dos seus dramas inéditos,
das tragédias shakespereanas de que elas foram teatro.
“Uma visita ao subterrâneo de “Santa Clara”
vale pela leitura de uma pagina instrutiva sôbre a vida da escravatura e as
diversas modalidades de suplícios aplicados à raça mártir e heróica.
“O direito de punir, de punir com o mais exagerado
rigor, era absoluto entre os senhores”.
“Êsse direito não se limitava ao perímetro da
propriedade semi-feudal.
“Cada qual se julgava o juiz supremo dos atos de seu
semelhante, e se constituia o executor inexorável das próprias e inapeláveis
sentenças. E um olhar, um atrevimento brioso, um gesto de nobre desfôrço de
um vizinho, mesmo de um parente, era sumàriamente punido com o facão ou com a
garrucha, quando não o era traiçoeiramente por escravos armados e em tocaia.
“Um certo Nogueira, fazendeiro nas vizinhanças,
tivera uma rixa com o poderoso senhor de “Santa Clara”. Tempos depois,
boiando sôbre as águas do rio Prêto, apareceu o cadáver do dito Nogueira, de
mãos atadas sôbre o peito. com correntes em cujos elos se viam as iniciais
S.C. (Santa Clara). Em determinada noite, saindo o velho Tereziano para uma
viagem, foi atacado a tiros pela gente dos Nogueira, no mesmo recôndito sítio
em que tinha mandado assassinar o seu inimigo.
“Mas, o velho era rijo. E também a tiros
defendeu-se, dispersando os atacantes, voltando tranqüilamente para o solar
acastelado e adiando indefinidamente a viagem “.
...“Depois da estação de Santa Clara surge o morro
do mesmo nome, que é visto à direita. No km. 245,670, o trem transpõe o córrego
“Indaiá”, por uma ponte de 28m,00. Logo adiante desta ponte, cêrca de dois
quilômetros, aparece a cachoeira “Barboza Gonçalves”, próxima à estação
dêsse nome, no km. 247,609. Ligando as duas margens do rio há, também, aí,
uma ponte interestadual situada aquém da estação. No km. 250,980, a linha
corta a estrada de rodagem por meio de um viaduto; logo depois passa por largo
boeiro. No km. 251,590 é o rio Prêto transposto por uma ponte de 54m,00,
construída sôbre esplêndida cachoeira, deixando-se aí o território
valenciano para atingir e penetrar, finalmente, no município de Santa Rita do
Jacutínga (Yacútinga = jacú
branco), no Estado de Minas, onde termina o ramal que liga tôda a região do
Sul de Minas à linha tronco da Auxiliar”.
Passemos
agora a uma ligeira referência histórica sôbre a “Rêde Mineira de Viação
Sul”, antiga Rêde de Viação Sul-Mineira, que corta todo o sudoeste e noroeste
do município de Valença, constituindo o ramal de Barra do Piraí. Essa
estrada, dentro do município de Valença, percorre os distritos de Ipiabas,
Conservatória e Santa Izabel do Rio Preto, num percurso total de 85,5 km, até
a ponte do Zacarias, sôbre o rio
Preto, nos limites com o Estado de Minas Gerais, de onde prossegue em demanda à
Santa Rita do Jacutinga, município mineiro, e onde está em ligação com o
ramal de Valença e com os ramais da “Oeste de Minas”, em Bom Jardim.
A
antiga Estrada de Ferro de Santa Izabel do Rio Preto — que era a primitiva
estrada daquele trecho — é a atual linha de Barra do Piraí — a Rede
Mineira de Viação Sul. Essa antiga ferrovia fora construída por iniciativa de
capitais particulares, sendo o seu mais esforçado propugnador João Pereira
Darrigue Faro, 2o Barão do Rio Bonito, falecido em 3 de fevereiro de
1889. A antiga estrada de ferro “Santa Izabel” teve seu contrato assinado em
16 de agosto de 1872, pelo bacharel Joaquim Augusto Guerreiro Lima e Antônio
Vitor de Assis Silveira, aos, quais se concedeu o privilégio exclusivo por 60
anos nos termos do art. 1o, da lei N. 1.672, de 21 de
dezembro de 1871. Essa estrada foi inaugurada, com a presença do Imperador D.
Pedro II, em 21 de novembro de 1883, e compreendia 3 seções: a 1a,
de Barra do Piraí à Ipiabas; a 2a, dêste ponto à Conservatória,
e a 3a, de Conservatória à Santa Izabel do Rio Preto. A planta da 1a
seção, cuja extensão era de 22 kms., foi aprovada em 21 de julho de 1873. O
traçado da 2a seção — de 18 kms — foi aprovado pela portaria
de 9 de setembro de 1873. A lei provincial No. 2.001, daquele mesmo ano,
concedeu garantia de juros de 7%, por espaço de 30 anos, ao capital da empresa,
avaliado em Cr$ 2.000.000,00.
Nos
seus estatutos, aprovados pelo decreto No. 7.549, de 22 de novembro de 1879, lê-se
em seu art. 1o: — “Tem a companhia da estrada de ferro de Santa Isabel do Rio Prêto por
objeto a construção, custeio e goso por 90 anos de uma estrada de ferro que,
partindo de Barra do Piraí, vá terminar em Santa Izabel do Rio Prêto; no
ponto que fôr designado de conformidade com o contrato, celebrado entre a Província
do Rio de Janeiro e o comendador João Pereira Darrigue Faro em 23 de dezembro
de 1876, contrato cujas cláusulas fazem parte dêstes estatutos.”
Da
“Revista da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro”, de 1928 (tomo XXXIII),
extraímos os seguintes comentários de F. A.
Noronha Santos:
“Na Rêde Viação Sul-Mineira, arrendada pelo govêrno
federal ao Estado dê Minas Gerais até 1950, estão compreendidas no
arrendamento as linhas tronco e dos seus ramais, inclusive as da extinta estrada
Sapucaí. Dos 1.142 kms. em tráfego, 149 estão situados em território
fluminense.
“Após alguns anos de descuidada administração,
vai se refazendo a Rêde Sul-Mineira de tristes dias de desalento e descrédito.
Graças à orientação dos novos dirigentes, tem sido melhorado o tráfego que
muito dependia e ainda depende do estado das linhas. Removidas estas
dificuldades e intensificado o serviço de transporte de cargas é de prever que
seja a estrada fator importantíssimo do progresso da região que percorre”.
“A primeira localidade a atingir essa estrada no
município de Valença é a Parada de Prosperidade,
distante de Barra do Piraí 17 kms. Depois de percorrer oito quilômetros
surge a estação de Pandia Calógeras,
antiga “Ipiabas”. Avançando o trem mais 10 kms., encontra-se a estação
de Paulo de Almeida, nome dado em homenagem ao Barão de Guaraciaba
(Francisco Paulo de Almeida). Em seguida, a parada Desvio Gomes, nome conferido àquela localidade em homenagem ao
fazendeiro Adolfo de Carvalho Gomes. Depois de um percurso de cerca de 8 kms.
surge a estação de Conservatória, denominação
que recorda a histórica “Conservatória dos Índios”. Essa estação é a
mais antiga da região e foi inaugurada em 1883. Depois de um percurso de 10 kms.
vem a estação de Pedro Carlos, nome
que relembra o antigo e ilustre engenheiro da E. F. Santa Izabel do Rio Prêto.
Mais adiante surgem as paradas Leite
de Souza e Andrade, para depois
prosseguir o trem cêrca de 6 kms. com destino à estação de Santa
Izabel do Rio Prêto. Prosseguindo, o trem alcança o estribo Jacuba,
para, finalmente, atravessar a ponte
do Zacarías, sôbre o rio Prêto, na divisa com o Estado de Minas Gerais.
“No trecho da Rêde Mineira, compreendido entre
Barra do Piraí e Santa Rita, nenhuma obra de arte se constata merecedora de
especial menção. Há porém, dois túneis, — um, nas proximidades de Pandiá
Calógeras e outro, na entrada da vila de Conservatória. A um quilômetro
de Pedro Carlos encontra-se uma ponte
em arco, solidamente construida e com cêrca de 100 metros de comprimento, da
aba de uma montanha à outra.
“Da estação de Paulo de Almeida em diante, devido à extranha natureza do terreno, o trem serpenteia por escarpas imensas, parecendo atirar-se a intermináveis abismos, quando em dado momento nos surpreende o infindo cenário de longínquas serranias que, ao longe, em território mineiro, se descortinam, deslumbrando”.
Segundo
nos relata Max Vasconcelos, na sua obra Vias Brasileiras de Comunicação (pág.
9 — 3a edição — 1935), — “em 1867, o Govêrno Central autorizava os estudos de um
ramal ligando a cidade de Valença à Linha do Centro, da E. F. D. Pedro II.
Foram incumbidos dêsses estudos, engenheiros da própria estrada.
“Sendo, porém, tais estudos efetuados para um ramal
de bitola larga, o respectivo orçamento apavorou o Govêrno, e a idéia
abortou.”
Lá
pelos meados de 1914, em Valença, na residência do então engenheiro da
Central do Brasil, Mário Castilhos do Espírito Santo, presente o diretor dr.
Paulo de Frontin, foi ventilado o assunto da possível passagem da bitola larga
pela cidade de Valença. Nessa reunião ficou deliberado, por ordem de Frontin,
que se fizessem estudos, levantamentos e projetos a respeito. Mais tarde,
soube-se que o projeto seria de um traçado saindo de Barra do Piraí,
diretamente à estação de Esteves, prosseguindo daí, em linha mista, por
Valença, até Afonso Arinos, onde iria juntar-se à bitola larga da Linha do
Centro.
O
trecho entre Desengano e Esteves continuaria a ser percorrido pela bitola
estreita da linha Auxiliar. Efetivamente, tal projeto só traria desembaraço
para o tráfego e encurtamento de razoável distância, tendo-se em vista as
vantagens de uma variante que viria evitar, periodicamente, as enchentes e suas
graves consequências no trecho situado nas margens do “Paraíba”.
Transcrevemos
abaixo o tópico com que O
País, em 1934, ventilou
tão importante assunto:
“O
Ministério da Viação deu, ou ao menos, permitiu curso à notícia segundo a
qual a Estrada de Ferro Central, do Brasil iria transformar tôda sua rêde de
bitola de 1 metro, para bitola de 1m60, aproveitando, como variante da linha do
Centro para Belo Horizonte, o trecho que vai de Juparanã a Afonso Arinos.
“Tôda a zona servida por êsse traçado ficou
justificadamente alvoroçada. Êsse trecho de Juparanã a Afonso Arinos serve
sobretudo aos municípios de Valença, Santa Teresa e Paraíba do Sul. Logo
depois de Valença, o traçado alcança e segue o vale do rio Prêto, zona
outrora, de grande riqueza agrícola, com a cultura do café, mas, ainda hoje,
importante, pelo grande número de propriedades territoriais e pastagens que
conta e que estão em franca atividade produtora.
“Êsse vale do Rio Prêto foi, de fato, nos últimos
anos do regime monárquico, a sede de magníficas fazendas onde floresciam os
baronatos e viscondados. Aí estão localizadas as melhores estâncias e
fazendas dotadas de todos os elementos de confôrto, conhecidos e usados na época,
aí teve seu habitat a larga família dos doutores e gran senhores que
governavam e dominavam as províncias do Rio de Janeiro e Minas.
“Alargando a bitola estreita que desce pelo vale do
Rio Prêto para alcançar e subir, entroncada com a bitola larga, o vale do Paraíbuna
em demanda da serra da Mantiqueira com o objetivo de alcançar o sertão mineiro
pelo vale do São Francisco, a Central do Brasil realiza um trabalho que,
servindo à zona, serve igualmente às suas finalidades de via-férrea de
penetração, destinada a fazer a ligação Rio-Norte.
“Vamos acreditar que isso não fique apenas em
projeto e que, dentro em breve, possamos encurtar, talvez de uma hora, a distância
entre Rio e Belo Horizonte, espertando, assim, as comunicações comerciais e de
simples contacto social e político com a capital do grande Estado montanhês.
Desse modo, a Central caminhará para a unificação de suas linhas e bitolas,
engrandecendo enormemente seus serviços e realizando, em grande capítulo, o tráfego
entre a capital do pais e a região nordestina, tão pobre ainda de vias
regulares de comunicação”.
Recentemente
voltou-se, de novo, a falar no assunto e cogitou-se mesmo de exumar o velho
projeto, para novos estudos, que, mais uma vez, ficou arquivado. Talvez, um dia,
se torne realidade um dos maiores empreendimentos que Paulo de Frontin apenas
pode sonhar...