Valença de Ontem e de Hoje

CAPÍTULO 5 

ASPECTOS ECONÔMICOS 

ESPLENDOR, DECADÊNCIA E RESSURGIMENTO

PARTE 4

Clicar sobre os títulos a seguir para ir direto ao assunto:

Caminhos e Rodovias

Estradas de Ferro

A Bitola Larga em Valença

 

 

CAMINHOS E RODOVIAS

Os primeiros caminhos e picadas que davam acesso, dos sertões do rio Preto ao vale do Paraíba, foram abertos pelos índios Purus e Araris. Eram, ao que se supõe, desvios irregulares nos escarpados das serranias.

 

Afirma-se que, a construção de estradas pelo interior fluminense teve o seu maior vigor em 1808, a cargo, principalmente, da “Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação”, criada em 23 de agosto daquele ano. Era o capitão de Ordenanças Inácio de Souza Werneck incumbido da exploração de estradas.

 

Dentre as obras públicas e os serviços que executou. o Intendente Geral da Polícia, Paulo Fernandes Viana, desembargador do Paço, durante os treze anos de sua gestão, está incluída no Memorial por ele apresentado (Rev. do Instituto Histórico — vol. IV), “a picada que, de Iguaçu, fizera abrir até rio Preto. (Minas) — para o rei viajar de sege.”

 

“Só em 1819, ou pouco depois, abriu-se, na região de Valença, uma estrada regular, que se derivava do Caminho Novo das Minas”, no dizer de Garcia Rodrigues o patriarca das estradas carroçáveis ou de rodagem no interior do Brasil. Crismaram-na de estrada nova. Levou-se, mais tarde, essa estrada a outras que se abriram de 1821 à 1824, para Desengano, Valença e Rio Preto. Seu tronco principal teve a denominação de estrada do Comércio, por ter sido projetada e executada pela “Junta do Comércio do Rio de Janeiro” e para “atender às urgentes necessidades de dar maior expansão ao transporte do café” — escreve Basílio de Magalhães.

 

As primitivas vias de comunicação foram os caminhos abertos por Inácio de Souza Werneck e José Rodrigues da Cruz, que desbravaram o sertão valenciano, para dar passagem à civilização. Ao lado de Inácio de Souza Werneck — o desbravador incansável — Custódio Ferreira Leite, mais tarde barão de Aiuruoca, foi, sem dúvida, um dos pioneiros do povoamento de Valença,

 

A respeito do Barão de Aiuruoca, extraímos da Seleta Brasiiense, de J. M. P. de Vasconcelos (ed. 1870 — págs. 52 a 55), a seguinte biografia:

 

“Nasceu na comarca do Rio das Mortes, da província de Minas, a 3 de dezembro de 1782. Desde tenra idade revelou talento e perspicácia, que seriam aproveitados frutuosamente, sê a escassez das luzes, mormente, em uma província central, que alumiava o Brasil colônia, lhe permitissem dedicar-se às letras.

 

“Ao fim de entregar-se à lucrativa indústria da mineração, partiu o jovem Custódio com seus irmãos para as margens do rio Preto; mas, pouco se demorou aí, pois como curioso observador, percorreu as províncias sul-americanas que pertenciam à Espanha e que hoje constituem outros tantos Estados independentes. Aguilhoado pelo espinho da saudade, e abandonando projetos de viagens mais longínquas, volveu aos lares pátrios.

 

“Seu lugar estava de antemão marcado. Necessitavam as províncias do Rio de Janeiro e Minas de um homem, assaz dedicado aos seus interesses, para as pôr em comunicação fácil e segura por meio de estradas e pontes.

 

“Gênio empreendedor, o capitão-mór (posto que lhe fora conferido em sua mo­cidade) não trepidava em embrenhar-se pelos sertões, ainda por esse tempo povoado de selvagens, atravessar a nado caudalosos rios, expôr seus dias às feras.

 

“Abrir fazendas era para o capitão-mór Custódio Ferreira Leite negócio de maior facilidade, em que sentia suma satisfação. Amplamente, ganharam com isso, seus amigos e protegidos, e mais de um personagem deveu a origem de sua fortuna à magnanimidade do distinto mineiro.

 

“Seria Custódio Leite um milionário se cuidasse só de seus interesses; porém, esquecia de si, para só se lembrar dos outros, preferindo a satisfação de fazer bem às positivas vantagens de colossal riqueza. Tinha em compensação a posse da maior popularidade.

 

“O fundador do Império distinguia-o com sua particular amizade, e agraciou-o com a comenda da Ordem de Cristo, e com a patente de coronel de milícias.

 

“Sua modéstia, e o cuidado que tinha em ocultar seus serviços, fez a impossibilidade de seguir par e passo essa benfazeja existência.

 

“Abriu a estrada chamada da Policia que se dirige de Iguaçu a Minas; mandou fazer os aterros do Engenho do Brejo, e por muitos anos administrou os trabalhos das estradas de Sapucaia e Feijão-cru. Ofereceu à província do Rio de Janeiro a estrada que, às expensas suas, mandou fazer de Magé até Sapucaia, assim como a ponte lançada sobre o rio Paraíba no trajeto dessa estrada, cedendo gratuitamente do privilégio, que por muitos anos lhe fora outorgado.

                                                     

“Com o produto de subscrições por ele agenciadas, e com seus auxílios pecuniários, erigiram-se ou repararam-se as matrizes da Barra Mansa, Arrozal Vassouras, Conservatória, Valença, Sapucaia e Mar de Espanha. Nesta vila, construiu ele, a casa da Câmara com prejuízo de algumas dezenas de contos, concluindo-se pouco depois de seu passamento, um formoso e vasto edifício, onde, em 1860, se achava estabelecido o “Colégio Brandão”.

 

“Quando lhe permitiam as inúmeras ocupações da vida positiva, entregava-se à leitura de bons livros, especialmente daqueles que tratavam de agricultura e indústria. Assim, introduziu ele melhoramentos na cultura do café, e iniciou a da batata de Demerara nos municípios de Mar de Espanha e Leopoldina.

 

“Exerceu muitos cargos eletivos, foi-lhe dado o título de Barão no Ministério do Marquês de Paraná, e teve assento na assembléia provincial de Minas, aonde sua velha experiência era sempre ouvida com respeito.

 

“Vítima de uma congestão cerebral, faleceu a 17 de novembro de 1859, pobre e onerado de dívidas “.

 

Abrindo a antiga estrada chamada da Policia, que se dirigia de Iguaçu a Minas Gerais, passando por Valença, trouxe para esta cidade um grande impulso, ligando-a à Corte.

 

Em 4 de fevereiro de 1829, isto é, no ano seguinte ao da Lei Orgânica das Municipalidades Brasileiras (1o de outubro de 1828), na sessão da Câmara Municipal de Valença, foi aprovada a matéria relativa às posturas sobre estradas de rodagem e caminhos de serventia pública e particular e construção de pontes e estivas necessárlas, ficando deliberado que os fazendeiros e proprietários de estâncias se obrigariam a compor e ratificá-los com todas as benfeitorias, protegendo a conservação das estradas públicas, de acôrdo com o plano do govêrno de S. Majestade imperial, de maneira a facilitar o trânsito, obrigando-se, ainda, com relação às estradas particulares, a conservá-las, de modo a proporcionar a passagem de dois animais carregados, a par um do outro, sem obstáculos e perigos, principalmente nos lugares onde não haja possibilidade de desvios

 

Pela deliberação de 12 de março de 1845, foi ordenada a construção da estrada de Santo Antônio do Rio Bonito, em comunicação com a da Policia. Também, por força do decreto No. 879, de 17 de setembro de 1856, construiu-se a estrada de Valença, passando por Ipiabas, até à divisa de Piraí.

 

Em 1865, o Barão do Rio Prêto, filho do Visconde do Rio Prêto, construiu, às suas expensas, a estrada no trecho compreendido entre a fazenda de “Santa Rosa” e o povoado de Taboas. A estrada de Ipiabas até à ponte do Zacarias, em Santa Izabel do Rio Prêto, começou a ser construída em 28 de maio de 1882.

 

As “disposições gerais” da Lei de Meios da Província, de 9 de junho de 1839, § 24, do art. 3o, autorizaram o governo a aceitar dos moradores de Santo Antônio do Rio Bonito (Conservatória) a oferta do restabelecimento de uma antiquíssima estrada.

 

Em 14 de outubro de 1861, inaugurava-se a estrada de rodagem de Valença a Desengano, cujas obras importaram em Cr$ 20.000,00 mais ou menos, importância conseguida por subscrição popular entre os habitantes do município. E’ essa a rodovia mais antiga de Valença.

 

Em 1886, a senhora Maria Bibiana Araujo de Lélis e Silva oferecia à servidão pública um trecho da estrada que mandara construir à margem da linha férrea da “Rio das Flores”, em terras da fazenda do “Paraíso”, então pertencentes a Valença.

 

A “Carta Corográfica da Província do Rio de Janeiro — de Pedro Alcântara Bellegarde e Conrado Jacob Niemeyer — levantada em 1858 a 1861, segundo as instruções contidas no decreto provincial de 30 de outubro de 1857, assinala, entre outras, as estradas de rodagem para Barra do Piraí, Valença e São José do Turvo.

 

Nas redondezas do antigo arraial de Conservatória, a “Carta Corográfica” nos mostra sinais indicadores de onze fazendas. Seriam, de certo, as mais extensas propriedades rurais e de maior produção de café, naquela época.

 

Referindo-se à primitiva estrada de rodagem de Valença, aqueles autores escrevem:

 

“A estrada de rodagem de Valença parece ter sido aberta obedecendo em alguns pontos à mesma direção do antigo caminho dos índios Araris, assinalado no mapa do sertão do Rio Prêto (1808), da coletânea de documentos relativos ao capitão de ordenanças Inácio de Souza Werneck. E’ das mais antigas estradas do município de Valença. Começa na vila de Conservatória e no lugar chamado “Benfica”, segue em direção à fazenda de “São José” e daí a Rancho Novo. Deste posto se estende até à cidade de Valença, indo ter, precisamente, seu fim, no começo da rua Nilo Peçanha. Essa estrada atravessa terrenos pouco acidentados numa parte e planos em outros trechos. Destaca-se uma variante que de “Bebedouro” passa pelas fazendas “Capelinha”, “São Marcelo”, “Santana”, “Olaria”, “Santa Rosa”, “Santa Zelinda”, “Cachoeirinha”, “Cantagalo” e “Chacrinha”, ligando, de novo, à estrada de Valença.

 

“A conhecida “estrada do Turvo” tem seu início na vila de Conservatória e atravessa terrenos sinuosos e elevados, e, às vezes, planície, seguindo até à localidade denominada “Bicame”.

 

O sistema rodoviário do município de Valença deixa ainda muito a desejar, em relação a outros municípios fluminenses, se considerarmos a necessidade inadiável da diminuição de distâncias, no interesse direto dos rumos econômicos em favor da prosperidade local.

 

Interessando às atividades agro-pecuárias e ao desenvolvimento turístico, as rodovias valencianas, conquanto assistidas pelos governos estadual e municipal, estão muito longe de favorecer ao maior desembaraço comercial e social de Valença. Não obstante, possui o município uma rede rodoviária que, se não é boa, ao menos satisfaz, em parte, à penetração do território municipal, principalmente na zona servida pela Rede Mineira de Viação, em cujos distritos, distantes da sede municipal, as comunicações estão sujeitas à desvantagem dos fatores tempo e espaço. Na época da sêca, as rodovias oferecem alguma facilidade ao trânsito, podendo escoar-se a produção interna, verificando-se, também, o movimento de forasteiros que, no verão, visitam a cidade.

 

Na estação chuvosa, grande parte do município sofre o seu colapso rodoviário. O tráfego, penoso e quase impossível, diminui consideravelmente. O intercâmbio distrital paraliza por completo. A lavoura e a pecuária se vêem oprimidas. Ninguém quer viajar. E’ arriscar...

 

Contudo, os valencianos experimentam alentadoras esperanças, ante os planos rodoviários que os governos estão esboçando. E’ de se acreditar que, em breve, tenha Valença um plano rodoviário próprio, com que venha a beneficiar-se definitivamente. A reconstrução da estrada Valença-Barra do Piraí, melhorada a sua pavimentação e retiradas algumas curvas e subidas, observando-se o mesmo no trecho de Valença a Rio Prêto, passaríamos a ter uma estrada-tronco, a rodovia Valença-Barra do Piraí-Rio Preto.

 

A estrada de Valença a Desengano, via Quirino, alargada e melhorado seu piso, viria corrigir o sacrifício de uma volta de mais de 60 kms. obrigatória, pela estação de Sebastião Lacerda, quando, para a cidade de Vassouras, via Quirino, a viagem seria atenuada com a diferença, para menos, de mais de 30 kms.

 

Uma outra estrada, a de Valença-Santa IzabeI, reformada inteiramente, facilitaria as comunicações da sede municipal com os distritos de Conservatória e Santa Izabel do Rio Preto, na zona da Rede Mineira. Constituiriam, assim, essas três rodovias o sistema rodoviário suficiente, uma vez aperfeiçoado tecnicamente, para atender às necessidades, assinalando uma nova fase de progresso indisfarçável para o município de Valença, quer na sua expansão econômica, quer no intercâmbio social entre o Rio de Janeiro e municípios vizinhos. Não faltariam empresas de ônibus e de transportes de mercadorias, organizadas, contribuindo para o desenvolvimento de Valença,

 

O tipo de pavimentação das rodovias de Valença é, em geral, o de terra batida, com exceção do trecho compreendido entre as fazendas da “Vista Alegre” e “Santa Teresa” (Esteves), que se apresenta com cascalho. A largura das estradas, geralmente, permite o cruzamento de veículos a uma velocidade de 20 kms horários, mais ou menos. Alguns trechos exigem, entretanto, a parada e o desvio dos veículos, e, muitas vezes, a marcha-a-ré. Excetuando-se as rodovias Valença-Taboas e Valença-Barra do Piraí (até o Vira-Táboa), as demais estradas têm fortes rampas e curvas de pequenos raios, apresentando muitas delas forma irregular. E’ absoluta, a ausência de sobrelevação nas curvas.

 

Trecho da estrada de rodagem Valença-Barra do Piraí

 

A estrada Valença-Barra do Piraí, que é a principal e a mais movimentada, liga entre si os municípios de Valença e Barra do Piraí. Essa rodovia, ao partir da cidade de Valença, atinge logo a estação ferroviária de Chacrinha e, em seguida, a de Esteves. passando, antes, pela serra do Vira-Táboa, que fica entre a fazenda de “S. Manoel de Baixo” e uma antiga caieira, pouco além da. estação de Esteves. Antes, porém, da serra do Vira-Táboa, a estrada se bifurca, tomando as seguintes direções: uma, à direita, que vai à Conservatória, e outra, à esquerda, que se destina à cidade de Barra do Piraí. Aproximando-se desta localidade, surge ainda a subida do “Lara Fortes”. Pouco antes da fazenda da “União”, a estrada se bifurca à direita, tomando a direção de Ipiabas.

 

A rodovia Valença-Desengano, via Quirino, quase intransitável na época seca, é constituída de um trecho da estrada Valença-Barra do Piraí (entre a cidade de Valença até à segunda bifurcação, próxima a um açude situado depois de Esteves), daí prosseguindo para Quirino e Desengano, de onde segue para a cidade de Vassouras, à margem da bitola larga da Central do Brasil e do rio Paraíba.

 

A estrada Valença-Conservatória-Santa Izabel tem início na rodovia Valença-Barra do Piraí, justamente no local próximo à antiga fazenda “Santa Teresa”, pouco depois da estação de Esteves. Bifurca-se aí, tomando à direita e passando pelo lugar denominado Rancho Novo, depois de haver atingido a estrada, que conduz às fazendas de “Santana” e “Vista Alegre”.

 

A rodovia Valença-Ipiabas tem início no entroncamento da estrada Valença-Conservatória-Santa Isabel, no lugar denominado Rancho Novo, próximo à fazenda de “Bom Jardim”, passando pelas fazendas da “Cachoeira” e “Floresta”, para depois alcançar a sede do distrito de Ipiabas.

 

                      Gráfico demonstrativo dos sistemas rodoviário e ferroviário de Marquês        

                                  de Valença, quando Conservatória ainda estava anexada 

                                              ao município de Barra do Píraí — 1944.

A estrada Valença-Pentagna-Rio Preto, ao partir de Valença, segue em direção à ponte de João Bonito, sobe a serra da “Charneca” e passa pela fazenda da “Bemposta”, atingindo, em seguida, a sede do distrito de Pentagna. Prosseguindo, passa pela “Cooperativa de Laticínios S. S. Rio Bonito”, a dois quilômetros de Pentagna, e pela fazenda das “Cruzes”, transpondo a serra do “Rio Preto“, pela fazenda do sr. Vasco Monteiro e por outras propriedades, até alcançar a sede do distrito de Parapeúna (ex-Rio Preto), que se encontra à margem esquerda do rio Preto.

 

A rodovia Valença-Santa Teresa começa na cidade de Valença, passa pela fazenda de “Santa Rosa”, alcançando, em seguida, a estação ferroviária de Taboas, daí prosseguindo até à sede do município de Rio das Flores (ex-Santa Teresa). De Rio das Flores dirige-se para Porto das Flores, alcançando a estrada “União e Indústria”, com destino à Juiz de Fora.

 

O trecho rodoviário Ipiabas-Barra do Piraí passa pelas fazendas “Cachoeirinha” e “Ibitira”, alcançando os terrenos da fazenda “União”, onde se liga à estrada Valença-Barra do Pirai.

 

Além dessas estradas, outras há, de relativa importância, que se dirigem para as fazendas, cortando o município em várias direções. Dessas estradas, as principais são: a da fazenda de “Sant’Ana”, a da fazenda do “Vargas”, a da fazenda da “Harmonia”, a da fazenda do “Destino”, a da fazenda do “Cláudio” e muitas outras.

 

Relativamente ao tipo de pavimentação, em geral, as estradas do município de Valença são de terra batida consolidada, destacando-se a de “Valença-Barra do Piraí”, que é ensaibrada com sermorão fino.

 

Damos, a seguir, quadros demonstrativos da rede rodoviária do município de Marques de Valença:

 

RODOVIAS ESTADUAIS EXTENSÃO CONDIÇÕES TÉCNICAS OBRAS DE ARTE
Total Dentro do Município Rampa Máxima (%) Raio Mínimo (ms.) Largura (ms.) No. de pontes e pontilhões No. de boeiros
Média Mínima
VALENÇA - B. DO PIRAI 36 20 10 30 6 3 5 320
VALENÇA - RIO PRÊTO 33 33 20 30 4 3 7 200
VALENÇA - RIO DAS FLÔRES 18 12 10 30 6 5 14 100

 

 

RODOVIAS MUNICIPAIS EXTENSÃO CONDIÇÕES TÉCNICAS OBRAS DE ARTE
Total Dentro do Município Rampa Máxima (%) Raio Mínimo (ms.) Largura No. de pontes e pontilhões No. de boeiros
Média Mínima
VALENÇA - SANTA IZABEL 56 56 45 30 2,5 1,8 7 75
VALENÇA - DESENGANO 25 25 45 30 2,5 1,8 3 25
VALENÇA - IPIABAS 37 37 45 30 2,5 1,8 2 9

   

No orçamento do Estado do Rio de Janeiro, relativo ao ano de 1952, figura a verba de Cr$ 20.000.000,00, destinada ao reparo e asfaltamento da rodovia Barra do Piraí-Marques de Valença, que, desse modo, retirada a maioria das curvas, será encurtada em 8 kms, passando a ter o total de 28 kms de extensão.

ESTRADAS DE FERRO

E’ inegável que o primeiro grito para a construção de uma estrada de ferro (bitola estreita), ligando a cidade de Valença à antiga E. F. D. Pedro II, atual Central do Brasil, houvesse partido do seio da Câmara Municipal de Valença, em sua sessão de 8 de janeiro de 1863.

 

A Câmara, considerando o alcance dessa iniciativa, graças aos esforços do vereador João Batista de Araujo Leite, fez imediatamente caloroso apelo ao Governo Imperial, solicitando a construção de um ramal que ligaria Valença à estrada de ferro “D. Pedro II”, em Desengano. Foi, então, nessa ocasião, nomeada uma comissão que ficou incumbida de presidir os trabalhos da benemérita campanha, constituindo-se dos seguintes cidadãos: Barão do Rio Preto (mais tarde Visconde), então presidente da Câmara, dr. Aureliano Cândido Tavares Bastos, dr. Manoel Antônio Fernandes, Herculano Furtado de Mendonça, Peregrino José da América (depois Visconde de Ipiabas) e majores Antônio Leite Pinto e Antônio Carlos Ferreira.

 

Na sessão da Câmara de 19 de junho daquele ano, leu-se uma portaria do governo da Província, na qual, se declarava que a representação valenciana sobre a construção de um ramal férreo para a cidade de Valença fora encaminhada ao Ministro da Agricultura.

 

Em 19 de junho de 1865, por proposta do vereador dr. Guilherme de Almeida Magalhães, foi pedido o privilégio de uma estrada de ferro entre Valença e Desengano, com ligação à de “D. Pedro II”, e como se conclui da leitura da ata da sessão da Câmara, de 4 de setembro desse mesmo ano, foi concedido esse privilégio. Entretanto, o sr. Luiz Damasceno Ferreira, autor da História de Valença, publicada em 1924, nos dá notícia de que esse privilégio deixara de ser concedido, sem outros esclarecimentos.

 

Pela portaria do Governo da Província, lida em sessão de 4 de dezembro de 1866, sabe-se que a Diretoria da Estrada de Ferro “D. Pedro II”, permitira chegassem os trens, uma vez por dia, à estação de Desengano, depois de feitas as respectivas manobras em Vassouras, a fim de receberem passageiros e cargas.

 

Nessa época, fundava-se, então, a Estrada de Ferro União Valenciana (bitola estreita), cuja companhia, com sede na cidade de Valença, teve a sua primeira diretoria assim constituída: presidente — dr. Ernesto Frederico da Cunha; secretário — Antônio Manoel de Menezes; diretor — Paulo José de Faria Brandão; engenheiro-chefe e gerente – João de Carvalho Borges Junior; e fiscal do governo provincial — dr. Artur Alvim. A Mesa destinada à Assembléia Geral era composta dos srs. dr. Carlos Augusto de Oliveira Figueiredo — presidente; Lúcio Martins Esteves — 1o secretário; Jerônimo José de Macedo — 2o  secretário. Eram membros do Conselho Fiscal os cidadãos — dr. Inácio de Loyola Gomes da Silva, Agostinho José Lopes da Silva e Maximiano de Siqueíra Silva da Fonseca.

 

Pelo decreto n. 8.641, de 27 de abril de 1866, o governo concedia privilégio, por espaço de 90 anos, à Companhia União Valenciana que se obrigava, então, a construir uma estrada de ferro que, partindo da cidade de Valença, fosse comunicar-se com a Estrada de Ferro D. Pedro II (bitola larga), em Desengano.

 

A construção da antiga estrada de ferro “União Valenciana” foi autorizada pelo decreto N. 3.945, de 11 de setembro de 1867. A 4 de janeiro de 1868, tomaram-se as primeiras medidas para o inicio das obras de construção da “União Valenciana”, ficando, pelo decreto No. 4.246, de 19 de outubro de 1868, assentadas as bases para as tarifas desse ramal.

 

A 25 de outubro de 1868, organizou-se a Cia. Estrada de Ferro União Valenciana, e a sua diretoria recebia propostas para a construção do leito da estrada de ferro, marcando o prazo até 8 de novembro para seu recebimento.

 

Pelo decreto de 21 de outubro de 1868, foi fixado o capital da Companhia, cujo fundo social era de Cr$ 600.000,00, mais tarde elevado para Cr 800.000,00, e o governo da Província do Rio de Janeiro, por força da lei N. 1.459, de 15 de janeiro de 1869, adquirira 1.000 ações no valor nominal de Cr$ 200,00.

 

Pelo decreto N. 4.393, de 19 de julbø de 1869, foram definitivamente aprovados os planos da estrada, organizados pelo engenheiro-chefe da Cia. — Herculano Veloso Ferreira Pena. Achava-se a estrada dividida, para efeito de construção, em oito seções, atingindo cada uma a 3 quilômetros de extensão, com exceção da sexta seção, que era de 4 quilômetros.

 

A primeira enxadada com que se iniciaram as obras verificou-se no dia 4 de fevereiro de 1869, às 9 horas da manhã, nas proximidades da cidade de Valença, sendo, em seguida, atacada a construção em vários pontos da linha projetada. O trecho entre Desengano (antiga Juparanã) e Valença, que constituía a 1a seção, compreendia as estações de Quirino, Esteves, Chacrinha e Valença, foi dado ao tráfego no dia 18 de maio de 1871, inaugurando-se, assim, o primeiro ramal da “União Valenciana”. A sua construção importou em Cr$ 742.531,44.

 

Houve grandes festas comemorativas, com a presença de Sua Majestade o Imperador D. Pedro II, que assistira à inauguração, tendo-lhe sido oferecido, pela diretoria da “União Valenciana”, num dos armazéns da estação de Valença, um lauto banquete, a que compareceram altas autoridades e grande número de convidados especiais da Corte. Esse banquete importou em Cr$ 6.500,00.

 

Sobre a personalidade do engenheiro construtor da E. F. União Valenciana, Herculano Veloso Ferreira Pena, o engenheiro Araujo Viana, em sua monografia intitulada “Saneamento de Valença”, publicada em 1894, conta-nos o seguinte episódio:

 

“O dr. Herculano Pena era tão paciente, levava a sua calma a um ponto tão elevado que, contam, ao traçar aquele engenheiro a estrada de ferro “União Valenciana”, coincidiu passar o eixo da estrada próximo à casa de um lavrador este, que não era homem de meias medidas e, com certeza, um pouco exaltado, zangou-se com a diretriz do traçado e vociferou:

 

- O que admira, o que parece ser uma embirrância é que, sendo tão grande este mundo, havendo tanto lugar onde passem estradas de ferro, queiram meter uma estrada junto de minha casa !...

 

Ao que replicou o engenheiro:

 

- Meu amigo, o que admira, o que parece ser uma embirrância de sua parte é que, sendo tamanho este mundo, havendo tanto lugar para edificar casas, viesse Vmcê edificar a sua em lugar por onde havia de passar uma estrada de ferro.

 

Esta razão teve tal força, que o lavrador desistiu da sua oposição, e, segundo consta, tornou-se até o melhor auxiliar do engenheiro”.

 

E prosseguindo, Araujo Viana nos relata:

 

“Assim como acabei de referir a esta pequena anedota para caracterizar bem o espírito da época, estereotipado naquela figura de lavrador, que — ainda bem !— reconsiderou mais tarde o seu ato impensado, vou narrar, conforme rezam os jornais do tempo e o primeiro relatório da Cia. União Valenciana, a guerra inconsciente movida pelos carroceiros, que, com o transporte de cargas, entre Valença e Desengano, e vice-versa, queriam concorrer com a estrada de ferro, asfixiando-a em seus começos. Senão, leiamos: “Acresce que mesmo desse pouco (movimento de exportação) uma parte considerável ainda é transportada por tropas e carroças que, não encontrando entre a estação terminal de Valença e os diversos centros produtores ocupação constante, devido isto à mencionada escassez de cargas, tentam, a todo custo, estabelecer, entre Valença e Desengano, uma concorrência insensata e impossível de sustentar-se...”

 

         

                                             A primeira locomotiva que correu entre

                                                    Desengano e Valença em 1871

 

A “União Valenciãna” foi construida por iniciativa particular, havendo sido os seus principais patrocinadores o Visconde do Rio Preto e o comendador Manoel Antônio Esteves.

 

Por ocasião da inauguração dessa estrada, segundo noticiário da época, a cidade nunca teve tamanha festividade, tal o brilho e a imponência das comemorações, com a presença de D. Pedro II, que se fazia acompanhar de respeitável comitiva. Raramente experimentaram os valencianos tanta emoção e regozijo, assistindo às solenidades desse extraordinário acontecimento.

 

A “União Valenciana”, que era construída em bitola estreita de 1,10m, tinha a sua sede na cidade de Valença, sita à antiga praça Cel. Leite Pinto, atualmente desaparecida com a construção de oficinas da Central do Brasil. Sabe-se, pela leitura de Saneamento de Valença, que a União Valenciana foi a primeira estrada de ferro, de bitola estreita que se construiu no Brasil, e que foi apelidada por um membro do Senado de “uma maravilha, na espécie”.

 

A “União Valenciana” teve como engenheiros, além de seu construtor dr. Herculano Veloso Ferreira Pena, comendador Pedro Moreno de Alagão, João Gomes Ribeiro do Val, João de Carvalho Borges Junior e Antônio de Noronha Gomes da Silva, e, como guarda-livros, por longos anos, o cidadão José de Almeida Ribeiro Junior, mais tarde substituído pelo sr. Manoel de Andrade Ribeiro.

 

Antes da inauguração do primeiro trecho ferroviário, o trajeto entre a cidade de Valença e o povoado dê Desengano se fazia por meio de carros de tração animal, alugados a João Batista de Araújo Leite.

 

A ligação das linhas da “União Valenciana” com a estrada de ferro “Rio das Flores”, era, a esse tempo, já uma velha aspiração dessa última empresa, cuja concessão fora obtida por decreto de 26 de julho de 1874. Em 7 de julho de 1875, foi celebrado acordo para estabelecimento de tráfego mútuo entre a “Central do Brasil” e a “Rio das Flores”.

 

O trecho da ferrovia entre Valença e Rio Preto (Estado de Minas), com um percurso de 39 kms, foi inaugurado em 1882, com a presença de SS. AA. Imperiais os Conde e Condessa d’Eu, que, com sua numerosa e distinta comitiva, foram recebidos festivamente pelo povo da cidade de Valença.

 

No trajeto de Valença àquela cidade mineira, deu-se, no dia da inauguração, com o trem especial que os conduzia, lamentável incidente, ocorrido em virtude de incêndio no vagão que levava os foguetes e fogos de artifício, destinados às comemorações. Muitos dos que viajavam no trem despreocupadamente, alarmados, de surpresa, com o incêndio que lavrava em todo o vagão se precipitavam, atirando-se para fora, pelas janelas, com o trem em vertiginosa carreira. Algumas pessoas que se achavam no carro onde estava o material inflamável sofreram queimaduras bem sérias. A História de Valença, de Luiz Damasceno Ferreira, registra o fato, destacando-se os nomes de Custódio Antônio da Silva, do farmacêutico Teófilo Alves dos Santos e Joaquim Cândido de Oliveira, como vítimas de escoriações diversas. Parado o comboio, desceram logo Suas Altezas e demais pessoas, as quais, trataram de prestar imediatos socorros aos feridos.

 

              

                                            Antiga estação da “União Valenciana” - 1884

Um fato ocorrido, nessa situação embaraçosa, mereceu especial atenção dos circunstantes. Em meio à confusão que, de momento, se estabeleceu, Sua Alteza, a Cøndessa d’Eu, preocupada em dar assistência aos feridos, não percebeu que deixara cair, de suas mãos, o vistoso e rico leque de finas rendas. Entre os presentes havia um modesto cidadão, de nome João Norberto Brasiel, que, solícito, o apanhou e, correndo em direção à Condessa, beijou o leque, com reverência, entregando-lhe, em seguida, bastante emocionado. A Princesa, radiante de alegria, apertou a mão da Brasiel.

De Valença a Rio Preto a estrada passou pelo mesmo traçado da projetada linha de tração animal, com a bitola de 1,50m, para a qual havia sido concedido privilégio pelo Decreto N. 5.593, de 11 de abril de 1874, de 30 anos, aos cidadãos engenheiros João Gonçalves de Araujo e Agostinho Polidoro Xavier Pragana, cujos direitos e obrigações foram mais tarde transferidos a Miguel Zacarias da Alvarenga e Francisco Terezio Porto Neto.

 

Na monografia Saneamento de Valença, encontramos os seguintes comentários:  

 

Comendador Manoel Antonio Esteves   

“Deixa-se êsse comboio (ao referir-se o autor à Central do Brasil, bitola larga) e toma-se a “União Valenciana”, que começa a correr no município de Valença. Semelhantes impressões sentimos ao contemplar a natureza das terras fluminenses. A primeira estação é a de Quirino, ponto de parada conveniente a uma região agrícola de café. A pequena estação é situada num arraial que tem modesto campanário. O trem vai parar na estação de Esteves, nome dado em homenagem ao Comendador Manoel Antônio Esteves, cuja memória é venerada em Valença e que fizera doação à estrada daquêle edifício, construído à sua custa”.

 

Abrindo aqui um parênteses, orgulha-nos o fato de que, ao Comendador Esteves, foi conferido, pelo Governo Imperial, o título honorífico, em virtude de decisivo esforço e serviços de benemerência com que cooperou na efetivação da construção da E. F. União Valenciana. O Comendador Esteves foi, inegàvelmente, um dos baluartes dessa ferrovia, e mereceu, por isso, elogio honroso da Corte, cujo documento, datado de 21 de julho de 1871, está assim redigido:  

 

— “A princesa Imperial, regente, em nome do Imperador o senhor D. Pedro Segundo, resolve nomear oficial da ordem da Rosa a Manoel Antônio Esteves, pelos serviços relevantes prestados na construção da Estrada de Ferro de Valença que, por iniciativa particular e sem auxilio do Govêrno, levou a efeito tão útil melhoramento para a agricultura do pais”.

 

“Nêsse local — continua o autor de Saneamento de Valença residem agricultores, ilustres descendentes dêsse finado lavrador. Em outeiro próximo está edificada a casa de vivenda da fazenda de “Santo Antônio”, estabelecimento importante onde em sua maior parte o trabalho agrícola é desempenhado por inúmeros colonos italianos.

 

Seja-nos permitido, em passando, não omitir o nome do benemérito fazendeiro Antônio Manoel de Menezes, diretor e um dos proprietários do referido estabelecimento. A imigração italiana foi, para bem dizer, introduzida por este cavalheiro, no município de Valença. Todos devem recordar-se dos serviços ingentes por ele prestados em 1889,  indo e vindo, inúmeras vezes, em plena canícula, da Ilha das Flores, para a cidade e desta para Valença, levando em sua companhia magotes de colonos, aos quais se afeiçoava e tratava carinhosamente, assistindo em suas doenças e fornecendo mesmo contingentes dêsses válidos trabalhadores a vizinhos e amigos em pontos afastados. O Govêrno Imperial quis galardoá-lo, mas deixou de o fazer porque o sr. Menezes não aceitava nenhuma distinção honorífica que não fosse à benquerença dos seus patrícios, cuja estima êle sempre apreciou em subido grau.

 

“De Esteves à Valença só existe uma parada intermediária que é a de Souza Barros (Chacrinha), pequena estação encravada em terras pertencentes às fazendas de “Campo Alegre” e “Chacrinha” onde, consta, abundam as melhores e mais copiosas matas (160 alqueires), superior terreno para a cultura do café. Outrora propriedade do Barão da Vista Alegre, foram compradas ùltimamente pela importante firma Esteves, Irmãos & Cia., do Rio de Janeiro.

 

“Quem, há 30 anos, transitasse pelas regiões percorridas hoje pelas vias férreas que cortam ou margeiam os abandonados caminhos de rodagem, e que procurasse Vassouras e Valença, apesar da incômoda viagem a cavalo e de tróli entre imensos atoleiros e pelo encontro malsinado dessas récuas de burros, chamadas tropas, ficava contentíssimo e encantado perante a enorme extensão de morros cultivados de café, riqueza inaudita que fez, desses municípios, os mais prósperos da antiga Província e quiçá do Brasil”.

 

Do antigo jornalista valenciano dr. Dario Furtado de Mendonça, são os seguintes trechos, publicados na Comarca de Valença:

 

“Até 1910 era péssimo o sistema de viação férrea ao serviço do município de Valença. Três emprêsas, dessa ordem, que além da Estrada de Ferro Central, cortavam o nosso território, arrastavam-se numa luta recíproca, mesquinha, comprometendo assim, os interêsses locais, a cujo incremento elas se destinavam. De sorte que a ação reparadora do tempo, devendo influir no desenvolvimento da fértil região em que operavam tais emprêsas, se achou materialmente frustrada pelos expedientes com que cada uma delas julgava acertado preservar a sua vida, à custa da destruição das outras. Em última análise, essas incansáveis manobras acabaram por constituir uma origem de desordens para aquelas emprêsas e de ruína para o município de Valença, sem remédio capaz de regenerar os métodos da sua viação rápida, com que contava para a saída dos seus produtos”.

 

Em março de 1910, com festiva vibração, ecoou, no município de Valença, a idéia da encampação da antiga “União Valenciana” à Central do Brasil. Uma representação nesse sentido foi dirigida pelos habitantes de Valença, Santa Teresa e Rio Preto ao governo da União, pedindo a ligação da “União Valenciana” a “Rio das Flôres”, de acordo com os estudos já feitos e aprovados, ligação essa que, seria feita por meio do novo trecho entre a estação de Taboas e a cidade de Valença. Como se verifica da narração feita por Max Vasconcelos na sua obra intitulada Vias Brasileiras de Comunicação, eis uma noticia relativa à asslnatura do decreto que instituiu a “Rede de Viação Fluminense”:

 

“Em 1910, promoveram os drs. Eloy de Andrade e Alberto Furtado, assim como várias personagens vassourenses e valencianas, uma representação ao governo federal, solicitando a encampação da estrada de Ferro “União Valenciana” e do “Rio das Flores” e suas ligações com a “Sapucaí” (Sul de Minas) e a Linha Auxiliar, passando por Vassouras”.

 

Mais tarde, em 17 de junho desse mesmo ano, o governo da República deliberou sobre as medidas de construção necessárias para a organização da “Rede de Viação Fluminense”, de bitola estreita (1,00 m), tendo por tronco a Linha Auxiliar da Central do Brasil, constituída, provisoriamente, pelas seguintes estradas:

 

“União Valenciana”, “Rio das Flores” (por uma linha entre Valença e Taboas —12 kms.), pelo trecho entre Governador Portela e a estação de Vassouras (passando pela cidade deste nome, num percurso de 20 kms.), pelo trecho de Tres Ilhas à antiga Barra Longa (Afonso Arinos), e ligação da “União Valenciana” a Barra do Piraí, pela colocação de um terceiro trilho na bitola larga da Central do Brasil, a partir de Desengano (atual Barão de Juparanã).

 

Desnecessário se torna dizer que foi indescritível o júbilo provocado pela notícia da encampação.

 

No dia 1o de agosto de 1910, chegou à cidade de Valença, uma comissão chefiada pelos engenheiros Joaquim Silveira de Castro Barboza e Humberto Saraiva Antunes, incumbida de proceder ao inventario do material e as antigas estradas “União Valenciana e “Rio das Flores”.

 

Os trabalhos de exploração da linha férrea entre Valença e Taboas tiveram lugar no dia 1o de outubro de 1910, realizando-se, também, dez dias depois, o início dos trabalhos de exploração do trecho entre Rio Preto e Santa Rita do Jacutinga. Estava presente nessa cerimônia o presidente da Câmara de Valença, cel. Frederico de la Vega, a quem, mais tarde, o engenheiro Mário Castilhos do Espírito Santo ofereceu a estaca com que se assinalou a construção desse trecho, estaca essa, com a data gravada, existente na Prefeitura.

 

A incorporação das estradas de ferro “União Valenciana” e “Rio das Flores” a Rede de Viação Fluminense, constituída pelo decreto No. 8.077, de 24 de junho de 1910, verificou-se pelo decreto No. 8.286, de 6 de outubro de 1910.  

 

                            

                                    Estação Ferroviária da Central do Brasil, recém-inaugurada.

                            

A 12 de novembro desse ano, ficavam definitivamente concluídas as obras de encampação da “União Valenciana” à Central do Brasil, realizadas em virtude do decreto federal do então presidente da República dr. Nilo Peçanha, assinado em 24 de junho de 1910, cumprindo assim, esse grande estadista fluminense, a promessa que fizera aos valencianos quando em visita oficial à cidade de Valença, em 1904.  

 

Não se podia conceder maior favor a uma cidade que, angustiada e esquecida, via terminado o seu período de decadência, para entrar numa fase de franco desenvolvimento.

 

A notícia da encampação foi recebida, em Valença, entre as mais calorosas demonstrações públicas. O povo, percorrendo as ruas da cidade, aclamava, delirantemente, entre os sons da banda de música local e o espoucar dos foguetes e girândolas, os nomes de Nilo Peçanha, Francisco Sá, Paulo de Frontin, Barros Carvalhais, Alberto Furtado e comendador Antônio Jannuzzi.

 

As tarifas e os preços das passagens — assim nos relata Luiz Damasceno — da antiga “União Valenciana” foram reduzidos, estabelecendo-se logo, diversos trens, inclusive “noturnos” que corriam aos sábados e segundas-feiras. Verificou-se, então, notável movimento de passageiros e cargas para Valença, que se tornou, desde logo, a cidade ideal dos veranistas, vindos, periodicamente, do Distrito Federal.

 

A antiga “Melhoramentos do Brasil”, como nos dá notícia Max Vasconcelos, passou então, a denominar-se “Linha Auxiliar”, sendo efetivada, finalmente, com a construção do trecho Governador Portela a Barão de Vassouras (42 kms), a fusão da aludida linha, com a antiga “Valenciana”, que estendia, por 64 kms., de Desengano até Rio Preto, na bitola de 1,10m.

 

Para dar passagem aos trens da “Auxiliar” foi intercalado um terceiro trilho no leito da bitola larga, desde Barão de Vassouras, com uma extensão de 3 kms. e 200 metros.

 

Em 30 de maio de 1914, Valença recebia a visita do Marechal Hermes da Fonseca, presidente da República, que, em companhia do presidente do Estado do Rio, dr. Francisco Chaves de Oliveira Botelho, do dr. Paulo de Frontin, diretor da Central do Brasil, acompanhados dos respectivos secretários, jornalistas e pessoas gradas, de destaque na política e na administração pública. E’ que, nessa data inauguravam-se, com grandes festas populares, o novo edifício da estação, as oficinas do antigo 10o  Depósito e vários edifícios da Central do Brasil, nas praças Dr. Paulo de Frontin e extinta Cel. Leite Pinto.

 

                            

                                      Outro aspecto da estação ferroviária E.F.C.B. de Marquês de Valença - 1914

As oficinas da E. F. Central do Brasil que, até há bem pouco tempo, eram consideradas centros de excelentes atividades e trabalhos modernos e uma das maiores expressões econômicas daquela ferrovia, pela sua invejável produção industrial, devem
a sua instalação ao ilustre engenheiro Mário Castilhos, quando engenheiro-residente em Valença. Elas representavam, antes da retirada recente de inúmeras máquinas, aliás importantes, como tornos e plainas, bem como serraria e fundição, para outras oficinas da Central
“um dos muitos e relevantes serviços que a Central deve à atuação dinâmica e à notável proficiência daquele saudoso engenheiro” — no dizer de Max Vasconcelos.

 

                                 

                                             Oficinas da C.R.D. - 4 (Divisão Auxiliar),

                                            antiga I.F.V. da Central do Brasil 1914.

Inestimável patrimônio da cidade, que mais se valorizava pela capacidade técnica de seus dedicados operários, verdadeiros e operosos mestres, a sua produção, perfeita e econômica, era a melhor recomendação que se podia fazer ao operário ferroviário valenciano, que, em toda a Central do Brasil, gozava de inequívoca fama.

                          

                                                Oficina da C.R.D.- 4 (Divisão auxiliar)

                                             antigo 10o depósito da Central do Brasil.

 

Como dizíamos, aos ilustres visitantes foi, então, oferecido um lauto banquete promovido pela Central do Brasil. Uma banda militar do Estado do Rio de Janeiro abrilhantou os atos dêsse memorável acontecimento. O sr. marechal Hermes da Fonseca e sua comitiva deixaram Valença, de regresso à Capital Federal, no mesmo dia, às 20 horas, em trem especial, sob calorosa e entusiástica aclamação popular.

 

Uma vez incorporada à Central do Brasil, a “União Valenciana’’ teve modificada a sua bitola para 1,00m, havendo sido a linha prolonga­da de Rio Preto a Santa Rita do Jacutinga, numa extensão de 38 kms., efetuando-se aí a ligação com a E. F. Sul de Minas, atual Rede Mineira de Viação Sul, e, consequentemente, com as estradas de ferro “Oeste de Minas”, “Goiás” e “Mogiana”.

 

Os trabalhos de exploração da linha de Valença a Taboas tiveram início no dia 1o de outubro de 1910 e o trecho de Rio Preto à Santa Rita do Jacutinga, no dia 11 do mesmo mês e ano, tendo sido aquela inaugurada em 1o de março do ano seguinte, ligando as antigas estradas “União Valenciana” e “Rio das Flores”, e este, em 1914, até Barboza Gonçalves, chegando os trilhos às margens do Jacutinga, em 1918. O trecho de Comércio (Sebastião Lacerda) a Taboas, da antiga “Rio das Flores”, foi, então, suprimido sendo atualmente aproveitado para estrada de rodagem.

 

Passemos, agora, a descrever o percurso da “Rede Fluminense”:

 

Ponte do “Desengano” sobre o Paraiba  

 

 

“O ramal de Alfredo Maia à Santa Rita obedece ao seguinte percurso: depois de passar pela estação de Barão de Vassouras e, em seguida, pelo viaduto da Polícia (km. 129,851), atravessa, no km. 130,051, a bela ponte do “Desengano” (sôbre o Paraíba), de 173m,20, em curva, dividindo o municipio de Valença com o de Vassouras, e se dirige, então, para o território valenciano, pelo leito da bitola larga que, para isso, intercalou um terceiro trilho no trecho compreendido até Desengano.  

 

“Entrando no município de Valença, a primeira estação, logo após o percurso de 2 km,102, é a de Desengano que é comum à Linha do Centro (bitola larga) com cujos trens a “Rede Fluminense” está em correspondência. Aliás, tradicionalmente, a bitola larga da Central é o percurso preferido pelos que viajam do Rio para Valença e vice-versa.

“Deixando Desengano, a bitola larga percorre, ainda dentro do município de Valença, um pequeno trecho à margem esquerda do rio Paraíba, apresentando belas paisagens. E “fugindo às escarpas e penhascos de insólitos contrafortes da serra das Cruzes, passa para a outra margem do rio, atravessando, no km. 135,367, a ponte do “Paraíso”, que mede 194 metros, para, de novo, entrar no município de Vassouras”. Esse trecho de estrada, isto é, de Desengano a Comércio (Sebastião Lacerda), foi solenemente inaugurado, com a presença de S. M. D. Pedro II, a 29 de novembro de 1866.

 

“Ao deixar Desengano, a bitola estreita toma a direção norte e começa a galgar a serra das Cruzes, oferecendo, à direita, linda vista panorâmica (km. 161). O trem, no km. 162,190, cruza, pela ponte do “Capim Plantado”, um pequeno afluente do Paraíba. Pouco além, eis que surge a margem do ribeirão “Quirino”, atingida pela linha no ponto em que se apresenta, transpondo o ribeirão, um estreito aqueduto (km. 164). (Este, segundo as velhas menções, é considerado, senão a primeira, uma das primeiras obras de cimento armado construídas no Brasil. Este aqueduto, outrora pertencente à Empresa Fluminense de Eletricidade, apresenta um vão livre de arco de 40 metros e é atualmente de propriedade da Light.

 

                                 

                         Aqueduto de cimento armado entre Barão de Juparanã e Quirino.

                              

“Margeando o ribeirão, o trem toma a direção oeste e vai até Quirino, no km. 166,163. O trem prossegue por entre elevações do acidentado terreno. Interminável tapete de capim gordura se estende pelos morros outrora recobertos “pelo oceano verde-escuro de milhões e milhões de cafeeiros”. O trem se aproxima do km. 170,365, onde antes se erguia a parada de Carvalho Borges, ali erguida em homenagem ao engenheiro João de Carvalho Borges Filho, um dos gerentes da antiga “União Valenciana”.

   

“Cento e cinquenta metros após, atravessa-se o ribeirão “Quirino”, pela “Ponte Alta”, com 33m,40 de comprimento, O trem prossegue em marcha ascendente para ganhar o divisor das águas do Paraíba e do Preto que é atingido, na cota 582 (km. 174), tomando, então, o trem a direção nordeste. Alcançando as nascentes do ribeirão “Esteves”, o trem desce pela direita daquele ribeirão, transpondo-o um pouco antes da estação de Esteves, no quilômetro 176,121. A estação de Esteves tem este nome, como já tivemos a oportunidade de mencionar, como homenagem e reconhecimento ao comendador Manoel Antônio Esteves, pelos seus grandes serviços prestados por ocasião da construção da “União Valenciana”.

 

 “O trem continua acompanhando o curso do ribeirão “Esteves”, atravessando-o ainda antes de chegar à estação de Chacrinha (km. 179,074), nome da antiga fazenda que fora fundada por Manoel Pereira de Souza Barros, Barão da Vista Alegre, a 7 kms da referida estação.

 

Escreve Max Vasconcelos, em sua obra “Vias Brasileiras de Comunicação”:

 

“Quando da remodelação da antiga “Valenciana”, o dr. Frontin, diretor da Estrada, ordenou que se mudasse o nome da estação para o de “Mário Castilhos”, em homenagem ao seu provecto auxiliar nos trabalhos de organização da “Rede Fluminense”. Mas o ilustre engenheiro recusou a homenagem”.

 

“Logo depois de Chacrinha, o trem corta, mais uma vez, o ribeirão “Esteves” e prosseguindo, em marcha sempre ascendente, chega à cidade de Valença, no km. 182,850. Em Valença, ponto inicial do sub-ramal de Afonso Arínos, que é constituido, na sua maior extensão, pela antiga E. F. Rio das Flôres que, já em 1874 — no dizer de Max Vasconcelos — se pensava em ligar, em Valença, as suas linhas às da “União Valenciana”. Êsse ramal, logo depois de deixar a estação de Valença, corta o córrego “Barrozo”, afluente do rio das Flôres, e tomando a direção nordeste segue mais ou menos o traçado da antiga estrada de rodagem de Valença à Santa Teresa.  

 

“No km. 187, o trem cruza a estrada de rodagem. Para atravessar êsse km. (ponte de 7m,00), o ribeirão “Manoel Pereira”, cujo curso é mais ou menos paralelo ao do rio das Flôres, a linha toma, por breve trecho, a direção léste; transposto o ribeirão, o trem segue para o norte, para alcançar a parada Eng. Dunhan, no km. 189,986, podendo-se ver, na baixada, à esquerda, a fazenda “Santa Rosa”, outrora pertencente à viúva Vito Pentagna.

 

“Tomando, de novo, a direção léste, o trem prossegue, deixando, dentro em pouco, o município de Valença, para atingir o de Santa Teresa.

 

“Voltemos, agora, à cidade de Valença e prossigamos no percurso da linha de Santa Rita do Jacutinga. Partindo de Valença, a linha corta o córrego “Barrozo“, e, tomando a direção noroeste, transpõe o rio das Flôres por uma ponte de 19m,65 de comprimento, no km. 186,479. Galgando, por uma rampa de 3m,840, a divisória das águas dos rios “Bonito” e “Flôres”, o trem atravessa a estrada de rodagem no km. 188, e vai ter à parada “General Osório”. Sobre essa parada, escreveu Max Vasconcelos:“Osório foi o primitivo nome, tomado de um antigo sitiante da localidade. Mas, a Central achou que era muito simples e pespegou­lhe, proclìticamente, um General. Como o pobre sitiante não podia ser tão altamente promovido, pois que, preferindo talvez a grosseira camisa de dormir à mais rutilante farda, nunca chegara sequer a furriel, a Central resolveu que, depois da promoção, a parada constituísse uma homenagem, não ao pobre Osório sitiante, mas ao nosso glorioso general”.  

       

 

“Agora, em declive, o trem continua na direção acima indicada. Depois de cortar mais uma vez a estrada de rodagem, o trem atravessa o córrego “Cantagalo” e chega à Santa Inácia, no km. 192,981. Ao sair desta estação, a linha sobe até atingir a cota 576; depois prossegue na direção do rio Bonito, cuja margem direita é tangida por breve trecho até à ponte, no km. 196,75 1, de 17m,60 de comprimento, pela qual é transposto o referido rio. Antes dessa ponte o trem passa sôbre largo boeiro, por onde se escoam as águas do ribeirão das “Cobras”; depois da ponte, a linha se desenvolve em rampa forte, passando pela estação de Pentagna, antiga Rio Bonito, no km. 1197,949. A partir de Pentagna, o trem toma a direção nordeste, atravessa duas vezes o córrego “Fabiano” e procura, por difícil traçado, o alto da serra da “Taquara”; atingida a garganta do Alto do Brilhante” (cota 594), o trem começa a descer e passa pela pequena parada de Coroas, no km. 203,800.

 

“Deixando Coroas, o trem segue rumo oéste. O horizonte se alarga e se limita ao fundo pela longínqua “Serra Negra”. Tomando a direção nordeste, passa o trem pela antiga parada Guimarães, no km. 206,464, e depois, já em rumo noroeste, transpõe uma ponte de 9,15m de comprimento, construída sobre pequena cachoeira formada pelo ribeirão “Macuco”. A linha corta a estrada de rodagem, primeiro, por passagem de nível, depois, por meio de um viaduto que fica junto à plataforma da estação de Eng. Alberto Furtado (antiga Santa Delfina), nome dado em homenagem ao dr. Alberto Furtado, engenheiro da antiga “União Valenciana”. Uma ponte interestadual, de armação metálica, liga as margens do rio”.

A antiga estação de Santa Delfina, no tempo da “União Valenciana”, foi pelos ares, em 10 de julho de 1912, quando da explosão de um vagão de 5.000 quilos, carregado de inflamáveis, que ali sofria descarga e conduzia grande quantidade de dinamite destinado à construção e prolongamento da linha férrea, no trecho Rio Preto-Santa Rita do Jacutinga, em início. O estampido dessa explosão foi ouvido num raio de mais de 10 quilômetros. Pereceram no acidente o guarda-chaves e dois auxiliares, sendo um destes, o próprio filho do infeliz serventuário da Estrada.

Contam as testemunhas do desastre que, com a explosão, só ficaram de pé as paredes das cabeceiras do edifício, desprendendo-se, porém, todo o emboço das mesmas, exceto nos pontos em que, em ambas, havia a inscrição do nome da estação, o que foi “atribuido a um milagre da santa do mesmo nome, enquanto que, os técnicos e os gnósticos atribuíram a efeitos da tinta a óleo”.

 

              

                                        Aspecto da antiga estação de Santa Delfina,

                                             atual Eng. Alberto Furtado 1903

 

A gravura acima fixa, parado na gare, o trem da carreira, a caminho de Desengano. Rebocava-o a locomotiva No. 2, dirigida pelo veterano maquinista Godofredo Amaral. A fotografia supra é oferta do finado Braga Neto, funcionário da Central do Brasil e uma das testemunhas oculares da dolorosa explosão.

 

... “Continuando, e tendo à direita as águas tranqüilas e negras do rio Preto, prossegue o trem, no sentido oposto ao do curso do rio. Um pouco depois de transposto o ribeirão “Santa Delfina”, aparece aos olhos do passageiro a cachoeira do “Criminoso”, ou melhor — as corredeiras do “Criminoso”, formadas pelo rio Prêto. A pouca distância dessa cachoeira, o trem segue para sudoeste, sempre marginando o “Prêto”. E assim, será essa, a sua direção geral, até transpor o cittado rio já nas proximidades da última estação do ramal.

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“Sempre à margem do rio, passa por uma ponte interestadual, coberta de zinco e fechada por meio de uma porteira, a qual foi destruída pelos revolucionários de 30. O trem alcança depois a parada Coutinho, a primitiva “Parada Souza Lima, em homenagem ao antigo fazendeiro da localidade Barão de Souza Lima. Logo depois dessa parada, o trem transpõe o córrego “São José”. No km. 218 havia a parada do “Ventura”. Prosseguindo, o trem avança para transpor, no km. 220, o rio “Ubá”, por uma ponte de 10m de comprimento.

 

“Dentro em pouco, no km. 221,308, surge a antiga cidade mineira de Rio Prêto, servida pela estação de Parapeúna (ex-Rio Prêto), da Rede Fluminense. De Parapeúna, prossegue o trem galgando o vale do rio Preto; no km. 222,504 apare­ce o ribeirão “S. Pedro”, cortado por uma ponte de 11m de comprimento. No km. 224,006, a linha atravessa uma ponte de 10m e o ribeirão “Tinto” é atravessado no km. 229,500, bem como o córrego “S. Luiz”, no km. 230. Transpondo ainda o ribeirão “Madalena”, por uma ponte de 19,80m, no km. 231,630, o trem defronta, na outra margem do rio, a povoação Taguá (contr. de ita, guaba, pedra ou argila, barreiro), para alcançar, logo, a estação de Fernandes Figueira, antiga S. Luiz, no km. 232,040. O nome de “S. Luiz” foi dado a esta estação, em homenagem a Luiz Ribeiro de Souza Rezende, Barão e depois Marques de Valença, fundador da fazenda de “S. Luiz”, que se vê à esquerda.

 

“Continuando o seu percurso, o trem alcança o km. 235,754 onde um pequeno estribo, à esquerda da linha, serve à antiga fazenda da “Glória”. Transposta uma ponte de 11m, no km. 235,800, o trem prossegue e, de novo, no km. 236,900, passa por um pontilhão. Surge, no km. 238,426, a primitiva “Cardoso”, hoje estação “Cel. Cardoso”, nome dado a essa estação em homenagem ao Cel. Manoel Joaquim Cardoso, antigo proprietário das fazendas “S. Fernando” e “S. Paulo”, e um dos maiores benfeitores da cidade de Valença. Cerca de quatrocentos metros além da estação, transpõe-se o ribeirão “S. Fernando”, por uma ponte de 41,80m, vendo-se, à distância, uma pequena cachoeira formada pelo ribeirão. O trem segue, sempre à margem do rio Preto, que corre no espaçoso vale formado pela serra “Taquara”, à esquerda, e pelas serras “S. Lourenço” e dos “Teixeiras”, mais afastadas, à direita. Ligando as duas margens do rio, havia uma ponte interestadual, situada um pouco antes da fazenda de Santa Clara”.

 

“Essa ponte — ainda se refere Max Vasconcelos — era de aroeira e fora construída em 1831. Por ela passara Caxias, em 1854, com as forças que iam bater, em Minas, os revolucionários de Feijó. As forças que defendiam o governo de 1930, mais avisadas, demoliram-na.

 

No km. 242,256 encontra-se a estação de Santa Clara, que tomou o nome da antiga fazenda de propriedade do Barão de Santa Clara. Max Vasconcelos conta-nos o seguinte:

 

“Tereziano de Bustamante Fortes, abastado senhor de grandes cabedais e de cerca de 1.800 escravos, foi o verdadeiro organizador, no primeiro quartel do século passado, da importante propriedade agrícola que depois veio a chamar-se “Santa Clara”. A viúva de Tereziano, mais tarde Viscondessa de Monte Verde, deixou a fazenda, ao morrer, o seu irmão Carlos Teodoro de Bustamante, Barão de Santa Clara. Por morte do Barão, passou a fazenda para a propriedade de Joanico de tal, de Conservatória; como, porém, estivesse hipoteca da ao Banco Crédito Real, foi ela executada e arrematada em praça pelo Comendador José Augusto Leal, que a vendeu.

 

“Santa Clara é o tipo clássico da fazenda daquêles tempos em que, fixando-se na vida sedentária, na bacia do “Paraíba” (metrópole fecunda da energia cafeeira), o fazendeiro abastado, sem meio de comunicações rápidas para a cidade, transformou o reino crasso do vegetal e do animal em núcleos medievais de vida luxuosa e de opulência agrícola.

 

“Dali, de onde não chegavam os gritos ululantes do escravo bàrbaramente castigado, chegam-nos hoje, através das obras de arte existentes nessas fazendas, impressionantes provas da habilidade e da inteligência dêsses humildes e martirizados obreiros de nossa riqueza agrícola de outros tempos.

 

“Em cada silencioso recanto dessas principescas moradas, está viva a memoria de sua história particular, dos seus dramas inéditos, das tragédias shakespereanas de que elas foram teatro.

 

“Uma visita ao subterrâneo de “Santa Clara” vale pela leitura de uma pagina instrutiva sôbre a vida da escravatura e as diversas modalidades de suplícios aplicados à raça mártir e heróica.

 

“O direito de punir, de punir com o mais exagerado rigor, era absoluto entre os senhores”.

 

“Êsse direito não se limitava ao perímetro da propriedade semi-feudal.

 

“Cada qual se julgava o juiz supremo dos atos de seu semelhante, e se constituia o executor inexorável das próprias e inapeláveis sentenças. E um olhar, um atrevimento brioso, um gesto de nobre desfôrço de um vizinho, mesmo de um parente, era sumàriamente punido com o facão ou com a garrucha, quando não o era traiçoeiramente por escravos armados e em tocaia.

 

“Um certo Nogueira, fazendeiro nas vizinhanças, tivera uma rixa com o poderoso senhor de “Santa Clara”. Tempos depois, boiando sôbre as águas do rio Prêto, apareceu o cadáver do dito Nogueira, de mãos atadas sôbre o peito. com correntes em cujos elos se viam as iniciais S.C. (Santa Clara). Em determinada noite, saindo o velho Tereziano para uma viagem, foi atacado a tiros pela gente dos Nogueira, no mesmo recôndito sítio em que tinha mandado assassinar o seu inimigo.

 

“Mas, o velho era rijo. E também a tiros defendeu-se, dispersando os atacantes, voltando tranqüilamente para o solar acastelado e adiando indefinidamente a viagem “.

 

...“Depois da estação de Santa Clara surge o morro do mesmo nome, que é visto à direita. No km. 245,670, o trem transpõe o córrego “Indaiá”, por uma ponte de 28m,00. Logo adiante desta ponte, cêrca de dois quilômetros, aparece a cachoeira “Barboza Gonçalves”, próxima à estação dêsse nome, no km. 247,609. Ligando as duas margens do rio há, também, aí, uma ponte interestadual situada aquém da estação. No km. 250,980, a linha corta a estrada de rodagem por meio de um viaduto; logo depois passa por largo boeiro. No km. 251,590 é o rio Prêto transposto por uma ponte de 54m,00, construída sôbre esplêndida cachoeira, deixando-se aí o território valenciano para atingir e penetrar, finalmente, no município de Santa Rita do Jacutínga (Yacútinga = jacú branco), no Estado de Minas, onde termina o ramal que liga tôda a região do Sul de Minas à linha tronco da Auxiliar”.

 

Passemos agora a uma ligeira referência histórica sôbre a “Rêde Mineira de Viação Sul”, antiga Rêde de Viação Sul-Mineira, que corta todo o sudoeste e noroeste do município de Valença, constituindo o ramal de Barra do Piraí. Essa estrada, dentro do município de Valença, percorre os distritos de Ipiabas, Conservatória e Santa Izabel do Rio Preto, num percurso total de 85,5 km, até a ponte do Zacarias, sôbre o rio Preto, nos limites com o Estado de Minas Gerais, de onde prossegue em demanda à Santa Rita do Jacutinga, município mineiro, e onde está em ligação com o ramal de Valença e com os ramais da “Oeste de Minas”, em Bom Jardim.

 

A antiga Estrada de Ferro de Santa Izabel do Rio Preto — que era a primitiva estrada daquele trecho — é a atual linha de Barra do Piraí — a Rede Mineira de Viação Sul. Essa antiga ferrovia fora construída por iniciativa de capitais particulares, sendo o seu mais esforçado propugnador João Pereira Darrigue Faro, 2o Barão do Rio Bonito, falecido em 3 de fevereiro de 1889. A antiga estrada de ferro “Santa Izabel” teve seu contrato assinado em 16 de agosto de 1872, pelo bacharel Joaquim Augusto Guerreiro Lima e Antônio Vitor de Assis Silveira, aos, quais se concedeu o privilégio exclusivo por 60 anos nos termos do art. 1o, da lei N. 1.672, de 21 de dezembro de 1871. Essa estrada foi inaugurada, com a presença do Imperador D. Pedro II, em 21 de novembro de 1883, e compreendia 3 seções: a 1a, de Barra do Piraí à Ipiabas; a 2a, dêste ponto à Conservatória, e a 3a, de Conservatória à Santa Izabel do Rio Preto. A planta da 1a seção, cuja extensão era de 22 kms., foi aprovada em 21 de julho de 1873. O traçado da 2a seção — de 18 kms — foi aprovado pela portaria de 9 de setembro de 1873. A lei provincial No. 2.001, daquele mesmo ano, concedeu garantia de juros de 7%, por espaço de 30 anos, ao capital da empresa, avaliado em Cr$ 2.000.000,00.

 

Nos seus estatutos, aprovados pelo decreto No. 7.549, de 22 de novembro de 1879, lê-se em seu art. 1o: “Tem a companhia da estrada de ferro de Santa Isabel do Rio Prêto por objeto a construção, custeio e goso por 90 anos de uma estrada de ferro que, partindo de Barra do Piraí, vá terminar em Santa Izabel do Rio Prêto; no ponto que fôr designado de conformidade com o contrato, celebrado entre a Província do Rio de Janeiro e o comendador João Pereira Darrigue Faro em 23 de dezembro de 1876, contrato cujas cláusulas fazem parte dêstes estatutos.”

 

Da “Revista da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro”, de 1928 (tomo XXXIII), extraímos os seguintes comentários de F. A. Noronha Santos:

 

“Na Rêde Viação Sul-Mineira, arrendada pelo govêrno federal ao Estado dê Minas Gerais até 1950, estão compreendidas no arrendamento as linhas tronco e dos seus ramais, inclusive as da extinta estrada Sapucaí. Dos 1.142 kms. em tráfego, 149 estão situados em território fluminense.

 

“Após alguns anos de descuidada administração, vai se refazendo a Rêde Sul-Mineira de tristes dias de desalento e descrédito. Graças à orientação dos novos dirigentes, tem sido melhorado o tráfego que muito dependia e ainda depende do estado das linhas. Removidas estas dificuldades e intensificado o serviço de transporte de cargas é de prever que seja a estrada fator importantíssimo do progresso da região que percorre”.

 

“A primeira localidade a atingir essa estrada no município de Valença é a Parada de Prosperidade, distante de Barra do Piraí 17 kms. Depois de percorrer oito quilômetros surge a estação de Pandia Calógeras, antiga “Ipiabas”. Avançando o trem mais 10 kms., encontra-se a estação de Paulo de Almeida, nome dado em homenagem ao Barão de Guaraciaba (Francisco Paulo de Almeida). Em seguida, a parada Desvio Gomes, nome conferido àquela localidade em homenagem ao fazendeiro Adolfo de Carvalho Gomes. Depois de um percurso de cerca de 8 kms. surge a estação de Conservatória, denominação que recorda a histórica “Conservatória dos Índios”. Essa estação é a mais antiga da região e foi inaugurada em 1883. Depois de um percurso de 10 kms. vem a estação de Pedro Carlos, nome que relembra o antigo e ilustre engenheiro da E. F. Santa Izabel do Rio Prêto.

 

Mais adiante surgem as paradas Leite de Souza e Andrade, para depois prosseguir o trem cêrca de 6 kms. com destino à estação de Santa Izabel do Rio Prêto. Prosseguindo, o trem alcança o estribo Jacuba, para, finalmente, atravessar a ponte do Zacarías, sôbre o rio Prêto, na divisa com o Estado de Minas Gerais.

 

“No trecho da Rêde Mineira, compreendido entre Barra do Piraí e Santa Rita, nenhuma obra de arte se constata merecedora de especial menção. Há porém, dois túneis, — um, nas proximidades de Pandiá Calógeras e outro, na entrada da vila de Conservatória. A um quilômetro de Pedro Carlos encontra-se uma ponte em arco, solidamente construida e com cêrca de 100 metros de comprimento, da aba de uma montanha à outra.

 

“Da estação de Paulo de Almeida em diante, devido à extranha natureza do terreno, o trem serpenteia por escarpas imensas, parecendo atirar-se a intermináveis abismos, quando em dado momento nos surpreende o infindo cenário de longínquas serranias que, ao longe, em território mineiro, se descortinam, deslumbrando”.

 

 

A BITOLA LARGA EM VALENÇA 

 

Segundo nos relata Max Vasconcelos, na sua obra Vias Brasileiras de Comunicação (pág. 9 — 3a edição — 1935), — “em 1867, o Govêrno Central autorizava os estudos de um ramal ligando a cidade de Valença à Linha do Centro, da E. F. D. Pedro II. Foram incumbidos dêsses estudos, engenheiros da própria estrada.

 

“Sendo, porém, tais estudos efetuados para um ramal de bitola larga, o respectivo orçamento apavorou o Govêrno, e a idéia abortou.”

 

Lá pelos meados de 1914, em Valença, na residência do então engenheiro da Central do Brasil, Mário Castilhos do Espírito Santo, presente o diretor dr. Paulo de Frontin, foi ventilado o assunto da possível passagem da bitola larga pela cidade de Valença. Nessa reunião ficou deliberado, por ordem de Frontin, que se fizessem estudos, levantamentos e projetos a respeito. Mais tarde, soube-se que o projeto seria de um traçado saindo de Barra do Piraí, diretamente à estação de Esteves, prosseguindo daí, em linha mista, por Valença, até Afonso Arinos, onde iria juntar-se à bitola larga da Linha do Centro.

 

O trecho entre Desengano e Esteves continuaria a ser percorrido pela bitola estreita da linha Auxiliar. Efetivamente, tal projeto só traria desembaraço para o tráfego e encurtamento de razoável distância, tendo-se em vista as vantagens de uma variante que viria evitar, periodicamente, as enchentes e suas graves consequências no trecho situado nas margens do “Paraíba”.

 

Transcrevemos abaixo o tópico com que O País, em 1934, ventilou tão importante assunto:

“O Ministério da Viação deu, ou ao menos, permitiu curso à notícia segundo a qual a Estrada de Ferro Central, do Brasil iria transformar tôda sua rêde de bitola de 1 metro, para bitola de 1m60, aproveitando, como variante da linha do Centro para Belo Horizonte, o trecho que vai de Juparanã a Afonso Arinos.

 

“Tôda a zona servida por êsse traçado ficou justificadamente alvoroçada. Êsse trecho de Juparanã a Afonso Arinos serve sobretudo aos municípios de Valença, Santa Teresa e Paraíba do Sul. Logo depois de Valença, o traçado alcança e segue o vale do rio Prêto, zona outrora, de grande riqueza agrícola, com a cultura do café, mas, ainda hoje, importante, pelo grande número de propriedades territoriais e pastagens que conta e que estão em franca atividade produtora.

 

“Êsse vale do Rio Prêto foi, de fato, nos últimos anos do regime monárquico, a sede de magníficas fazendas onde floresciam os baronatos e viscondados. Aí estão localizadas as melhores estâncias e fazendas dotadas de todos os elementos de confôrto, conhecidos e usados na época, aí teve seu habitat a larga família dos doutores e gran senhores que governavam e dominavam as províncias do Rio de Janeiro e Minas.

 

“Alargando a bitola estreita que desce pelo vale do Rio Prêto para alcançar e subir, entroncada com a bitola larga, o vale do Paraíbuna em demanda da serra da Mantiqueira com o objetivo de alcançar o sertão mineiro pelo vale do São Francisco, a Central do Brasil realiza um trabalho que, servindo à zona, serve igualmente às suas finalidades de via-férrea de penetração, destinada a fazer a ligação Rio-Norte.

 

“Vamos acreditar que isso não fique apenas em projeto e que, dentro em breve, possamos encurtar, talvez de uma hora, a distância entre Rio e Belo Horizonte, espertando, assim, as comunicações comerciais e de simples contacto social e político com a capital do grande Estado montanhês. Desse modo, a Central caminhará para a unificação de suas linhas e bitolas, engrandecendo enormemente seus serviços e realizando, em grande capítulo, o tráfego entre a capital do pais e a região nordestina, tão pobre ainda de vias regulares de comunicação”.

 

Recentemente voltou-se, de novo, a falar no assunto e cogitou-se mesmo de exumar o velho projeto, para novos estudos, que, mais uma vez, ficou arquivado. Talvez, um dia, se torne realidade um dos maiores empreendimentos que Paulo de Frontin apenas pode sonhar...

 

 

 

 

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