A decadência da classe trabalhadora IX


Os trabalhadores, em sua luta por um espaço no mercado global, talvez precisem de um conjunto de idéias que facilitem uma transformação do atual quadro que os mantém excluídos.

 
Vimos que no caminho da emancipação, em direção a sua inserção direta no mercado globalizado, os trabalhadores terão de superar velhas ideologias e evitar sofrer a influência de novos movimentos sociais alienantes, destrutivos e sem qualquer projeto de desenvolvimento.

Também vimos que as ideologias coletivistas derivam de comportamentos associados às antigas classes de sacerdotes e guerreiros. Tendem ao culto a obediência e a uniformidade de pensamento e ação. Desestimulam a criatividade e a inovação, e por isso, são impróprias para pessoas que pretendem produzir com eficiência e viver por conta própria.

Mas seria viável que os trabalhadores, educados por gerações a viver na dependência dos empreendedores para extrair seu sustento do mercado, aderissem em massa as ideologias liberais convencionais?

Sabemos que as próprias elites intelectuais burguesas “contaminaram” o liberalismo com um enorme “entulho” de idéias absurdas, que pretendiam justificar as enormes disparidades de renda e a exploração descarada dos primeiros proletários industriais.

Entre essas idéias, a mais resistente e deletéria, é o culto ao empreendedor como figura com poderes quase sobrenaturais. As habilidades dessas pessoas estariam para sempre fora do alcance da maioria das pessoas comuns, principalmente dos trabalhadores.

Mas o processo de emancipação do trabalhador deve transforma-lo necessariamente em empreendedor. Como não dispõe de capital, deverá ser capaz de atraí-lo. Para isso precisa demonstrar que, com suas habilidades e conhecimentos, tem a capacidade de utiliza-lo de forma produtiva e rentável.

Já vimos que os avanços tecnológicos provocaram um processo de alienação que vale tanto para o operário quanto para o dono do capital financeiro. O capitalista, cedeu voluntariamente seu poder ao empreendedor e ganhou com isso. O operário foi obrigado a faze-lo, com grande prejuízo.

Já comentamos o papel do empreendedor e do empreendedorismo do ponto de vista puramente econômico. Mas como seriam essas pessoas? Segundo Max Weber o empreendedor é produto da moderação racional do impulso ilimitado para o ganho, sob a égide da Reforma Protestante. Essa seria na visão sociológica, o “Espírito do Capitalismo”.

Em uma perspectiva de gestão, os empreendedores são pessoas que, simultaneamente, criam novos tipos de procura e aplicam novos e insólitos conceitos administrativos. Numa perspectiva psicológica, seria a “necessidade de realização” a motivação essencial do empreendedor.

Em resumo, podemos afirmar que o empreendedor é, antes tudo, uma pessoa que pensa por conta própria, e acredita que seu êxito ou fracasso depende em grande parte dele próprio. Isso é incompatível com qualquer ideologia cheia de dogmas e verdades reveladas.

O ambiente ideológico favorável ao empreendedor é aquele em que os limites de sua ação sejam ditados apenas pelas leis da física de um lado, e pelas relações livremente estabelecidas com outras pessoas, de outro. Numa palavra, o anarquismo.

Alguém pode argumentar que o liberalismo, em sua versão “laissez-faire”, também se encaixa nessa definição. Isso só é verdade se por relações “livremente estabelecidas”, aceitarmos o “contrato” entre o capitalista rico e o operário faminto.

Numa futura sociedade, em que todos procurarão evitar a condição de empregados, pela sua crescente tendência a inviabilidade, os contratos mútuos acabariam por limitar a exploração do trabalho alheio. Não por força de leis, mas devido às próprias condições de mercado.

Mas do que estaríamos falando ao nos referirmos a “anarquismo”? Seria uma volta a velha ideologia romântica de Proudhon e Bakunin? Decerto que não. Embora o conceito fundamental de emancipação simultânea das amarras do Estado e das igrejas tenha sido estabelecido por eles e outros, temos de considerar os diferentes momentos históricos em que se dão essas formulações.

Temos de levar em conta que nessa época, a propriedade privada não passava de um direito subjetivo, concedido arbitrariamente a uma minoria, nas mesmas bases que os títulos de nobreza ou as honrarias eclesiásticas. Os que dispunham de propriedade derivada de seus próprios esforços, eram raríssimos.

Por outro lado, muitas das idéias introduzidas por esses homens são hoje perfeitamente viáveis. A democracia direta, eliminando-se a figura dos “representantes do povo” que tendem a formar uma casta governante, dependia de um sistema de comunicações inexistentes na época.

Hoje às “eleições” e “plebiscitos” de todo tipo por telefone ou pela Internet, vão se tornando coisa corriqueira. O princípio federativo de Proudhon já corresponde mais ou menos à realidade das “empresas em rede”. A transformação do Estado em um mero prestador de serviços, “igual entre iguais”, é uma tendência do terceiro milênio.

A ênfase na liberdade e na primazia do individuo sobre as exigências coletivas arbitrárias, tornou-se uma verdadeira religião contemporânea. A derrota de todos os sistemas políticos centrados no Estado onipotente é outra marca de nossa era.

Os desafios ao monopólio do conhecimento, a verdadeira mercadoria estratégica da Era da Informação, lançados pelos hackers pelo mundo afora, é um sintoma de busca irresistível por liberdade e igualdade de oportunidades para todos.

A própria evolução da tecnologia da informação, que inicialmente se previa como instrumento por excelência do “Grande Irmão” do Estado totalitário, se transformou na Internet, um espaço sem fronteiras, refratário a controles e essencialmente anárquico.

Mas existiria uma versão realmente moderna de anarquismo, capaz de se ajustar às realidades contemporâneas? Existiria uma forma de revolução, não violenta, que se mostrasse eficaz na era das armas atômicas e do poder militar ilimitado?

A resposta está num conceito bem próximo à afirmação de Bakunin de que “a destruição também é criação”. Trata-se do princípio da “destruição criativa” de Joseph Schumpeter.

Ele diz textualmente: "o empreendedor é o responsável pelo processo de destruição criativa, sendo o impulso fundamental que aciona e mantém em marcha o motor capitalista; constantemente criando novos produtos, novos métodos de produção, novos mercados e implacavelmente, sobrepondo-se aos antigos métodos menos eficientes, eficazes e mais caros".

Sabemos que na Era da Informação, as maiores fontes de lucros são as inovações tecnológicas. Não é por acaso que os novos milionários estão sempre associados a elas. Uma verdadeira lenda contemporânea é a Microsoft de Bill Gates.

Só que os bem informados sabem que Gates está muito longe de ser um gênio em programação. Mesmo o sistema operacional em disco (o DOS) que viabilizou os microcomputadores, não é de sua autoria. Ele simplesmente o comprou e revendeu a IBM, que na época, desconhecia totalmente esse mercado.

O Windows é um produto coletivo, por várias vezes acusado de ser um mero plágio do programa da Apple. Embora não fosse pobre, Gates não dispunha de nenhum capital, Sua empresa, fundada em 1975, não dispunha de nada além de alguns microcomputadores.

Pessoalmente, William Henry Gates III é descrito até hoje como um “nerd”, termo depreciativo que pode significar várias coisas, menos uma pessoa de charme e talentos para a vida social.

Então o que ele tinha de especial? Apenas os contatos certos no mercado (sua mãe era amiga de um gerente da IBM) e um apurado senso de oportunidade (ele disse ao cara que possuía um sistema operacional pronto, quando na realidade, nem tinha idéia ainda de onde conseguir um).

Aos poucos a mídia o foi mistificando e ele passou a condição de gênio e super homem, com qualidades fora do alcance do comum dos mortais. Sua capacidade de reunir gente brilhante e seu implacável senso de “destruição criativa” (ainda hoje assunto para infindáveis batalhas judiciais), o levou a liderança no mercado.

O que mais nos interessa saber é por que vários profissionais de informática, muito mais competentes que ele, aceitam trabalhar para sua empresa. Por que não o desafiam montando negócios próprios? A resposta está em que essas pessoas, mesmo dominando a mais alta tecnologia, pensam como “proletários” e agem como tais.

Por outro lado, desponta o movimento do código aberto (open source), liderado por Linus Torvalds e Richard Stallman. Trata-se de um desafio aberto a hegemonia da Microsoft e tem uma inspiração claramente anarquista. Envolve relações tipicamente mutualistas entre seus adeptos.

Apesar desses hackers terem uma postura claramente libertária, de maneira alguma desprezam o mercado e nem muito menos oportunidades de ganhar dinheiro. São portanto os precursores dos revolucionários do futuro.
 

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