A decadência da classe trabalhadora VII


As novas tecnologias da Era da Informação obrigam o trabalhador a atuar diretamente no mercado. Depois do rompimento com a alienação do processo produtivo, a transformação do trabalhador em empreendedor passa pela superação das ideologias coletivistas.

 
Vimos que além de se livrar de todo o “entulho” ideológico que lhes impuseram os pensadores liberais e os reformadores sociais acadêmicos, os trabalhadores deverão superar outros problemas, derivados da própria organização tradicional da produção, que deixaram profundas marcas em seu modo de ver o mundo.

Um desses problemas é a alienação causada pela necessidade da divisão do trabalho. Sabemos que isso foi uma imposição tecnológica mas, a reação se tornou uma questão política e ideológica.

Também vimos que a necessidade da especialização tende a provocar uma ruptura entre o trabalhador e o mercado. O que Karl Marx chama de alienação é o processo em que o operário perde completamente a noção da relação entre suas atividades e o processo de produção como um todo.

A conseqüência política e social, é uma extensão dessa ruptura para as esferas além do cotidiano do trabalho. É a perda gradual da ligação com a própria realidade objetiva. Segue-se uma imersão num mundo “mágico”, que se aproxima das utopias de origem religiosa.

Já vimos também que ao contrário do burguês capitalista, o burguês artesão tendia a buscar abrigo e proteção nas instituições do Estado e das igrejas. Enquanto os primeiros procuravam romper as amarras dos privilégios e regulamentações, estabelecidos pelo despotismo dos monarcas e sacerdotes, os segundos procuravam apenas reformulá-las a seu favor.

Com a vitória definitiva da burguesia capitalista, o Estado e as igrejas foram imediatamente apropriados pela nova classe dominante. Esvaziados de seu antigo poder, e/ou postos a serviço de seus interesses, suas instituições pouco podiam fazer para reverter à completa subsunção do trabalho ao capital.

Vimos também que por um razoável período, os últimos artesãos lideraram a nova classe proletária, formada por camponeses expulsos de suas terras. Com isso, passaram a eles suas idéias e concepções, mais tarde apropriadas também pelos profissionais liberais que iam, aos poucos, se tornando proletários.

A brutal exploração a que eram submetidos os primeiros operários, levou a percepção, correta, de que formavam uma numerosa classe de pessoas, exploradas por outra classe, cujos interesses lhes eram antagônicos.

Os conflitos de interesses, que se traduziam em greves e motins, prontamente reprimidos com a máxima violência, só fizeram reafirmar essa visão. Ao utilizar o aparelho repressivo do Estado para resolver disputas que deveriam, em tese, ser um problema de mercado, a burguesia industrial praticamente inaugurou a “luta de classes” como fenômeno indissociável do capitalismo.

A conseqüência foi à abertura de um enorme fosso entre as duas classes e a aceitação pelos trabalhadores das ideologias coletivistas.

Devemos lembrar que nem o artesão nem o camponês eram adeptos dessas idéias. Na verdade tendiam a ser (e até hoje são) muito individualistas. Karl Marx reconhecia que o camponês e o artesão “pequeno burguês”, eram um entrave a revolução, devido a sua obstinada independência e individualismo.

Paradoxalmente, vemos que os ideais coletivistas eram uma constante entre as classes armadas e os religiosos. O conceito de “companheiro de armas” entre os nobres guerreiros e o de “irmãos” entre sacerdotes é até hoje uma idéia recorrente. Mas sabemos que essas classes não produziam nada, sendo mantidas pelo trabalho das outras.

Para o guerreiro ou o frade, que não produzem seus alimentos, roupas e utensílios, dividir tudo em regime de “comunismo” é uma atitude prática, diante das adversidades da guerra ou da busca pela salvação. Mas para o camponês e para o comerciante pode significar a sua ruína.

Além disso, vimos que a classe dos comerciantes sempre foi a que conviveu mais diretamente com a realidade objetiva. As qualidades que se esperavam deles, eram praticamente o oposto das que eram valorizadas nas antigas classes dominantes. Delas se esperava a lealdade e a obediência.

Nada é mais caro ao guerreiro e ao sacerdote do que a uniformidade de pensamentos e ações. O comportamento ritualístico e o uso de uniformes e hábitos, sempre foram características marcantes dessas classes. O coletivismo associado a um forte apego à autoridade e o repúdio a iniciativa individual, sempre estiveram presentes no seu universo

O novo proletário urbano vivia desligado do mercado e de suas oportunidades. Passava por enormes privações e só contava com seus próprios companheiros de infortúnio na luta contra o poder dos patrões, que tinham o Estado a seu lado. Por isso, tendiam a pensar mais como soldados ou monges do que como negociantes, vendendo sua força de trabalho.

Essa realidade foi a responsável pela transformação de pessoas, tradicionalmente arredias ao coletivismo, em socialistas, fascistas, anarquistas, comunistas, etc. Mas muito mais importante pelas suas conseqüências, foi o desenvolvimento de um certo repúdio ao mercado. Afinal negócios, livre mercado, liberdade de empreender, etc, eram a linguagem dos opressores, dos inimigos de classe.

Era em nome dessas idéias que eram reprimidas toda a iniciativa tendente a aliviar as privações por que passavam os trabalhadores. Os enormes abusos cometidos em nome da “racionalidade” e do “progresso”, que se traduziam em mais e mais miséria para os operários, abriram fissuras no sólido edifício racionalista. Por elas abriu passagem todo tipo de idéias vindas dos tempos pré-capitalistas e/ou francamente obscurantistas.

Todas elas tinham um traço em comum: Um profundo desprezo pelo mercado. Isso se explica por ser esse o verdadeiro espaço da racionalidade, ateu e impessoal, onde tudo se reduz a seu valor de troca e não há espaço para ilusões nem crendices.

Mas a própria classe capitalista dominante, ao perceber o perigo das ideologias coletivistas, reagiu com cinismo. Ao invés de incentivar os trabalhadores em direção ao racionalismo do mercado, usaram de todos os meios ao seu alcance para criar alternativas ainda mais obscurantistas.

É daí que surge o capitalista “temente a Deus” e dedicado ao culto da “lei e ordem” do governo. Ao usar as instituições das igrejas e do Estado, que agora dominavam, como instrumento de seus interesses, a nova classe dominante aprofundou o fosso que a separava de seus aliados naturais, na luta contra o coletivismo, ou seja, os trabalhadores assalariados.

Com isso, o capitalismo nascente perdeu a rara oportunidade de eliminar definitivamente um dos pilares das sociedades despóticas e irracionais do passado. A universalização das idéias baseadas na liberdade individual e no racionalismo do mercado, ficou comprometida. A revolução burguesa não conseguiu concluir sua obra principal: A extinção da sociedade de classes.

A conseqüência para as classes trabalhadoras foi à alienação completa. As idéias coletivistas logo fariam seus estragos por toda parte. Países industrializados se transformaram em réplicas gigantes de quartéis e conventos. Nações já desenvolvidas ou em processo de desenvolvimento capitalista, retornaram ao culto do líder infalível, ao pensamento único e a perseguição de hereges.

A história se encarregou de destruir politicamente essas irrupções de irracionalidade, mas a um custo elevadíssimo. A herança dessas idéias persiste na mente de milhões de pessoas e as impede de adentrar definitivamente no mercado.

Até hoje, as iniciativas de economia solidária como a criação de cooperativas de produção, crédito ou compras, órgãos de incentivo a criação de negócios, etc, acabam apropriadas por “idealistas”, ligados a partidos políticos “nacionalistas”, movimentos ideológicos coletivistas, grupos e organizações religiosas e “ONGs” inconseqüentes.

Seus objetivos, na prática, se reduzem invariavelmente a um só: Combater o execrável mercado e se possível substituí-lo pela sua própria utopia.

Isso resulta em desvios em relação ao objetivo que deveria ser primordial, ou seja, o sucesso desses empreendimentos dentro do mercado global. A conseqüência é a estagnação ou o fracasso do projeto, ou pior, sua transformação em instituição de caridade, frente de trabalho ou “experiência social” esquizofrênica.

Esses projetos acabam por desmoralizar os trabalhadores e reafirmar sua necessidade de submissão a mentores “iluminados”. Ao reforçar sua condição de membros de uma classe, os aprisionam nas limitações que a definem.

 

Sem a libertação dos trabalhadores das idéias coletivistas, qualquer iniciativa no sentido de implantar empreendimentos em larga escala transforma-se logo numa versão disfarçada da velha “sopa dos pobres”.
 

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