Zetética e Dogmática


Juscelino Vieira Mendes






Zetética

Dogmática

Significa perquirir (zetein)

Significa doutrinar, ensinar (dokein)

Acentua o aspecto da pergunta
(pergunta o que é algo)

Acentua o aspecto da resposta (pergunta o que deve ser algo)

Parte de evidências, constatações que podem ser verificadas e modificadas; os princípios ficam abertos a dúvidas

Parte de premissas que são inatacáveis, são postas fora de questionamento; os dogmas

Dissolve as opiniões, pondo-as em dúvida

Revela o ato de opinar

Função especulativa explícita

Função diretiva explícita

Produz questionamentos infinitos

Produz questionamentos finitos

Exemplos: Sociologia do Direito, Filosofia do Direito etc.

Exemplos: Direito Civil, Processual, Penal, Tributário etc.



1. Definição de Dogmática e Zetética: Dogmática (dokein) = não questiona; Zetética (zetein) = questiona

2. Os currículos das faculdades de Direito brasileiras dão maior ênfase a matérias dogmáticas, desprezando uma visão zetética, multidisciplinar e crítica, indispensáveis à formação de bons operadores do Direito.

3. Enquanto a concepção domesticada do Direito transmitida dá ao aluno uma visão fechada, pronta e acabada a partir de dogmas (verdades que ninguém pode discutir), a visão zetética lhe é sonegada como possibilidade de indagar, investigar, duvidar.

4. Uma postura zetética inclui disciplinas com caráter empírico, como Sociologia Jurídica, Antropologia Jurídica, História do Direito, Psicologia Jurídica, Ciência Política e Economia Política.

5. A zetética analítica possibilitará uma aprendizagem mais profunda e comprometida, por tomar os dogmas como meros pontos de partida. Pressupõe o ensino competente de Filosofia do Direito, Lógica, Metodologia Jurídica, Teoria Geral do Direito, Hermenêutica, Teoria da Argumentação, Semiótica...

6. Enquanto esta postura diferenciada não é oferecida ao futuro operador do Direito, o resultado que se tem é total desconexão dos parcos conhecimentos introjetados, com a repetição de conceitos prontos, ditados pelos professores, isolados em cada disciplina, e que não conseguem articulação em uma visão conjunta e coerente do fenômeno jurídico.

7. Há, por outro lado, uma hipertrofia do conhecimento teórico, em detrimento da prática, que impede ao aluno inferir, estabelecer relações e concluir de sua aplicabilidade na vida. Ainda mais porque tais abstrações não são bem claras, ficando ao aluno a sensação de que pode "misturar" um pouquinho de cada teoria, formando uma posição eclética, muito ao gosto do "jeitinho" brasileiro.

8. Assim, sempre é frágil este saber, não aprofundado, pouco sério (do tipo diz-que-diz-que: o professor diz que o doutrinador diz que Kelsen diz...). A insegurança profissional do operador é sua decorrência natural.

9. Além disso, acresça-se ainda a defasagem de duzentos anos do conhecimento teórico ministrado no país. Aqui, a "Ciência" do Direito evolui lentamente e sem muita vontade. Conforma-se a modelos estrangeiros importados acriticamente, e, por comodismo, mantido o repertório de dogmas, dos lugares comuns, dos nossos mitos. No caso dos operadores do Direito que pretendem ser juízes, a defasagem entre o ensino oferecido e o necessário se revela mais dramática. Sua tarefa primordial será julgar, tarefa mental superior, não-inata. É necessário aprender a pensar e a desenvolver todas as capacidades e a usar a inteligência como poder.

10. Pensar é uma forma de aprender, básica para qualquer atividade futura que exija reflexão, conclusão, julgamento, avaliação. Apesar de compreender o emprego de um conjunto de potencialidades inatas, a tarefa de pensar não vem pronta para ser realizada, como outras para as quais o homem já nasce biologicamente preparado (por exemplo, respirar). Pensar é um processo mental superior, que requer aperfeiçoamento. É preciso que o ser humano tenha consciência das operações de pensamento, e que se empenhe para realizá-las com competência. As principais são: comparação, resumo, observação, suposição, imaginação, crítica, decisão, interpretação, aplicação de fatos e princípios a novas situações, planejamento, projetos e pesquisas. Pensar é julgar, concluir, decidir; aceitar como opinião estabelecida, acreditar. É refletir; raciocinar; intencionar; planejar. Para Hannah Arendt pensar, querer e julgar são as três atividades mentais básicas, cuja análise permitirá compreender a existência racional.


Maio/2003.

Fontes de estudo: FERRAZ JR., Tércio Sampaio. "Introdução ao Estudo do Direito" - Editora Atlas, quarta edição - 2003; FLORES CUNHA, Regina Maria E. "Crítica ao modelo de ensino jurídico comum a todos os operadores do Direito"; LARENZ, Karl. "Metodologia da Ciência do Direito", Fundação Calouste Gulbenkian, 2a edição. Tradução de José Lamego.




Direitos reservados. Para citar este texto:

Mendes, Juscelino V. – Zetética e Dogmática. Página de Juscelino Vieira Mendes, seção "Pedagogia". Sítio http://planeta.terra.com.br/arte/juscelinomendes/, Internet, Campinas, 2003.



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