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FEIRA
DO LIVRO SEM NOBRE(ZA)
Alfredo de Sousa
Quem
anda minimamente a par do que se passa com aquele ramo da economia
que é dos mais ligados à cultura e ao desenvolvimento intelectual dos
portugueses, que é o ramo editorial, ou seja e para simplificar, o dos livros,
sabe muito bem que não é nada optimista o que se passa em Portugal
relativamente a esta matéria, o que, não sendo novo, parece não ter solução,
dado que novo seria uma política do livro de forma a que ele chegasse a todos e
de modo acessível, isto é, acessível também a todas as bolsas dos
portugueses. Assim, do modo como se tem encarado a política do livro,
jamais se alcançarão os níveis de leitura desejáveis. E se alguém se tenta
convencer de que em Portugal se lê e compra cada vez mais livros, tome esse
convencimento como ilusão, porque o que na realidade existe é serem sempre os
mesmos, que constituem uma singela minoria, a ler e a comprar livros, o mesmo é
dizer, a comprar cultura. É por isso que as feiras do livro,
que por estes tempos se realizam um pouco por todo o lado, pelo menos nos
concelhos que não desprezam a cultura e que crêem que levar livros à rua é
uma forma eficaz de ela se partilhar, são manifestamente concorridas. É por
isso que as designadas festas do livro, que também periodicamente se
realizam com preços variáveis entre os 300 e os 2000 escudos, são de igual
modo muitíssimo concorridas, como o tem demonstrado o grande volume de vendas,
sempre crescentes. É que vai lá sempre a mesma minoria de leitores e
compradores que nessas ocasiões aproveitam para se excederem em compras, visto
as marés serem poucas, não deixando, portanto, fugir a oportunidade. (Sintomático
é que também lá vão alguns livreiros espertalhões que compram livros
a 300$00 que mais tarde irão aparecer nos seus catálogos com preços quatro,
cinco e mais vezes superiores e, por vezes, até mais).
O
que me impele, porém, a este escrito é o facto de na Feira do Livro do Porto
deste ano ( que tem sido a Feira do Livro dos penafidelenses de há anos a esta
parte ) as polémicas entre editores e entre as duas associações de classe que
os representam, terem impedido a Câmara Municipal do Porto de estar
presente com um seu Pavilhão, que este ano seria dedicado ao poeta
"portuense" António Nobre, de resto, o mesmo Pavilhão que esteve
recentemente no Salão do Livro de Paris. É que, por uma cedência da vereadora
da Cultura da dita Câmara Municipal, todos os portuenses e os penafidelenses, e
todos os portugueses que o quisessem, não viram uma exposição comemorativa
sobre o poeta do "Só", neste ano significativo em que alguns
celebraram o centenário da sua morte. Mas viram-na os parisienses e
isso é que foi importante, pensará cosmopoliticamente a senhora
vereadora. Mais uma vez ficou expressa a política que nos governa há cinco
anos: subserviência, quando não submissão, aos empresários deste país...
empresarial.
E,
agora, pergunta-se, que, neste caso é uma forma superior de reflexão: o que
leva o governo de um grande concelho como o Porto, a exemplo do que faz o
governo da Nação, a submeter-se aos lobbies, que os há também nos livros?
Pergunta-se mais: o que leva uma conceituada vereadora da Cultura do segundo
maior município do país a ceder às querelas, às polémicas, às zangas e aos
arrufos entre os editores potugueses, que já conduziram a uma cisão entre
eles, e que em vez de beneficiarem os leitores os prejudicam? Que culpa têm os
leitores, que se viram privados de um Pavilhão dedicado a António Nobre no
centenário da sua morte, em
detrimento da falta de espaço aludida pela vereadora para que todos os editores
se instalassem na Feira do Livro do Porto deste ano da graça de 2000,
privando-se a Câmara do seu próprio espaço?
Ou
esta querela entre a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros e a nóvel
e dissidente União de Editores Portugueses foi apenas um pretexto para a Câmara
Municipal do Porto, lavando as mãos, responsabilizar ambas as associações
pela sonegação aos portuenses, aos penafidelenses, aos portugueses, da exposição
sobre o poeta, repartido entre Porto e Penafiel, entre a Foz do Sousa e Leça,
entre Coimbra e Paris, e que os portugueses conhecem pelo nome de António
Nobre, ao abdicar do espaço em que deveria erguer o Pavilhão dedicado ao poeta
em favor das duas associações de editores, ou foi mesmo desinteresse e negligência
da Câmara Municipal do Porto convencida de que já lhe chegava o Pavilhão António
Nobre ter estado no Salão do Livro de Paris. Seja, porém, uma ou outra a razão,
ou mesmo que existam outras razões, a verdade é que mais uma vez António
Nobre foi tratado com muito pouca nobreza. E com muito pouca nobreza foram também
tidos em conta os portuenses, os penafidelenses, enfim, todos os portugueses que
poderiam beneficiar com o Pavilhão António Nobre, caso a Câmara do Porto não
tivesse abdicado e cedido os seus direitos de presença aos lobbies editoriais
deste país, cada vez mais submisso.
E
assim vai, assim continua, a cultura em Portugal, designadamente a emergente da
política do livro!...
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