ANO III  Nº 27  JUNHO 2000
Director : Armando Moreira Fernandes

 


 

 

FEIRA DO LIVRO SEM NOBRE(ZA) 
Alfredo de Sousa

 

Quem anda minimamente a par do que se passa com aquele ramo  da   economia que é dos mais ligados à cultura e ao desenvolvimento intelectual dos portugueses, que é o ramo editorial, ou seja e para simplificar, o dos livros, sabe muito bem que não é nada optimista o que se passa em Portugal relativamente a esta matéria, o que, não sendo novo, parece não ter solução, dado que novo seria uma política do livro de forma a que ele chegasse a todos e de modo acessível, isto é, acessível também a todas as bolsas dos portugueses.  Assim, do modo como se tem encarado a política do livro, jamais se alcançarão os níveis de leitura desejáveis. E se alguém se tenta convencer de que em Portugal se lê e compra cada vez mais livros, tome esse convencimento como ilusão, porque o que na realidade existe é serem sempre os mesmos, que constituem uma singela minoria, a ler e a comprar livros, o mesmo é dizer, a comprar cultura. É por isso que as feiras do livro, que por estes tempos se realizam um pouco por todo o lado, pelo menos nos concelhos que não desprezam a cultura e que crêem que levar livros à rua é uma forma eficaz de ela se partilhar, são manifestamente concorridas. É por isso que as designadas festas do livro, que também periodicamente se realizam com preços variáveis entre os 300 e os 2000 escudos, são de igual modo muitíssimo concorridas, como o tem demonstrado o grande volume de vendas, sempre crescentes. É que vai lá sempre a mesma minoria de leitores e compradores que nessas ocasiões aproveitam para se excederem em compras, visto as marés serem poucas, não deixando, portanto, fugir a oportunidade. (Sintomático é que também lá vão alguns livreiros espertalhões que compram livros a 300$00 que mais tarde irão aparecer nos seus catálogos com preços quatro, cinco e mais vezes superiores e, por vezes, até mais).

O que me impele, porém, a este escrito é o facto de na Feira do Livro do Porto deste ano ( que tem sido a Feira do Livro dos penafidelenses de há anos a esta parte ) as polémicas entre editores e entre as duas associações de classe que os representam, terem impedido a Câmara Municipal do Porto de estar presente com um seu Pavilhão, que este ano seria dedicado ao poeta "portuense" António Nobre, de resto, o mesmo Pavilhão que esteve recentemente no Salão do Livro de Paris. É que, por uma cedência da vereadora da Cultura da dita Câmara Municipal, todos os portuenses e os penafidelenses, e todos os portugueses que o quisessem, não viram uma exposição comemorativa sobre o poeta do "Só", neste ano significativo em que alguns celebraram o centenário da sua morte. Mas viram-na os parisienses e  isso é que foi importante, pensará cosmopoliticamente a senhora vereadora. Mais uma vez ficou expressa a política que nos governa há cinco anos: subserviência, quando não submissão, aos empresários deste país... empresarial.

E, agora, pergunta-se, que, neste caso é uma forma superior de reflexão: o que leva o governo de um grande concelho como o Porto, a exemplo do que faz o governo da Nação, a submeter-se aos lobbies, que os há também nos livros? Pergunta-se mais: o que leva uma conceituada vereadora da Cultura do segundo maior município do país a ceder às querelas, às polémicas, às zangas e aos arrufos entre os editores potugueses, que já conduziram a uma cisão entre eles, e que em vez de beneficiarem os leitores os prejudicam? Que culpa têm os leitores, que se viram privados de um Pavilhão dedicado a António Nobre no centenário da sua  morte, em detrimento da falta de espaço aludida pela vereadora para que todos os editores se instalassem na Feira do Livro do Porto deste ano da graça de 2000, privando-se a Câmara do seu próprio espaço?

Ou esta querela entre a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros e a nóvel e dissidente União de Editores Portugueses foi apenas um pretexto para a Câmara Municipal do Porto, lavando as mãos, responsabilizar ambas as associações pela sonegação aos portuenses, aos penafidelenses, aos portugueses, da exposição sobre o poeta, repartido entre Porto e Penafiel, entre a Foz do Sousa e Leça, entre Coimbra e Paris, e que os portugueses conhecem pelo nome de António Nobre, ao abdicar do espaço em que deveria erguer o Pavilhão dedicado ao poeta em favor das duas associações de editores, ou foi mesmo desinteresse e negligência da Câmara Municipal do Porto convencida de que já lhe chegava o Pavilhão António Nobre ter estado no Salão do Livro de Paris. Seja, porém, uma ou outra a razão, ou mesmo que existam outras razões, a verdade é que mais uma vez António Nobre foi tratado com muito pouca nobreza. E com muito pouca nobreza foram também tidos em conta os portuenses, os penafidelenses, enfim, todos os portugueses que poderiam beneficiar com o Pavilhão António Nobre, caso a Câmara do Porto não tivesse abdicado e cedido os seus direitos de presença aos lobbies editoriais deste país, cada vez mais submisso.

E assim vai, assim continua, a cultura em Portugal, designadamente a emergente da política do livro!...

 
 


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Jornal o Arrifana - A vez e a voz dos penafidelenses
Penafiel - Junho 2000

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