ANO III  Nº 26  MAIO 2000
Director : Armando Moreira Fernandes

 


 

 

AMIZADES DESNIVELADAS

Emílio Fonseca

  Belos aqueles tempos em que uma amizade era mesmo verdadeira e autêntica. Os homens ainda não tinham sido tocados pelo "virus" das sociedades modernas. A sociedade de hoje promove, acima de tudo, os valores referenciais do sistema capitalista. O homem procura, por todos os meios e formas, o seu bem-estar material mesmo que, para o conseguir, arraste à sua frente e pise despudoradamente o seu semelhante! Tornamo-nos muito egoístas e só vemos as razões dos nossos interesses. Hoje é necessário que cada um de nós tenha um grande cuidado com os que se dizem amigos e também na formação de novas amizades.

 No entanto, há ainda verdadeiras amizades! Ainda existem aqueles homens que estão dispostos a sacrificarem-se para manterem as suas amizades tradicionais e buscam escrupulosamente a possibilidade de novas amizades, mas autênticas. Sei que é difícil porque grande parte dos homens do nosso tempo deixou-se minar pelo tal "virus" que fomenta as amizades interesseiras e enganosas. Tudo começa bem e vai de vento em  popa, tudo singra com elegância mas, de repente, começam a surgir as dúvidas e, por fim, as desilusões. Começamos a ver nas horas calmas duma serena reflexão que afinal mais uma vez nos enganamos... com este ou aquele que se dizia amigo.

 Por uma questão didáctica, dividiria as amizades em três níveis ou grupos e faríamos uma breve reflexão sobre o modo como as pessoas comunicam, em geral, umas com as outras:

 A)      A um primeiro nível de amizade, a conversa processa-se através de "Chavões": « como vai?»; «como tem passado?»; «a família está bem?». O interlocutor apercebendo-se da superficialidade o do convencionalismo da pergunta, responderá: «bem obrigado». Esta é também uma resposta "chavão" mas que corresponde ao limite mínimo da comunicação. Poderemos afirmar que nem sequer houve comunicação porque não existiu partilha entre essas pessoas. Elas fazem isto por hábito e duma forma mecanizada mas nunca são afectadas interiormente. Passam ao lado...

B)       A um segundo nível diremos que já poderá existir um diálogo, que haverá interesse em que um saiba certas coisas em relação ao outro e vice-versa, mas essa curiosidade não leva a uma aproximação maior entre as pessoas, mas dá azo a certos mexericos em que muita boa gente se compraz, falando e criticando a vida e certas situações de outras pessoas. Perguntamos coisas ao amigo, não com a intenção de o ajudar, de o respeitar ou de ter por ele grande consideração mantendo o sigilo da conversa, mas para depois nos espraiarmos na crítica negativa e destrutiva quando nos relacionamos com "outros amigos". Parece que sentimos um prazer mórbido em rebaixar os outros e, muitas vezes, distorcendo a verdade das conversas tidas e / ou dos factos.

C)      A um terceiro nível, poderemos afirmar que existirá uma verdadeira comunicação quando nos interessamos pelas situações dos outros e sentimos as suas emoções como se fossem nossas. Quando estou interessado em saber da situação dum amigo não é para ir depois mexericar sobre a sua vida, com os outros,  mas é sobretudo para o ajudar, para sofrer com ele e para utilizar todos os meios ao meu alcance no sentido de amenizar os seus problemas ou até, se possível, solucioná-los. Eis o programa de vida de um amigo de verdade. Aqui é que está a verdadeira amizade! Quando estamos sintonizados com os outros, quando existe uma grande empatia com o meu semelhante, quando olhamos para ele com respeito e carinho, quando vemos nele um irmão carente e estamos dispostos a estender-lhe a mão mesmo que a nossa vida sofra alguns sobressaltos e uma certa instabilidade, só nessa altura é que entendemos o que é ser amigo. Lá diz o velho ditado do povo e com inteira razão: "Os amigos são para as ocasiões".


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Penafiel - Maio 2000

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