ANO III  Nº 24  MARÇO 2000
Director : Armando Moreira Fernandes

 


 

 

Toda a liberdade:
a religiosa também
Antero da Silva Santos

 

Vive-se presentemente em Portugal a fase preliminar do debate, no parlamento português, da chamada lei de liberdade religiosa. O tema é complexo e por isso mesmo é que tem suscitado e suscita tanta discussão prévia, ou seja, mais concretamente, tantos depoimentos opinativos antes do debate parlamentar propriamente dito, o que significa que a democracia se cumpre, se vai cumprindo. Assim fossem tomadas em consideração algumas das ideias expendidas em textos ad-hoc, escritos e publicitados pelos bem pensantes analistas dos nossos jornais de referência, de ordinário sempre na primeira linha de intervenção sobre qualquer tema complexo (tema / problema) ou somente actual, que apareça em Portugal, como, de resto, compete a quem escreve em jornais. O que vale por dizer que aparecem constantemente, porque os temas / problemas em Portugal são frequentes e as mais das vezes complexos.

O tema, ou um dos temas / problemas actualmente na ordem do dia é, como já se disse, o da liberdade religiosa. E tudo poderia ficar por aqui, numa aceitação inócua idêntica a muitíssimos outros temas debatidos (tenham consistido ou não problemas) se não se tivessem cometido excessos, e se continuem a cometer, por puro proselitismo religioso, isto é, por proteccionismos inadmissíveis a uma confissão religiosa em detrimento de outra. Explico.

A liberdade religiosa deveria residir (e reside, no essencial) e enquadrar-se somente no conceito amplo de liberdade individual do cidadão, que apenas professará uma qualquer religião se assim o entender e desejar. Como, de igual modo, frequentará supermercados ou híperes em passeios dominicais (as novas catedrais, segundo alguns, o que pressupõe uma nova religiosidade) ou será frequentador de estádios de futebol, ou procederá a quaisquer opções a seu belo prazer, apenas dependendo da sua expressa e livre vontade, desde que não colida ou ofenda a liberdade e as opções dos outros. Ora, todos os cidadãos portugueses são livres de professarem ou não uma religião, seja ela qual for, e não será, pois, por causa dos cidadãos que é imperioso que se aprove uma nova lei de liberdade religiosa. Longe vai o tempo em que se era obrigado a ser católico para se concorrer ao funcionalismo público, por exemplo. Hoje essa obrigatoriedade não existe, dado vivermos numa sociedade livre, cuja grandeza maior reside precisamente em ninguém ser excluído por uma mera questão religiosa, só sendo de lamentar que, embora à revelia de quaisquer preceitos legais ou morais, se verifiquem exclusões por meras questões partidárias, o que pressupõe, também, um novo tipo de religiosidade, embora se proclame aos quatro ventos o laicismo dos partidos, precisamente como forma de demarcação.

O que é reprovável é que, com base na liberdade religiosa, ou de costas voltadas para ela, o Estado proteja uma religião e não outras; conceda privilégios a uma e não a todas, enfim, considere que só uma tem direitos, que às outras são sonegados. São de reconhecer, e deve-se ter em atenção que é de toda a justiça, que as religiões deverão ser diferenciadas. E não pelo facto de uma ser maioritária e as outras serem minoritárias. Não, as diferenças devem existir em razão dos serviços prestados por cada religião para o desenvolvimento de Portugal e dos portugueses. E, nesse aspecto, não poderemos ter dúvidas de que a religião católica, que é a maioritariamente preferida pelos portugueses, tem prestado, e presta ainda, serviços relevantes, predominantemente, entre outros, ao ensino e à assistência, as duas vertentes maiores em que se notabilizou desde há séculos, além de outras.

O que se pretende com uma nova lei de liberdade religiosa, que implicitamente impõe uma nova revisão da Concordata, é que se ponham cobro a determinados privilégios que ofendem a dignidade do cidadão leigo pela absurda diferenciação entre seres humanos também. E nunca o foram tanto como agora, como o demonstra a necessidade de uma nova lei de liberdade religiosa e da concomitante revisão da Concordata.

O debate sobre liberdade religiosa, que ora previamente se discute, não terá, não deverá ter outra finalidade que não seja moralizar as relações Estado / Igrejas, no que concerne aos direitos e deveres de cada uma das instituições envolvidas, tendo em atenção a relevância de cada uma das confissões professadas relativamente aos serviços que prestam a Portugal e aos portugueses.

É neste sentido que é imperioso aprovar-se uma lei de liberdade religiosa e uma nova revisão da Concordata entre o Estado Português e o Estado do Vaticano, revisão que, de resto, deve estar
 
 

 


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Penafiel - Março 2000

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