Inteligência Artificial1
Juliana Starosky2

 


O presente trabalho tem por objetivo relacionar o filme "Inteligência Artificial" com as teorias psicanalíticas do : Complexo de Édipo, Complexo Materno, Complexo de Castração, Desejo e a relação entre mãe e filho.

Inteligência Artificial trata-se de um filme que na visão da psicanálise demonstra a relação entre mãe e filho, do afeto, de todo desenvolvimento da relação entre os dois, das pessoas que estão presentes, e inclusive o filme fala sobre o desejo do homem. A fabricação dos Mecas ( robôs ) para satisfação dos desejos e necessidades humanas.

Começamos a falar sobre um casal, Mônica e Henry. Eles tem um filho ( Martin ) que está num estado de instabilidade. O casal mantém o filho em um centro de medicina até descobrirem a cura para a doença do filho. A mãe aparece nessas cenas contando historinhas de conto de fadas para o filho ( aparecem imagens pintadas nas paredes de personagens infantis ). Podemos apresentar um trecho lido por Mônica ao filho : " O bebê nasceu ao cair das primeiras folhas surge o menino e o desejo maior se torna real, o menino tinha cabelos brancos. Ele foi batizado seu avô" (www.iamovie.hpg.com.br/home/p1b.htm). É nesta cena que parece que a mãe tenta trazer a vida o seu filho " perdido". Podemos entender por " perdido" pois, a ciência ainda estava tentando descobrir a cura, e tudo era possível, a vida novamente ou a morte ( coma profundo ).

 

Nas teorias sobre desenvolvimento da criança, temos a fase de gestação dela onde aparece o momento em que a mãe ao fazer o trabalho de parto e o bebê lhe é retirado do seu ventre, ela sente-se " castrada". É um castramento simbólico mas, que leva a mãe a sentir a perda do seu objeto de desejo ( seu bebê ) que permaneceu ali dentro de seu ventre por nove meses. Podemos entender o acontecimento dessa cena de Mônica ( busca do filho doente ), como a busca pelo objeto castrado simbolicamente, o objeto que lhe foi retirado quando saiu do seu ventre e agora quando fica doente.
Durante esse processo, Henry ( figura do pai )sente a angústia e tristeza de sua esposa e lhe dá um novo objeto de desejo. Nesse momento surge David ( menino robô ). A aceitação da figura materna foi de negação pois, seria impossível para ela amar algo que não fosse gerado dentro do seu próprio útero, não era humano e sim um robô.

Mas foi durante o processo de adaptação do menino robô dentro daquele casal, Mônica passa a manter uma relação com David, mesmo que seja apenas um robô, sem sentimentos de amor, como os humanos.

Ao ser entregue à Henry, a fábrica dos mecas entregou um código com algumas palavras que ao serem pronunciadas ativavam o sentimento de amor em David. Henry entrega esse código à Mônica e ela acaba ativando em David o amor.

O que podemos analisar dessa cena que o filme nos passa, sobre " ativar o amor"? que tipo de amor é esse?.

Pode-se dizer que é aqui inicia-se o Complexo de Édipo, uma relação entre criança ( David ), e a mãe ( Mônica/ figura materna ).

Para compreender melhor vamos comentar um pouco sobre: O conceito de Édipo inicia-se na ilusão de que o bebê tem de possuir proteção e amor total, o que é reforçado pelos cuidados intensivos que o recém nascido recebe por condição frágil. Esta proteção é relacionada de maneira mais significativa, à figura materna.

Mais ou menos aos três anos de idade, a criança começa a entrar em contato com algumas situações em que sofre interdições.

Essas interdições são facilmente exemplificadas pelas proibições que começam a acontecer nesta idade. A criança não pode mais fazer certas coisas porque já está " grandinha", não pode mais passar a noite inteira na cama dos pais, andar pelada pela casa ou na praia, é incentivada a sentar corretamente e controlar o esfíncter, além de outras cobranças .

No filme, temos a cena onde David esta sentado com Mônica e Henry, o menino procura manter o mesmo comportamento que os humanos à mesa, e os imita como na fase de desenvolvimento da criança que imita o comportamento dos pais mas, Henry (figura paterna) limita e pede para que David pare pois ele não é humano. Outra cena acontece quando o telefone toca e David atende reproduzindo a voz de Henry, Mônica rapidamente pede para que ele pare e entregue o telefone à ela. E mais uma cena acontece quando, as figuras materna e paterna colocam David para dormir, porém um robô não dorme! Sentem-se nesse momento " desmascarados" pela relação que estabeleciam com seu filho (orgânico) que não estava presente, passam então a deslocar essa falta objetal (figura do filho não presente) para o um substituto temporário David.

Freud irá definir as fases do Édipo em fase oral ( zona de erotização é a boca), fase anal ( a zona de erotização é o ânus), fase fálica ( a zona de erotização é o órgão sexual) e em seguida vem um período de latência que se prolonga até a puberdade e se caracteriza por uma diminuição das atividades sexuais, isto é, há um intervalo" na evolução da sexualidade. E finalmente na puberdade é atingida a última fase, a genital, quando o objeto de desejo não esta mais no próprio corpo, mas em um objeto externo ao indivíduo- o outro.

E é no Complexo de Édipo que está a estruturação da personalidade do indivíduo. (livro: Psicologias de Ana Mercês Bahia Bock, pg 75).

 

Para Lacan o Édipo se divide em três estágios ou estados, que são:

1º) da diferenciação primeira com a mãe,estágio do espelho, ordem imaginário(frustração ).

2º) a criança passa para sua inclusão a ordem simbólica da família ( privação); graças à intervenção " fálica" do pai, como representante da cultura e da linguagem. Nesta ocasião a

criança se adota a classe gramatical do "eu"; e o 3º) é de ordem real, o pai fica sujeito também à lei e é destruído como sujeito " fálico" exclusivo ( castração ).

Pode-se analisar o 1º momento do édipo quando David tenta se aproximar da mãe, seguindo ela em todos os lugares da casa, até mesmo no banheiro; esse é um momento onde a criança busca o amor da mãe e ao mesmo tempo tenta fazer a diferenciação, seguindo ela, mantendo contato, tocando, olhando, sentindo. A cena onde David derruba o perfume de Mônica no banheiro também é uma tentativa de aproximação, de busca pelo amor da mãe.

O segundo momento entra a figura indireta do pai que limita David. Ocorre uma cena onde David para conquistar o amor de sua figura materna, entra em no quarto do casal e com uma tesoura tenta cortar um maço de cabelo de Mônica, aqui a figura paterna acorda para "punir" o menino robô, pois acreditou que David fosse machucar Mônica.

Com a volta de Martin a vida da família, ocorrem atritos que tenta provocar David despertando competição pelo amor de Mônica ( mãe ). No desenvolvimento da criança a competição entre irmãos é uma fase de disputa por um único objeto simbólico - o amor materno. A criança pode até regredir até mesmo na linguagem para " ser igual" ao seu irmãozinho mais novo e " ser aceito" igualmente pela mãe (ganhar atenção na mesma proporção).

 

Durante um outro momento onde Martin cai na piscina pois David o abraça para se proteger de outras crianças que tentam cortá-lo com uma faca para saber se o robô sente dor o pai coloca a lei e diz a Mônica que Davi não pode mais permanecer na casa, ele precisa ser levado devolta à Cybertronics ( onde foi projetado ) para então ser destruído. Podemos dizer que ocorre aqui o momento da castração simbólica, ou seja, o pai castra a mãe lhe estabelecendo uma lei. Mesmo Mônica sentido-se angustiada, não querendo levar o menino robô até a fábrica para ser destruído, tem a idéia de deixá-lo na floresta. Um ato de amor materno, tentando proteger o seu filho. Mônica o deixa com Teddy, um ursinho de pelúcia dado por ela. Essa figura do ursinho pode ser comparada ao consciente de Davi ou como o seu objeto fálico, ou como seu Objeto Transicional ( termo de Winnicott ).

Lacan define o Objeto Transicional ( no caso o ursinho Teddy ), como "o representante do ganho obtido pelo sujeito em relação a dependência do outro, na relação do sujeito ao Outro da demanda".

Neste sentido, este objeto constitui uma vitória sobre a angústia provocada no sujeito pelo desejo do outro, no que este desejo tem de enigmático para o sujeito. O efeito do Objeto Transicional é tranqüilizante pois este permite à criança adormecer tranqüila. Em conseqüência, enquanto o Objeto Transicional se apresenta como o que supre a falta a ser do sujeito o objeto é o índice desta falta . Assim, sendo, o objeto é correlacionado com a angústia de castração, enquanto o Objeto Transicional encobre totalmente esta angústia. O Objeto revelando-se através da angústia, revela a falta do significante no outro e no sujeito, deixando de emergir a impossibilidade de se representar o gozo do outro, a não ser em termos de objeto.

Então, compreendendo um pouco da teoria de Objeto Transicional relacionada a figura do ursinho Teddy no filme podemos dizer que a mãe deixou ( fisicamente) David na floresta mas simbolicamente estava presente na figura do urso dado por ela, para protege-lo.

Contudo, vamos entender um esse termo " castração": O termo castração é um dos conceitos fundamentais de Freud.

Lacan define castração como uma operação simbólica sobre objeto imaginário (o falo) efetuada por um agente (o pai real). Essa definição é freudiana mas, Lacan aprofunda dois elementos desta definição que são o falo e o pai real.

Analisando o momento em que Mônica deixa David na floresta, ela rompe o falo (objeto imaginário de amor) para não ser punida pelo marido (Henry).

Sentindo-se abandonado na floresta e com Teddy, David vai em busca do imaginário que a fada azul, ou seja, é a personagem dos contos de fadas que deu vida ao boneco pinóquio.

No desenvolvimento infantil percebemos que as crianças procuram buscar algo como objeto simbólico, pode ser uma frauda, um travesseiro, um ursinho ( ou outro brinquedo ), esse foi o caso de David e acreditam em suas fantasias, como o filme : a fada azul.

Passando por apuros acaba conhecendo o gigolô Joe, um robô fabricado para satisfazer os desejos sexuais dos humanos. Pode-se dizer que o desejo do homem à perfeição ao desejo sem dor ou angústia, levou o homem à fabricar um robô capaz de proporcionar prazer.

Em um dado momento David usa o seguinte diálogo com Joe: " Minha mãe não me odeia ! Porque eu sou especial e único! Porque nunca existirá alguém como eu. Nunca!

Mamãe ama Martin porque ele é real e quando eu for real, Mamãe vai ler para mim, vai me levar para a minha cama, e cantar para mim, e escutar o que eu digo, ela me abraçará e dirá centenas de vezes por dia que ela me ama!" (www.iamovie.hpg.ig.com.br/home/b2b.htm).

Aqui o Édipo fica mais forte, pois David quer seu objeto de desejo ( mãe ) e corre atras do imaginário para conquistá-lo.

David na busca pelo imaginário depara-se com um enigma e tentando decifra-lo encontra um outro David, nessa cena a reação da criança robô é de fúria e então destrói o outro robô.

Então surge seu inventor que diz : " David, você é único, você aprendeu a amar, você teve fantasia e imaginação e foi em busca do seu desejo!".

O menino robô entrando no laboratório vê ali milhares de David´s em caixas e pela janela a figura que desenhava para a sua mãe. Então, atira-se do prédio ao oceano de Nova York inundada, será que a àgua simbolizava o útero materno para David?.

Mergulhando na imensidão do oceano vê pinóquio, e o menino é salvo pelo gigolô Joe em sua cápsula.

Estando na cápsula, Joe é preso pelas pessoas que o seguem e David segue sozinho na busca do seu objeto de desejo ( Mônica ).

 

Navegando no fundo do mar junto à Teddy ( ursinho ), encontra a fada azul , e uma roda gigante desaba sobre a cápsula permanecendo ali durante anos, pedindo a fada azul que desse à ele a vida para sua mãe o amá-lo, como ama Martin.

Descongelado por robôs super evoluídos David tem sua memória lida por eles e seu desejo de ter sua mãe é aceito por apenas um dia, isso só foi possível pois Teddy havia guardado um maço de cabelo que David havia cortado.

Tendo seu desejo realizado ( Mônica diz que o ama ), David sabe que ela irá adormecer para toro o sempre assim que a noite chegar , e então sobem até o quarto deitam-se na cama , e a figura da mãe e filho adormecem .



Notas

1 - Produção publicada no site Instituinte em 31 de agosto de 2002.
2 - Aluna do 2º ano do curso de Psicologia da Faculdade Joinvilense de Psicologia - ACE. Cidade de Joinville, Santa Catarina. E
-mail: [email protected]


Voltar ao início da página

Voltar

Hosted by www.Geocities.ws

1